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Um grupo no facebook que reúne quase 90.000 mulheres. O que é que fazem juntas? Trocam ideias, fomentam negócios e alavancam projetos de empreendedorismo, alimentadas pela vontade de colaborar, sem competir. São as Mulheres à Obra, um grupo que nasceu do “nada” e ganhou vida como um espaço partilhado por mulheres que procuram um caminho profissional capaz de satisfazer as necessidades de conciliação da família e o trabalho. O idealista/news esteve à conversa com uma das suas fundadoras, Camila Rodrigues, para descodificar este projeto inovador com voz feminina. 

Um negócio? Uma empresa? Uma associação? Nenhuma das três hipóteses. As Mulheres à Obra são uma plataforma colaborativa de mulheres empreendedoras que funciona sob a premissa da partillha de ideias, oportunidades e experiências – e que fomenta a criação de negócios, sejam eles de pequena, média ou grande dimensão.

O grupo Mulheres à Obra nasceu de um outro grupo no Facebook chamado For Moms (Para Mães). Foi este último grupo que cruzou os caminhos e as vidas das fundadoras do Mulheres à Obra, Camila Rodrigues (socióloga) e Carla Lopes (tradutora), que até então não se conheciam. A premissa era simples: mostrar a todas as mulheres que, juntas, podiam combater os entraves ao empreendedorismo feminino. O grupo cresceu e já conta com quase 90.000 membros atualmente.

Um grupo de (e para) mulheres reais

O grupo é procurado por todo o tipo de mulheres. Desde pessoas com inquietações profissionais, pessoas que já têm o seu próprio negócio estabelecido ou que estão a dar os primeiros passos no “mundo” do empreendedorismo. Camila Rodrigues explica ao idealista/news que este grupo é procurado, sobretudo, por pessoas que “querem explorar novas avenidas em termos laborais”.

A principal fonte de inquietação, diz, está na dificuldade em conseguir conciliar a vida profissional e familiar”, porque ainda é um “encargo que cai muito sobre as mulheres”. De acordo com a fundadora do grupo, as mulheres que trabalham por conta de outrem, muitas vezes, são confrontadas com “alguma discriminação e intransigência por parte das entidades laborais em se compadecerem com algumas obrigações que elas têm, em virtude dos filhos ou às vezes até de pessoas mais velhas que também são dependentes”.

“Surpreende pela negativa a quantidade de relatos que surgem a todo o momento de mulheres que são discriminadas no local de trabalho por causa da maternidade”, refere.

Camila Rodrigues não tem dúvidas de que o “mercado de trabalho está a mudar” e relembra que se as empresas “querem captar bons trabalhadores e novos talentos” também têm de oferecer qualidade de vida. “A qualidade de vida passa muito pela flexibilidade”, declara.

“É perigosa esta noção de que empreender é muito fácil”

Nas Mulheres à Obra partilham-se ideias, experiências, dicas, contactos, serviços de consultoria e formação para potenciar os negócios. Qualquer mulher é bem-vinda: seja uma empresária de sucesso, a mulher que faz bolos em casa para vender para fora, uma reformada ou uma desempregada. Todas as mulheres têm as mesmas oportunidades de participação do grupo.

As fundadoras da plataforma consideram que a realidade vivida nos eventos de “empreendedorismo tchanam” está completamente desfasada da “realidade da mulher comum”. “Introduziu-se a noção errónea de que empreender é extraordinário e que vamos ficar todos ricos”, explica a fundadora.

Camila Rodrigues considera “muito perigosa” esta noção de que empreender é muito fácil e que toda a gente deve empreender. A socióloga sublinha as dificuldades e responsabilidades inerentes a um negócio que se começa do nada. “Temos de ser um bom gestor, um bom contabilista, temos de ser bons a marketing digital, temos de ser bons vendedores... temos de ter um conjunto muito alargado de competências”.

Empreender é com elas: há Mulheres à Obra que fazem negócio de mãos dadas com a família
Camila Rodrigues, uma das fundadoras do Mulheres à Obra idealista/news

É isso que a plataforma das Mulheres à Obra oferece: uma comunidade de partilha e de inter-ajuda onde se discutem os assuntos sem tabus. Um espaço onde as pessoas têm acesso facilitado a muita informação, parcerias e até eventualmente angariar clientes – um espaço onde as mulheres se ajudam umas às outras.

“Não fazemos milagres. Há muitos negócios que falham, sonhos que não se concretizam, e há negócios que se realizam e que correm bem”, diz Camila, referindo-se aos “avanços e recuos naturais do processo de empreendedorismo”.

Além do grupo no facebook e do site – onde partilham artigos e todo o tipo de informações úteis -, as Mulheres à Obra já têm uma revista, um livro, promovem conferências e estão a preparar-se para lançar em breve a Academia MAO, que irá disponibilizar regularmente ações de formação presenciais e online em diversas áreas relevantes ao nível do empreendedorismo.

Florbela Silva: uma voz das Mulheres à Obra

O grupo Mulheres à Obra é alavancado por um conjunto de 100 mulheres empreendedoras que decidiram investir na plataforma. Têm o estatuto de patrocinadoras, pagando uma quota anual de 150 euros que ajuda a manter vivo o grupo – recentemente conseguiram estabelecer a primeira parceria institucional, com a Universidade Católica Portuguesa.

Florbela Silva, fundadora da ViewPoint, é uma das patrocinadoras do grupo. É o rosto de alguém que decidiu “arregaçar mangas” para impulsionar o seu próprio negócio. A consultora de comunicação, depois de anos a trabalhar por conta de outrem, decidiu trocar o emprego "seguro" por um projeto pessoal de Communication & PR Consultant.

Estava insatisfeita no momento em que decidiu abandonar o emprego. Florbela tinha acabado de ser mãe e sentiu que a maternidade não foi bem aceite, “talvez também por culpa da conjuntura... a crise fechou as portas a muitas empresas que tiveram de reestruturar-se”, diz. Quando regressou da licença sentiu que, de certa forma, se tornou “descartável” e que o seu lugar tinha como que desaparecido. Por exemplo, não tinha tarefas atribuídas, algo que também causou frustração. “É como se a pessoa deixasse de existir porque esteve seis meses fora".

Empreender é com elas: há Mulheres à Obra que fazem negócio de mãos dadas com a família
Florbela Silva, fundadora da ViewPoint e patrocinadora das Mulheres à Obra idealista/news

“As empresas têm essa responsabilidade social, a de apoiar a maternidade, mas foi algo que eu não senti. Percebi que já não tinha lugar, e num processo de reestrutação da empresa fiz um acordo para sair”, explica Florbela. E agora, o que é que se faz a seguir? Com mais de 20 anos no setor da consultoria de comunicação e relações públicas, decidiu que era isto que queria fazer: ter o seu próprio negócio dentro da área em que está especializada. Admite, contudo, que isto não é tarefa fácil.

 “O processo de criação de emprego não é instantâneo. As pessoas acham que vão ganhar mais tempo, mas pode não ser bem assim, é o nosso emprego, o que quer dizer que vai exigir mais de nós ao início. O tempo fica mais diluído, uma vez que temos de dar resposta em diversas frentes”, confidencia Florbela.

Conta ao idealista/news que decidiu participar numa sessão de apoio à criação do próprio emprego no Centro de Emprego onde ouviu falar do Programa de Apoio ao Empreendedorismo, em Almada. Inscreveu-se com a sua ideia de negócio e foi selecionada para participar numa formação gratuita que reunia várias abordagens desde a área jurídica, marketing digital, design thinking, financiamentos, entre outros. Nessa altura já tinha criado e materializado a sua marca e foi só “arrancar”. Começou a trabalhar num cowork em Almada e foi por essa altura que teve contacto com as Mulheres à Obra.

“Percebi que era um grupo muito ativo, com formações, oportunidades e links úteis a vários níveis para quem está a criar o seu emprego”, revela Florbela, que decidiu tornar-se patrocinadora pouco tempo depois. “Ser patrocinadora poderia trazer algum tipo de projeção”, refere, uma vez que quem tem este estatuto pode publicitar e publicar anúncios no grupo, tendo um espaço reservado no próprio site para a apresentação dos seus serviços, acesso a alguns descontos e eventos exclusivos.

“O que se faz nas Mulheres à Obra é muito simples. Criam-se parcerias, projetam-se negócios, é possível angariar clientes. São muitas mulheres a entusiasmar outras e a estimular negócios que vão ganhando força”, salienta a fundadora da ViewPoint. “É também um movimento social, com uma missão, um grupo informal e uma network com uma base igualitária que me faz querer estar ligada a este projeto”, conclui.

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