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Preferência a inquilinos na compra de casa: o que motivou o chumbo de Marcelo (e as reações)
GTRES

O polémico diploma - aprovado no Parlamento a 18 de julho de 2018 - para dar mais poder aos inquilinos no direito de preferência na venda de imóveis não passou no crivo do Presidente da República. Marcelo Rebelo de Sousa, apoiado por pareceres jurídicos, considerou que a proposta legislativa para alterar o Código Civil feria a constitucionalidade por violar o direito de propriedade. Estas são as "duas razões específicas” invocadas para vetar o Decreto n.º 233/XIII.

  • “A falta de indicação de critérios de avaliação para o exercício do direito de preferência, que existia em versão anterior do diploma”;
  • “O facto de, tal como se encontra redigida, a preferência poder ser invocada não apenas pelos inquilinos para defenderem o seu direito à habitação, mas também por inquilinos com atividades de outra natureza, nomeadamente empresarial”.

Com base nestes argumentos, o Presidente decidiu assim devolver à Assembleia da República, sem promulgação, o Decreto n.º 233/XIII, relativo ao exercício do direito de preferência pelos arrendatários, segundo é explicado numa nota publicada esta quarta-feira no site da Presidência.

Em causa está um texto de substituição ao projeto de lei do BE, que incorpora alterações propostas pelo PCP e pelo PS, que o Parlamento aprovou, no passado dia 18 de julho, em votação final global, com os votos contra do PSD e do CDS-PP e os votos favoráveis das restantes bancadas parlamentares.

Em concreto, a proposta legislativa aprovada, que visava alterar o Código Civil para “aprimoramento” do exercício do direito de preferência pelos arrendatários, eliminava o critério de duração do contrato de arrendamento para o exercício do direito de preferência pelos inquilinos na transmissão de habitações, acrescentando que tal era possível, “ainda que inserido em prédio não sujeito ao regime da propriedade horizontal”.

BE preocupado, PSD satisfeito

O Bloco de Esquerda considera que a não promulgação do decreto numa altura em que a Assembleia da República está encerrada irá criar uma “situação muito difícil para milhares de pessoas” que “vão estar confrontadas, nos próximos tempos” com a venda de imóveis sem poderem exercer o direito de preferência. Os trabalhos só serão retomados em setembro, o que significa que só nessa altura o decreto poderá ser revisto no Parlamento.

Já do lado do PSD há outra leitura. O deputado social-democrata António Costa e Silva afirmou à Lusa que “foi uma decisão acertadíssima" uma vez que “põe em causa o mercado de arrendamento”.

Proprietários aplaudem veto, mas reclamam apreciação do TC

Os proprietários também aplaudiram a decisão de veto ao diploma por considerarem “uma aberração jurídica”, mas defendem que o Presidente da República deveria ter solicitado o apoio do Tribunal Constitucional.

“Qualquer jurista com conhecimentos mínimos sabe que esta alteração estava condenada ao fracasso”, declarou à Lusa o presidente da Associação Nacional de Proprietários (ANP), António Frias Marques, indicando que o diploma carece de fundamentação jurídica.

Com uma posição semelhante, o presidente da Associação Lisbonense de Proprietários (ALP), Luís Menezes Leitão, diz que o diploma “não só era uma aberração jurídica como também mais um elemento do combate contra os direitos legítimos dos proprietários relativamente à sua propriedade”.

“Em vez de vetar politicamente a lei, deveria tê-la mandado para o Tribunal Constitucional, isso era o que se exigiria perante as dúvidas de constitucionalidade que têm surgido”, afirmou Luís Menezes Leitão, lamentando, ainda, que o Presidente da República não tenha assegurado uma proteção constitucional ao direito de propriedade em Portugal.

Inquilinos apoiam Marcelo

Também a Associação de Inquilinos Lisbonense (AIL) se manifestou a favor da decisão do Presidente da República de vetar o diploma sobre o exercício do direito de preferência pelos arrendatários, defendendo que a lei pode ser melhorada antes da promulgação.

"É importante a promulgação do diploma, agora deve ter alguns aspetos clarificadores", afirmou à Lusa o presidente da AIL, Romão Lavadinho, explicando que existem "algumas dúvidas" sobre como é que se aplica esta lei. Neste sentido, o representante dos inquilinos disse que é necessário esclarecer todo o procedimento para o exercício do direito de preferência pelos arrendatários, nomeadamente "quem é que transforma o prédio em propriedade horizontal, se é o inquilino ou se é o senhorio que vende a casa".

Avaliadores apontam efeito nefasto do diploma

Antes de ser conhecido a decisão de Marcelo, e imediamente após a aprovação do diploma no Parlamento, a Associação de Empresas de Consultoria e Avaliação Imobiliária (ACAI) tinha vindo alertar para o "efeito nefasto" que as alterações ao exercício do direito de preferência dos arrendatários na aquisição de habitações terão sobre o mercado de arrendamento residencial.

"Não temos dúvida de que, perante tais alterações e face aos riscos de crescente instabilidade legislativa, a reação dos investidores será de inequívoca aversão a um mercado que, após décadas de decadência, começava agora a inverter o ciclo de captação de investimento", defendeu a ACAI, em comunicado enviado à Lusa.

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