Apaixonado pela arquitetura e pela sua equipa, João Rodolfo é a personificação da liderança. Foi no Traçado Regulador – atelier que fundou em 1997 – sob o olhar curioso dos colaboradores, habituados à sua discrição, que nos recebeu. Embora acredite que a arquitetura é cada vez mais valorizada, reconhece que ainda há um caminho a percorrer para que “a sociedade a valorize como indispensável”.
O Traçado Regulador é uma espécie de casa de família: “Aqui os projetos são uma atividade coletiva de toda esta equipa”. “Somos um bocado um pai para os nossos projetos e tratamos os filhos de igual modo”, explica em entrevista ao idealista/news para a rubrica “Em casa do arquiteto”.
O atelier especializou-se progressivamente na área da reabilitação, mas os projetos de construção – nomeadamente moradias unifamiliares, são também preponderantes. “As casas são criadas a partir de dentro. O primeiro objetivo de todos é criar um espaço agradável, um espaço para criar felicidade”, refere.
Sempre foi apaixonado pela arquitetura?
Eu acho que as pessoas são levadas a uma área, quando começam a valorizar as suas partes boas. Eu tinha jeito para desenhar. E toda a gente dizia que ia ser arquiteto. Depois houve uma personalidade que me influenciou muito - o arquiteto Cândido Palma de Melo, uma referência da nossa arquitetura moderna. Ele era melhor amigo dos meus pais, uma pessoa completamente diferente das outras, exprimia-se de maneira diferente. E eu disse para mim: “se isto é ser arquiteto, eu quero ser um pouco assim”. Foi dessa maneira que começou esta paixão.
Conte-nos a história deste atelier.
Este atelier – Traçado Regulador –, nasceu em 1997. Não é o meu primeiro atelier, o primeiro atelier nasceu em 1985, uma sociedade irregular, digamos assim, com o arquiteto João Ferreira Nunes, e a arquiteta Teresa Cunha Lopes, ambos paisagistas. As nossas estruturas acabaram por crescer e tornamo-nos independentes. Depois tive um atelier em Alcântara, no Alto de Santo Amaro. Em 1997, cansado de estar sozinho, arranjei um sócio.
Uns anos mais tarde, acabei por ficar sozinho na Traçado Regulador, comprei a quota do meu sócio. Na verdade, não fiquei sozinho, fiquei com esta equipa magnífica, que me acompanha e que me atura. Somos 15 pessoas. E são quase 40 anos.
Ao longo destes 40 anos, alguns projetos que tenham sido mais marcantes?
Eu diria que somos um bocado um pai para os nossos projetos e tratamos os filhos de igual modo, isto é, eu não consigo dizer que há um projeto mais marcante. Todos os projetos foram importantes no crescimento do atelier.
Quando olhamos para o vosso trabalho sente-se uma linguagem idêntica.
Sim, não duvido que se sinta. Há uma cultura que se incute com uma linguagem que visa basicamente dois objetivos. O primeiro objetivo de todos: eu digo sempre que os espaços são criados a partir de dentro, queremos criar um espaço agradável, um espaço para criar felicidade.
Depois, há uma outra característica das nossas casas, que tem a ver com a forma como se entra na casa. Quase sempre estamos a falar de moradias, em 99% dos casos, temos um duplo pé direito na entrada para que se entenda o espaço, para que se entenda a relação entre o piso da entrada no piso superior.
Outra característica é uma fuga de perspetiva constante para o exterior. As pessoas entenderam durante a pandemia o quão necessária era essa relação permanente com o exterior e o quão fechadas se sentiam nas suas casas. Antigamente, quando eu falava sobre estas coisas, era um bocadinho filosofia de arquiteto. Agora as pessoas sentem de facto que isso é de facto assim.
As pessoas entenderam durante a pandemia o quão necessária era essa relação permanente com o exterior e o quão fechadas se sentiam nas suas casas.
Essa linguagem comum é um processo absolutamente natural aqui no atelier, é um entendimento da forma e do espaço vulgarmente conhecido como uma linguagem contemporânea, mas não é mais do que uma herança do neoplasticismo, uma linguagem que visa sintetizar a forma o máximo possível.
Sente que a arquitetura é cada vez mais valorizada?
Penso que sim. A arquitetura é cada vez mais valorizada, embora a nossa sociedade ainda não a valorize o suficiente. Eu diria que, quando comecei a trabalhar, o trabalho do arquiteto era quase “um mal necessário”, quando era necessário. Hoje em dia é mais exigível e as pessoas exigem porque reconhecem que, no seu investimento, o papel do arquiteto é fundamental.
Qual é o bem mais caro que uma pessoa compra durante a sua vida? A casa.
E esse investimento pode ser muito bem feito ou mal feito. Basicamente, tem de haver uma grande relação de confiança com o arquiteto. Vou por dinheiro nas mãos desta pessoa e pode fazer um bom ou um mau trabalho, se ele fizer um mau trabalho o meu investimento foi para deitar fora. Portanto, deve-se investir num bom projeto por várias razões, a primeira é que um bom projeto pode gerar uma boa vivência no futuro, depois, um bom projeto gera outras coisas, gera economia, gera que eu tenha menos erros e omissões, e tenho uma poupança significativa no custo da obra porque a obra foi pensada a interior.
Mas ainda falta muita coisa em termos de valorização. Se compararmos, por exemplo, os honorários dos arquitetos portugueses com os arquitetos franceses ou alemães, estamos muito aquém.
Falta que a sociedade valorize como indispensável e que não pense no trabalho do arquiteto como um mero desenho. O desenho é o suporte de um conjunto de ideias e de um conjunto de prescrições. Que são fundamentais para uma construção com qualidade.
Se pudesse viver em qualquer lugar do mundo, qual é que seria a cidade?
Sempre tive o sonho de viver em cidades pequenas, com pouco movimento. Não tenho uma cidade específica. Eu gosto sobretudo de deambular de cidade em cidade, espaços em espaço.
Detestaria viver em Nova Iorque, por exemplo. Os sítios que eu procuro são quase um retiro espiritual, muito calmas, muito tranquilas.
Mas também não sei se consigo numa cidade assim tão tranquila, porque depois falta-nos este equilíbrio do bulício da cidade.
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