Charmosa, elegante, natural e sustentável, a madeira é um material de excelência no mundo da arquitetura e design de interiores. Além da resistência e durabilidade, permite criar ambientes aconhegantes, confortáveis, visualmente atrativos e, sobretudo, diferenciados. Vasco Fragoso Mendes distingue-se na arte de trabalhar a madeira maciça, criando peças de mobiliário “originais e irrepetíveis”, feitas à mão. Através de uma abordagem geométrica e funcional, o jovem designer português desenvolve um trabalho assente naquilo que a natureza oferece, espacial e materialmente, reconhecendo e potenciando a imperfeição da madeira.
Tendo como base o desenho de arquitetura, muitos dos projetos nascem em alçado, ou corte, e a exploração geométrica torna o outro lado do produto um mistério, com um perfil orgânico. “As peças que produzo não nascem em folhas brancas ou de um imaginário apenas formal. Surgem daquilo que as pranchas de madeira me permitem fazer, das suas imperfeições e da melhor maneira de as assumir e torná-las em objetos especiais”, explica o artista em entrevista ao idealista/news, cujo trabalho já atravessou fronteiras e chegou a destinos como Espanha, Bélgica, França ou Alemanha.
“Cru” é o que define o seu trabalho, uma vez que todas as peças começam a ser desenhadas no seu “estado mais puro”, sendo autênticas obras de arte. Segundo Vasco Fragoso Mendes, as mesas de jantar e/ou de centro, por exemplo, são das mais requisitadas, uma vez que “são peças que marcam um ambiente e têm muita presença no espaço”.
É no Barracão Wood Architecture and Design (WAD), o atelier que criou em 2016, que nascem estas peças em madeira maciça “cuidadosamente escolhida”, e onde Vasco combina três ofícios que se complementam: a arquitetura, o design e a marcenaria. Nesta entrevista escrita para o idealista/news, que agora reproduzimos na íntegra, o designer/arquiteto/marceneiro fala sobre o seu percurso e como nasceu esta paixão pelo mundo das artes, sobre as peças que produz e qual é o “motor” do seu processo criativo.
Quando é que o Vasco descobriu a paixão pelo mundo da arquitetura/artes?
Não foi uma descoberta ou uma paixão imediata, foi com tempo e com uma direção que ainda hoje estou a descobrir qual é. Desde novo que gostava de desenhar e pintar, tinha algum jeito para o esquiço rápido e isso fez-me gostar ainda mais. Daí até ao curso de artes visuais e arquitetura foram só mais uns anos.
E como foi estudar na Nova Zelândia e depois trabalhar na Austrália?
A experiência na Nova Zelândia foi focada quase a 100% no rugby, que jogo desde que me lembro de andar. Com 17 anos fui viver para Christchurch e para o St. Bede’s College, em 2011. O objetivo era absorver o máximo possível a nível desportivo e voltar para casa melhor jogador e melhor pessoa. Na Austrália a experiência foi diferente, já com 22 anos, a meio do curso, sempre com o foco no rugby, mas quis ter uma experiência particular, trabalhar num atelier de arquitetura e saber o que me esperava daí para a frente. Foi um “abre olhos” grande, diferente do que tinha imaginado um atelier… Nunca pensei em ficar, sempre quis voltar para Portugal e trabalhar cá.
Formou-se em arquitetura, mas direcionou o seu percurso para a construção em madeira. Porquê?
Por causa do “imediatismo” que a madeira permite, conseguir imaginar, desenhar e fazer num curto espaço de tempo, enquanto a arquitetura e/ou mesmo um projeto de arquitetura levam muito (demasiado) tempo a ser construídos e apresentados. O facto de ser só eu o responsável por fazer acontecer o que desenhei também me cativou bastante a seguir por este mundo.
O facto de ser só eu o responsável por fazer acontecer o que desenhei também me cativou bastante a seguir por este mundo.
Como é que o “Cru” define o seu trabalho?
Cru define o trabalho na medida em que é nesse estado que as peças começam a ser desenhadas, no seu estado mais puro. As peças que produzo não nascem em folhas brancas ou de um imaginário apenas formal. Surgem daquilo que as pranchas de madeira me permitem fazer, das suas imperfeições e da melhor maneira de as assumir e torná-las em objetos especiais.
Faz mobiliário em madeira maciça, original e à mão. Em que é que se inspira para criar estas peças?
Apesar do meu trabalho ser e ter um lado criativo, eu faço questão que as peças tenham uma função específica, que sejam usadas e que se criem boas memórias à sua volta. A inspiração para isto vem de tudo o que a rodeia e permite que a peça esteja onde está: ou pelas proporções da sala, para quebrar algum ritmo arquitetónico que exista ou alguma referência que seja importante ter em consideração no ambiente. Mais uma vez, nunca é uma folha em branco, e eu gosto.
E como é que combina a arquitetura, design e marcenaria no seu trabalho?
Quer seja através do desenho inicial ou dos desenhos para produção, tudo é feito com rigor geométrico e com muita atenção à proporção, equilíbrio e arquitetura das peças. A minha base é a arquitetura, o que eu faço talvez seja design e a forma que uso para o fazer é através da marcenaria.
Apesar do meu trabalho ser e ter um lado criativo, eu faço questão que as peças tenham uma função específica, que sejam usadas e que se criem boas memórias à sua volta.
Significa, portanto, que não há duas peças iguais? São todas (sempre) diferentes?
Digo aos meus clientes que as suas peças são originais e irrepetíveis. Primeiro porque é um compromisso meu com o cliente em entregar uma peça original, única. E em segundo lugar, mesmo que quisesse fazer igual, não conseguiria. Não há uma peça que acabe como foi desenhada, ao longo do processo muitas coisas mudam, ou pedem para ser mudadas, e não há registos dessas alterações, por ímpetos ou por pura necessidade.
Faz peças por medida?
Não são exatamente por medida porque gosto de ter a liberdade de poder desenhar de acordo com aquilo que a madeira me permite fazer. Trabalho maioritariamente por encomenda.
Quanto tempo pode demorar a produzir um peça destas?
Há algumas condicionantes que influenciam o tempo de produção, como o tipo de projeto, de madeira e desenho, mas nunca menos de 6 a 8 semanas.
Que tipo de mobiliário é mais requisitado atualmente?
Mesas de jantar e/ou de centro. São peças que marcam um ambiente e têm muita presença no espaço.
Qual o perfil de cliente? Vende mais para Portugal ou para o estrangeiro?
São essencialmente clientes interessados em Design e Arquitetura, que valorizam o trabalho criativo aliado à produção manual. 40% dos clientes são estrangeiros residentes em Portugal. Tenho peças em Paris, Berlim, Madrid e Bruxelas, mas o core ainda é em Portugal.
Refere que a maior parte das madeiras que usa tem origem nas antigas Colónias Portuguesas (durante os anos 50 e 60). Onde descobriu esta matéria prima?
Foi uma fase em que descobri uma serração que comprava toros (troncos das árvores) nas antigas colónias e trazia a madeira para Portugal. Desde que descobri a origem destas peças que se foram perdendo no tempo fiz o investimento de as armazenar e de lhes dar um destino que considere apropriado. Já não tenho tantas como tinha há 2 ou 3 anos, mas ainda tenho umas relíquias.
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