Comentários: 0
Guia para entender a lei da habitação vitalícia – a alternativa à compra e arrendamento tradicional
Luca Dugaro on Unsplash

Está criado o Direito Real de Habitação Duradoura (DHD), um regime que pretende dar às famílias uma solução habitacional estável – permite manter residência permanente numa casa por período vitalício –, surgindo como alternativa à compra e venda ou ao arrendamento tradicional.

O diploma, já aprovado pelo Governo, estará em consulta pública durante um mês, até 18 de abril de 2019. Neste período o Executivo socialista de António Costa espera receber contributos da sociedade civil, pelo que a versão final do decreto-lei ainda pode sofrer alterações.

O idealista/news decidiu preparar um guia explicativo sobre o tema, para que entendas o que é e como irá funcionar este regime. Eis o documento em consulta pública detalhado ponto a ponto.

O que é o Direito Real de Habitação Duradoura

O regime foi criado no âmbito da Nova Geração de Políticas de Habitação (NGPH) e surge como uma alternativa às soluções aquisição de habitação própria ou de arrendamento habitacional. O titular do DHD não tem de adquirir a casa e poderá viver no imóvel durante toda a vida mediante o cumprimento de determinados requisitos e pagamento, ao proprietário, de uma caução e de uma prestação por cada mês de duração do contrato.

Quer isto dizer que com o DHD o morador detém direitos semelhantes aos previstos para o usufruto vitalício e, portanto, mais amplos que os do arrendatário. O direito real tem características próprias, pelo que não se lhe aplica a lei das rendas.

O que é preciso fazer para ter o DHD

Diz o diploma que cabe ao proprietário promover a avaliação prévia do estado de conservação da habitação “realizada por arquiteto, engenheiro ou engenheiro técnico inscrito na respetiva ordem profissional, que não se encontre em qualquer situação de incompatibilidade ou de impedimento no âmbito desse processo”.

A avaliação deve assegurar o registo das condições existentes na habitação há menos de 12 meses.

O que deve conter o contrato

O DHD é constituído pelo proprietário de uma habitação a favor de uma pessoa ou mais pessoas, que adquirem a qualidade de moradores, devendo a habitação ser entregue pelo proprietário ao morador com um nível de conservação, no mínimo, médio.

  • O contrato é celebrado por escritura pública ou por documento particular no qual as assinaturas das partes devem ser presencialmente reconhecidas;
  • O contrato deve conter a declaração do morador que aceita o estado de conservação da habitação, determinado de acordo coma avaliação prévia realizada; o endereço postal ou eletrónico que cada uma das partes se compromete a utilizar para efeito de todas as comunicações a realizar no âmbito do DHD;
  • Após celebração do contrato, qualquer alteração do endereço de uma das partes deve ser comunicada à contraparte no prazo máximo de 10 dias, sob pena de aquela não poder invocar a falta de receção de comunicações;
  • No ato de celebração do contrato são pagas pelo morador as quantias relativas à caução e à primeira prestação mensal, esta pelo valor proporcional ao número de dias de vigência do DHD no mês de celebração do contrato.

Valor da caução e prestação mensal

O proprietário do imóvel e o futuro chegam a acordo sobre um primeiro pagamento inicial, que funcionará como caução pecuniária e que deverá variar entre 10% e 20% do “valor mediano das vendas por m2 de alojamentos familiares, por concelho, aplicável em função da localização da habitação e da área constante da respetiva caderneta predial, de acordo com a última atualização divulgada pelo Instituto Nacional de Estatística (INE)”.

À caução somar-se-á uma prestação mensal, cujo valor também será decidido pelas partes, e que poderá ser depois atualizada anualmente de acordo com o índice publicado pelo INE.

Para que serve a caução

“A caução é prestada por um prazo de 30 anos, sendo o seu valor inicial reduzido em 5% ao ano a partir do início do 11.º ano e até ao final do 30.º ano de vigência do DHD”.

Na prática, ao fim de 30 anos o morador perde o direito à caução. Já o proprietário poderá investir o valor como bem entender até ao 11º ano, uma vez que só nessa altura será tratado como rendimento sujeito a pagamento de IRS.

O proprietário pode utilizar a caução para se ressarcir de dívidas e de despesas decorrentes do não cumprimento pelo morador das suas obrigações, bem como para pagamento de dívidas garantidas por hipoteca constituída pelo morador sobre o DHD, “caso em que o proprietário fica sub-rogado nos direitos do credor, na medida do pagamento efetuado”.

As obrigações do proprietário

  • Assegurar que a habitação é entregue ao morador em estado de conservação, no mínimo, médio;
  • Pagar, na parte relativa à habitação, os custos de obras e demais encargos e quotizações relativos às partes comuns do prédio e, no caso de condomínio constituído, o cumprimento das suas demais obrigações enquanto condómino;
  • Realizar e suportar o custo de obras de conservação extraordinária na habitação, salvo se as anomalias existentes resultarem de atos ilícitos e ou do não cumprimento de obrigações por parte do morador;
  • Gerir o montante recebido a título de caução, sem prejuízo de, em qualquer caso de extinção do DHD, assegurar a devolução da mesma ao morador nos termos previstos no presente decreto-lei.

As obrigações do morador

  • Utilizar a habitação exclusivamente para sua residência permanente;
  • Contratar e assegurar a vigência, a todo o tempo, de um seguro multirriscos da habitação;
  • Pagar as taxas municipais e entregar ao proprietário do imóvel os montantes relativos ao IMI da habitação;  
  • Promover, ou permitir a realização, das avaliações do estado de conservação da habitação e, em qualquer dos casos, pagar o respetivo custo;
  • Dar conhecimento, em tempo, ao proprietário da existência de anomalias na habitação e cuja reparação seja da sua responsabilidade;
  • Podem residir na habitação, além do morador, as pessoas que compõem o seu agregado habitacional.

Vantagens do proprietário

  • Trata-se de uma solução com rentabilidade estável para o seu património habitacional disponível;
  • A garantia da caução paga pelo morador, que neutraliza o risco do não pagamento por este das contrapartidas devidas ou de não realização das obras que deve efetuar;  
  • Redução significativa do custo da gestão do seu edificado, pois é o morador que paga as despesas com a conservação ordinária, os seguros, as taxas municipais e o IMI.

Direitos do morador

  • Direito de residir toda a vida numa habitação, sem que exista um vínculo eterno, já que pode denunciar livremente o contrato; 
  • Direito à devolução, total ou parcial, da caução por eles paga (até ao 30º ano);
  • Direito de hipotecar o DHD se precisar de contratar crédito para pagar a caução;
  • Direito de retenção da habitação quando o proprietário não lhe devolva a caução.

Quem paga IMI e taxas

As taxas municipais são pagas pelo morador e o IMI pelo proprietário, mas o morador tem de lhe entregar os montante respetivo. 

Pagamento do IMT

Para já o diploma nada diz a este respeito, pelo que não haverá lugar ao pagamento deste imposto. Ainda assim, e depois da consulta pública, a lei pode vir a sofrer alterações.

Caducidade do contrato

O DHD caduca com a morte do morador ou, se constituído a favor de mais do que uma pessoa, com a morte do último deles.

O DHD não se transmite por morte aos herdeiros que não sejam também eles titulares do contrato inicial.

Venda ou doação do imóvel pelo proprietário

O proprietário pode doar ou vender o imóvel, mas não pode constituir outros direitos reais sobre ele – nomeadamente uma hipoteca. No caso de transmissão da propriedade da habitação para o morador, este pode utilizar o montante da caução a cuja devolução tenha direito para compensar, total ou parcialmente, a obrigação de pagamento do preço.

Renúncia do morador ao DHD

O morador pode renunciar livremente ao DHD através de declaração com assinatura reconhecida presencialmente enviada ao proprietário, por carta registada com aviso de receção, com uma antecedência mínima de 90 dias em relação à data de entrega da habitação, juntando ficha de avaliação da habitação, comprovativa de um nível de conservação da mesma, no mínimo, médio.

Se o DHD tiver mais que um titular, e se um deles renunciar ao direito, o contrato fica em nome do outro.

Prazo para devolver a caução em caso de renúncia

A extinção do DHD por renúncia do morador determina a devolução do montante correspondente à caução por parte do proprietário (quem tem um prazo para fazer o pagamento), nos seguintes termos:

  • Até nove meses, quando o valor do saldo for igual ou superior a 60% dos montantes pagos pelo morador a título de caução;
  • Até seis meses, quando esse valor for inferior a 60% e superior a 30% dos referidos montantes;
  • Até três meses, quando o saldo for de valor igual ou inferior a 30%.
Ver comentários (0) / Comentar

Para poder comentar deves entrar na tua conta