Há cerca de cinco anos, Javier Diaz e a sua mulher - ele espanhol, ela portuguesa - viajavam pela Serra da Estrela à procura de um imóvel antigo para converter num hotel. Foi em Oliveira do Hospital que encontraram um palacete do século XIX pelo qual se apaixonaram de imediato, apesar de estar “bastante degradado”. Foi aí que começou a grande aventura de reabilitar o imóvel e transformá-lo naquilo que é hoje: o Palacete do Guerreiro, o hotel que une história, luxo, natureza e exclusividade. Aqui os “hóspedes sentem-se em casa”, revela o empresário espanhol em entrevista ao idealista/news.
A reabilitação do palacete revelou-se uma “travessia dura”, tendo sido preciso recuperar o telhado, o soalho, a canalização e a rede elétrica. E, por isso, demorou muito mais do que o previsto, tendo representado um investimento total de cerca de 2 milhões de euros. A caminhada de recuperação foi tão difícil que batizaram-no Palacete do Guerreiro, inspirado no guerreiro Viriato, figura histórica que dá vida e cor à decoração deste hotel de luxo, que tem 9 quartos e um apartamento T2.
“Quisemos devolver ao palacete a exclusividade, a história e a própria essência que ele tinha”
Abriram as portas ao público este verão e tem sido “surpreendente”, não só pelos casais que os visitam para celebrar a vida, como também pelo facto de não quererem sair do hotel. “O palacete não é apenas um palacete. O palacete é história, luxo, exclusividade e natureza. E, através destes quatro fatores, queremos dar esse detalhe e exclusividade ao hóspede — que ele se sinta em casa e com o maior dos propósitos”, resume Javier Diaz, manager do Palacete do Guerreiro.
“O cliente de luxo é quem mais procura esta zona, porque está farto de turismo de massas. E o que quer o cliente de luxo? Paz, sossego e relaxar. E o Palacete do Guerreiro tem todos esses elementos”, revela o empresário espanhol que vive no país há cerca de 13 anos. Mas só a essência do palacete não chega, sendo preciso “mais apoio por parte das instituições públicas para ajudar o interior de Portugal a atrair (…) o hóspede de luxo, o hóspede exclusivo”, frisa. Na visão de Javier Diaz, só assim se consegue “evitar que os edifícios históricos em Portugal desapareçam”.
A história do Palacete do Guerreiro remete-nos para o final do século XIX. Conte-nos a sua origem e importância local.
O Palacete do Guerreiro foi comprado há cinco anos a uma família de muitas gerações. Eram uns senhores daqui de São Gião, que queriam ganhar dinheiro e foram para o Brasil comercializar pão. Durante anos fizeram muito dinheiro e contrataram, supostamente, o melhor arquiteto de Coimbra para construir o maior palacete de São Gião, para ostentar o trabalho que tinham feito no Brasil e a capacidade económica que tinham. Assim, construíram o palacete com os melhores materiais da região: granito, madeira de carvalho…
"Quando comprámos o palacete, já funcionava como hotel rural, (...) e estava bastante degradado"
O que o levou a comprar e a recuperar o Palacete do Guerreiro? Em que estado o encontraram?
Foi muito engraçado, na verdade, porque nós (eu de Salamanca e a minha esposa de Santarém) viajávamos para a Serra da Estrela e gostamos mesmo desta zona. E queríamos encontrar um palacete realmente antigo nesta zona, porque percebemos o potencial que a Serra da Estrela tem tanto em Portugal, como na Europa. Portugal tem condições turísticas extraordinárias com luz, natureza… e a Serra da Estrela enquadra-se muito bem no que procurávamos. Vendo opções tanto em Manteigas, como na Covilhã e Oliveira do Hospital, encontrámos este lindo palacete, ficámos apaixonados e comprámos.
Quando comprámos o palacete, já funcionava como hotel rural, que pertencia ao senhor Luís Barbas, e estava bastante degradado. Na verdade, os quartos eram vendidos por preços muito baratos e nós quisemos devolver ao palacete a exclusividade, a história e a própria essência que ele tinha. Então, começámos a fazer projetos e obras. Mas um projeto previsto para um ano acabou por se transformar em quatro anos de trabalhos, porque estava realmente degradado. Após muita luta conseguimos abrir.
Quais foram os principais desafios na reabilitação do imóvel? E qual foi o valor do investimento?
Quando começámos as obras no palacete, vimos que a estrutura estava muito danificada. Encontramos animais surpresa dentro do palacete e, portanto, tivemos de tirar toda a estrutura do telhado e o soalho tivemos de o recuperar por completo. Isso para nós foi uma travessia dura, porque não o tínhamos previsto, tal como a canalização e a eletricidade — tivemos de fazer tudo totalmente novo. Isso foi um grande obstáculo para nós. E não só.
Pensávamos que o palacete tinha água suficiente e potável, mas quando ligámos as minas de água percebemos que a água não era potável. Então, tivemos de trazer água da rede pública, o que se revelou uma obra estrutural complicada também por todas as licenças necessárias para poder trazer água pública até ao palacete. Foi muito duro para nós.
O valor do investimento na reforma do palacete ronda os 1,2 milhões e 1,3 milhões de euros. Depois, há outros investimentos à parte, seja mobiliário, seja a própria recuperação ou reestruturação. O valor total de investimento está entre os 2,1 milhões e 2,2 milhões de euros.
"O que destaco neste palacete é algo surpreendente para quem o visita: o estuque que temos no interior"
Durante a recuperação do palacete ficaram elementos que fazem parte do início da sua história. Quais é que destaca?
O que destaco neste palacete é algo surpreendente para quem o visita: o estuque que temos no interior, entre os corredores e os pisos. É um elemento que também visou transmitir a riqueza dos antigos proprietários. O estuque é uma verdadeira obra de arte, porque é gesso pintado por um artista. E já ninguém faz. Para mim, é um dos recantos mais importantes do palacete, a essência do próprio palacete.
Porque é que a temática do hotel se inspira na figura de Viriato, herói hispano-lusitano que liderou a resistência contra Roma?
É uma grande história, porque consideramo-nos guerreiros por natureza. E diz-se que Viriato lutou na Serra da Estrela. Quisemos, então, criar um corredor romano entre Bobadela, uma vila romana em Oliveira do Hospital, e o Palacete do Guerreiro. Viriato era um pastor que se converteu em guerreiro, porque era contra a invasão romana na Lusitânia. Quisemos dar o nome de Palacete do Guerreiro pela essência guerreira do Viriato, porque nos revemos muito nele: ser guerreiros, lutar para alcançar os nossos sonhos. E este é um dos nossos sonhos. Depois de quatro anos de muito sacrifício e muito trabalho, conseguimos recuperar o palacete.
"Comprámos mobiliário em França, Espanha e Portugal totalmente diferente entre si", que reflete "a essência do palacete"
Como é que a essência de Viriato se reflete na decoração do palacete?
A decoração revelou-se uma longa caminhada, porque queríamos manter a essência própria do palacete. E não quisemos seguir o caminho mais fácil: comprar mobiliário 'vintage' de design genérico. Fomos mais longe e recolhemos cada peça de mobiliário, cada detalhe de qualquer parte do mundo que se identificasse com o Palacete do Guerreiro. Comprámos mobiliário em França, Espanha e Portugal totalmente diferente entre si. E a nossa decoradora, que tem um estúdio de recuperação, fez um grande trabalho para restaurar estas peças. Dessa recuperação das mobílias surgiu esta decoração, que tem tanta essência e que os nossos hóspedes apreciam tanto.
Abriram o Palacete do Guerreiro ao público este verão, a 10 de agosto. Quem são os turistas que vos têm procurado?
O nosso público tem sido uma surpresa, tanto a nível de nacionalidade como de perfil. Temos muitos clientes estrangeiros — europeus, espanhóis, alemães, ingleses — e portugueses. Temos outro hotel aqui na zona onde há muitos clientes portugueses. E, neste, há uma grande alternância entre portugueses e europeus, o que é muito importante porque indica que o palacete está a ser reconhecido a nível europeu.
Trata-se de um público jovem, dos 25 aos 50 anos. São casais, normalmente que querem vir à Serra da Estrela para desligar da rotina diária. E é surpreendente porque são pessoas que vêm sobretudo para celebrar. Posso dizer que 80% dos nossos hóspedes até ao momento vieram celebrar aniversários de casamento, de anos …
"O palacete não é apenas um palacete. O palacete é história, é luxo, é exclusividade e é natureza"
Em que gama de preços está o alojamento de luxo que oferecem?
Atualmente, o preço médio do quarto está em 170 euros, com os valores mais baixos em 150 euros, sendo que têm pequeno-almoço e circuito de spa incluído. Mas iremos aumentar o preço gradualmente, com o objetivo de chegar aos 200-220 euros por noite. Esse é o nosso nicho. E a razão é simples: o palacete não é apenas um palacete. O palacete é história, é luxo, é exclusividade e é natureza. E através destes quatro fatores queremos dar esse detalhe e essa exclusividade ao hóspede — que ele se sinta em casa e com o maior dos propósitos.
Comentou que, muitas vezes, os hóspedes acabam por ficar apenas no palacete e não saem para explorar as redondezas. Que experiência de luxo é que oferece para quererem ficar?
É surpreendente: as próprias paredes, a própria decoração, a essência que o palacete transmite leva os hóspedes a não quererem sair nem para visitar a aldeia de São Gião, que é aqui ao lado e é espetacular. Os hóspedes procuram cada vez mais paz, sossego e bem-estar. E nós transmitimos esse bem-estar. Muitas vezes ficam a ler um livro na nossa biblioteca ou a beber um copo de vinho à lareira, ou ficam no quarto a ver um filme. De facto, os nossos hóspedes não querem sair do palacete, o que para mim é algo surpreendente. Não sei explicar porquê. Talvez se sintam em casa, como já me disse um hóspede.
"O cliente de luxo é quem mais procura esta zona, porque está farto de turismo de massas"
Fale-nos da importância das comodidades do hotel para elevar a experiência de luxo.
Estamos abertos há apenas dois ou três meses, e conseguimos observar a procura com calor e com frio. E é surpreendente porque, com calor, as pessoas não saem da piscina. E com o frio procuram o spa, massagens e lareira. Com estes complementos que oferecemos – tão simples – as pessoas sentem-se bem. E até promovemos muitas experiências para fora do palacete: visitas a museus, trilhos, yoga… e mesmo assim as pessoas preferem ficar. A nossa ideia é também criar um projeto com cursos de yoga e aulas de dança flamenca, por exemplo, e aproveitar o nosso terraço e esplanada. Acreditamos que o palacete, tanto no inverno como no verão, pode oferecer experiências diferentes e acolhedoras.
Também possui outro hotel nesta zona, o Alva Valley. Fale-nos um pouco deste projeto.
Abrimos o Alba Valley hotel há um ano e meio. É um quatro estrelas onde oferecemos alojamento e restauração. É um hotel muito acolhedor, temos um excelente feedback dos hóspedes. Acontece que, por estamos perto de Piódão, fomos afetados pelo incêndio este ano e, agora mais do que nunca, precisamos de ajuda dos turistas para podermos ultrapassar esta fase tão difícil para os hoteleiros e para todos os estabelecimentos de restauração da região. O turismo, neste momento, precisa de ajuda na zona de Piódão.
Quais são os principais desafios que destaca para o turismo de luxo na Beira Interior e a nível nacional?
Nesta região da Beira Interior e Serra da Estrela, temos um turismo circunstancial. Ou seja, ora os hotéis estão cheios, ora estão vazios. É um turismo difícil, mas muito gratificante. Porque, quando estamos cheios, os hóspedes consomem, gastam muito dinheiro em restauração e a comprar produtos regionais. É um turismo reconhecido, que gosta de visitar a Serra da Estrela.
O cliente de luxo é quem mais procura esta zona, porque está farto de turismo de massas. E o que quer o cliente de luxo? Paz, sossego e relaxar. E o Palacete do Guerreiro tem todos esses elementos. Os nossos hóspedes de luxo vêm, almoçam, jantam, fazem massagens… Não se importam de pagar, porque o que querem é tranquilidade. Para nós é muito fácil trabalhar com estes hóspedes, porque fica tão agradecidos com o que oferecemos que se sentem em casa.
"A nível hoteleiro, precisamos de mais apoio por parte das instituições públicas para ajudar o interior de Portugal, sobretudo, a atrair (...) o hóspede de luxo"
A reabilitação de imóveis antigos em hotéis é tendência em Portugal? Porquê?
É difícil. Portugal tem um potencial turístico espetacular, porque tem tudo para ser um dos maiores países turísticos do mundo: sol, comida, tradição, património... Mas é certo que, a nível hoteleiro, precisamos de mais apoio por parte das instituições públicas para ajudar o interior de Portugal, sobretudo, para atrair esses hóspedes — o hóspede de luxo, o hóspede exclusivo. Não queremos turismo de massas, queremos turismo exclusivo.
O que poderia ser melhorado ao nível da legislação para facilitar a reabilitação de um imóvel antigo e transformá-lo num hotel ou noutro tipo de negócio?
Sobretudo no interior, porque acredito que nas grandes cidades de Portugal existem todos os meios possíveis para transformar um edifício histórico num estabelecimento público. Mas no interior é certo que falta dinamismo e rapidez por parte das instituições públicas. As licenças demoram muito. Não é fácil transformar um edifício histórico num hotel, num museu ou noutro segmento. O que quero dizer é que quem pretende investir num edifício histórico precisa de mais apoio institucional – não apenas financeiro – para que, juntos, consigamos evitar que os edifícios históricos em Portugal desapareçam. É extremamente importante.
Como empreendedor em Oliveira do Hospital, recebi esse apoio por parte da câmara. Estou muito agradecido à câmara, porque me ajudaram muito a converter este espaço no hotel que é hoje. A Câmara de Oliveira do Hospital foi a primeira a vir ver o prédio quando o comprei, sem que eu os tenha contactado. Para mim, essa foi a primeira pedra deste projeto. A partir daí, facilitaram todo o tipo de apoio: desde canalizar a água até ao hotel, as estradas, todas as licenças, até a divulgação do palacete. Só posso estar agradecido, porque acho que não há muitas câmaras em Portugal a fazer o trabalho que esta câmara faz.
"Estamos abertos a qualquer prédio histórico que possamos recuperar, seja em Portugal, seja em Espanha"
Enquanto empresário, planeia abrir mais hotéis de luxo com história em Portugal? Onde e porquê? Também tem negócios deste tipo em Espanha ou noutros países?
O nosso conceito são hotéis históricos em locais classificados como Património da Humanidade. E estamos abertos a qualquer prédio histórico que possamos recuperar. Seja em Portugal, seja em Espanha, estamos a analisar outros projetos. Mas o que queremos agora é dar essência ao palacete, porque este é o primeiro projeto deste tipo. Antes de agarrar noutro projeto, queremos valorizar o palacete, a região da Serra da Estrela e Oliveira do Hospital.
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