Como em tudo na vida, há zonas cinzentas. E as relações amorosas entre colegas de trabalho são um desses temas complicados de gerir. Para quem as vive e para as empresas. Além dos princípios de "bom senso" dos empregadores e de "transparência" dos colaboradores, as duas partes têm de respeitar o enquadramento legal que existe previsto para estas situações, avisam os especialistas.
A recente demissão do presidente e diretor executivo da McDonald's veio reacender este ponto que tende a ser um "tábu" na realidade laboral portuguesa. Muitas empresas a operar no mercado nacional, à semelhança da cadeia da restauração norte-americana, têm já códigos de conduta ou regulamentos internos que contemplam as regras a aplicar nos casos de relação amorosa entre companheiros de trabalho. Mas a Lei do Trabalho também prevê este cenário e determina como atuar.
O Notícias ao Minuto foi perguntar a um advogado se uma empresa pode proibir uma relação amorosa entre dois colegas. E a resposta, que agora reproduzimos, foi taxativa. Não, não pode, estando em causa os direitos de personalidade do trabalhador previstos no Código de Trabalho.
O que diz a lei laboral em Portugal?
“As relações amorosas que cada um entende ter com quem quer que seja é um aspeto que contende com a reserva da intimidade da vida privada do trabalhador”, explicou ao portal de notícias Nuno Cerejeira Namora, sublinhando que “o Código do Trabalho refere expressamente que o empregador deve respeitar os direitos de personalidade do trabalhador, inclusive abstendo-se de aceder e/ou divulgar aspetos relativos à esfera afetiva e sexual do trabalhador”.
Estes factos anulam qualquer tipo de proibição a uma relação amorosa entre colegas, uma vez que o empregador “depois fica impedido de questionar aspetos relativos a essas mesmas relações”, frisa o especialista em Direito Laboral e fundador da Law Academy.
E, uma relação amorosa entre dois colegas pode valer despedimento por justa causa? Depende. Ou seja, o facto de um trabalhador iniciar uma relação romântica com um colega não é motivo para despedimento por justa causa, fazendo parte da intimidade do trabalhador, em que o empregador não pode interferir. Mas o caso muda de figura em certas circunstâncias.
“Uma coisa é a liberdade que cada um tem para se relacionar com entende; outra coisa, bem diferente, é a liberdade que um casal tem para, no contexto laboral, demonstrar afetos em público”, indica Cerejeira Namora ao mesmo meio.
Empresas podem penalizar quem tem uma relação assumida e consentida?
As relações amorosas assumidas de uma forma transparente, por regra, não são um motivo aliás um motivo que penalize quem tem namorado/a ou cônjuge a trabalhar no mesmo local, desde que sejam cumpridas estas regras.
"Temos de nos lembrar que há um importante número de grandes empresas portuguesas que começaram como empresas familiares e que estas últimas, são também, ainda muito representativas do nosso universo empresarial. Ora, é impossível que nesses casos as relações familiares não existam" aponta Mariana Canto e Castro, diretora de Recursos Humanos da Randstad ao Notícias ao Minuto.
Mas é verdade, que "talvez desde o virar do século começou a nascer alguma vontade não de proibir mas de regulamentar essas situações, que é o que geralmente acontece nas multinacionais”, acrescenta a responsável, até por preocupação relacionadas com a produtividade (assumindo que uma relação amorosa no local de trabalho pode diminuir a concentração e, por conseguinte, a produtividade). Outras preocupações são, como referido acima, potenciais situações de abusos de poder, de benefícios indevidos ou até potenciais casos de assédio ou importunação sexual.
No caso da possibilidade de assédio e abuso de poder, Nuno Cerejeira Namora relembra que em causa estão coisas diferentes. “O assédio e o abuso de poder não estão no mesmo patamar que uma relação amorosa consentida. É evidente que o empregador tem a responsabilidade de sancionar todo e qualquer comportamento abusivo e assediante que ocorra no local de trabalho”, diz o advogado.
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