Miguel Geraldes, presidente da Histérico, conta como a Associação de Artes está a levar o teatro e a música à população residente, antes e depois da Covid-19.
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Jovens promovem a cultura nas Aldeias do Xisto e lutam contra o isolamento da população
Histérico

São jovens e recusam-se a baixar os braços quando olham para a realidade de isolamento em que se encontra a população que vive no meio rural, como é o caso de muitas das pessoas que habitam nas zonas das Aldeias do Xisto. Atualmente, não são espetáculos para turistas – porque, nesta altura, por causa da pandemia da Covid-19 há poucos - mas sim, para as próprias pessoas das aldeias, para os seus residentes. Os que ali vivem de sempre e os novos que estão a chegar, pelo maior interesse que estão a despertar as zonas rurais desde o confinamento.

Miguel Geraldes, presidente da Histérico - Associação de Artes, diz ao idealista /news que o objetivo “é fazer com que as pessoas se sintam parte integrante de um projeto que pega no isolamento/afastamento social como tema”. Por outro lado, a ideia é que esta ação se torne num futuro documentário, segundo partilha o também jornalista freelancer.

Qual o papel da Histérico na realização de eventos e na parceria com as Aldeias do Xisto?

Temos tido uma colaboração com a ADXTUR - Agência para o Desenvolvimento Turístico das Aldeias do Xisto, já quase desde a criação da nossa associação juvenil, em 2008. Se, no início, essa colaboração passava por iniciativas pontuais, como workshops de escrita criativa, ou espaço para residências, depressa evoluiu para ciclos de passeios de fotografia temática e peças de teatro multifacetadas, inspiradas nas aldeias, para as aldeias e seu território.

Jovens promovem a cultura nas Aldeias do Xisto e lutam contra o isolamento da população
Evento antes da pandemia da Covid-19. Histérico

Tivemos ainda a responsabilidade enorme, que nos colocou à prova, de organizarmos um evento multifacetado (gastronomia, arte, cultura, lazer), que foi o 'Xisto & Lendas' em 2012 e 2013, na Aldeia do Xisto de Sobral de São Miguel, no concelho da Covilhã. Para este ano, retomando esse evento, que foi tido como de excelência, tinha-nos sido proposto voltar a organizá-lo, na mesma aldeia. Infelizmente, tal não pôde ser possível, devido ao Covid-19, mas, entretanto, surgiu a oportunidade de realizarmos animação de rua, teatral e musical, por diversas aldeias.

Em que consiste este nova iniciativa?

Posso falar mais em pormenor desta iniciativa, que estamos a ultimar os detalhes, e da qual sinto grande orgulho e grande motivação, pois não se trata de espetáculos para turistas, mas sim para as próprias pessoas das aldeias, exclusivamente para os residentes. Isto, porque são aprofundados os dados culturais e etnográficos (levantamento etnográfico), além de aspetos mais curiosos e até lúdicos e populares da aldeia, para que as pessoas se sintam identificadas e acarinhadas.

É assim uma possibilidade de fazer sentir a proximidade com as artes, às pessoas que se sentem mais isoladas, com uma resposta teatral e artística. E também uma oportunidade de evidenciar características próprias existentes no território, a nível etnográfico, cultural, patrimonial, turístico, entre outras.

Trata-se da interação com as próprias pessoas, que, sem sair do seu espaço residencial, podem também cantar essas músicas, ou até juntarem-se musicalmente, com instrumentos próprios, criando animação interativa.

É um projeto criado a pensar no atual momento de distanciamento social, por causa da pandemia?

Sim, de forma que as pessoas se sintam seguras e mantendo o devido afastamento social, pois o objetivo é mesmo esse: fazer com que as pessoas se sintam parte integrante de um projeto que pretende mostrar como o isolamento/afastamento social foi contornado através desta ação, vendo-se assim retratadas num futuro documentário.

Trata-se do projeto ‘Criar Raízes pelas terras’ - espetáculo teatral, performativo e musicado. No qual os atores andam de rua em rua da aldeia e esboçam curiosidades, aspetos característicos da aldeia. Mais importante ainda: a interação e a dinâmica criada com as pessoas, que não têm de sair da sua soleira da porta. Procuramos assim interação com o público, no qual se evidenciam histórias, sobretudo da comunidade local e as suas tradições ou costumes.

Trata-se da interação com as próprias pessoas, que, sem sair do seu espaço residencial, podem também cantar essas músicas, ou até juntarem-se musicalmente, com instrumentos próprios, criando animação interativa.

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Histérico

Tem também um projeto musical?

O projeto musical ‘Porta a Porta’ é uma iniciativa de itinerância musical que pretende levar, pelos acordes e pelas canções, animação musicada às pessoas, de rua em rua, de porta em porta. A intenção também passa pela ideia de interação com as próprias pessoas, que, sem sair do seu espaço residencial, podem também cantar essas músicas, ou até juntarem-se musicalmente, com instrumentos próprios, criando animação interativa.

Trata-se de um projeto eclético, que permite o total convívio, próximo das pessoas. Permitindo, ainda, que as pessoas peçam músicas populares, ou outras, que queiram ouvir. Nele participam o grupo Acallela e o músico e cantor José Bonifácio. Tencionamos fazer gravações vídeo destas atuações, que vão resultar num documentário sobre esta ação, em parceria com a ADXTUR.

Em 2021 queremos manter esta proximidade, conseguida através de espetáculos artísticos multifacetados, pelas Aldeias do Xisto. Estamos já a pensar e a preparar diversas iniciativas.

Com o fim do confinamento notam-se melhorias, e pensamos que as pessoas estão a redescobrir o centro interior do país, que tanto tem para oferecer.

Qual é a vossa perceção sobre o atual momento e o impacto que está a ter nas Aldeias de Xisto?

Temos consciência que foi terrível, sob diversos aspetos consequentes do fluxo turístico próximo do zero. Seja a nível gastronómico, animação de lazer, estadias, museus, etc., etc.

Com o fim do confinamento notam-se melhorias, e pensamos que as pessoas estão a redescobrir o centro interior do país, que tanto tem para oferecer.

Contudo, sabemos que esse aumento de fluxo turístico, sobretudo nacional, ainda não é suficiente para muitos negócios aqui existentes, tendo mesmo conhecimento do encerramento de algumas empresas e negócios. O que aumenta os receios, num território já de si com parcos recursos económicos, onde a economia em muito de baseia no turismo, como se podia ver pelo aumento de investimentos diversos ao longo dos últimos anos.

Jovens promovem a cultura nas Aldeias do Xisto e lutam contra o isolamento da população
Evento antes da pandemia da Covid-19. Histérico

Aspetos positivos são poucos. Talvez o da ‘pegada ambiental’, tal como se assistiu a nível global. Mas é algo, talvez, quase irrelevante, pois a ideia é desfrutar do território, e isso só é permitido se as pessoas tentarem fazer os percursos pedestres e os trilhos, ou até com canoas. Isso é o ideal.

De qualquer forma, este vasto território tem excelentes condições, que são diferenciadoras de muitas outras regiões ou destinos turísticos. É este o futuro.

Quanto ao turismo sustentável, já existem alguns bons projetos desenvolvidos e outros em fases de desenvolvimento. O que seria necessário fazer para incentivar e desenvolver um turismo sustentável nestas regiões?

É aos políticos quem compete implantar medidas, quer nas condições de acesso e comunicação, quer na redução de impostos, para incentivar a vinda e o investimento num território que tem imenso para oferecer. É sobretudo este ‘esquecimento’ de décadas, que agora provoca a curiosidade e a vinda de centenas de milhares de pessoas. Mas as pessoas também procuram a comodidade, a rapidez na internet, boas estradas.

Quanto ao turismo sustentável, já existem alguns bons projetos desenvolvidos e outros em fases de desenvolvimento. Mas a aposta em fontes de energia renováveis é essencial e fundamental, até para o exemplo que se quer passar, de um ‘destino verde’. Depois, há a oferta diversa, quer, por exemplo, nos restaurantes quer nos alojamentos locais, onde se tem de apostar nos produtos biológicos da terra, na disponibilidade de bicicletas ou veículos elétricos, por exemplo.

De qualquer forma, este vasto território tem excelentes condições, que são diferenciadoras de muitas outras regiões ou destinos turísticos. É este o futuro.

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Miguel Geraldes, presidente da Histérico - Associação de Artes Histérico

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