
Aquece o clima político em Itália, com a aproximação do referendo. Será este domingo, 4 de dezembro de 2016, que a reforma da Carta Constitucional impulsionada pelo Governo de Matteo Renzi, estará à prova do voto popular. E esta votação já ultrapassou as fronteiras de uma simples consulta sobre uma reforma (que apesar de ser importante, poucos esperavam que tivesse tal alcance) para converter-se numa prova de fogo para a estabilidade do Governo e do sistema político-económico de Itália, no marco europeu.
Analistas, organismo internacionais e até diários como o Financial Times lançaram vozes de alarme - mais ou menos fundamentadas - sobre as possíveis consequências para o país no caso de que ganhe o "Não".
A reforma quer mudar mais de 40 artigos da Constituição italiana, criada em 1948, num país que procurava a sua identidade depois da triste experiência fascista e dos estragos da Segunda Guerra Mundial. Se no referendo ganhar o "Sim", em Itália deixará de existir o chamado "bicamarismo paritário", segundo o qual a Câmara e o Senado têm o mesmo papel e idênticas competências.
O Senado irá reduzir-se ao número de membros, passando dos atuais 315 para 100. Além disso verá restringido o seu poder de legislação apenas para normas que tenham a ver com a Constituição, referendos populares, sistemas eleitorais locais e ratificação de tratados internacionais. Tudo com o objetivo de facilitar a aprovação de leis, uma vez que necessita atualmente a aprovação das duas câmaras para dar luz verde ao texto legislativo.
Já aprovada no Parlamento pela maioria política e parte da mesma oposição que hoje a censura, a reforma foi objeto de uma massiva campanha eleitoral por parte do primeiro ministro, que chegou a anunciar que iria retirar-se da vida política se vencesse o "Não". Pouco depois meteu marcha-atrás e agora deixa a porta aberta a um governo tecnocrata ou a novas eleições.
Haverá "Italexit"?
A campanha coseguiu o objetivo de reunir debaixo da bandeira do "Não" toda a variada oposição italiana, que vai desde o progressista "Movimento 5 Estrelas", à direita mais extremista e xenófoba da "Liga Norte". Uma oposição que se converteu num movimento de rejeição contra Renzi e o seu Governo "não eleito" (não liderava o partido democrata quando ganhou as últimas eleições), até agitar a política da Europa.
E é exatamente o "populismo" desta corrente que mais preocupa a Europa, já ameaçada pelo Brexit e pela recente vitória de Donald Trump nos EUA, que teme uma crise de Governo que leve a uma demissão de Renzi, à subida dos movimentos anti-europeistas e uma nova onda de instabilidade nos mercados financeiros.
Até o primeiro ministro da Economia alemão - que protagonizou no passado duros enfrentamentos com o primeiro ministro italiano - apoiou abertamente a frente do "Sim" de Renzi. "Se eu pudesse votar, votaria por ele. Desejo-lhe o maior êxito", chegou a assegurar.
Um problema para a economia
A instabilidade política que se poderia abrir depois de uma vitória do "Não" e o seu correspondente contágio ao sistema financeiro da região é o principal foco de atenção. O Financial Times foi ainda mais longe e apontou o risco de quebra de oito entidades bancárias italianas, sobretudo do Monte dei Paschi di Siena que se está à espera de ser recapitalizado.
Segundo Pietro Cafaro, professor de História Económica na Universidade Católica de Milão, entrevistado pelo idealista/news, "todo o sistema bancário italiano está numa delicada fase de reestruturação, em que a estabilidade é crucial para atrair investidores. Sem esquecer que agora Itália está numa etapa de débil crescimento".
Apesar disso, insiste Cafaro, "parece que existe vontade por parte da imprensa internacional de deitar lenha na fogueira, alimentando a sensação de instabilidade". Não é uma coincidência que nas últimas semanas o diferencial na taxa de juro de dívida soberana italiana a 10 anos (Btp) e o seu homólogo alemão (Bund, o referente de liquidez da Europa) tenha chegado a registar um crescimento de 190 pontos.
Segundo os últimos rumores, Draghi está preparado para aumentar o seu arsenal, intensificando a compra de títulos de dívida transalpinos se o resultado do referendo acabar por incrementar o custo da dívida de Itália. As sondagens mais recentes apontam para uma vantagem do "Não", entre três e seis pontos, mas a chave do resultado estará no que decidam os 20% de votantes que ainda não têm a certeza de que lado vão escolher.

Para poder comentar deves entrar na tua conta