Alerta é dado por juristas e pela proteção de dados, destacando a medida que vem obrigar os privados a arrendar casas devolutas.
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Arrendamento obrigatório de casas devolutas
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O pacote “Mais Habitação” trouxe várias medidas polémicas e que têm levantado questões de constitucionalidade, como é o caso do arrendamento forçado de casas devolutas. Agora, fiscalistas e juristas admitem que há o risco destas medidas aumentarem o risco de litigância. E os especialistas em proteção de dados alertam que a ideia de levar os operadores de água, gás, eletricidades e telecomunicações a comunicarem os consumos nulos ou baixos para detetarem potenciais casas devolutas viola a privacidade.

Uma das medidas do “Mais Habitação” que tem levantado mais dúvidas em termos legais é mesmo o arrendamento obrigatório de casas devolutas, que visa aumentar a oferta de casas para arrendar em Portugal. Mas António Costa logo descartou quaisquer dúvidas, argumentando que, em termos constitucionais, o “direito de propriedade” não se pode sobrepor a outros direitos fundamentais, como o “direito à habitação”.

“Não tenho a mais pequena dúvida de que este pacote vai aumentar a litigância", admite José de Matos Correia, da sociedade de advogados CMS.

Sobre o arrendamento forçado de casas devolutas, o jurista José de Matos Correia, da sociedade de advogados CMS, referiu que o desenho final da medida será relevante para determinar se esta é ou não equilibrada face ao que tem sido o entendimento do Tribunal Constitucional em matéria de direito de uso e direito de propriedade, disse na conferência "Mais Habitação - Proteção, regulação ou travão", organizada pelo Jornal Económico e pelo Novo Semanário, que decorreu esta terça-feira, dia 7 de março, em Lisboa.

Na mesma ocasião, a ministra da Habitação Marina Gonçalves reforçou que o arrendamento forçado de casas devolutas "faz sentido estar na lei", precisando que a diferença face ao regime legal que já existe é que neste caso se está a tratar de imóveis devolutos em condições de serem utilizados (para arrendamento). Para Marina Gonçalves este "será mais um instrumento do nosso ordenamento jurídico, mas certamente não será a forma como faremos esta parceria com todos os promotores de respostas habitacionais", sublinhou ainda. 

Dúvidas constitucionais
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Enviar consumos de água, luz e gás viola privacidade

Há outras questões que agora se levantam. A proposta de lei, que vem definir os contornos legais do arrendamento obrigatório de casas devolutas e que agora está em consulta pública, revela que os donos das casas devolutas têm 100 dias para as usar ou arrendar. Além disso, o diploma também diz que as empresas de água, luz ou gás deverão enviar todos os anos uma "lista atualizada da ausência de consumos ou de consumos baixos, por cada prédio urbano ou fração autónoma", de forma a facilitar a identificação do património habitacional devoluto.

Sobre este ponto, Inês Oliveira, presidente da Associação dos Profissionais de Proteção e de Segurança de Dados (APDPO) já alertou que levar os operadores de água, gás, eletricidade e telecomunicações a comunicarem obrigatoriamente os consumos viola a privacidade e é abusiva. Por isso mesmo, Vítor Palmela Fidalgo, advogado e professor na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, considera que esta “matéria terá de ser alvo de escrutínio” e “no limite até pode ser enviada para o Tribunal Constitucional para se saber se é ou não uma medida proporcional”, cita o Expresso.

Por outro lado, os operadores de telecomunicações alertaram também para o facto de não usarem contadores e não medirem os consumos, escreve o mesmo jornal. Por isso mesmo, questionam a utilidade do envio dos "consumos" para efeitos de identificação de casas devolutas.

Empresas de luz a dar dados de consumos
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Garantir que o Estado paga rendas em atraso ao senhorio também pode aumentar a litigância

Além de o "Mais Habitação" apresentar riscos legais no arrendamento obrigatório de casas devolutas e levantar questões de privacidade no fornecimento de dados pessoais no caso das empresas de serviços, os juristas e fiscalistas acreditam também que há outras medidas que podem aumentar o número de casos que chegam a tribunal.

Para João Pinheiro da Silva, sócio imobiliário da CMS, também há risco de litigância na medida que prevê que o Estado pague ao senhorio rendas em atraso. "Quem apresenta uma proposta destas ou percebe pouco ou não percebe nada de arrendamento, porque isto é um incentivo ao incumprimento que vai gerar uma litigância grande", afirmou o advogado no mesmo encontro.

Foram várias a vozes que já levantaram questões sobre a constitucionalidade destas e de outras medidas que integram o “Mais Habitação”, como a suspensão do Alojamento Local Sobre este pronto, o Presidente da República já admitiu que quando as medidas chegarem a Belém poderá vetá-las ou enviá-las para o Tribunal Constitucional caso suscitem dúvidas jurísticas.

*Com Lusa

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