Aninhados nas paisagens pitorescas da região da Puglia, no sul da Itália, encontramos um testemunho de engenhosidade e resiliência, que fizeram de um tipo de arquitetura a sua marca registada. Estamos a falar de Alberobello, uma pequena cidade que surgiu como uma humilde comunidade agrícola no século XVI, em circunstâncias não convencionais. A sua existência deve-se ao conde Giangirolamo Acquaviva, cuja tentativa de enganar o Governo resultou num legado arquitetónico particular.
Tudo começou quando o conde Acquaviva foi convocado perante a corte do Reino de Nápoles para justificar o seu não pagamento de impostos sobre as habitações dentro das suas propriedades. Numa jogada ousada, ele argumentou que tais moradias não existiam e disse ao tribunal para inspecionar suas terras. Assim, antes que os representantes da corte pudessem chegar ao local, o conde orquestrou a demolição dessas casas e transferiu os moradores para a mata, aguardando a conclusão da inspeção.
Após a saída da corte, satisfeita com a explicação do conde, as pessoas foram autorizadas a voltar com uma condição: só podiam construir casas que pudessem ser rapidamente desmontadas. Assim nasceram os 'trulli'. Estas estruturas únicas, construídas sem argamassa, consistiam em tijolos empilhados e podiam ser desmontadas removendo o suporte central.
Fazendo uma virtude da necessidade
Durante séculos, Alberobello prosperou sob o domínio feudal, e os seus habitantes dominaram a arte de construir e viver dentro dos 'trulli'. No entanto, ventos de mudança varreram a região em 1797. Fortalecidos por um novo espírito de autonomia, os cidadãos de Alberobello pediram ao rei Fernando IV de Nápoles, filho do popular rei espanhol Carlos III, que fosse libertado da servidão. O seu pedido foi atendido e Alberobello foi declarada uma cidade livre, leal à coroa.
Com as correntes do feudalismo levantadas, os habitantes de Alberobello já não temiam a demolição das suas casas. No entanto, eles não negligenciaram o estilo arquitetónico peculiar dos 'trulli', honrando o seu património e preservando um símbolo da sua resiliência contra as adversidades.
Embora possamos encontrar alguns 'trulli' ao longo do Vale do Itria, a sua maior concentração e exemplos mais bem preservados desta forma arquitetónica estão na vila de Alberobello, onde existem mais de 1.500 estruturas deste tipo nos bairros de Rione Monti e Aja Piccola. Graças à alta densidade deste tipo de construção, Alberobello foi declarado Património Mundial da UNESCO em 1996.
Um exemplo da técnica da pedra seca
Os 'trulli' são exemplos claros de construção de pedra seca do tipo cantilever, uma técnica de construção pré-histórica ainda usada nesta região. Essas estruturas caracteristicamente apresentam telhados piramidais, abobadados ou cónicos construídos com lajes calcárias em balanço. Foram construídos principalmente de calcário rudimentar, extraído do local durante a escavação de cisternas subterrâneas e obtido de campos próximos e afloramentos rochosos.
As paredes caiadas de branco são erguidas diretamente sobre a rocha calcária, empregando uma técnica de parede de pedra seca, sem argamassa ou cimento, com uma pele dupla e um núcleo de entulho. Apresentam portas e pequenas janelas, bem como lareiras internas e nichos embutidos nas paredes espessas. Os telhados, também de pele dupla, consistem numa pele de pedra interna abobadada, coroada por uma pedra de fechamento, e um cone externo hermético construído de lajes de calcário em balanço, conhecido como chiancarelle.
A estrutura do telhado fica nas paredes por cantos simples, permitindo a transição da estrutura retangular das paredes para as secções circulares ou ovais dos tetos. Esses tetos geralmente apresentam marcas mitológicas ou religiosas em cinzas brancas e culminam num pináculo decorativo que procura afastar más influências ou má sorte. A água da chuva é recolhida através de beirais na base do telhado, desviando-a para uma cisterna sob a casa.
Acompanha toda a informação imobiliária e os relatórios de dados mais atuais nas nossas newsletters diária e semanal. Também podes acompanhar o mercado imobiliário de luxo com a nossa newsletter mensal de luxo.
Para poder comentar deves entrar na tua conta