Governo Balear lançou um conjunto de medidas para atenuar o problema habitacional nas Ilhas Baleares. Mas será suficiente?
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Ibiza
Pixabay

Ibiza tem dois extremos. Por um lado, a Ibiza do luxo, das discotecas e das moradias de sonho. Por outro, a Ibiza das barracas e da exclusão habitacional. Já não é novidade que os preços altíssimos das casas obrigam muitas pessoas a abandonar a ilha por não conseguirem encontrar uma habitação com uma renda acessível.

“Tentei por todos os meios renovar o contrato de arrendamento com o senhorio, mas quando acabaram as prorrogações previstas na lei, foi impossível. O senhorio não quis. No meu caso, tive sorte, porque tenho uma loja online e pude mudar-me para León, com a minha família. Mas tenho amigos que são de Ibiza e tiveram de abandonar a ilha por não conseguirem pagar uma renda. E nem vale a pena falar em comprar casa”, conta Nerea S.M. ao idealista/news.

Nerea explica que, depois de sair, viu um anúncio do apartamento onde vivia, numa plataforma de arrendamento turístico, e já esperava que isso acontecesse. A escalada dos preços da habitação afeta muitos residentes em cidades e regiões de Espanha onde a oferta de casas para arrendar tem vindo a diminuir, sendo ainda mais notória nas Ilhas Baleares, onde o espaço disponível para construir é muito limitado.

As causas deste cenário são várias: constrói-se pouco, as medidas de intervenção do Governo no mercado de arrendamento tradicional desincentivam os proprietários a colocarem as casas no mercado, e a rentabilidade superior do arrendamento turístico ou sazonal torna-se mais atrativa, entre outros fatores.

Segundo dados do idealista, o preço médio do arrendamento em Ibiza era de 25,3 euros por metros quadrados (euros/m2) em fevereiro de 2025. O facto desse ser o último valor disponível indica que as casas para arrendar desaparecem assim que o verão se aproxima, não havendo oferta suficiente para calcular um preço médio. Quanto ao preço de venda, em junho de 2025 situava-se nos 6.751 euros/m2, um valor incomportável para a maioria dos espanhóis. A zona mais cara da ilha é Marina Botafoc - Talamanca (7.534 euros/m2) e a mais acessível é Figueretes - Platja d'En Bossa (5.738 euros/m2).

Apesar de Ibiza ter uma população de 159.180 habitantes (2023), os preços das casas são comparáveis ou até superiores aos dos maiores mercados imobiliários de Espanha. Por exemplo, o preço médio de venda em Barcelona é de 4.920 euros/m2 e o do arrendamento é de 23,9 euros/m2. Em Madrid, os valores são de 5.642 euros/m2 e 22 euros/m2, respetivamente. Esta comparação dá uma ideia da enorme pressão que existe no mercado habitacional da ilha.

“Antes de sair de Ibiza tentei encontrar outro apartamento, mas quase todos estavam a preços absurdos e apenas disponíveis por períodos curtos, normalmente depois do verão. Cheguei a ponderar viver num estúdio de 30 m2 por 1.000 euros mensais, mas acabei por desistir. Quando procurei casas para comprar, a realidade foi ainda mais dura: casas minúsculas a preços exorbitantes ou propriedades que só vendiam uma parte”, recorda Nerea. “Tenho um conhecido que acabou por pagar a um proprietário de um terreno para poder viver no carro”, acrescenta.

Ibiza
MrPepanos, CC BY 3.0 Creative commons

Os preços proibitivos da habitação em ilhas como Ibiza, além de expulsarem os residentes, estão a dar origem a um fenómeno que mais parece o regresso de um velho fantasma: os bairros de barracas. Em Ibiza, este tipo de acamapamentos improvisados proliferaram, ao ponto de muitos já descreverem a ilha como uma cidade de caravanas. Muitas pessoas veem-se obrigadas a viver em veículos ou em habitações precárias para conseguirem continuar a trabalhar na ilha.

De facto, a 15 de julho de 2025, a polícia iniciou o despejo de 200 pessoas que viviam no maior bairro de barracas ilegal de Ibiza, situado na propriedade privada de Can Rova 2. Tratava-se de um aglomerado de habitações precárias onde residia um grande número de trabalhadores sazonais, incapazes de arrendar uma casa devido aos preços exorbitantes. Esta nova concentração de caravanas surgiu depois de, em 2024, ter sido desalojado outro núcleo de habitações improvisadas num terreno vizinho.

Mas este não é um caso isolado. Recentemente, a 7 de julho de 2025, a Câmara Municipal de Ibiza procedeu ao despejo de um bairro de barracas em es Gorg, na zona industrial de GESA, perto do Ikea, onde se encontravam caravanas, autocaravanas, carrinhas adaptadas e tendas de campismo. A situação na ilha leva a episódios surreais, como um anúncio na Airbnb a alugar uma carrinha por 101 euros por noite em julho. Em agosto, o preço sobe para 110 euros.

Como já foi referido, a falta de habitação a preços acessíveis obriga muitos trabalhadores a abandonarem a ilha, como aconteceu com o conhecido caso de Sonia Sancho, técnica auxiliar de enfermagem no Hospital Can Misses. Sonia teve de mudar-se para Ciudad Real porque não conseguia pagar uma renda em Ibiza. Apesar de lá pagar apenas 450 euros de renda, as condições de trabalho e de vida eram piores, pelo que acabou por regressar à ilha. Atualmente, vive com a mãe.

Este hospital foi mesmo obrigado a adaptar uma ala inutilizada do edifício, transformando quartos de antigos pacientes em alojamentos individuais para acolher gratuitamente médicos e enfermeiros que chegam no verão e não têm onde ficar. O projeto começou com oito quartos e, atualmente, já ultrapassa os 40.

Ibiza
Petr Kratochvil, CC0 Creative commons

Medidas para aliviar a crise da habitação em Ibiza

Terá solução o problema da habitação em Ibiza? O Governo das Ilhas Baleares lançou um plano de emergência em colaboração com as autarquias, que inclui diversas medidas e programas. No caso de Ibiza, este plano prevê a construção de mais de 1.000 habitações a preços acessíveis, destinadas a residentes.

“Uma das medidas adotadas pelo Governo, aplicada por câmaras municipais de todas as cores políticas, é garantir que estas habitações acessíveis sejam prioritariamente atribuídas a cidadãos residentes com, pelo menos, cinco anos de residência nas ilhas (quer seja para habitação de proteção pública, quer para a nova categoria de habitação a preço limitado, ambas abaixo dos valores de mercado)”, explicam fontes da Direção Regional de Habitação, Território e Mobilidade ao idealista/news.

“Com o plano de emergência impulsionado por Marga Prohens, presidente do Governo das Ilhas Baleares, estão a ser aplicadas medidas para acelerar a promoção de habitação social e, em simultâneo, desenvolvem-se iniciativas em parceria com o setor privado. O objetivo é enfrentar as múltiplas dimensões do problema da habitação, que não afeta apenas os grupos mais vulneráveis e as pessoas com baixos rendimentos, mas também jovens, trabalhadores e a classe média. Paralelamente, os Conselhos Insulares estão a intensificar o combate ao arrendamento de turístico ilegal, com o intuito de recuperar casas para o mercado de arrendamento de longa duração, destinadas aos residentes”, acrescenta a Direção Regional.

Ibiza
Eivissa, Ibiza / UnFUG-Fabi, CC BY-SA 4.0 Creative commons

No total, estão previstas mais de 1.000 novas habitações destinadas a residentes, através de projetos de promoção pública, parcerias público-privadas e novas ferramentas legislativas.

“No âmbito da promoção pública, o Instituto Balear da Habitação (IBAVI) está a desenvolver 276 novas habitações, que se somam às 60 já em construção. Trata-se de uma aposta clara e firme, que representa um aumento de quase 195% na oferta de habitação pública em Ibiza, onde o IBAVI gere atualmente 174 habitações”, explicam fontes do governo.

Além disso, o Governo está a promover quatro novos projetos de habitação pública em dois terrenos cedidos pela Câmara Municipal de Eivissa e outros dois pelo Consell de Eivissa. Está também previsto o desenvolvimento de um lote na futura urbanização de Ca n’Escandell (as outras duas parcelas deverão ser promovidas pela SEPES), assim como 200 novos alojamentos de serviço (habitação destinada a trabalhadores) em Eivissa.

Dentro do plano de emergência, destaca-se em Eivissa a construção de mais de 600 habitações numa primeira fase, integradas no programa Construir para Arrendar (Build to Rent), através da nova Lei de Emergência do Governo. Concretamente:

  • 311 habitações serão construídas em dois terrenos cedidos pela Câmara Municipal de Eivissa, através de um concurso público promovido pelo Governo;
  • Cerca de 300 habitações serão edificadas em três parcelas do município de Santa Eulària, que iniciou um processo próprio.

Este programa baseia-se na cedência de terrenos públicos à iniciativa privada para a construção de habitação de proteção pública ou de preço limitado.

Está igualmente previsto, através da Lei de Emergência, reconverter estabelecimentos comerciais em habitações de preço limitado, o que permitirá criar pelo menos nove novas unidades habitacionais.

Por outro lado, no âmbito do programa “Arrendamento Seguro” (Lloguer Segur), destinado a captar casas devolutas para serem arrendadas a residentes a um preço 30% abaixo do mercado, existem cerca de 20 imóveis em Eivissa em fase de tramitação, a aguardar a documentação necessária para integrarem este programa.

“A tudo isto soma-se um novo Decreto-Lei cujo objetivo é aumentar a oferta de habitação acessível no arquipélago. Este diploma cria a figura dos Projetos Residenciais Estratégicos, que permitirá desbloquear terrenos urbanos e urbanizáveis e acelerar os prazos de licenciamento urbanístico.”

Durante a tramitação parlamentar, o Governo chegou a um acordo com o grupo parlamentar VOX para alargar o alcance do Decreto. Entre as principais novidades, está a extensão dos Projetos Residenciais Estratégicos a todos os municípios com mais de 10.000 habitantes. No caso de Ibiza, isto abrange os concelhos de Eivissa, Santa Eulària des Riu, Sant Antoni de Portmany e Sant Josep de sa Talaia.

Além disso, a Direção Regional da Educação implementou um programa para facilitar o acesso à habitação para professores em Ibiza e Formentera, uma medida que visa reter e atrair talento para estas ilhas com forte pressão imobiliária.

Por outro lado, o Governo anunciou também um investimento de 8,13 milhões de euros para combater a oferta ilegal e a concorrência desleal no setor turístico, com especial atenção à luta contra o arrendamento turístico não autorizado.

Será que este conjunto de medidas será suficiente para resolver os problemas de habitação? Só o tempo o dirá.

Ibiza
Hans Põldoja, CC BY 2.0 Creative commons

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