
A inflação na zona euro está a desacelerar a bom ritmo, mas já está abaixo da meta dos 2%. E a economia europeia continua frágil, estando a gerar uma onda de preocupações. Foi tendo por base estes e outros indicadores económicos, que o Banco Central Europeu (BCE) decidiu avançar esta quinta-feira, dia 17 de outubro, com aquele que é o terceiro corte dos juros diretores em 25 pontos base, deixando as taxas abaixo de 3,7%.
Este novo corte dos juros do BCE em outubro já era esperado por muitos analistas de mercado e membros do regulador europeu, perante o risco da inflação na zona euro ficar abaixo do objetivo (como está agora), a par da vulnerabilidade da economia europeia. Uma das vozes que se fizeram ouvir nas últimas semanas foi a de Mário Centeno, governador do Banco de Portugal, que defendeu que o BCE deveria baixar as taxas de juro nesta reunião, tendo em conta o "estado atual da economia da área do euro".
E assim foi. O regulador europeu liderado por Christine Lagarde avançou mesmo com o terceiro corte dos seus juros diretores na reunião de política monetária realizada esta quinta-feira, dia 17 de outubro, na Eslovénia. Desta vez, a redução foi de 25 pontos base nas três taxas de juro diretoras (em setembro a descida não foi linear nas três taxas). E admitiu que embora o processo desinflacionista esteja "bem encaminhado", as condições de financiamento permanecem "restritivas", lê-se no comunicado divulgado após a reunião.
Com este novo alívio da política monetária avançado pelo BCE, assim ficam as três taxas de juro diretoras a partir de 23 de outubro:
- Taxa de juro das principais operações de refinanciamento desceu para 3,4%. Antes destes três cortes, esta taxa estava nos 4,5%, o nível mais elevado desde maio de 2001;
- Taxa aplicável à facilidade permanente de cedência de liquidez cai para 3,65%;
- Taxa aplicada à facilidade permanente de depósitos diminui para 3,25%;
Assim, “o BCE continua com a sua agenda de redução controlada da pressão monetária, confiante de que a inflação parece controlada, embora ainda tenha uma reta final para atingir o objetivo de 2%”, comenta Miguel Cabrita, responsável pelo idealista/créditohabitação em Portugal, em reação à decisão do regulador europeu.
Porque é que o BCE decidiu avançar com novo alívio nos juros?
Este novo alívio dos juros constitui uma “reviravolta” por parte da instituição, uma vez que na última reunião da política monetária, realizada em setembro, o BCE mostrou-se prudente sugerindo que iria aguardar pela reunião de dezembro para agir. Aliás, na altura, os próprios analistas admitiram que seria improvável haver uma redução das taxas em outubro, empurrando novos cortes só para dezembro.
Mas, de lá para cá, chegaram novos dados económicos que acabaram por aumentar – e muito – as probabilidades de haver um corte dos juros do BCE mais rápido do que o esperado inicialmente. Até porque é tendo por base estes dados que o guardião do euro decide o rumo da sua política monetária:
- Inflação na zona euro: continuou a abrandar caindo para 1,7% em setembro de 2024, o valor mais baixo desde o início de 2021, segundo revelou o Eurostat esta quinta-feira;
- Inflação subjacente na zona euro (que exclui energia e alimentos não processados): esta taxa abrandou em setembro para 2,7%, mas ainda está acima do objetivo do BCE (de 2%). "A inflação interna mantém‑se alta, porque os salários ainda estão a aumentar a um ritmo elevado", explica o regulador europeu no documento. Ainda assim, “a tendência desinflacionista é inegável e dará cobertura a uma maior flexibilização monetária”, dizem os analistas da Ebury Portugal ao idealista/news;
- Crescimento económico: a economia europeia apresentou‑se “mais fraca” do que o esperado pelo BCE, com um crescimento tímido do PIB de apenas 0,2% no segundo trimestre de 2024. “A situação na indústria e na construção não é boa, as pessoas estão a gastar menos e as empresas a cortar investimentos”, detalhou o regulador na última reunião.
Tem sido, aliás, a fraca evolução da economia europeia – em especial da economia alemã – que tem feito soar os alarmes durante as últimas semanas, tendo motivado este novo alívio da política monetária em outubro, que deverá ajudar a estimular o consumo e o investimento. E nem os mais recentes sinais de recuperação económica fizeram o BCE mudar de ideias.
A procura de créditos ao consumo e para empresas aumentou no verão de 2024. E os bancos europeus sentiram mesmo um “forte aumento” na procura de empréstimos habitação no terceiro trimestre, o que dá “mais um sinal do início de uma recuperação após as fortes descidas ao longo do ciclo de maior restritividade da política monetária”, lê-se no mais recente inquérito aos bancos europeus levado a cabo pelo próprio BCE.
A par de tudo isto, a indústria europeia também está a dar sinais de retoma. Esta terça-feira (dia 15 de outubro), o Eurostat informou que o índice de produção industrial na zona euro cresceu 1,8% em agosto face a julho. Em destaque está a Alemanha, a maior economia da Europa, com um aumento da produção industrial de 3,3%, um dos mais elevados.
Sobre estes dados, Christine Lagarde observou que apesar de a produção industrial ter sido "particularmente volátil", durante os meses de verão as pesquisas mostram que a indústria transformadora continuou a contrair-se. E, por isso, a líder do BCE concluiu que "atividade económica foi mais débil do que o esperado", embora rejeite a ideia de que a zona euro se encaminhe para uma recessão.
Por outro lado, o facto de a inflação na zona euro estar abaixo do objetivo de 2%, também motivou este novo corte dos juros do BCE. Isto porque, tal como explicou o governador do Banco de Portugal, "uma política monetária que permaneça restritiva durante demasiado tempo corre o risco de fazer com que a inflação fique abaixo do seu objetivo”, o que não é bom para um crescimento económico sustentável.
"Estamos preocupados com o crescimento [económico] na medida em que ele tem impacto na inflação", explicou Lagarde, o que significa que se a situação económica se deteriorar muito, a inflação pode ficar abaixo da meta do BCE, levando a instituição a uma maior flexibilização da sua política monetária para apoiar a economia e os preços.
Com este novo corte dos juros, o BCE admite que "a inflação deverá subir nos próximos meses, descendo depois para o objetivo no decurso do próximo ano. Ao mesmo tempo, as pressões sobre os custos do trabalho deverão continuar a registar um abrandamento gradual, com os lucros a amortecer parcialmente o impacto dessas pressões na inflação", acrescentou ainda em comunicado.

Haverá nova descida dos juros do BCE em dezembro?
Uma vez mais, Christine Lagarde deixou no ar a dúvida se vai haver ou não um novo corte dos juros do BCE na próxima reunião de política monetária, que se vai realizar a 12 de dezembro. "O Conselho do BCE não se compromete previamente com uma trajetória de taxas específica", voltou a sublinhar em comunicado, frisando que as decisões vão ser tomadas no devido momento e que continuam dependentes dos novos dados económicos e financeiros.
"Atualmente, o BCE não está em condições de definir previamente uma trajetória para as taxas de juro, com Lagarde a enfatizar mais uma vez uma abordagem de análise 'reunião a reunião'", comenta Joana Vieira, partner da Ebury. Ainda assim, "os seus comentários sobre a inflação, que parecem retratar uma maior confiança na concretização do objetivo de 2%, e as aparentes preocupações do banco sobre as perspetivas de crescimento, que se deterioraram claramente desde o verão, apontam para novos cortes nas taxas até ao final do ano", acrescenta.
“Os mercados preveem que as taxas de juro sejam reduzidas em 25 pontos de base em cada uma das próximas reuniões do BCE, pelo menos, até meados de 2025. Na ausência de mais notícias, é de esperar que as taxas evoluam lentamente para valores mais baixos, à medida que nos aproximamos da concretização destas previsões”, admitem os analistas da Ebury Portugal. Se assim for, a taxa dos depósitos ficará em 3% no final do ano.
Na perspetiva de Felix Feather, economista da ABRDN, haverá três cortes consecutivos nos juros do BCE nas reuniões de dezembro, janeiro e março. E Kevin Thozet, membro do comité de investimento de Carmignac, lembra que os mercados estão a antecipar atualmente cortes das taxas em cada reunião do BCE até abril de 2025 (inclusive), o que colocaria a taxa dos depósitos em 2% no próximo verão.
Claro está é que além de o BCE ter de estar atento aos indicadores económicos na zona euro, também está de olhos postos no desenvolvimento dos conflitos no Médio Oriente e na Ucrânia, que podem voltar a aumentar os preços da energia de forma significativa. A par de tudo isto, o guardião do euro também tem em conta as decisões tomadas pela Reserva Federal dos EUA, uma vez que se os juros de referência não descerem ao mesmo ritmo haverá uma desvalorização do euro face ao dólar, elevando o custo das importações.
De qualquer forma, a própria Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) já deixou uma recomendação global de que “há espaço para reduzir as taxas de juro”, embora a política monetária deva continuar “prudente”. "Nos EUA e na área do euro projeta-se que as taxas de juro diretoras diminuam mais 1,5 e 1,25 pontos percentuais, respetivamente, até ao final de 2025, aproximando-as de níveis neutros", sinalizou a instituição internacional no final de setembro.

As próximas reuniões do BCE
O Conselho do BCE reúne-se aproximadamente de seis em seis semanas. Este é o calendário das próximas reuniões de política monetária do guardião do euro, nas quais vai anunciar as suas decisões sobre as taxas de juro diretoras:
- 12 de dezembro de 2024
- 30 de janeiro de 2025
- 6 de março de 2025
- 17 de abril de 2025
- 5 de junho de 2025
- 24 de julho de 2025
- 11 de setembro de 2025
- 30 de outubro de 2025
- 18 de dezembro de 2025
*Notícia atualizada dia 18 de outubro, às 14h40, com novas declarações de Christine Lagarde, presidente do BCE, citadas pela Lusa
Acompanha toda a informação imobiliária e os relatórios de dados mais atuais nas nossas newsletters diária e semanal. Também podes acompanhar o mercado imobiliário de luxo com a nossa newsletter mensal de luxo.
Para poder comentar deves entrar na tua conta