Explicamos tudo sobre estas duas figuras jurídicas de grande utilidade prática com fundamento jurídico.
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Usufruto e nua-Propriedade
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Sérvulo & Associados
Sérvulo & Associados, Sociedade de Advogados, SP, RL (Colaborador do idealista news)

O direito de propriedade é, por natureza, o mais amplo e completo direito real previsto no ordenamento jurídico português. Contudo, esse direito pode ser desdobrado em diferentes faculdades, permitindo que a posse, o uso e a fruição do bem estejam separados da titularidade plena. É neste enquadramento que assumem relevância duas figuras jurídicas de grande utilidade prática: o usufruto e a nua-propriedade - duas faces da mesma moeda.

O que são o usufruto e nua-propriedade?

Importa esclarecer, antes de mais, o que significam estes dois conceitos. "O usufruto é definido como o direito de gozar temporariamente de coisas ou direitos alheios, sem alterar a sua forma ou substância. Trata-se de um direito que confere ao usufrutuário a posse, uso e fruição do bem, preservando-se, contudo, a titularidade da propriedade para o nu-proprietário", começa por explicar Pedro João Domingos, da Sérvulo & Associados, neste artigo preparado para o idealista/news.

Já a nua-propriedade consiste no direito de propriedade desprovido do direito de uso e fruição. "O nu-proprietário mantém a titularidade jurídica do bem, mas não goza do direito de usufruir deste durante a vigência do direito de usufruto", acrescenta o advogado. 

Usufruto e nua-propriedade
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Regime Jurídico 

Constituição do usufruto

O usufruto pode ser constituído por contrato, testamento, usucapião ou disposição legal e poderá vigorar por um determinado prazo ou deter natureza vitalícia, caso em que o direito cessará por morte do usufrutuário. No caso de pessoas coletivas, o prazo máximo do usufruto é de 30 anos.

Direitos e deveres do usufrutuário

O usufrutuário goza de um conjunto de direitos, nomeadamente:

  • Possuir e usar a coisa;
  • Perceber os frutos da coisa;
  • Ceder o usufruto a terceiros, salvo disposição em contrário;
  • Realizar benfeitorias úteis e necessárias;

Em contrapartida, o usufrutuário tem obrigações que visam proteger o bem e os interesses do nu-proprietário, nomeadamente:

  • Relacionar os bens, declarando o estado e o valor dos mesmos;
  • Prestar caução, salvo dispensa legal ou contratual;
  • Conservar a substância do bem;
  • Suportar as reparações ordinárias indispensáveis à conservação do bem e as despesas de administração;
  • Avisar o nu-proprietário de qualquer facto de terceiro suscetível de lesar os direitos daquele.

Direitos do nu-proprietário

Na medida em que a nua-propriedade consiste na propriedade jurídica do bem desprovida dos direitos de uso, posse ou fruição, o nu-proprietário tem direitos limitados durante o usufruto. Ainda assim, o nu-proprietário pode:

  • Alienar a sua posição jurídica, ou seja, vender a nua-propriedade;
  • Exercer atos de disposição, como doações ou hipotecas, respeitando os limites do usufruto;
  • Direito a exigir a prestação de caução pelo usufrutuário;
  • Fiscalizar o uso do bem;
  • Ser indemnizado pelo usufrutuário por danos que ultrapassem os limites do uso normal e diminuam o valor do bem;
  • Reaver a plenitude da propriedade com a cessação do usufruto.

Extinção do Usufruto

O usufruto extingue-se por:

  • Morte do usufrutuário;
  • Decurso do prazo fixado;
  • Reunião do usufruto e da nua-propriedade na mesma pessoa;
  • Pelo seu não exercício durante 20 anos, qualquer que seja o motivo;
  • Renúncia pelo usufrutuário;
  • Perda ou destruição do bem.

Com a extinção do usufruto, o nu-proprietário recupera a propriedade plena do bem.

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Aplicações práticas 

A separação entre usufruto e nua-propriedade revela-se de grande utilidade prática no direito português, permitindo uma gestão mais flexível do património, sobretudo em contextos de planeamento sucessório e gestão patrimonial.

Planeamento sucessório 

Uma das aplicações práticas mais frequentes das figuras do usufruto e nua-propriedade, é o planeamento sucessório, nomeadamente, através da doação da nua-propriedade de um bem (habitualmente um imóvel) a descendentes, com reserva de usufruto para o doador ou para o cônjuge sobrevivo. Exemplos:

  • Doação em vida da casa de família aos descendentes, com constituição de usufruto vitalício a favor do doador, permitindo que este continue a residir no imóvel ou arrendá-lo, garantindo a sua segurança patrimonial até à morte.
  • Deixa testamentária com atribuição de usufruto de determinados bens a um herdeiro (por exemplo, o cônjuge sobrevivo), enquanto os descendentes ficam com a nua-propriedade, equilibrando direitos e interesses.

A utilização das figuras do usufruto e da nua-propriedade em contexto de planeamento sucessório não só assegura que o doador não fica desprovido do uso dos seus bens, como permite evitar conflitos sucessórios futuros.

Processos de divórcio

Nos casos de dissolução do casamento, o usufruto pode funcionar como forma de assegurar o direito de habitação de um dos ex-cônjuges. Exemplo:

  • Em sede de processo de divórcio, constituição de um direito de usufruto sobre a casa de morada de família a favor de um dos ex-cônjuges, sem necessidade de proceder à alienação imediata do imóvel.

Gestão patrimonial e proteção do rendimento

O usufruto pode ser utilizado como forma de garantir rendimento ao usufrutuário, permitindo-lhe explorar economicamente o bem, sem risco de perda da propriedade. Exemplo:

  • Um proprietário transfere a nua-propriedade de um prédio urbano a um familiar, mas conserva o usufruto, continuando a receber as rendas dos arrendatários.

Garantia patrimonial 

Em certos casos, o usufruto pode ser utilizado como forma alternativa de garantia. Exemplo:

  • Um credor pode aceitar a constituição de usufruto como forma de assegurar o pagamento de uma dívida, possibilitando-lhe a exploração económica do bem.

Transmissões patrimoniais e fiscalidade

O fracionamento entre usufruto e nua-propriedade tem implicações relevantes em sede matéria fiscal, pelo que poderá ser utilizada para otimização fiscal, permitindo ceder património em vida, com custos reduzidos, e sem perder o controlo sobre os bens. 

A doação da nua-propriedade, com reserva de usufruto, é tributada com base no valor da nua-propriedade, calculado em função da idade do usufrutuário, pelo que poderá ser uma opção fiscalmente mais vantajosa face a outras formas de transmissão de bens.

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Conclusão

Além de conceitos jurídicos, o usufruto e a nua-propriedade são ferramentas práticas que permitem gerir património com segurança e flexibilidade. Seja para planeamento sucessório ou gestão patrimonial, estes institutos oferecem soluções adaptadas às necessidades reais das famílias e dos proprietários. Compreender bem o seu funcionamento, através de apoio jurídico qualificado, é dar um passo importante para tomar decisões patrimoniais mais conscientes, eficazes e vantajosas.

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