Novo estudo da JLL analisa impacto do trabalho à distância em Portugal, identificando tendências do pós-pandemia. Nada voltará a ser igual.
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Aviso a trabalhadores e empresas: mais teletrabalho, sim; fim dos escritórios, não
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Da noite para o dia. Foi mais ou menos assim que o teletrabalho teve de ser implementado em muitas empresas portuguesas, em plena pandemia da Covid-19. O conceito não é novo, mas vivia agarrado a um “estigma” que agora caiu por terra. Trabalhar a partir de casa será o novo normal e 95% dos profissionais considera que, após o desconfinamento, o melhor é passar a teletrabalhar, pelo menos um dia por semana, segundo um estudo da JLL. Mas a nova tendência não será, de maneira nenhuma, o princípio do fim dos escritórios ou 'open spaces', pelo contrário. Os escritórios do futuro têm agora um desafio: transformarem-se em espaços de trabalho mais flexíveis e promotores do bem-estar mental e físico.

Portugal - à semelhança do mundo - experimentou, em poucas semanas, mudanças e alterações nunca antes vistas, nomeadamente nas estruturas organizacionais das empresas. A rapidez e agilidade foram palavras de ordem, sendo necessário criar dentro de muitas casas um espaço dedicado ao trabalho. Graças ao digital, e aos grandes avanços da tecnologia, foi possível, à distância, manter vivas muitas atividades empresariais que, noutra altura, não teriam boia de salvação possível. O mais recente estudo da consultora JLL, “Remote Work em Portugal”, apresentado virtualmente à imprensa, esta terça-feira, 18 de maio de 2020, destaca esta e outras ideias que deixam antever profundas alterações para o futuro.

Aviso a trabalhadores e empresas: mais teletrabalho, sim; fim dos escritórios, não
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O trabalho a partir de casa não é novo, e não era tido, por muitas empresas, como um ente querido. Agora que já faz parte da “família” de muitos, por causa da pandemia, ganhou “adeptos”. O estudo, realizado pela consultora nas últimas semanas junto dos profissionais portugueses, destaca que este regime está a ser “muito bem aceite” e que “há uma clara vontade de o manter no futuro”. De acordo com este inquérito, 95% dos profissionais considera que, após o desconfinamento, o melhor é passar a trabalhar a partir de casa pelo menos um dia por semana, sendo que dois a três dias é considerada “a dose ideal", sendo uma opção indicada por 57% dos inquiridos”.

Pandemia acelera mudança de realidade

A pandemia “veio acelerar uma realidade que mais cedo ou mais tarde acabaria por acontecer – a massificação do teletrabalho” - refere o estudo, explicando que muitas empresas adaptaram-se a esta nova realidade em poucos dias, usando os recursos e tecnologias que já tinham, provando assim que, mesmo sem ser necessário, “já era possível trabalhar a partir de casa e, em vários casos até, manter o mesmo nível de contacto, comunicação e resultados, sendo a transformação digital um elemento chave nesta mudança”.

“A pandemia veio acabar com alguns estigmas que existiam e acelerar a massificação do teletrabalho (...) e a transformação digital é a chave essencial para esta mudança. A pandemia veio apenas acelerar a mudança de mentalidade”, comenta Maria Empis, Head of Strategic Solutions da JLL Portugal. Caetano Bragança, Head of Workplace Strategy, não deixa de lembrar, também, que esta experiência está longe de representar um quadro típico de trabalho remoto, mas não tem dúvidas que estamos perante uma transição sem retorno. O estudo refere, aliás, que muitos negócios jamais voltarão a ser o que eram.

Vantagens, motivações e dificuldades do teletrabalho

Entre as principais vantagens do teletrabalho apontadas pelos profissionais estão não ter que perder tempo nas deslocações (32%), não ter as interrupções constantes do escritório (27%) e ter uma agenda flexível (25%), além de ter mais tempo para a família (13%). Estas vantagens traduzem-se não só em ganhos de produtividade, como também redução da pegada ambiental, melhor gestão do tempo e uma vida mais sustentável, valores alinhados com as novas gerações: o estudo mostra que para 83% dos profissionais é relevante que uma proposta de trabalho passe a considerar o teletrabalho associado a uma agenda flexível, mostrando que estes podem ser importantes pontos para a captação e retenção de talentos.

Entre as principais vantagens do teletrabalho apontadas pelos profissionais estão não ter que perder tempo nas deslocações (32%), não ter as interrupções constantes do escritório (27%) e ter uma agenda flexível (25%)

A perceção sobre o teletrabalho é, destaca o documento, “francamente positiva”, com os inquiridos a considerar que esta forma de trabalho podem contribuir para uma melhoria no desempenho profissional (importante para 71% dos inquiridos), que não impede a progressão na carreira (69%) e que reduz o stress (57%).

Os inquiridos reconhecem algumas dificuldades neste conceito, apontando como inconveniente as tentações da casa (31%), a dificuldade de concentração devido à estrutura familiar (23%) e não ter um espaço adequado em casa (19%). A tecnologia como impedimento foi apenas apontado por 13% dos inquiridos.

Para Maria Empis, a maior dificuldade prende-se como “traçar a linha entre a vida profissional e a vida pessoal, onde entram as relações familiares e sociais, a gestão do dia-a-dia e o lazer”. “Se estas duas vidas são confundidas sem uma separação visível, existe o risco de se cair em isolamento profissional ou isolamento social. Neste tema, põe-se também a importância de ter um espaço em casa confortável e adaptado ao trabalho remoto”, explica a responsável de Strategic Solutions da JLL Portugal.

Fim dos escritórios? Um redondo não

O teletrabalho veio para ficar, mas não será uma “ameaça” aos espaços físicos. Caetano de Bragança afirma, com toda a certeza, que o traballho a partir de casa não significa o fim dos 'open spaces'. “Cada empresa terá de descobrir a sua receita”, garante, referindo que iremos, sobretudo, começar a falar menos de escritórios e mais de espaços de trabalho. Se há empresas para as quais o teletrabalho é a solução ideal, diz, para outras fará sentido transformar pronfundamente os espaços para receber os colaboradores, porque faz parte da sua cultura organizacional - e também porque a desumanização é o principal "calcanhar de aquiles" do trabalho a partir de casa. 

Aviso a trabalhadores e empresas: mais teletrabalho, sim; fim dos escritórios, não
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Na prática, a massificação do teletrabalho vai revolucionar o conceito do escritório físico trazendo novas necessidades, vontades e hábitos para o futuro. Não haverá, uma transição total do trabalho no escritório para o trabalho em casa, segundo o estudo da JLL. “O espaço físico de trabalho em equipa vai ganhar importância no futuro com espaços de trabalho mais flexíveis, onde se incluem mais espaços de colaboração e de sociabilização”, refere, adiantando que “o escritório do futuro deverá ainda ser promotor de bem-estar fisico e mental” uma vez que acolhe e potencia as interações espontâneas diárias entre colaboradores. “Este é responsável por uma parte relevante da vida social da empresa, que em muitos casos cria uma rede de amizades forte, o que acaba por contribuir positivamente para a cultura da mesma”, lembra a consultora.

Não haverá, segundo o estudo da JLL, uma transição total do trabalho no escritório para o trabalho em casa

As empresas terão, por isso, e em última análise, de criar conforto com espaços adequados ao trabalho desempenhado, reorganizando o escritório com estratégias que combinem espaços, pessoas e tecnologia, “uma vez que a tendência futura é de uma maior atenção à qualidade do espaço social”.

As (muitas) mudanças à vista

O trabalho, a casa, o ambiente e a saúde são todos vetores que trabalham em uníssono, complementado-se em diferentes vertentes. O estudo da JLL destaca, por exemplo, que o bom enquadramento do teletrabalho pode ser um aliado na luta contra a crise climática, porque é sinónimo de sustentabilidade ambiental e social. Poderá verificar-se uma diminuição de emissões de CO2 com a redução das deslocações e até uma redução do stress, que pode ainda significar ganhos para a saúde.

Teletrabalho significa também passar mais tempo em casa e nas nossas zonas de residência. Assim, e “se por um lado é esperado uma maior exigência na qualidade da habitação e a reserva de um espaço para trabalho, por outro podemos esperar novas oportunidades em muitas zonas urbanas que deixarão de ser meros dormitórios e ganharão uma nova vida”.

Por fim, e não menos importante, esta pode ser uma oportunidade para Portugal. A massificação global do teletrabalho poderá ter fortes impactos no mercado imobiliário nacional, segundo a JLL, uma vez que “reúne condições únicas para profissionais estrangeiros que consigam estar em teletrabalho”.

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