
Tal como já antecipavam os mercados, o Banco Central Europeu (BCE) decidiu voltar a manter as três taxas de juro diretoras inalteradas na reunião de política monetária desta quinta-feira, dia 7 de março. Por detrás desta decisão está a necessidade de o regulador europeu ter garantias de que a inflação na zona euro está mesmo a descer até aos 2%, para assegurar a estabilidade de preços. Assim, as taxas de juro voltam a ficar nos atuais níveis restritos, entre os 4% e 4,75%, até ao próximo dia 11 de abril, data da próxima reunião. Já os primeiros cortes dos juros do BCE só deverão avançar em junho.
Esta foi a quarta vez que o regulador liderado por Christine Lagarde decidiu manter os juros inalterados nos atuais patamares restritivos, depois de ter subido as taxas 10 vezes consecutivas entre julho de 2022 e setembro de 2023. Assim, as três taxas de juro diretoras ficam nos seguintes valores, pelo menos, até dia 11 de abril de 2024, data em que se vai realizar a próxima reunião de política monetária do BCE:
- Taxa de juro das principais operações de refinanciamento fixa-se nos 4,5%, o valor mais elevado desde maio de 2001;
- Taxa aplicável à facilidade permanente de cedência de liquidez fica nos 4,75%, um valor igual ao registado em outubro de 2008;
- Taxa aplicada à facilidade permanente de depósitos situa-se em 4,00%, sendo, ainda assim, o maior valor alguma vez registado.
A explicar a decisão do BCE está a sua necessidade de garantir que a inflação na zona euro está mesmo a reduzir-se para a meta dos 2%, aquela que é considerada a fase mais difícil deste processo. A verdade é que, depois de passar vários meses a cair, a inflação no espaço europeu subiu em dezembro de 2023 para 2,9%, tendo recuado nos meses seguintes até chegar ao patamar dos 2,6% em fevereiro.
"Desde a última reunião do Conselho do BCE, em janeiro, a inflação voltou a diminuir. Embora a maior parte das medidas da inflação subjacente tenham diminuído ainda mais, as pressões internas sobre os preços permanecem elevadas, em parte devido ao forte crescimento dos salários. As condições de financiamento são restritivas e os anteriores aumentos das taxas de juro continuam a pesar sobre a procura, o que está a ajudar a reduzir a inflação", explicam no comunicado.
O que também é visível é que a linha cautelosa assumida pelo BCE também está a ser adotada por outros bancos centrais do mundo, como é o caso do Banco Popular da China e do Banco de Inglaterra, que também optaram por manter os juros tal como estão nas suas reuniões de fevereiro.
Em reação à decisão do BCE, o Presidente da República português frisou que "não é uma boa notícia, mas é uma notícia esperada. Embora a razão dada seja a inflação que há em alguns países pela Europa fora, penso que a verdadeira razão é outra: é a preocupação com as eleições norte-americanas e europeias, com as suas consequências na guerra e, portanto, o peso que isso pode ter na situação económica ao longo do ano de 2024. Daí o compasso de espera de mais três meses", disse Marcelo Rebelo de Sousa à RTP3.
A par de tudo isto, o Conselho do BCE voltou a reiterar na reunião desta quinta-feira, que “as taxas de juro diretoras estão em níveis que, se forem mantidos por um período suficientemente longo, darão um contributo substancial" para que a inflação regresse ao objetivo de médio prazo de 2%, lê-se no comunicado. E por isso continuam a assinalar que” as taxas diretoras serão fixadas em níveis suficientemente restritivos durante o tempo que for necessário" para atingir essa meta, frisando que as suas decisões vão continuar a ser tomadas reunião a reunião, olhando para vários dados económicos e financeiros, como a inflação, inflação subjacente e a força da transmissão da política monetária.
A boa notícia é que os especialistas do BCE reviram as projeções da inflação na zona euro em baixa, situando-se em 2,3% em 2024, 2,0% em 2025 e 1,9% em 2026, "o que reflete principalmente um menor contributo dos preços dos produtos energéticos", explicam. Também as previsões para a inflação subjacente foram revistas em baixa e situam-se em média em 2,6% para 2024, 2,1% para 2025 e 2,0% para 2026. Por outro lado, a economia europeia também deverá abrandar ainda mais o seu crescimento (para 0,6% este ano), "prevendo-se que a atividade económica permaneça moderada no curto prazo". Depois, haverá um período de recuperação económico com crescimentos previstos de 1,5% em 2025 e 1,6% em 2026, "apoiados inicialmente pelo consumo e mais tarde também pelo investimento", explicam.
Quando é que o BCE vai descer os juros diretores?
No início deste ano, Christine Lagarde empurrou os primeiros cortes dos juros para o verão e considerou "prematuro" antecipar as reduções para antes dessa data. E continua a considerar que só em junho é que haverá dados mais fortes para uma decisão deste tipo. Isto porque o regulador europeu precisa de estar mais seguro de que a inflação está a reduzir-se para a meta dos 2%, antes de cortar as taxas de juro. “Em termos de uma avaliação global da nossa trajetória política, precisamos de estar mais adiantados no processo de desinflação antes de podermos estar suficientemente confiantes de que a inflação atingirá a meta em tempo útil e se estabelecerá na meta de forma sustentável”, explicou Philipe Lane, economista-chefe do BCE, no início de fevereiro.
Recentemente, o membro do Conselho do BCE, Robert Holzmann, sublinhou que o BCE “quer apenas um pouco mais de confiança antes de darmos esse passo muito importante de começar a cortar as taxas de juros". O também governador do Banco Nacional da Áustria considerou ainda pouco provável que o BCE comece a descer os juros antes da Reserva Federal dos EUA (Fed), um país que também se depara com perspetivas económicas “incertas” e uma redução da inflação para os 2% “não assegurada”, tal como frisou esta semana Jerome Powell, presidente da Fed, admitindo, ainda assim, que a descida dos juros nos EUA pode começar este ano. Aliás, os analistas agora acreditam mesmo que o BCE e a Fed vão avançar sincronizados para um corte das taxas de juro em junho.
Mas esta não é uma visão partilhada por todos os membros do BCE. O governador do Banco de Portugal (BdP), Mário Centeno, diz que é preferível um corte nos juros mais cedo [antes do verão] e gradual, que mais tarde e abruptamente, considerando uma redução em passos de 0,25 pontos percentuais uma “boa métrica”. Até porque, tal como alertou o ministro das Finanças Fernando Medina, “quanto mais tempo se prolongar um regime de taxas de juro muito elevadas, maiores são os riscos de aquelas economias que estão em recessão poderem ver aprofundada das suas recessões e aquelas que estão estagnados poderem ver a passagem para um estado de recessão”. Este não é o caso da economia portuguesa que cresceu 2,3% em 2023.
O que parece ser consensual nos mercados é que o BCE terá de inverter a sua política monetária em algum momento deste ano e que as descidas dos juros deverão ocorrer de forma gradual. Mário Centeno diz ser “totalmente favorável aos cenários de gradualismo”, uma vez que é preciso “dar tempo aos agentes económicos para se adaptarem às decisões”. E Isabel Schnabel, membro da comissão executiva do BCE, também admite que quando o regulador europeu avançar com os cortes dos juros deverá “proceder com cautela, dando pequenos passos”.
Já quando aos primeiro corte dos juros, os mercados financeiros têm vindo a adiar as suas perspetivas: antes apostavam em abril e agora estão mais voltados para junho, coincidindo, assim, com as previsões de Christine Lagarde. "Nesta reunião, o BCE apresentou a indicação mais clara até à data de que os cortes nas taxas de juro estão no horizonte, com as comunicações do banco a irem ao encontro da nossa opinião de que a descida das taxas está encaminhada para a reunião de junho", afirma David Brito, diretor-geral da Ebury Portugal. Portanto, tudo indica que o BCE "começará a flexibilizar a política na sua reunião de junho, desde que, entretanto, não se assista a um aumento da inflação e dos salários", frisa.
"Se ontem os mercados começavam a ter dúvidas sobre a possibilidade de o BCE reduzir as taxas quatro vezes este ano, a um ritmo de 25 pontos base de cada vez, a declaração do banco central convenceu os investidores de que será esse o movimento que farão este ano", explica o diretor-geral da Ebury apontado "uma primeira descida de 25 pontos base em junho, seguida de três outras do mesmo calibre em setembro, outubro e dezembro, deixando o preço do dinheiro em 3,5% no final do ano".
Segundo as projeções da Moody's, as taxas de juro do BCE vão levar ano e meio a descer. Depois, devem ficar em 2% durante vários anos, caso não haja uma nova crise que justifique uma alteração da política monetária.
*Notícia atualizada dia 8 de março, às 11h22, com a reação do Presidente da República, declarações do diretor da Ebury e previsões da Moody's
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