Para o arquiteto natural de Bagunte, o projeto, o cliente e o empreiteiro são fundamentais para o resultado final de uma obra.
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Na estrada que atravessa a pequena freguesia de Bagunte há uma fachada que se destaca. Entramos e encontramos um espaço único, pensado ao pormenor. Já assim seria o atelier de arquitetura perfeito mas, o facto de estarmos na antiga casa dos avós de Raulino Silva, torna tudo ainda mais especial. 

O arquiteto, que nasceu exactamente em Bagunte em 1981, tem recebido inúmeros reconhecimentos pelo seu trabalho. antiga casa dos avós. O transformação do atelier de arquitetura garantiu o primeiro lugar da sétima edição do Prémio de Arquitectura de Bacu 2025 na categoria de interiores.

É fácil identificar o luxo - qualidade, a autenticidade e a exclusividade, no trabalho de Raulino Silva, ainda que o arquiteto não queira estar colado à palavra. "O detalhe está presente em todas as obras, sejam baratas ou caras. Para mim, o verdadeiro luxo é desenhar bem e construir bem. Dou muita importância à construção. Gostamos que a obra fique bem executada, próxima daquilo que desenhámos", defende. Talvez seja exactamente por isso. 

Atelier Arquitetura
Atelier Arquitetura João Campos

Como nasceu a sua paixão pela arquitetura?
Eu acho que surgiu naturalmente. Ao longo do percurso escolar, sempre fui escolhendo as disciplinas de desenho, de artes, de trabalhos manuais. Sempre gostei muito, sempre gostei de trabalhar com as mãos, fazer esculturas, maquetes. Nasci aqui em Bagunte e, em pequeno, fazíamos cabanas, era um modo de brincadeira. Depois, no secundário, escolhi Artes Visuais e, depois desses três anos, decidi escolher Arquitetura e fui estudar para o Porto.

O atelier está neste espaço há 15 anos. Como foi esse início?
Depois de terminar o curso de Arquitetura, trabalhei alguns anos na cidade do Porto. Quando decidi abrir o meu escritório, a casa estava vazia, e havia sempre um gosto da família, tanto dos meus pais como dos meus tios, para que a casa ficasse na família e não fosse vendida. Decidi, então, ficar aqui a trabalhar. Na altura, ser arquiteto em Portugal era um bocado difícil, eu não tinha dinheiro para alugar um espaço, então foi uma oportunidade.

Vila do Conde
Vila do Conde João Morgado

E a transformação do espaço, que hoje é uma referência, como aconteceu?
Trabalhámos na casa antiga durante cerca de 12 anos. Só depois, na altura da pandemia, quando fomos todos para casa, decidimos avançar com a ampliação. Já tínhamos feito alguns estudos de como poderia ser, vários projetos, uns maiores, outros mais pequenos, mas a necessidade de melhorar o isolamento e o aquecimento acabou por acelerar tudo. A obra foi concluída no ano passado e já estamos aqui há cerca de um ano.

Em 15 anos de percurso, há projetos que se destacaram?
Tivemos sempre a sorte de poder construir, o que é muito importante. Temos muita obra construída e isso é uma marca do atelier. Há cerca de cinco ou seis anos, concluímos um projeto muito especial, um hotel para cães e gatos, aqui em Vila do Conde, que foi diferente de tudo o que tínhamos feito e também um dos maiores. Foi uma experiência engraçada e enriquecedora. Além disso, fizemos várias casas espalhadas pelo Grande Porto e concelhos vizinhos, com clientes muito participativos e empreiteiros dedicados. Acho que esses três elementos: projeto, cliente e empreiteiro, são fundamentais para obras boas e singulares.

Hotel para cães e gatos
Hotel para cães e gatos João Morgado

O que é, afinal, o luxo na arquitetura?
O luxo é um tema difícil de definir. O que procuramos sempre é desenhar bem as obras, encontrar os materiais adequados. Claro que há clientes com maior capacidade financeira que pedem pedras mais caras ou vidros especiais, mas o detalhe está presente em todas as obras, sejam baratas ou caras. Para mim, o verdadeiro luxo é desenhar bem e construir bem. Dou muita importância à construção. Gostamos que a obra fique bem executada, próxima daquilo que desenhámos.

Refere muitas vezes a importância do empreiteiro. A execução é tão essencial quanto o desenho?
Sem dúvida. Ao longo dos anos, aprendi muito nas obras. Aqui na zona do Grande Porto encontramos carpinteiros, trolhas, profissionais com gosto pelo que fazem e vontade de fazer bem. Costumam dizer “queremos servir bem o cliente”, e isso cativa-me. Quando todos procuramos o mesmo resultado, o resultado final é sempre melhor.

Casa Pedroso
Casa Pedroso José Campos

Olhando para o futuro, que caminhos gostava de explorar?
O nosso atelier fez, durante muitos anos, projetos de habitação unifamiliar, casas desenhadas para pessoas que vinham ter connosco com os seus sonhos e necessidades. Nos últimos anos, talvez também por eu estar a ficar mais velho (risos), temos feito projetos diferentes: edifícios de apartamentos e habitação coletiva. São projetos maiores, mais demorados e exigentes, mas interessantes. No início estranhámos, porque deixámos de ter aquele contacto direto e contínuo com o cliente, só o encontramos quase no fim, quando os apartamentos são vendidos, mas foi uma evolução natural.

Como se desenha para um comprador desconhecido?
O local influencia sempre muito o projeto: o tamanho do terreno, a orientação solar, se está na cidade ou no campo. Tudo isso condiciona o desenho. Gostamos de ouvir as pessoas, perceber o que pretendem. Quando há um cliente, desenhamos para ele, com base nos seus desejos e sonhos. Quando não há, tentamos antecipar o que tornará aquele espaço confortável, funcional e harmonioso. Um arquiteto desenha por encomenda, mas também interpreta o lugar e as necessidades humanas que ainda não foram ditas.

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