
Preservar um legado de 250 anos enquanto se mantém relevante para as novas gerações pode parecer um desafio complexo, mas no Madame Tussauds de Nova Iorque isso acontece de forma natural. Renovar as figuras em exposição e integrar tecnologia nos cenários é a fórmula para transformar cada visita numa experiência memorável. À frente desta atração icónica, que mistura arte, entretenimento e turismo cultural, está um português, Tiago Mogadouro. Em entrevista ao idealista/news, o diretor geral daquele que é um dos museus mais famosos e visitados do mundo explica que não se vê apenas como gestor, mas como contador de histórias. Afinal, cada figura de cera tem uma narrativa, e é esse poder que mantém o museu relevante e fascinante para milhões de visitantes todos os anos.
Depois de iniciar a sua carreira na Walt Disney World, na Florida, regressou a Portugal para desempenhar funções de marketing, antes de embarcar numa jornada que o levaria ao topo da hierarquia do Madame Tussauds. Em Nova Iorque desde 2020, liderou campanhas de grande impacto, incluindo a aclamada introdução da figura de Cristiano Ronaldo, que se tornou o primeiro atleta a dominar o ecrã de Times Square, atingindo uma audiência global de 1,2 mil milhões de pessoas.
Tiago Mogadouro não vê o museu apenas como uma atração turística, mas como um espaço onde a arte e a tecnologia se fundem para criar experiências memoráveis. "Saber que sou o guardião desta experiência em Nova Iorque traz um sentido adicional de responsabilidade", confessa, destacando o equilíbrio entre manter o legado histórico e inovar para atrair novas gerações.
Mas o segredo do sucesso do Madame Tussauds não está apenas na cera ou na tecnologia. "Os visitantes não querem exatamente mais do que podem ter em casa", explica. A verdadeira magia acontece quando as pessoas partilham momentos únicos, criam memórias e se envolvem com as histórias por detrás de cada figura. Mesmo num mundo cada vez mais digital, o contacto físico e a interação direta continuam a ser o que mais atrai o público, segundo diz o responsável nesta entrevista que agora reproduzimos na íntegra.

Como é ser o diretor de um dos museus mais famosos (e visitados) do mundo?
Embora não seja algo em que pense diariamente, a marca Madame Tussauds carrega um legado histórico de 250 anos, e isso tem um impacto no trabalho que realizo. Acima de tudo, saber que sou o guardião desta experiência em Nova Iorque traz um sentido adicional de responsabilidade e um enorme orgulho em estar à frente dos destinos de um museu com este reconhecimento e fama.
Saber que sou o guardião desta experiência em Nova Iorque traz um sentido adicional de responsabilidade e um enorme orgulho
O que o inspirou a seguir uma carreira internacional em marketing e gestão? Sempre sonhou em trabalhar no estrangeiro?
Sim, sem dúvida. Quando era adolescente, olhava “para fora”, para o que estava a acontecer no estrangeiro, particularmente nos países de língua inglesa. Os Estados Unidos têm sido o epítome da inovação empresarial e da criação de valor há mais de um século, e por isso sempre vi este país, e Nova Iorque em particular, como um destino de sonho onde adoraria trabalhar e viver um dia.
Sente-se mais como gestor ou como contador de histórias? A cultura sempre fez parte do seu ADN?
Hoje em dia, a maioria das empresas conta uma história ou defende um ideal para se manter relevante aos olhos do consumidor. Tenho a sorte de estar numa marca onde as histórias fazem parte do nosso ADN. Marie Tussaud fundou o Madame Tussauds há 250 anos, e mais de dois séculos depois continua a ser o museu de cera mais famoso do mundo. Contar histórias é parte do que fazemos, seja pela longevidade da nossa história ou pelo facto de lidarmos diariamente com as maiores celebridades do mundo, algo que desperta curiosidade em qualquer pessoa. Nunca tenho problemas em reuniões de negócios ou eventos do setor, pois sempre tenho histórias engraçadas que funcionam como ótimos pontos de partida para conversas.
Contar histórias é parte do que fazemos, seja pela longevidade da nossa história ou pelo facto de lidarmos diariamente com as maiores celebridades do mundo, algo que desperta curiosidade em qualquer pessoa

Que lições aprendeu com a sua experiência no Walt Disney World?
A experiência na Walt Disney World foi fundamental na minha trajetória académica e profissional, pois foi lá que aprendi o verdadeiro significado de serviço de “classe mundial”. Muitas marcas prestam um excelente serviço, mas nenhuma o faz como a Disney. Na Disney, aprendi o que é necessário para oferecer um serviço de excelência a um volume avassalador de visitantes, de forma consistente, personalizada e com um toque único. Acredito que, até hoje, são os melhores do mundo nesse aspeto, devido ao cuidado e à atenção que dedicam a esse lado do negócio.
Qual é a sua visão sobre a relação entre arte, entretenimento e turismo cultural em espaços como o Madame Tussauds?
O Madame Tussauds New York é um espaço onde famílias, amigos e conhecidos partilham momentos de lazer e criam memórias para a vida inteira. Claro que continuamos a ser um espaço de entretenimento, pois proporcionamos esse lado mais divertido, mas somos, acima de tudo, um espaço onde a arte de séculos está em exibição e onde os visitantes têm acesso ilimitado às personalidades que se destacaram e impactaram diferentes indústrias. O reconhecimento desta arte, que é a criação de figuras de cera, é o que motiva as visitas, e o nosso trabalho é garantir que as duas horas que as pessoas passam no nosso espaço sejam um momento único e memorável.
Somos, acima de tudo, um espaço onde a arte de séculos está em exibição

Como é o processo de escolha de novas figuras para o museu, e como decidem quais têm maior potencial para atrair visitantes?
O processo é longo, metódico e passa por várias etapas. Começamos por ouvir os nossos visitantes, que nos dizem constantemente quem querem ver no museu. Depois, fazemos uma análise da relevância da celebridade, do impacto que têm na sua indústria e das necessidades do museu para renovar as diferentes áreas do espaço. No final, surge uma lista de nomes, e a partir daí começamos a trabalhar com essas pessoas para criar a figura.
Que figura ou personalidade gostaria de ver representada no museu e que ainda não foi imortalizada? Porquê?
Tenho a sorte de ser responsável pela escolha das figuras do Madame Tussauds New York há vários anos e, nesse sentido, em 2022 conseguimos adicionar a figura de Cristiano Ronaldo ao museu. Em 2020, quando comecei a trabalhar no museu, identifiquei imediatamente o Cristiano como a maior ausência, e poder trazê-lo para o museu foi uma grande vitória que me deixou extremamente satisfeito.

Como equilibrar a responsabilidade de preservar o legado histórico do museu com a necessidade de mantê-lo relevante e inovador para as novas gerações?
É um exercício que acaba por acontecer naturalmente quando renovamos as figuras em exposição e incorporamos tecnologia nos diferentes cenários, ajudando a criar uma experiência em torno dessas figuras de cera. Voltando ao exemplo do Cristiano, ele é novamente um excelente caso neste capítulo. Quando decidimos lançar a sua figura, criámos o conceito “CR7 Air Challenge”, onde três dos seus golos de cabeça estão em loop num ecrã e há bolas penduradas à altura a que ele as cabeceou. Perdi a conta às vezes que ri ao ver pessoas a tentar desesperadamente saltar para cabecear as bolas, sem sucesso, mesmo pessoas altas e em boa forma física! Este é apenas um exemplo de como combinamos a figura de cera, criada da mesma forma desde o início, com novas tecnologias para melhorar a experiência dos visitantes.
Como avalia o papel da tecnologia – como a realidade aumentada ou a inteligência artificial – na evolução da experiência dos visitantes? As experiências digitais estão a ganhar terreno?
Não diria que estão a ganhar terreno. Acredito que há espaço para tudo. Uma das coisas interessantes que a indústria descobriu há alguns anos foi que os visitantes não querem exatamente mais do que podem ter em casa. Na última década, muitos museus apostaram em visitas virtualmente aumentadas ou totalmente virtuais, e essas experiências falharam. Os nossos visitantes querem viver algo único, partilhar esse momento com alguém próximo e criar memórias enquanto o fazem. Isso não implica necessariamente experiências digitais, embora utilizemos tecnologia onde faz sentido e onde realmente melhora a experiência.

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