
O grupo hoteleiro português Vila Galé anunciou esta segunda-feira (18 de novembro de 2019) que já não vai construir um resort turístico no estado brasileiro da Bahia, num terreno que é reclamado pela comunidade indígena Tupinambá de Olivença. “Vamos ser forçados a abandonar este projeto”, disse o grupo, que é atualmente responsável pela gestão de 34 unidades hoteleiras: 25 em Portugal e nove no Brasil.
A decisão de abandonar a construção do empreendimento está relacionada com o terreno onde seria construído o resort. Trata-se de uma área de mangue – ecossistema costeiro e húmido presente em zonas tropicais e subtropicais –, onde o povo indígena Tupinambá de Olivença coleta crustáceos, escreve o Diário de Notícias.
“Não é de nosso interesse que um Hotel Resort Vila Galé nasça com a iminência de um clima de 'guerra', ainda que injusta e sem fundamento, como são exemplo as ameaças proferidas na Embaixada de Portugal em Brasília e algumas declarações falsas, dramáticas e catastróficas que deveriam envergonhar quem as profere”, refere em comunicado o grupo hoteleiro, citado pela Lusa.
Segundo o documento, a empresa critica “ataques por alguns que abraçam causas mediáticas, só aparentemente justas, e usam de falsidades, sem sequer procurarem minimamente obter a verdade dos factos”.
O Vila Galé lembra que o projeto nasceu em abril de 2017 na sequência de um convite do Governo da Bahia e da Prefeitura de Una para “realizar um investimento num mega 'resort' para ajudar ao desenvolvimento da região de Una, tendo sido estabelecida uma parceria com a empresa proprietária dos terrenos”.
A empresa garante que realizou todos os estudos e projetos, que foram aprovados pelas autoridades competentes, e que “ao longo de todo esse tempo não surgiu qualquer reclamação ou reivindicação, apesar de ser pública e notória em toda a região a notícia do projeto”, lê-se na mesma nota, citada pela Lusa.
Segundo o grupo, não há sinais de ocupação ou utilização indígena num raio de muitos quilómetros e “não existe qualquer reserva indígena decretada para esta área, nem previsão de a vir a ser”.
“Passaram três mandatos governamentais anteriores, com vários ministros da Justiça e nenhum deles aprovou a demarcação das terras indígenas”, garante a empresa portuguesa. “Entretanto, tratando-se de um tema delicado que suscita estados emocionais por parte de alguns setores, fomos acusados de falsidades inconsistentes e graves”, critica o grupo.
Um processo polémico
No dia 29 de outubro, numa nota enviada às redações, o grupo reagiu a uma notícia do portal de jornalismo de investigação brasileiro The Intercept, garantindo que “não existem indígenas” na zona onde pretendia instalar o Vila Galé Costa do Cacau.
“Não existe no local qualquer tipo de ocupação de pessoas e bens ou sequer vestígio da mesma num horizonte temporal muito alargado”, lê-se num comunicado divulgado nessa altura, onde o grupo justificava a legitimidade do hotel, que tinha abertura prevista para 2021.
A área em causa, que corresponde a 470 quilómetros quadrados, pertence ao povo Tupinambá de Olivença, que luta pela demarcação daquelas terras há pelo menos 15 anos, e cuja primeira fase do processo foi concluída em 2009.
“Esta é a primeira vez, pelo menos desde a Constituição de 1988, que um órgão federal faz 'lobby' sobre outro – e o regista num documento oficial do Governo – para entregar à iniciativa privada uma área indígena, também ela registada num documento oficial do executivo”, escreveu o The Intercept, depois de falar com vários especialistas, que declararam a ação inédita e ilegal.
O empreendimento estimava criar mais de 500 empregos diretos e cerca de 1.500 indiretos, segundo o Vila Galé, que mantém a intenção de investir na zona de Una.
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