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"O turismo está a ser ótima oportunidade de negócio para muitas famílias portuguesas" (vídeo)
idealista/news

Portugal está na crista da onda do turismo internacional, distinguindo-se como um destino de chamado modelo low cost/high spend. Os estrangeiros chegam ao país à procura do que "é genuíno e autêntico", sendo essa a imagem que o Turismo de Portugal quer passar lá fora para continuar a crescer. Numa grande entrevista ao idealista/news, o presidente do organismo público, João Cotrim de Figueiredo, revela a sua estratégia e diz que "evitar uma excessiva pressão que torne os turistas mais incómodos do que é benéficos" é um dos grandes desafios.

Que balanço faz do novo regime de alojamento local?

Muito positivo. Temos trazido para a formalidade alojamentos que estavam a operar de forma ilícita. Está em vigor há cerca de um ano, temos registadas cerca de 23 mil unidades de alojamento e continuamos a registar um grande número todos os meses, entre os 600 e mil, sendo um processo que vai continuar. 

Perto de 90% dos registos são de entidades com um alojamento. É esmagadoramente um negócio de empresários individuais, o que significa que o turismo acabou por ser uma oportunidade de vida para muitas famílias. E como é um investimento com uma componente pessoal e emocional muito forte, tem funcionado bem na propagação da imagem

"Perto de 90% dos registos de alojamento local são de empresários individuais" 

O setor hoteleiro sempre foi muito crítico quanto ao alojamento local. Considera que as suas preocupações são legitimas?

O alojamento local é uma resposta à evolução da procura. Existe porque as pessoas escolhem ficar nele. A nossa responsabilidade enquanto autoridade turística nacional é garantir que há uma pressão de procura suficiente que acomode os vários tipos de oferta de alojamento. É desta variedade que podemos ter maior esperança de satisfazer as diferentes necessidades dos diversos segmentos turísticos.

Há uma nova vida nos centros das cidades portuguesas alimentada por este tipo de oferta turística...

Não tenho dúvida nenhuma. Há oito ou 10 anos discutia-se a desertificação dos centros urbanos e a falta de investimento, de segurança e de higiene. Hoje discutem-se problemas quase opostos. Se há, ou não, concentração excessiva de pessoas. O grande motor dessa mudança foi o rendimento trazido pelo boom turístico às cidades.

Mas há movimentos de cidadãos que se queixam de um excesso de turistas. Como se faz esta gestão de equilíbrios?

A primeira responsabilidade de uma entidade como o Turismo de Portugal é não ignorar queixas, nem feedbacks positivos, por exemplo, os de muitas famílias e pequenas empresas que passaram a existir.

A pressão sobre os residentes é um dos temas que mais acompanhamos de perto com as autarquias, entidades de segurança e de fiscalização. Não apenas por uma questão de coesão social, mas também de atratividade turística.
 

"A pressão sobre os residentes é um dos temas que mais acompanhamos de perto com as autarquias"

Uma das nossas vantagens é o gosto genuíno com que recebemos e o convívio direto e próximo entre quem nos visita e de quem cá reside. Se houver cada vez menos oportunidade de haver essa mistura e se as pessoas deixarem de receber bem os turistas, porque de alguma forma passaram a ser mais incómodos do que benéficos, então estaremos a perder um ativo e isso não seria inteligente que acontecesse.

Aconteceu na maior parte das cidades que apostou no turismo massificado, como por exemplo Barcelona. Pode acontecer o mesmo em Lisboa?

Em qualquer crescimento, e o turismo não é exceção, há fases em que poderá ser necessário um ajustamento. Temos a vantagem de acompanhar este crescimento depois de outros países e assim evitar incorrer nos mesmos erros.

Mas Barcelona é um excelente exemplo porque estamos em Lisboa a menos de metade da pressão turística que há em Barcelona. A grande Lisboa tem cerca de 1,6 milhões de habitantes e Barcelona terá perto do dobro. Barcelona recebe cerca de oito milhões de turistas em dormida e mais dois ou três milhões em turistas de cruzeiro, Lisboa recebe cerca de 3,2 milhões para dormir e muito menos do que isso em termos de passageiros de cruzeiros. 

Agora, não é possível ter os atrativos do turismo e não ter os aspetos menos positivos disso. É uma escolha que os países e as cidades têm que fazer.

Portugal está a fazer a escolha certa?

Portugal fez a sua escolha a favor de aquilo que o turismo traz de bom e isso está a fazer com que as regiões que mais estão a crescer não sejam as com maior pressão turística, mas as que têm muito baixa densidade. O que está a crescer fortemente em Portugal são os Açores, a região norte do continente, a região centro e o Alentejo, na procura. Quem aterra em Lisboa, não fica só em Lisboa, ou quem aterra no Porto não fica só no Porto, desloca-se para a parte rural e interior dessas regiões.

"O que está a crescer fortemente em Portugal na procura turística são os Açores, a região norte do continente, a região centro e o Alentejo"

Nesse contexto, faz sentido continuar a dar ajudas públicas às transportadoras aéreas low-cost?

O nosso papel é o de tornar possível aquilo que de outra forma não existiria. A partir do momento em que há procura robusta não são necessários quaisquer tipos de incentivos. Mas existem momentos em que nos interessa que exista oferta aérea quando ela não é espontânea, como por exemplo, nas regiões com maior sazonalidade. 

E como vê a construção de um novo aeroporto na região de Lisboa?

Tudo o que permita o acesso fácil a Portugal é vantajoso. Nada seria mais lamentável do que haver procura para se deslocar a Portugal em alturas do ano interessantes e não haver capacidade aeroportuária para receber essas pessoas.

Sobre os cruzeiros há quem diga que trazem um tipo de turistas que não interessa às cidades que visitam porque não gastam. Concorda?

Acho que tem sido muito mais interessante o trabalho que tem sido feito no transporte aéreo do que marítimo.

Em que nível é que a marca país tem sofrido com as recorrentes notícias de casos de alta corrupção em Portugal?

Qualquer notícia negativa, como o caso da corrupção, afeta a imagem do país, mas temos que ver isso em perspetiva. Temos cerca de 20 mil menções anuais na imprensa, das quais muito acima de 95% são positivas. 

Estamos em condições de afirmar que a imagem de que estamos a beneficiar é aquela que queremos projetar. Já conseguimos ultrapassar uma imagem antiga que Portugal tinha.

"Já conseguimos ultrapassar uma imagem antiga que Portugal tinha. Criatividade, modernidade e liberdade são os aspetos que mais são associados agora ao país"

Os aspetos de criatividade, modernidade e liberdade, harmonia e colaboração são os que mais vezes são agora associados ao país. Beneficiamos muito da alteração profunda das motivações de viagem desde a crise financeira. A componente ostensiva da viagem e do turismo perdeu muito terreno a favor daquilo que é a busca do autêntico.

Como é que Portugal se distingue da concorrência de outros destinos?

É um país onde ainda se encontra aquilo que é genuíno nas pessoas, nos sítios, nos locais, na oferta turística. Isso tem-nos permitido ganhar quota constantemente. 

Estamos a entrar cada vez mais num segmento que se chama low cost/high spend. Ou seja, naquilo que não é central à fruição da viagem, os turistas optam por modelos low cost, mas naquilo que lhes é essencial gastam o que for preciso para terem uma experiência autêntica, genuína e diferente daquilo que teriam no seu país de origem. Portugal está muito bem colocado para beneficiar disto. Não temos qualquer pretensão de ser um turismo de glamour, de elite ou de grande sofisticação, mas antes pelo contrário. 

"No que não é central à fruição da viagem, os turistas optam pelo low cost, mas gastam o que for preciso para terem uma experiência autêntica. Não temos qualquer pretensão de ser um turismo de glamour, de elite ou de grande sofisticação"

A aplicação da taxa turística, já em vigor, como é que está a ser recebida pelo mercado?

Tudo o que seja onerar a estadia em Portugal não é conducente a um aumento da procura por questão de princípio e as taxas não são a medida mais hospitaleira que se pode impor a quem nos quer visitar, mas sendo uma taxa de um valor relativamente pequeno e sendo que está em vigor há pouco tempo, não antecipamos que venha a ter um impacto na procura, nem que se venha a traduzir em prejuízo para o turismo.

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