Se tens gatos em casa, provavelmente já ouviste falar de cuidados tradicionais como vacinas, desparasitação e consultas de rotina. Mas existe uma abordagem que vai além da medicina convencional, a medicina veterinária integrativa. Esta prática combina tratamentos tradicionais, como cirurgias e medicação, com terapias complementares, como por exemplo, acupuntura, fitoterapia, homeopatia, nutrologia e aromaterapia, para cuidar do gato de forma holística. O objetivo não é apenas tratar da doença, mas olhar para o teu melhor amigo felino como um todo. Ou seja, consideram-se fatores físicos, emocionais e ambientais, com vista a melhorar o bem-estar geral do teu animal de estimação.
Em Portugal, a Clínica do Gato no Parque das Nações, inaugurada em 2017, é um exemplo de excelência nesta área. Sob a direção clínica de Filipa Manteigas, a clínica oferece serviços diferenciadores para gatos, que combina essas terapias alternativas e complementares e disponibiliza consultas de medicina geral e preventiva, exames de diagnóstico, cirurgias e consultas de especialidade, sempre num ambiente tranquilo.
Para percebermos melhor como funciona esta medicina e as suas possibilidades, falámos com a veterinária Filipa Manteigas, que nos partilhou como podemos cuidar dos nossos gatos ao explorar estratégias de bem-estar, alimentação, prevenção de doenças e redução de stress.
A sua abordagem é a medicina veterinária integrativa. Poderia explicar em que consiste e como pode complementar os tratamentos convencionais?
Basicamente, a medicina veterinária integrativa é uma conjugação de várias terapias. A base é sempre a medicina convencional, mas adaptada especificamente para os gatos. Podemos complementar com outras terapias, como acupuntura, fitoterapia, homeopatia ou terapia neural. A abordagem integrativa permite tratar e prevenir doenças considerando o gato como um indivíduo único. Assim como nos humanos, cada gato tem a sua personalidade, preferências alimentares e tolerâncias. O objetivo é conhecer a rotina e o ambiente do animal, bem como a dinâmica da sua família, para criar estratégias que previnam doenças e prolonguem a sua vida de forma saudável.
Quando existe uma doença, o tratamento é personalizado, considerando o gato como um todo e não apenas o órgão ou um sintoma. E, muitas vezes, este cuidado também envolve orientar os tutores, tornando-os parte ativa no bem-estar do gato.
A alimentação natural está certamente relacionada com esta vertente da medicina veterinária. O que é e quais os benefícios?
A alimentação natural é muito diversa. Podemos optar por alimentos cozinhados, crus, com osso ou sem osso. Eu uso sobretudo a alimentação cozinhada e mista, complementada com alimentos secos de alta qualidade, sem cereais, e com muita proteína. É importante que os gatos tenham comida disponível de forma interativa, para que possam “caçar” a sua própria refeição. Isso estimula os seus comportamentos naturais e mantém-nos ativos.
Quais são os erros mais comuns na transição para este tipo de alimentação?
Um erro frequente é o tutor escolher alimentos secos de baixa qualidade. Os gatos são carnívoros estritos, por isso precisam de proteínas de carne ou peixe de alta qualidade. Outra falha comum é fazer uma transição drástica. Na verdade, os gatos precisam de tempo para se habituar a novos alimentos. É importante introduzir mudanças gradualmente, perceber o que cada gato prefere e, idealmente, ter acompanhamento profissional para ajustar as proporções e os ingredientes às necessidades de cada animal.
Eu sou adepta de uma alimentação mista. Isto significa combinar alimentos disponíveis em comedores interativos com refeições principais adaptadas ao horário do gato. Nessas refeições, podemos oferecer alimentos cozinhados com proporções equilibradas de carne e legumes, latinhas como complemento ou, em alguns casos, alimentos crus, que exigem cuidados adicionais de higiene. Tudo isto é sempre ajustado às necessidades do gato, às expectativas e disponibilidade do tutor, garantindo uma transição segura e nutritiva.
Estas mudanças tendem a ser mais desafiantes para os gatos mais velhos. Que adaptações podemos fazer em casa para melhorar o conforto e a qualidade de vida dos felinos séniores?
Os gatos idosos costumam apresentar dores articulares, rigidez muscular ou dificuldade em saltar, o que torna algumas tarefas do dia a dia mais exigentes.
Para lhes facilitar a vida, podemos colocar banquinhos, escadas pequenas ou rampas que lhes permitam alcançar camas, janelas ou outros dos seus locais favoritos, sem muito esforço. Os pisos antiderrapantes são também fundamentais, sobretudo em zonas como casas de banho ou cozinhas, onde as superfícies lisas podem provocar escorregões e quedas. Também é importante adaptar as casas de banho e as caixas de areia, tornando o acesso mais fácil e confortável. Por exemplo, as suas casas de banho devem estar sempre abertas e a entrada deve ser o mais baixinha possível. Ou se não for baixinha, então ter uma rampa ou uma escada de acesso.
Diria que é importante observar o comportamento do gato sénior diariamente, porque não é um animal que se queixe das suas dores. Deveremos perceber se existem alterações na locomoção, saltos mais curtos ou sinais de desconforto, que indicam que precisam de começar a ser feitas algumas adaptações.
E para aquelas pessoas que costumam viajar com gatos. Que cuidados deverão ter durante viagens curtas ou longas?
Há gatos que preferem ficar em casa, e isso é algo importante a ter em conta. Muitos sentem falta dos donos, mas valorizam o seu território e, por vezes, estar no ambiente familiar é mais tranquilo do que viajar. Para os gatos que viajam, é fundamental que estejam habituados à transportadora. Antes da viagem, deve estar disponível em casa como um esconderijo ou caminha, com uma mantinha e até alguns snacks ou brinquedos, para que o gato se sinta confortável e associe a transportadora a algo positivo.
No dia da viagem, podem ser usados suplementos calmantes naturais ou sprays com feromonas para ajudar a reduzir o stress. É útil incluir uma mantinha com o cheiro de casa e, em alguns casos, cobrir parcialmente a transportadora para que o gato não veja tudo à sua volta. Cada gato reage de forma diferente, por isso é importante testar e perceber se prefere estar coberto.
Durante a viagem, evitar a música alta ou os sons perturbadores também ajuda. Música calma, tocada baixinho, contribui para criar um ambiente mais tranquilo e seguro, reduzindo a ansiedade do animal.
E quanto aos produtos de higiene que temos em casa, como lixívias e lava-tudo? Tem alguma recomendação?
Uma opção é fazer a limpeza com o gato numa divisão isolada, para que ele não tenha contacto com esses produtos. Alguns gatos até têm medo do aspirador e sentem-se mais tranquilos no seu ambiente, longe da confusão. Outra alternativa é optar por produtos mais naturais, disponíveis no mercado, inclusive indicados para casas com crianças pequenas.
Todos os produtos devem ser guardados fora do alcance do gato, prevenindo ingestões acidentais. A maioria dos gatos é suficientemente cautelosa para se afastar dos produtos, mas há sempre exceções, nomeadamente animais curiosos podem lamber ou mexer nos produtos. Nestes casos, a atenção deve ser redobrada, garantindo que os produtos estão bem guardados.
Além de vacinação e desparasitação, que cuidados diários são essenciais?
É muito importante realizar a higiene diária do gato. Recomendo a escovar os dentes e o pelo, bem como cortar as unhas regularmente, pois ajudam a prevenir problemas dentários e de pele. Estas práticas devem ser introduzidas desde cedo, idealmente antes dos seis meses, e sempre associadas a reforços positivos, para que o gato se habitue. Quanto aos banhos, não são necessários.
Além disso, é essencial manter visitas anuais ao veterinário. Mesmo que o gato não necessite de vacinas naquele ano, a avaliação permite controlar o peso, detetar precocemente qualquer alteração e ajustar alguns cuidados, garantindo uma vida mais saudável e feliz.
Tendo em conta o contexto do setor imobiliário atualmente, que dicas daria para quem tem gatos em casas mais pequenas, que acabam por ser também mais movimentadas, pela presença de crianças ou de outros animais?
Eu acho muito importante que o gato tenha um ponto de fuga. Ou seja, na casa deve existir um lugar, ou vários, onde ele possa se esconder e estar tranquilo. Quando está nesse refúgio, ninguém o incomoda: ele fica ali, como se fosse invisível. E estes refúgios podem ser muito simples, como uma caixa de cartão, uma transportadora, uma cama acolhedora ou até um armário. O importante é que ele tenha um espaço seguro onde se possa retirar e descansar sem ser perturbado. Outro elemento determinante é o arranhador. Na natureza, os gatos arranham para marcar território e deixar o seu cheiro. Por isso, é importante perceber se o gato prefere arranhar na vertical ou na horizontal e fornecer um arranhador adequado às suas preferências.
Em casas mais pequenas, uma boa solução é criar espaços na vertical. Estruturas como prateleiras ou plataformas permitem que o gato suba, explore e utilize o espaço de forma ativa. Estas estruturas podem incluir esconderijos e transformar a exploração num verdadeiro jogo.
É recomendável que um gato durma com os seus tutores?
O mais importante é ser consistente desde o início. Se decidirem que o gato não deve dormir na cama, a porta deve permanecer fechada à noite. Muitos gatos ficam confusos quando a rotina é irregular. Se o gato se habituar desde pequeno a uma rotina, isso torna o comportamento previsível e seguro. Há pessoas que gostam de dormir com o gato, outras não, e ambas as opções estão corretas.
E na adoção de um gato, sobretudo para quem é tutor pela primeira vez, que passos devem ser seguidos para garantir uma adaptação tranquila?
Antes de adotar, devemos perceber que tipo de gato vamos ter: a idade, se é de raça ou não, se vem de uma associação, etc. É muito útil fazer pelo menos uma consulta veterinária antes de levar o gato para casa, para entender o que será necessário.
Quando o gato chega, idealmente deve começar numa divisão limitada da casa, especialmente se for um bebé, para se habituar ao espaço e às pessoas. À medida que se adapta, podemos apresentar gradualmente o restante da casa e distribuir os recursos (comida, água, caixa de areia e brinquedos), pelas divisões. Isso ajuda o gato a associar cada recurso ao seu local correto e a sentir-se seguro.
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