O Porto vai tornar-se por estes dias num epicentro de celebração da diversidade e direitos humanos LGBTI. De 13 a 15 de setembro, a cidade recebe o Porto Pride 2024 e foi selecionada a nível internacional para ser palco, já em novembro, do encontro europeu anual da EPOA (European Pride Organisers Association). A verdade é que o mercado pride continua a conquistar Portugal e, neste caso, a ganhar força na Invicta, reflexo da atratividade que o país tem para a comunidade arco-íris e do impacto que o segmento tem nos negócios (de que é exemplo o imobiliário), investimentos e sociedade civil. Em entrevista ao idealista/news, Diogo Vieira da Silva, coordenador geral do Porto Pride, mostra não ter dúvidas de que a cidade e região Norte “estão a posicionar-se muito bem neste mercado”, a nível nacional e internacional, relembrando que este tipo de eventos beneficiam toda a economia local, gerando riqueza e acrescentando valor.
O Porto Pride é o evento mais antigo do norte de Portugal, realizado desde 2001, ainda antes da primeira Marcha do Orgulho LGBTI na cidade. Em 2019, sob o lema “Dar cor ao Porto”, deixou de ser uma festa privada, transformando-se o evento numa celebração gratuita o ar livre, aberto a todas as pessoas. Hoje em dia, apresenta-se como um evento holístico, com um programa diversificado que inclui conferências, atividades culturais, promovendo o encontro entre pessoas, instituições, empresas e ativistas.
“É por isto que nos afirmamos holísticos, porque queremos, enquanto intervenientes na cidade, convencer novas marcas e empresas, instituições públicas e privadas, e a sociedade civil em geral, que as questões LGBTI não são específicas para uma data, um dia ou um mês, é algo que tem de ser trabalhado 365 dias por ano e é isso que nós tentamos fazer”, explica Diogo Vieira da Silva. Além disso, garante, os eventos pride “estão cada vez mais a ser motivos de deslocação/visitas à cidade do Porto”.
“Sempre que anunciamos as datas recebemos milhares de mensagens de pessoas ou que já estiveram no evento no passado e vão voltar a marcar presença, ou para dizer que estão a reservar voos para participar. Muita gente de Espanha, por exemplo. Isto demonstra duas coisas: primeiro, que os prides são catalisadores do principal agente económico em Portugal, que é o turismo. Segundo, é importante referir que os prides não beneficiam apenas alguns, beneficiam toda a economia local. Quando se vai a um pride ou uma marcha, percebemos que os agentes locais e pequeno comércio ativa-se e prepara iniciativas e posiciona-se e isto é multiplicador, cria riqueza e acrescenta valor. O que falta fazer é esta estratégia mais planeada, em termos turísticos, de preparar e apoiar eventos pride para que sejam cada vez mais impactantes”, frisa o responsável.
Os bairros mais inclusivos para viver na Invicta
Atraídas por estes eventos e pela cada vez maior abertura da cidade aos direitos LGTBI, chegam cada assim vez pessoas interessadas em viver no Porto, seja para estudar ou trabalhar. E consideram tanto arrendar como comprar casa, animando o mercado imobiliário. O mesmo acontece com muitos outros residentes locais da comunidade, que sentem que já não tem de procurar fora outro lugar para morar.
João Santos, consultor na João das Casas Imobiliária, que atua precisamente na zona da Invicta, confirmou recentemente ao idealista/news que o Bonfim, Cedofeita e Foz “tiveram um crescimento enorme nos últimos anos de atração da comunidade LGBTI”, tendo o Bonfim uma expectativa de se tornar um dos bairros inclusivos por excelência. De acordo com o responsável, estes bairros continuam a atrair novos residentes LGBTI, tanto locais quanto estrangeiros, a par com a abertura de novos serviços e comércios com foco na comunidade.
A verdade é que estes bairros apresentam elevados preços das casas, com a Cedofeita e a Foz a registarem valores bem acima da mediana do concelho do Porto, que se fixou em 3.639 euros/m2 em agosto (depois de ter subido 1,3% face ao mês anterior), revela o índice de preços do idealista.
Na União de Freguesias da Cedofeita, Santo Ildefonso, Sé, Miragaia e São Nicolau, o preço das casas à venda subiu 1,5% em agosto face ao mês anterior, fixando-se em 4.243 euros/m2, o maior valor que há registo no idealista.
E na União de Freguesias Aldoar, Foz do Douro e Nevogilde, o preço das casas situou-se em 4.089 euros/m2 em agosto, mantendo-se praticamente estável em termos mensais. O Bonfim é mesmo o bairro mais acessível dos três, com os preços a fixarem-se nos 3.442 euros/m2 em julho, depois de subirem 0,4% num mês (não há dados disponíveis para agosto).
Mercado pride cresce à boleia dos negócios (imobiliário incluído)
O Porto está a afirmar-se assim não só como um ponto de atração turística, mas também como um polo de negócios e investimento. O reforço de iniciativas culturais e a promoção de igualdade estão a colocar a cidade no mapa internacional, destacando-a como um exemplo, face à crescente oferta voltada para o público LGBTI. O mercado pride está a servir, também por isso, de estímulo a uma economia mais inclusiva e dinâmica.
Diogo Vieira da Silva não tem dúvidas de que o Porto e a região Norte “estão a posicionar-se muito bem neste mercado”. “Há que salientar e dar os parabéns à associação Visit Porto e Norte, que é a única entidade regional de turismo que faz parte da IGLTA [uma referência na indústria do turismo LGBTI]. Nem Lisboa que vai receber o EuroPride 2025 tem uma estratégia tão bem definida para o segmento como a Visit Porto e Norte e isto tem de ser celebrado e dado o devido mérito”, frisa o coordenador do Porto Pride.
Contudo, garante, “não basta ter uma estratégia, é preciso aplicá-la”. “E o apoio a eventos pride deve fazer parte dessa estratégia, bem como o saber comunicar para potenciar os investimentos. A maior cadeia LGBTI do mundo vai abrir um hotel em pleno coração da cidade do Porto e isto demonstra que o Porto tem um potencial de crescimento gigantesco. Além disso, com estes parceiros, com estes agentes económicos que têm uma visão inclusiva, é possível criar oportunidades para as pessoas LGBTI, porque estes negócios/investimentos que abrem direcionados para este segmento, habitualmente, na sua maioria, contratam pessoas LGBTI e isso permite a esta população ter acesso a emprego, por exemplo, e por consequência, à emancipação económica”, acrescenta.
A realidade é que Portugal tem vindo a posicionar-se como um destino de referência para a comunidade LGBTI, dinamizando vários outros negócios além do turismo, como o imobiliário. Seja para comprar ou arrendar e fixar residência, como segunda habitação ou investimento, a procura segue forte e continua a ganhar espaço no país. Por ocasião da celebração do Mês do Ogulho, em junho, o idealista/news falou com especialistas de mercado que confirmaram esta tendência, analisando as duas grandes cidades do país, Lisboa e Porto.
João Santos, consultor na João das Casas Imobiliária, alertava então que um dos maiores desafios do mercado imobiliário prende-se com o acesso à habitação, num cenário de maior procura e pouca oferta, que vem a arrastar-se há vários anos. E a comunidade LGBTI não está imune a estas dificuldades.
O especialista referia-se, por exemplo, o facto de esta ver-se “forçada a sair de casa em faixas etárias cada vez mais jovens, por diversos fatores, tais como o abandono do interior para o litoral - a maioria das vezes forçado pela discriminação social e familiar que se vive mais intensamente no interior, por exemplo”. Estes e outros fatores, garantiu, “implicam numa diminuição direta do poder aquisitivo, sendo a capacidade de gerar riqueza nos primeiros anos menor, o que coloca a comunidade LGBTI, à semelhança de outras, numa franja mais tardia de potenciais compradores da primeira residência”.
No entanto, considerou que as novas políticas habitacionais de apoio ao arrendamento jovem e incentivos à compra de imóveis – são exemplo a isenção de IMT e Imposto do Selo na compra da primeira casa ou a garantia pública no crédito habitação – parecem antecipar “a etapa que se projeta sempre para mais tarde, a saída de casa dos pais, o abandono da partilha de quartos e alcançar finalmente o seu próprio espaço, um marco na independência”
Para João Santos, as novas medidas poderão dar impulso a um crescimento na procura, um reajuste de planos e antecipação de compra ou de arrendamento. O consultor adiantou ainda que, com anúncio do novo programa de habitação do Governo, houve, de imediato, “a procura por mais informação e reanálise de processos disparou”. No entanto, já antecipava uma consequência direta, “a inevitável subida de preços e aquecimento de mercado para atingir novos recordes”.
Cidade vai receber mais de 200 prides da Europa em novembro
Além do Porto Pride 2024, a cidade prepara-se ainda para receber o encontro anual da European Pride Organisers Association (EPOA), de 1 a 3 de novembro. Esta reunião, que antecede o EuroPride 2025 em Portugal, coloca o Porto no centro das atenções internacionais na promoção dos direitos LGBTI.
Diogo Vieira da Silva explica que a candidatura foi feita pela equipa do Porto Pride o ano passado. “Foi algo que fizemos sem recursos, de uma forma totalmente voluntária. Havia duas cidades candidatas a receber o encontro anual – Porto e Copenhaga – e o Porto venceu. Venceu porque o Porto tem uma estratégia de que mais importante de que uma visão turística, queremos que o encontro de mais de 200 prides da Europa seja catalisador de ideias, troca de experiências, para que os prides locais da região Norte sintam-se empoderados e consigam crescer e ter maior impacto nas suas comunidades. É fundamental envolver os prides locais e os ativistas locais, para que também eles se sintam representados neste encontro”, sublinha.
Steve Taylor, diretor da EPOA, revela em declarações ao idealista/news que adora o Porto e está muito entusiasmado por voltar à cidade, em novembro. Além disso, explica que o encontro anual “é muito importante”. “É a única oportunidade que temos a cada ano para nos reunirmos, fazer um balanço do ano que passou e olhar para 2025 e mais além. A comunidade de organizadores do Pride é realmente um grande grupo de amigos e, quando nos encontramos, é um espaço muito acolhedor”, diz.
“Neste encontro faremos um balanço do ano que passou, selecionaremos um vencedor entre as quatro propostas para o EuroPride 2027, decidiremos sobre o local da assembleia geral anual para 2025, faremos um ponto de situação sobre o EuroPride 2025 de Lisboa, elegeremos os membros do conselho e participaremos em workshops. É um fim de semana bastante agitado”, esclarece.
Recorde-se que Lisboa vai acolher o EuroPride de 14 a 22 de junho de 2025, um evento internacional que será um grande momento de celebração da visibilidade LGBTI. O evento acontece anualmente desde 1992 em diferentes cidades europeias, com um extenso programa de atividades, conferências, encontros, uma marcha e uma festa.
Diogo Vieira da Silva liderou, em 2022, a candidatura ao evento que juntava as associações Variações – Associação de Comércio e Turismo LGBTI de Portugal, ILGA Portugal – Intervenção Lésbica, Gay, Bissexual, Trans e Intersexo, a AMPLOS – Associação de Mães e Pais pela Liberdade de Orientação Sexual e Identidade de Género e a Rede Ex-aequo.
“Estou a título pessoal muito feliz, porque sei o impacto que isto terá no principal armário que existe em Portugal, que são as empresas, o mundo corporativo. O EuroPride faz com que as questões LGBTI se tornem ‘mainstream’, não sejam meramente questões ligadas a partidos políticos ou a visões ideológicas. São direitos humanos e por isso dizem respeito a todos nós, todas as instituições, públicas e privadas, e é isso que o EuroPride vai trazer. Mais importante que o evento em si, são os ‘side events’ e aquilo que nós enquanto sociedade civil fazemos à volta do EuroPride. E isso é o que me dá esperança. Acredito que vai ser um sucesso e transformador da sociedade portuguesa”, conclui.
Direitos LGBTI em Portugal e na Europa: para onde caminhamos?
Portugal voltou ao top 10 do ranking global de direitos das pessoas LGBTI, reafirmando o seu compromisso com a igualdade e a inclusão. De acordo com o relatório anual da ILGA Europe, a subida deve-se a avanços legislativos recentes, depois de ter sido aprovada a lei contra práticas de conversão da orientação sexual.
O coordenador geral do Porto Pride considera que Portugal tem todos os motivos para orgulhar-se disto, mas lembra que ainda “há muito por fazer”. “Há que frisar que Portugal registou uma subida de 185% do discurso de ódio nas redes sociais, além de um aumento do nível de ataques e invasões a eventos LGBTI por extremistas e ultraconservadores. Sentimos que há cada vez mais táticas dissimuladoras para proibir eventos pride - é algo que na equipa Porto Pride sentimos este ano e que percebemos que a subtileza do discurso de ódio existe e que tem de ser combatida”, salienta Diogo Vieira da Silva.
Para Steve Tailor, um dos principais desafios que a Europa enfrenta hoje em termos de direitos humanos é o “ressurgimento de políticas de extrema direita e anti-LGBTI”. Para este responsável, o ‘Orgulho’ é maior ferramenta que temos e “que deve ser usada para desafiar a homotransfobia onde quer que ela exista”.
Acompanha toda a informação imobiliária e os relatórios de dados mais atuais nas nossas newsletters diária e semanal. Também podes acompanhar o mercado imobiliário de luxo com a nossa newsletter mensal de luxo.
Para poder comentar deves entrar na tua conta