A maioria dos créditos indexados à Euribor a três e seis meses ainda estão com indexante inferior ao que tinham quando foram contratados, segundo as recentes declarações do governador do Banco de Portugal (BdP), durante a audição da Comissão de Orçamento e Finanças sobre a atuação da banca na comercialização ou pedidos de renegociação de crédito habitação e desajustamento dos juros nos depósitos a prazo. Mário Centeno acredita que pico das taxas de juro chegará em agosto.
Considerando que a situação atual é "desafiante", devido à forma rápida como a subida das taxas de juro se tem transposto para os indexantes da generalidade dos créditos habitação, Centeno referiu que 75% dos contratos indexados à Euribor a três meses e 69% dos indexados a seis meses "têm um indexante inferior ao indexante utilizado no contrato inicial". Já no caso dos indexados à Euribor a 12 meses esta situação contempla 34% dos contratos.
Porém, adiantou, enquanto no caso da Euribor a 12 meses, o valor máximo do indexante já terá atingido o pico em fevereiro, já os contratos indexados a três e seis meses "apenas atingirão os seus máximos durante os meses do verão deste ano". Em causa estão 70% dos contratos de crédito habitação, tendo em conta que atualmente 40% dos contratos utiliza Euribor a seis meses, 30% a três meses e 30% a 12 meses.
Contratos indexados a três e seis meses "apenas atingirão os seus máximos durante os meses do verão deste ano".
Estes dados, referiu, indicam que "este processo [de impacto da subida dos juros na prestação do empréstimo da casa] ainda não atingiu o fim", sendo por isso este um processo "em curso" que deve ser acompanhado com "cuidado". Mário Centeno disse ainda que neste momento "todos os contratos a três e seis meses já sofreram alguma atualização", enquanto a 12 meses foram cerca de metade.
"Estamos num processo que ainda vai decorrer em 2023", referiu Mário Centeno, assinalando que no final de 2022 a Euribor a três meses estava em 2,13% sendo que a estimativa atual é que possa atingir um máximo de 3,22% em agosto, o que revela que o processo "ainda vai demorar alguns meses".
Agosto é também o mês em que se antecipa que a Euribor a seis meses atinja o valor máximo, para começar a descer a partir daí, pelo que os contratos com este indexante que renovem até lá ainda registarão nova subida. Questionado sobre a medida que integra o pacote Mais Habitação e que obriga os bancos a terem uma oferta de taxa fixa, o governador do BdP salientou ser importante que os consumidores tenham possibilidade de escolher.
Contudo, referiu que se a oferta surgir quando se espera que as taxas variáveis estejam próximo do seu valor máximo, a medida poderá ter pouca eficácia e poderá até fazer com que os consumidores fiquem amarrados a uma taxa mais elevada – tendo em conta a evolução que o mercado agora permite antecipar em relação às Euribor.
Processos de renegociação de crédito não devem ser banalizados
O governador do Banco de Portugal também se manifestou contra a banalização dos processos de renegociação de crédito, acentuando que os créditos são uma obrigação e uma responsabilidade. "Não podemos banalizar o processo de negociação de um crédito, porque este é uma obrigação e uma responsabilidade", disse Mário Centeno, acentuando também a necessidade de não se induzir os clientes em erro de que a renegociação é um processo simples.
"As renegociações são processos naturais na banca, mas são processos que devem ser vistos com muita cautela por todos os intervenientes", referiu, tendo em conta as obrigações e responsabilidade que envolvem, nomeadamente do lado do banco, que é "o intermediário financeiro", que tem de responder sobre a forma como são utilizados os recursos.
Relativamente a reclamações que tenham chegado ao BdP sobre eventual marcação de clientes que pedem para o seu crédito ser renegociado ao abrigo do decreto lei que foi publicado em novembro do ano passado sobre medidas destinadas a mitigar os efeitos do incremento dos indexantes de referência de contratos de crédito para aquisição ou construção de habitação própria permanente, Mário Centeno referiu que ao abrigo deste decreto-lei chegaram ao BdP 339 reclamações (3,5% do total das reclamações).
Questionado por vários deputados sobre os resultados da aplicação daquele decreto-lei, Mário Centeno referiu que o balanço está ainda por fazer, adiantando, contudo, que o BdP fez uma inspeção transversal sobre a sua aplicação, não estando ainda os resultados disponíveis.
Rendimento das famílias ainda "suficiente" para pagar prestações da casa
Na sua intervenção inicial, Mário Centeno tinha referido que no final de 2022, para metade das famílias, 15,5% do seu rendimento líquido de impostos e contribuições é suficiente para fazer face às prestações do crédito habitação e que apenas 12,3% das famílias têm taxas de esforço superiores a 36%.
Analisando a variação da taxa de esforço entre 2022 e 2023, referiu que para metade das famílias a parcela do rendimento destinada ao crédito à habitação aumenta em menos de 2,4 pontos percentuais e que para 32% a variação é superior a cinco pontos percentuais (p.p).
"Até ao final de 2023, 335 mil contratos terão uma variação da taxa de esforço maior ou igual a cinco p.p., dos quais 58 mil com taxa de esforço significativa", disse ainda, sinalizando que os contratos com redução da taxa de esforço entre 2021 e 2022 representam mais de um quarto do total.
*Com Lusa
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