Portugal vive um momento marcado pela falta de oferta de casas, que agrava a subida dos preços, bem como o acesso à habitação. E, para resolver a questão e construir mais casas para classe média, é preciso que o Governo trabalhe lado a lado com os promotores privados. A receita está na “confiança e na estabilidade fiscal, legislativa e urbanística”, defende em entrevista Francisco Carmona, CEO da Alma Development, uma promotora imobiliária que aterrou em Portugal há cerca de um ano e planeia agora desenvolver um megaprojeto residencial em Vila Nova de Gaia avaliado em mais de 100 milhões de euros, também dirigido a famílias portuguesas de classe média. E não vai ficar por aqui.
Estabilidade é tudo o que os promotores imobiliários não têm tido nos últimos anos, marcados pela pandemia e, depois, pela guerra na Ucrânia, que gerou a escalada da inflação e a subida dos juros nos empréstimos. E para acrescentar ainda mais incerteza ao clima económico português, surgiu ainda, em 2023, o programa Mais Habitação e um cenário de instabilidade financeira internacional. “Esta alteração legislativa ligada ao pacote Mais Habitação tem impacto não só fiscal, como também impacto urbanístico”, considera Francisco Carmona em entrevista ao idealista/news realizada durante o Salão Imobiliário de Portugal (SIL 2023), que decorreu entre 4 e 7 de maio, em Lisboa.
"Os investidores estrangeiros são muito sensíveis a estas questões: a estabilidade fiscal, estabilidade legislativa e estabilidade urbanística. Isso é fundamental."
Mas, mesmo assim, a Alma Development avançou com três projetos residenciais em Portugal entre 2022 e 2023, focando-se na colocação de mais casas no mercado. De olhos postos nos riscos decorrentes do atual contexto macroeconómico, a promotora imobiliária de capital francês já tem em marcha dois projetos residenciais em Portugal, avaliados em cerca de 40 milhões de euros. Um deles é nas Antas, no Porto, que vai colocar 84 casas no mercado do segmento médio ao médio alto. E o outro em Caxias (Lisboa), com 24 apartamentos direcionados para um segmento mais alto.
Além deste, Francisco Carmona avança ao idealista/news que a Alma Development tem um terceiro projeto em andamento na freguesia de Canidelo, em Vila Nova de Gaia. Trata-se de um loteamento já aprovado de 50.000 metros quadrados, onde vão ser construídas novas casas ao longo dos próximos oito anos, com um investimento “seguramente” superior a 100 milhões de euros. E a oferta de casas vai ser ajustada às famílias portuguesas de classe média e superior.
O futuro segue cheio de incertezas a pairar no clima macroeconómico, que devem ser monitorizadas para tomar decisões no longo prazo. Até porque a Alma Development, depois de um ano de atividade em Portugal que “correu bem”, quer continuar a investir. “A nossa perspetiva a médio prazo é ter um quarto projeto [residencial] na zona geográfica de Lisboa, para equilibrar também o investimento em termos geográficos no país”, adianta o responsável pela promotora imobiliária, que também planeia entrar no mercado de residências sénior, dado o envelhecimento da população e a falta de oferta de qualidade neste segmento.
Fica a conhecer os projetos residenciais da Alma Develpment na entrevista realizada ao seu responsável Francisco Carmona, que agora reproduzimos na íntegra.

A Alma Development estreou-se em Portugal em 2022 para desenvolver projetos de promoção e investimento imobiliário. Como foi criada a empresa? E como avaliam a vossa atividade até ao momento?
A Alma Development foi criada em março do ano passado. A nossa estrutura acionista é composta por três family offices francesas, que se apaixonaram pelo nosso país. Depois de dois, três anos à procura de ativos para investir, finalmente, em março do ano passado, decidiram investir no primeiro projeto, que é o nosso projeto de entrada em Portugal: o Essence no Porto, na zona das Antas. E até ao momento a atividade está a correr bem. No espaço de um ano, estamos a constituir equipa e já somos cerca de oito pessoas, com os sócios, e já temos três projetos “ongoing”, o que mostra que estamos focados no investimento imobiliário em Portugal.
"A sustentabilidade é um ponto importante para nós, porque achamos que também do lado do cliente há essa preocupação".
Quais são os projetos residenciais que têm hoje em marcha no nosso país? Fale-nos um pouco sobre eles (localização, número de casas, tipologias, comodidades, eficiência energética).
Temos este primeiro projeto de entrada nas Antas, no Porto, que são 84 apartamentos de T0 até T4. Aqui temos T4 com “rooftop” com vistas muito simpáticas para o rio Douro. É um projeto que está dividido em quatro blocos, sendo que dois deles são em condomínio fechado. Trata-se de um projeto que está, digamos, direcionado para o segmento médio e médio alto e de pessoas que querem ter uma casa nova e que não conseguem comprar noutras zonas do Porto. As Antas é uma zona que está neste momento a crescer bastante, com bastante procura e com alguns projetos que estão realmente a pôr este este local no mapa.
Além do Antas, temos mais um projeto residencial em Caxias (Oeiras, Lisboa), composto por 24 apartamentos. Trata-se de um projeto mais pequeno e exclusivo, também em condomínio fechado, com algumas “amenities”, como piscina, “kids club”, “social room”. São, sobretudo, tipologias maiores de T3 e T4, direcionadas para famílias portuguesas. Alguns apartamentos têm vistas muito simpáticas para o mar. Também estamos muito contentes com esse investimento.
Depois, temos um terceiro projeto, de longo prazo, que é o projeto de Gaia, em Canidelo. É um “greenfield”, que comprámos já com loteamento aprovado. Estamos a falar de 50.000 metros quadrados acima do solo. E estamos, neste momento, a desenvolver os projetos de infraestruturas para começarmos ainda este ano a desenvolvê-las.
Em termos de classificação energética, nós estamos a procurar soluções bastante eficientes. A sustentabilidade é um ponto importante para nós, porque achamos que também do lado do cliente há essa preocupação. Há uma preocupação de comprar e de prescrever materiais e equipamentos nacionais. E isto é comum aos três projetos que temos.

Qual é o investimento associado a estes projetos residenciais em Portugal?
Nos projetos de Caxias e Antas estamos a falar à volta de 40 milhões de euros, dividido entre “equity” e financiamento bancário. E o projeto de Gaia, como é um projeto de longo prazo (oito anos), com 50.000 metros quadrados e que vamos construir por fases, seguramente o investimento vai ser superior a 100 milhões de euros, também nestas duas componentes, equity e crédito.
A que famílias se destinam as casas que constroem? E qual é o preço por metro quadrado?
Nas Antas, abrange os dois segmentos: segmento médio e médio alto, porque temos quatro blocos com características distintas, com vistas distintas, uns estão em condomínio fechado e outros não. Já os preços de venda ainda não estão fechados, pretendemos fechar em breve, ainda durante o mês de maio ou junho. Em Caxias, já é um segmento um pouco mais alto: segmento médio, alto. E Gaia, pela natureza do projeto, por ser muito grande, vamos ter também segmentos diferentes e que se podem ajustar depois ao ciclo imobiliário, que é muito longo (oito anos). Mas eu diria que vamos começar por um ‘target’ segmento médio também.
"Toda esta alteração legislativa ligada ao pacote Mais Habitação tem impacto não só fiscal, como também impacto urbanístico, pelo que estamos muito atentos"
O atual contexto marcado pela alta inflação, subida de juros e instabilidade financeira impactou de alguma forma a atividade da Alma Development? De que forma?
Está sempre presente nas nossas análises de risco todo o contexto macroeconómico, seja ao nível do crédito, não só a promotores, como crédito habitação para os nossos clientes. É óbvio que tem um impacto considerável e, portanto, estamos bastante focados na análise desse risco e na definição temporal do lançamento dos projetos, tendo em conta estes riscos do mercado bancário e de crédito. E, por outro lado, toda esta alteração legislativa ligada ao pacote Mais Habitação tem impacto não só fiscal, como também impacto urbanístico, pelo que estamos muito atentos, apesar de termos os projetos muito bem analisados e muito bem agarrados. E, certamente, vamos tentar mitigar esse risco faseando as operações ou atrasando, de certa forma, alguma fase dos empreendimentos.

A falta de oferta de casas para vender face à alta procura é um dos principais problemas o imobiliário em Portugal. Como quer a Alma Development contribuir para mudar esta realidade no futuro?
A falta de oferta e, sobretudo, o pipeline que se perspetiva para os próximos anos, é um “driver” que acho que nos pode ajudar enquanto promotores imobiliários ao injetarmos novas casas no mercado imobiliário, sobretudo, para este segmento: segmento médio e segmento médio-alto. Portanto, esse é o nosso contributo. Nós queremos vender , sobretudo, para famílias portuguesas. E, portanto, vamos tentar ao máximo ajustarmo-nos às condições de mercado, claro, nunca esquecendo a rentabilidade dos projetos e do capital investido pela estrutura acionista.
"Deveria haver quase como que um acordo para garantir uma estabilização, que tem impacto direto no investimento imobiliário com prazo alargado"
Qual é a “receita” para incentivar os promotores imobiliário a construir mais casas para a classe média?
Temos de olhar para o contexto numa questão de estabilidade e de confiança. Os investidores estrangeiros são muito sensíveis a estas questões: a estabilidade fiscal, estabilidade legislativa e estabilidade urbanística. Isso é fundamental. Deveria haver quase como que um acordo para garantir uma estabilização destes temas, que têm impacto direto no investimento imobiliário com prazo alargado, de forma a que seja transversal a todos os governos que tenhamos no futuro. Isso é fundamental. Portanto, confiança e estabilidade. E depois os outros ingredientes surgem por natureza, que nos torna mais competitivos face a outras geografias. Toda a segurança, o bom tempo, a gastronomia e todo este “welcome” que temos enquanto povo português ajuda muito a trazer investimento estrangeiro. E, portanto, acho que são estes os “drivers” para continuarmos a ter este investimento de que tanto precisamos.

Quais são as suas perspetivas de investimento imobiliário em Portugal? Consideram investir noutros segmentos?
A nossa perspetiva a médio prazo é ter um quarto projeto residencial na zona de Lisboa, para equilibrar também o investimento em termos geográficos no país. E estamos à procura de projetos, eu diria, mais fáceis de entrar, como um loteamento em que já sabemos os parâmetros urbanísticos. Apesar de haver aqui alguma luz ao fundo do túnel em termos de alterações de tudo o que diz respeito ao licenciamento, para nós o capital investido estar parado é um assunto realmente premente e, portanto, apostamos muito bem em projetos que estejam já numa fase muito avançada de licenciamento. E os loteamentos caracterizam se por isso e, portanto, estamos à procura de um quarto projeto nesse sentido.
Em termos de segmentos, estamos a estudar a entrada no mercado de residências sénior, eventualmente numa perspetiva mais de investimento e não tanto de operação. Este é um mercado que nós acreditamos que tem futuro em Portugal, sobretudo, por causa do envelhecimento da população, da falta de oferta de qualidade e de todos estes ingredientes que falei anteriormente, que tornam Portugal num país com bastante procura para este segmento.
Qual é o valor de investimento que têm no horizonte para levar avante estes empreendimentos residenciais em Portugal?
Ainda não definimos, mas será certamente avultado, porque investimos em projetos com escala. Em termos residenciais, estamos sempre a pensar em projetos com no mínimo 30-40 unidades. Portanto, são sempre projetos escaláveis.

Vão colocar as vossas primeiras casas à venda no segundo semestre deste ano. Quais são as vossas perspetivas de vendas?
Dada a falta de oferta, consideramos que vamos ter sucesso no lançamento das vendas. O mercado das Antas é um mercado bastante competitivo, mas nós acreditamos que temos um produto bastante diferenciador numa localização na zona leste da cidade, com enquadramento paisagístico muito bom. E, portanto, achamos que pelos preços que estamos a pensar praticar, vamos ter sucesso, até porque temos tipologias variadas e, portanto, tanto dá para o “target” de investidores, como para solteiros, para casais sem filhos, casais com um filho, com dois ou três filhos. É um projeto muito versátil, com muito espaço exterior, como mandam as regras hoje em dia. Por isso, achamos que vamos ter muito sucesso.
A localização só por si do projeto residencial de Caxias (Lisboa), diz tudo: não há muita concorrência e há bastante procura por uma zona que é muito próxima a Lisboa - falamos entre dez a 15 minutos do centro. E, depois, há a proximidade à praia e a alguns parques, fatores que vão ditar o sucesso deste projeto.
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