Públicos e privados devem ser convocados a dar resposta urgente ao desafio da habitação. Defende o presidente da Gebalis, Pedro Pinto de Jesus, em entrevista ao idealista/news.
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A pandemia colocou em evidência um problema que vinha a acentuar-se nos últimos anos: a crise habitacional em que vive a classe média. Pessoas com rendimentos a mais para beneficiar de habitação social e rendimentos a menos para aceder a casas com preços de mercado. Ao mesmo tempo, é preciso continuar a dar apoio às classes mais desfavorecidas. Este desafio tornou premente a necessidade de respostas urgentes por parte das entidades públicas, mas gerou também uma área de potencial negócio a explorar do lado dos investidores. Num contexto como o atual, mais do que nunca, todos devem ser convocados a participar, privados e públicos, defende o presidente da Gebalis. Em entrevista ao idealista/news, Pedro Pinto de Jesus diz acreditar que "todos temos que ter papel a prestar quando nos vemos perante crises tão intensas como a que estamos a viver” e garante que existem janelas de oportunidades para os privados poderem entrar (também) no mercado da habitação pública.

Para Pedro Pinto de Jesus, que dirige aquela que é a maior empresa de gestão de habitação pública do país, em Lisboa, é fundamental uma abordagem urbana integrada que permita dar respostas aos problemas existentes, alguns estruturais, em detrimento de políticas e respostas pontuais e dispersas. O presidente da Gebalis lembra que os problemas ao nível da habitação não são de agora, citando os relatórios do Observatório de Habitação Europeu, que apresentam dados que revelam que vivemos uma crise habitacional desde 2015 com impacto na vida concreta das pessoas, aumentando o risco de pobreza e exclusão social. E recorda outros números: em 2017, 10,2% dos agregados familiares na União Europeia gastaram mais de 40% do seu rendimento disponível em custos de habitação, uma percentagem aumenta para 37,8% quando se considera os agregados familiares em risco de pobreza.

Existem "janelas de oportunidade" para os privados que entrem no mercado da habitação pública
Gebalis

A Gebalis gere, atualmente, um parque habitacional composto por 23 mil habitações, tendo por isso um papel central na vida das cerca de 65 000 pessoas que vivem nos 66 bairros que estão debaixo da sua “alçada”. Pedro Pinto de Jesus explica que, neste caso, dizem respeito "maioritariamente a questões de renda apoiada, que dão resposta a populações mais vulneráveis, que estão em condições de se candidatarem a uma habitação pública”, frisando, porém, que “têm em grande desenvolvimento a área do pilar da renda acessível, que é dirigida maioritariamente a jovens e classes médias”. “E também temos depois respostas mais focadas em problemas concretos”, destaca.

Dá ainda como exemplo o programa Reabilitar o Centro Histórico da Câmara Municipal de Lisboa (CML), o Renda Segura, lançado mais recentemente, e que ativa património privado e põe-no ao serviço através ainda de outro programa, o Renda Acessível. “Estas são algumas respostas diversificadas, e é por isso que digo muitas vezes que é preciso uma resposta universalista, ou seja, diversificar para conseguirmos respostas mais transversais estruturadas”. Está convencido que estas são algumas das “janelas de oportunidades” para os privados poderem entrar também no mercado da habitação pública, “contribuindo para a disponibilização de um número de fogos numa cidade como a Lisboa”.

A nível nacional, não deixa de referir as políticas da nova geração de políticas de habitação, e a forma como património habitacional público está a ser reativado para dar respostas às pessoas com sinergias diretas com as autarquias, acreditando “que temos instrumentos estruturantes e boas respostas para fazer mais e melhor habitação de qualidade”.

Repensar as políticas de habitação e as cidades

O presidente da Gebalis considera que as políticas de habitação, públicas ou privadas,  precisam “necessariamente” de acompanhar na mesma medida outro tipo de políticas, e dá o exemplo das cidades, que estão permanentemente a mudar, quer ao nível dos aspetos demográficos e sociais, mas também ao nível ambiental e cultural. “Nós vivemos num contexto em que somos permanentemente desafiados para acompanhar as mudanças demográficas sociais culturais e ambientais das cidades. As cidades estão sempre em evolução”, refere.

Para isso, as organizações que servem a cidade e as pessoas, também têm que se ajustar, e estar até um passo à frente naquilo que são as respostas necessárias. “As organizações têm que se muscular, têm que se dotar de conhecimento”, defende. “Às questões de habitação juntam-se sempre as questões ambientais da mobilidade, da energia, da distribuição espacial e também da coesão justiça social. Portanto, uma abordagem urbana integrada é fundamental para nós conseguirmos construir políticas públicas sustentáveis, nomeadamente na área da gestão habitacional”, frisa ainda.

Existem "janelas de oportunidade" para os privados que entrem no mercado da habitação pública
Gebalis

Ideias que foram igualmente exploradas na conferência internacional “Habitar o Futuro” promovida pela Gebalis, que conseguiu atrair em tempos muito desafiantes e melhores especialistas europeus e mundiais na área da habitação e dos assuntos urbanos – da ONU, da Universidade Columbia a Universidade de Melbourne, até aos palcos europeus de Bruxelas. Uma iniciativa onde este e outros temas foram colocados em cima da mesa, para se chegar a uma conclusão unânime: a necessidade de garantir o acesso a habitação de qualidade para todos, nas suas mais diferentes dimensões, que obriga a bom planeamento e execução de políticas públicas estruturantes e universalistas.

E a Gebalis está a dar  passos neste sentido. Foi oficialmente admitida em setembro na Federação Europeia de Habitação Pública, Cooperativa e Social – Housing Europe, sendo a primeira empresa portuguesa a marcar presença na elite europeia dos providers de habitação pública. Entrar na Housing Europe é, para Pedro Pinto Jesus, um aspeto muito relevante, ainda para mais perante os desafios que a pandemia da Covid-19 traz.” São novos desafios para o setor da habitação e tanto nós a nível local como a nível nacional, a nível global, temos vindo a enfrentar. E é por isso particularmente relevante termos organismos, termos palcos, temos cenários, onde podemos trocar boas práticas, falar sobre experiências, ajustar programas que já foram bem sucedidos noutros países e noutras cidades”, diz.

“Aqui há Mais Bairro” vai beneficiar mais de 26 mil famílias

Um dos maiores projetos da Gebalis, que celebra este ano 25 anos de existência, é o programa “Aqui há Mais Bairro”. São 52,5 milhões de euros que estão a ser investidos na regeneração dos bairros municipais, que vão desde obras profundas nos edifícios com uma forte componente de melhoria do desempenho energético dos edifícios, substituição integral do revestimento exterior das fachadas ou ainda aplicação de revestimento com isolamento térmico e substituição das janelas. Este investimento deverá beneficiar quase as 10 mil frações, com impacto direto na qualidade de vida de mais de 26 mil famílias, no total de 30 bairros.

De acordo com Pedro Pinto Jesus, e desde a erradicação das cerca de 11 mil barracas de Lisboa que não se assistia a um investimento “tão evidente e ímpar” no que diz respeito à habitação pública na cidade. E não tem dúvidas que o futuro passará por uma abordagem urbana integrada que possa criar mais iniciativas políticas sustentáveis e desenvolvimento de ações que contribuam para a melhoria da qualidade de vida dos espaços, garantindo maior conforto e segurança às pessoas.

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1 Comentários:

Lucinda Matias
27 Novembro 2020, 18:26

Existe, desde há muito tempo, uma crise de habitação em Portugal, sim, devido à especulação imobiliária em cidades como Lisboa, onde, se fizermos bem as contas e analisarmos o estado e qualidade do parque habitacional, não tem paralelo com os preços praticados noutras zonas do país bem mais qualificadas.

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