No município espanhol de Algar, este velho costume ainda não se perdeu. E quer que a UNESCO proteja este hábito da conversa ao "acaso".
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Estar sentado ao fresco à conversa quer ser património da Humanidade
Foto de Jan Kroon no Pexels

Estar sentado ao fresco, à porta de casa, a conversar, contar histórias e peripécias da vida. Um hábito do antigamente que se foi perdendo ao longo do tempo (e quase em extinção). E é por isso que há um município em Espanha que quer elevar este velho costume a património cultural imaterial da Humanidade. O objetivo é simples: recuperar a aproximação entre pessoas, vizinhos, provando que as conversas ao ar livre podem conviver com outras formas de comunicação nascidas das novas tecnologias.

A ideia nasceu em Algar, um pequeno município espanhol na província de Cádis, com cerca de 1.400 habitantes. Lá, a tradição do “corro de sillas al fresco” (conversas ao fresco) ainda existe e persiste, tal como conta o El País. Ao final do dia e à noite, a população sai à rua, senta-se nas suas cadeiras, forma grupos, e pratica o antigo hábito da conversa ao acaso. Contam anedotas e as suas vivências quotidianas.

Algar não quer que estes rituais ou modo de as pessoas se relacionarem se perca, e por isso pretende que este costume seja reconhecido como património da Humidade. É apenas um detalhe, mas faz parte da personalidade destes povos, tal como explica o jornal espanhol.

Estar sentado ao fresco à conversa quer ser património da Humanidade
Photo by Cristina Gottardi on Unsplash

“A minha mãe tem 82 anos e fica sentada na rua todos os dias. Há dias em que termino o trabalho, saio, sento-me e conversamos. É o momento mais bonito do dia ”, explica José Carlos Sánchez, presidente de Algar e promotor da iniciativa, citado pela publicação. Um dos moradores do município faz um retrato dos dias por lá se vivem: “Pondo-se o sol, estamos aqui. Esperamos até o jantar, voltamos para casa, e depois saímos de novo até à meia-noite", conta José Ibáñez, de 81 anos, reclinado confortavelmente numa cadeira de plástico.

É difícil perceber de onde vem esta tradição de ficar à conversa à porta de casa com os vizinhos ao pôr do sol. Não se trata, porém, de um ritual exclusivo de Algar, mas está vinvulado a um modo de vida tranquilo e rural, e muito menos evidente em cidades, como explica a antopóloga Eva Cote. Segundo a especialista, “o costume é mediterrâneo, porque também acontece no Sul de Itália ou na Grécia”, e em Portugal ainda se encontram estes velhos hábitos. Trata-se, na verdade, de uma herança de todos.

O medo do vírus e o despovoamento (também) em Portugal

“Quando o hábito de nos pormos ao fresco era normal, ficávamos nas ruas até às 22h ou 22h30”, conta Idalina Filipe, de 78 anos, residente na freguesia do Cano, concelho de Sousel, no Norte alentejano, ao jornal Público. A habitante conta que neste último ano e meio, com receio do vírus, o convívio entre as pessoas foi-se perdendo. “Temos uma vida triste”, diz a alentejana.

Outro exemplo, mais a norte do país, é o de António Marmelo, de quase 90 anos. Vive na aldeia de Vale do Peso e conta que antes tinha o costume de se sentar num banco de pedra À porta de casa a conversar com os amigos. “Quem não tinha bancos de pedra trazia de casa uma cadeira”, conta, lamentando que o hábito se tenha perdido.

Estar sentado ao fresco à conversa quer ser património da Humanidade
Photo by Vlad Sargu on Unsplash

“As pessoas foram abalando da terra. Eu próprio saí de Vale do Peso para Almada. Tinha 14 anos. Regressei nos anos 90 para ter uma vida muito mais calma e numa casa que é minha”, diz.

Para o investigador José Carlos Mota, o despovoamento é um dos principais entraves à continuidade destes velhos costumes, não só nas aldeias, mas também nas zonas mais históricas das grandes cidades. “Para que estas práticas aconteçam tem de haver pessoas”, defende, em declarações ao Público.

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