É fácil imaginar esta conversa com o arquiteto Paulo Merlini em Nova Iorque, a sua cidade de sonho. Mas estamos no Grande Porto, num espaço com várias salas de reuniões, trabalho, lazer, inspiração e espaços criativos, bem como áreas exteriores, para uma equipa de mais de 10 pessoas.
Este atelier poderia ser em qualquer lugar do mundo em que exista um problema para resolver e “quanto mais complexo, mais atrativo”. São essas complexidades que impulsionam Paulo Merlini, um dos fundadores do atelier Paulo Merlini Architects, com Rúben Calado e André Silva.
“A nossa principal preocupação é criar espaços que deem às pessoas os estímulos certos”, tal como explica nesta entrevista ao idealista/news para a rubrica “Em casa do arquiteto”. E neste espaço está criado o estímulo para criar arquitetura que sirva as pessoas.

Sempre quis ser arquiteto?
Eu queria ser artista de banda desenhada quando era mais novo. Só depois optei por tomar uma decisão mais pragmática porque, sendo artista de banda desenhada, a probabilidade de conseguir chegar a algum lado não me parecia muito fácil. Então acabei por racionalizar um bocado e pensei: o que é que efetivamente eu gostava? Percebi que gostava de criar e arquitetura poderia servir essa essa finalidade.
Honestamente, não me apaixonou logo, nem no primeiro nem no segundo ano, só a partir do terceiro é que me comecei a apaixonar mais. Gostei da complexidade do problema. Eu gosto muito de pensar e se o problema for complexo, é mais atrativo. Foi isso que me apaixonou na arquitetura.
Em que projetos sente essa sensação de um problema desafiante?
Estamos agora a trabalhar num complexo de apartamentos que nós desenvolvemos, e a forma como distribuímos no terreno é bastante complexa. Tudo isso juntamente com toda a inteligência que se tem que juntar de forma que o edifício seja economicamente viável. Esta peça que estamos neste exato momento a trabalhar é um belíssimo exemplo disso.

E já fizeram um estádio.
Desenhámos, mas acabou por não avançar. É daqueles processos que depois ficam em standby. Na verdade, a faculdade do Porto permite-nos ficar preparados para qualquer tipo de exercício. Qualquer tipo de exercício que façamos que nunca experimentamos, uma igreja, um estádio, obriga-nos a integrar todas as necessidades que um edifício destes tem que ter, e isso é a tal complexidade que lhe falava.
Estes edifícios levam a programas diferentes, temos que encontrar legislação, as formas diferentes de fluir no espaço. Isso é o que me apaixona na arquitetura.
Têm imensos projetos fora de Portugal. Quais os maiores desafios?
É claramente mais desafiante no sentido em que é um mercado diferente. Mais uma vez, em cada mercado temos que nos inteirar sobre como funciona.
Temos agora a nossa primeira peça em Nova Iorque. Seja pelo sistema de medição ser diferente do nosso, temos que nos adaptar. Temos que perceber como é que vamos fazer a transição, entrar dentro do problema. Métodos construtivos diferentes é sempre desafiante.

Algum projeto que gostasse de destacar em Portugal?
Por exemplo, um edifício na Avenida dos Combatentes, no Porto, pela complexidade formal, a distribuição tipológica foi complexa, uma série de questões com as engenharias, tubagens, etc.
Gostaria também de referir o SPARK, que está a ser planeado para ser um dos primeiros smart buildings em Portugal. De forma bastante sucinta, um smart building está preparado para centralizar e recolher dados sobre o funcionamento e utilização das redes de infraestruturas, sensores e até de alguns smart devices presentes no edifício, permitindo que, com a recolha e tratamento desses mesmos dados, todos esses componentes e o seu funcionamento possam ser otimizados. Cumulativamente, estão pensadas soluções técnicas inteligentes para aproveitamento, gestão e utilização inteligente de recursos naturais e energéticos.

A tomada de consciência do impacto negativo das atividades humanas no ecossistema, surge há pouco mais de cinquenta anos, e é hoje um facto entranhado na consciência coletiva. Assim, e numa perspetiva mais holística, os smart buldings são uma solução inevitável dessa mesma perceção.
Tudo isto, permitirá que o SPARK Matosinhos seja um edifício ambientalmente e financeiramente mais sustentável, enquanto otimiza a sua operação em função dos seus utilizadores, ou seja, o equilíbrio entre produção e consumo, na ambição de que num futuro breve culminem num produto perfeitamente integrado.

O mercado português tem uma dimensão reduzida?
Somos muitos arquitetos, e está tudo bem, porque cada um se posiciona no seu patamar. O mercado internacional é muito interessante pela dimensão e também porque dá prestígio. Nós estamos a tentar deixar uma marca por isso, se pudermos influenciar o máximo de pessoas, mais interessantes se torna, pelo menos na nossa perspetiva.
Mas sente que a arquitetura é valorizada em Portugal?
É uma pergunta complexa efetivamente. Sinceramente, acho que não, mas porque as pessoas não estão educadas para o valor da arquitetura e há motivos históricos, no nosso país, relativamente fáceis de compreender o porquê. Não estamos educados para uma série de outras áreas e só com a interação com essas áreas é que começamos a perceber a sua importância. Se pensarmos num privado, tem contacto com a arquitetura quando faz a sua casa, e fazer uma casa normalmente acontece uma vez na vida, e nem sequer tem termo de comparação. Ele experimenta um arquiteto, fica satisfeito ou não, mas ele nem sequer sabe se é melhor, se é pior.
Há sempre aquela ideia do que é que é fazer bonito, e a questão da estética é apenas uma percentagem muito reduzida da importância da arquitetura.

Aqui está de Gondomar para o mundo. Mas, se pudesse escolher uma cidade, onde é que gostaria de viver?
Eu gostava muito de viver em Nova Iorque. Porque acho que os Estados Unidos é onde acontece tudo, se quisermos singrar no mundo dos negócios, é lá. Já lá fui duas vezes e sentes a cidade a fervilhar. Adorava viver uns anos em Nova Iorque. Depois temos outros sítios mais românticos. Eu estudei um ano em Florença, último ano de curso, e fiquei apaixonado pela cidade. Deve ser uma cidade incrível para viver, mas numa fase mais tranquila. Em Portugal temos sítios ótimos, onde podemos relaxar, é um belíssimo país para isso.
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