
O diretor executivo da Casa da Arquitetura, Nuno Sampaio, defende um regime de exceção para resolver o problema da habitação em Portugal, mas alertou que o recurso reiterado a mecanismos de exceção significa que a regra não está bem.
“Provavelmente o que temos de fazer é um regime de exceção para resolver o problema. Isto quer dizer que temos um regime de base que tem problemas. Temos governos que têm vontade, temos engenheiros e arquitetos que querem projetar, temos empresas que querem construir, existe dinheiro. Se não conseguimos pôr uma máquina em movimento, temos de ver qual é o enquadramento em que estamos a atuar: Definitivamente, olharmos a forma de fazer, que tem de ser simplificada”, afirmou Nuno Sampaio, em entrevista à agência Lusa.
A presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses, Luísa Salgueiro, assumiu há 10 dias (em entrevista à Lusa), que as autarquias não têm atualmente problemas financeiros para construir habitação, mas dificuldades em executar e cumprir prazos. Segundo a autarca, o “grande problema” reside nos prazos porque, até se chegar à fase de construção, o processo é muito moroso”.
Nuno Sampaio recordou que para reabilitar rapidamente o degradado parque escolar português foi necessário recorrer a regimes de exceção em vários domínios. “Agora temos um problema para recuperar o nosso parque habitacional e mesmo o parque não habitacional do Estado podia ser convertido em parque habitacional em que o terreno é do Estado”, advogou.
“Por exemplo, antigamente as cooperativas funcionavam muito bem para produção de habitação a baixo custo. Temos aqui no Porto exemplos lindíssimos de boa arquitetura, que construíram cidade nova (…). Hoje têm muita dificuldade em realizar, porquê? Nem tudo pode ser Estado, nem tudo pode ser promoção de alta gama. A dificuldade está em criar mecanismos de execução com o atual enquadramento legal, fazer projetos e fazer construção e, simultaneamente, dar capacidade às pessoas de acederem à compra”, sustentou o arquiteto.
De acordo com Nuno Sampaio, o modelo do crédito à habitação está “a esgotar-se”, devido às elevadas taxas de juro, enquanto no âmbito da construção, o formato jurídico atual é “bastante complexo”.

É preciso menos "menos esforço" e "menos burocracia" para construir casas
“Vivemos um momento, principalmente no período da ‘troika’ [2011-2014], e já antes da ‘troika’, em que começamos a desenvolver um processo jurídico para que o país demorasse muito a fazer. E depois, quando é necessário fazer-se, estamos todos dentro de um emaranhado legal que dificulta e atrasa muito o desenvolvimento dos processos”, observou, instando a classe política a refletir. “Temos a capacidade de fazermos mais, com menos esforço, com menos burocracia, com mais eficácia”.
Para Nuno Sampaio, é importante que todos os profissionais envolvidos neste setor consigam trabalhar em conjunto. “O que implica que Portugal desburocratize para conseguirmos rapidamente fazer face às urgências que existem, que é a falta de habitação num momento em que temos juros altíssimos que sufocam a economia para poder ir buscar dinheiro e fazer”, indicou.
“É necessário fazer algumas mudanças no Estado, porque foram muitos anos a construir-se legislação que dificulta fazer coisas em Portugal”, prosseguiu, lamentando: “No fundo, quem está a sofrer com esta crise de habitação é a população”.
O arquiteto referiu que além dos processos terem de passar por várias entidades e os concursos serem prolongados e de fácil contestação, há dificuldades na contratação dos projetistas e na adjudicação das obras, mesmo quando as entidades públicas querem executar. O tempo e a forma de atuação do Tribunal de Contas para fazer cumprir a lei, considerou, representa neste momento “uma entropia”. “É preciso alterar isto, deixar de pensar que cada cidadão é um eventual corrupto e que cada cidadão é um eventual infrator”, declarou.
“O mercado está a mostrar que, existindo demanda para habitações de classes mais elevadas, elas realizam-se. Havendo clientes que garantam a compra de habitação mais elevada, os promotores conseguem arranjar maneira de fazer. O que não estamos a conseguir é dar à classe média uma capacidade de comprar”, resumiu Nuno Sampaio.
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