De inexistente a ter uma cada vez maior procura, este mercado está a dar cartas em Portugal. Entrevistámos o presidente da direção da Associação Passivhaus Portugal.
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Passive House: mais saudável, eficiente e pode custar menos que a construção tradicional
Associação Passivhaus Portugal

Maior qualidade de vida, que se reflete no conforto e na saúde, mas também ganhos em termos de poupanças com energia e para o ambiente. De forma resumida, são estes os grandes benefícios de uma "casa passiva" e que, cada vez mais, têm vindo a ser percecionados e valorizados pelo mercado em Portugal. "Temos assistido a uma procura maior de clientes que pretendem construir ou reabilitar de acordo com a Passive House", confirma João Marcelino, presidente da direção da Associação Passivhaus Portugal.

Em entrevista ao idealista/news, o especialista desmistifica também que o investimento neste tipo de construção seja mais caro, explicando onde está a margem de ganho, face à construção tradicional. E na hora de vender ou arrendar um imóvel, a diferença também se faz sentir. "De acordo com diversos estudos, são referidos valores médios entre 10 a 15% para o prémio a pagar pelo imóvel devido à existência de certificações voluntárias de desempenho ou de sustentabilidade, no caso da compra/venda. No caso do arrendamento de espaços comerciais e administrativos são referidos valores médios de 5 a 10%, grosso modo", revela.

Reforçando que a Passive House é aplicável a qualquer tipo de edifício, quer seja residencial ou de serviços, João Marcelino está convencido que o potencial de mercado está agora na reabilitação, e que setor terá de se adaptar a esta realidade.

Por outro lado, considera que o "confinamento, que vivemos durante esta pandemia, veio alertar para a importância da qualidade dos espaços em que vivemos", defendendo que "devemos transformar esta situação numa oportunidade para agir e fazer bem". 

Deixa como exemplo a cidade de Frankfurt que traçou que, desde 2020, "todas as construções, quer sejam edifícios públicos ou particulares, quer sejam construções novas ou reabilitações profundas, têm de ter um desempenho Passive House".

Passive House: mais saudável, eficiente e pode custar menos que a construção tradicional
Associação Passivhaus Portugal

Quais as vantagens de uma casa de construção passiva face a uma casa de construção tradicional? E os desafios?

A maior vantagem é, sem dúvida, a qualidade de vida e o bem estar proporcionados aos seus ocupantes. Ou seja, podemos usufruir de excelente conforto térmico e uma constante qualidade do ar interior. Além desta mais valia, existe obviamente a poupança energética gerada, que se transforma numa menor renda de energia a pagar e também numa menor pegada ecológica por parte dos ocupantes do edifício.

Não pode haver uma Passive House que resulte dum mau projeto e duma má construção.

Além da exigência em termos de conhecimento e capacidade para implementar, o maior desafio passa por fazer bem. Isso significa projetar bem e construir bem, ou seja, valorizar as atividades de projeto e de construção. Não pode haver uma Passive House que resulte dum mau projeto e duma má construção.

A construção passiva é mais cara ou mais barata do que a construção tradicional? Quais são os ganhos para quem decide investir?

Se colocarmos a nossa inteligência no projeto e se aplicarmos os princípios Passive House nas fases iniciais do processo podemos ter uma Passive House até com menores custos de investimento que um edifício convencional.

A regulamentação nacional obriga à definição de níveis de isolamento que, por vezes, já respondem àquilo que a Passive House pode exigir. E numa Passive House o número de equipamentos e sistemas a instalar será mais reduzido que num edifício convencional. Por exemplo, numa fase inicial do projeto, definir a boa orientação do edifício, optimizando a exposição solar, tem o mesmo custo que orientá-lo mal. Por isso é possível, e está a ser conseguido, construir Passive Houses com preços correntes.

As poupanças de energia para aquecer e arrefecer o edifício podem variar entre 75 e 90% em comparação com edifícios convencionais.

Relativamente ao custo de operação, com uma Passive House as poupanças de energia para aquecer e arrefecer o edifício podem variar entre 75 e 90% em comparação com edifícios convencionais. E isso pode levar a poupanças anuais de algumas centenas de euros em habitações até bastantes milhares de euros em edifícios de serviços.

Quais são as principais dúvidas que têm de esclarecer os arquitetos ou desenhadores projetistas passivhaus às pessoas que decidem construir uma casa passiva?

Não será bem a resposta a uma dúvida, mas talvez os projetistas e consultores devessem afirmar duma forma clara que a prioridade na definição dos ambientes que projetamos é a saúde. A saúde das pessoas é muito importante e os edifícios só existem porque existem pessoas para os projetar, construir e utilizar. Mas o desempenho dos edifícios tem impacto na qualidade de vida e saúde das pessoas que o utilizam. Por exemplo, a eficiência energética não pode ser considerada apenas porque permite optimizar e reduzir desperdícios energéticos, ela tem que ser vista como meio para melhorar o conforto das pessoas, reduzindo o desenvolvimento de patologias nos edifícios, patologias essas que levam as pessoas a ficar doentes (como bolores ou humidades).

A industrialização da construção, cada vez mais forte, é compatível com princípios passivhaus?

As tecnologias e as inovações a nível dos processos devem ser usadas ao serviço das pessoas e não apenas ser um fim em si mesma. E, portanto, todas as inovações que ajudem e permitam alcançar um parque edificado mais confortável, saudável e sustentável devem ser consideradas. E a inovação não deve ser vista apenas no sentido de “gadget” ou no sentido da digitalização da economia; o setor da construção tem desenvolvido soluções construtivas de elevado desempenho que incluem materiais tecnologicamente desenvolvidos e que permitem maior qualidade de vida aos utilizadores dos edifícios.

A eficiência energética não pode ser considerada apenas porque permite optimizar e reduzir desperdícios energéticos, ela tem que ser vista como meio para melhorar o conforto das pessoas, reduzindo o desenvolvimento de patologias nos edifícios, patologias essas que levam as pessoas a ficar doentes (como bolores ou humidades).

Pelo conhecimento que têm do mercado, os compradores/investidores valorizam que um imóvel seja passivhaus na hora de comprar/arrendar? Quanto pode adicionar de valor face um tradicional?

De acordo com diversos estudos, são referidos valores médios entre 10 a 15% para o prémio a pagar pelo imóvel devido à existência de certificações voluntárias de desempenho ou de sustentabilidade, no caso da compra/venda. No caso do arrendamento de espaços comerciais e administrativos são referidos valores médios de 5 a 10%, grosso modo.

Passive House: mais saudável, eficiente e pode custar menos que a construção tradicional
Associação Passivhaus Portugal

E os bancos? Valorizam mais uma casa passiva na hora de avaliar para dar crédito à habitação para construir?

Cada vez mais são disponibilizados produtos financeiros sustentáveis. Inclusivamente há bancos que se dedicam inteiramente a sua atividade a promover e a investir na sustentabilidade. Em Portugal ainda há muito para fazer nesta área mas, no resto da Europa, são muito comuns as bonificações para edifícios que comprovem (através da certificação) ter elevado desempenho ao nível do desempenho e, sobretudo, da eficiência energética.

O fundamento é simples, com uma Passive House as rendas de energia são efetivamente mais baixas, significando um maior alívio nos orçamentos familiares ou das instituições e com isso há um menor risco de incumprimento do crédito bancário.

Como tem a evoluído a procura de construção passiva em Portugal? Há zonas do país com maior procura? Porquê?

Temos assistido a uma procura maior de clientes que pretendem construir ou reabilitar de acordo com a Passive House. E o foco destes clientes e promotores está na procura de um melhor produto, que assegure uma maior qualidade de vida e um maior retorno do investimento.

Já existem algumas Passive Houses construídas, sobretudo no centro/norte de Portugal, mas há muitas dezenas de projetos em desenvolvimento um pouco por todo o país, incluindo nas ilhas.

Este caminho foi iniciado a partir do zero, em que não havia capacidade instalada (projetistas, construtores, fabricantes) e não havia um público consciencializado e conhecedor. O trabalho realizado até agora com o fortalecimento da rede Passive House permite afirmar a existência dum mercado Passive House atualmente. Há procura e há capacidade de oferta. Convém também relembrar que este caminho foi construído sem qualquer apoio público ou comunitário. Apenas com o interesse e participação voluntária dos agentes do setor.

Com uma Passive House as rendas de energia são efetivamente mais baixas, significando um maior alívio nos orçamentos familiares ou das instituições e com isso há um menor risco de incumprimento do crédito bancário.

A construção passiva aplica-se tradicionalmente a casas unifamiliares, mas há cada vez mais projetos internacionais de edifícios em altura. Como é esta realidade em Portugal e que tendências se podem antecipar?

A Passive House é aplicável a qualquer tipo de edifício, quer seja residencial ou de serviços, e em qualquer tipo de intervenção, quer seja construção nova ou reabilitação. Em relação a edifícios em altura, já há torres residenciais Passive House a serem desenvolvidas em Portugal, bem como outras tipologias nos edifícios de serviços.

A tendência geral do mercado passará, sobretudo pela reabilitação, e a Passive House tem de fazer parte da resposta. 

De que forma se pode introduzir o conceito passivhaus na reabilitação urbana?

Obviamente, torna-se mais simples a aplicação do conceito numa construção nova, mas é perfeitamente possível e economicamente acessível reabilitar um edifício existente e dotá-lo deste desempenho. Aliás, no panorama atual, sem dúvida que o grande potencial de transformação está na reabilitação de edifícios existentes. É aí onde o setor da construção irá estar focado e onde os profissionais terão de intervir.

A tendência geral do mercado passará, sobretudo pela reabilitação, e a Passive House tem de fazer parte da resposta. 

A atual crise compromete o desenvolvimento deste conceito? Ou pelo contrário, a pandemia e consequente procura de casas com mais espaço, qualidade de vida e em zonas mais isoladas/rurais é uma oportunidade para a construção passiva em Portugal?

O confinamento, que vivemos durante esta pandemia, veio alertar para a importância da qualidade dos espaços em que vivemos, não só do ponto de vista de conforto térmico e acústico, como da qualidade do ar interior, da iluminação natural, da ligação interior/exterior e até da eficiência energética.

Passando mais tempo no interior as necessidades de climatização aumentaram, e devido à baixa qualidade das casas os consumos aumentaram, levando as pessoas a perceber o quanto a eficiência energética e o isolamento térmico não são apenas expressões da moda, mas como afetam a sua carteira no final do mês. A percepção do espaço, da sua qualidade e do seu valor está a alterar-se.

Em suma, o que a pandemia trouxe foi uma evidência clara dos problemas dos edifícios e das preocupações que já existiam e, portanto, podemos e devemos transformar esta situação numa oportunidade para agir e fazer bem.

Pode dizer-se que as casas do futuro vão ser construção passiva; em que horizonte temporal?

Nós todos, enquanto entidade coletiva, construímos o futuro que queremos. Por exemplo em Frankfurt desde 2020, todas as construções, quer sejam edifícios públicos ou particulares, quer sejam construções novas ou reabilitações profundas, têm de ter um desempenho Passive House e o objetivo é que em 2050 todo o parque edificado de Frankfurt seja Passive House.

Tudo depende da ambição que tenhamos e do plano que definimos.

O que a pandemia trouxe foi uma evidência clara dos problemas dos edifícios e das preocupações que já existiam e, portanto, podemos e devemos transformar esta situação numa oportunidade para agir e fazer bem.

Que relação mantém a Associação com a administração pública (governo e autarquias) para impulsar o conceito passivhaus na normativa vigente? Como se poderia melhorar a lei e os códigos em vigor para introduzir critérios mais eficientes e sustentáveis na construção em Portugal?

A Associação Passivhaus Portugal tem demonstrado sempre a total abertura para o estabelecimento de parcerias e estratégias comuns. Há alguns avanços feitos ao nível de alguns organismos públicos que estão a dar frutos. A Passivhaus Portugal tem também participado de forma voluntária, e também quando solicitada, a apresentar a sua visão e a dar o seu contributo, nomeadamente aquando da definição do nZEB, ou seja do edifício com necessidades de energia quase nulas, da discussão da Estratégia de Longo Prazo para a Renovação dos Edifícios (ELPRE) e mais recentemente na discussão do Plano de Recuperação Económica de Portugal 2020-2030

O que defendemos, duma forma fundamentada, é simples e passa por fazer a necessária transição do parque edificado para os elevados níveis de desempenho da Passive House. Temos de ter objetivos ambiciosos para que haja capacidade real de transformar a realidade.

É esta visão que está refletida no Manifesto Passive House Para Todos. 

Passive House: mais saudável, eficiente e pode custar menos que a construção tradicional
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