Medida mais polémica do Mais Habitação foi aprovada em Conselho de Ministros. António Costa explica os detalhes do novo regime.
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O arrendamento forçado esteve no centro da discussão pública do Mais Habitação, levando mesmo o Presidente da República a admitir vetar a lei caso a proposta avançasse. Mas nem isto fez o Governo recuar na medida e o chamado arrendamento coercivo vai mesmo avançar no caso dos apartamentos devolutos há mais de dois anos, em territórios de alta densidade, segundo foi aprovado no Conselho de Ministros desta quinta-feira, dia 30 de março. António Costa, dizendo-se "surpreendido com todo o entusiasmo com que o tema tem sido debatido" fez-se valer dos argumentos de que tanto "o conceito de prédio devoluto, como o conceito de arrendamento forçado não são novos na nossa legislação" e que, juntamente com as restantes iniciativas legislativas, esta é uma medida "absolutamente fundamental para termos mais habitação acessível para dar às famílias portuguesas", para justificar a decisão na conferência de imprensa após a reunião do Executivo.

"Não se trata de expropriar. Trata-se simplesmente de evitar que haja um imóvel necessário que esteja retirado do acesso ao mercado e, ao mesmo tempo, cobrar uma renda acessível", insistiu o líder do Governo socialista. "Vivemos num momento de grande carência habitacional no nosso país, num momento onde, em particular as novas gerações enfrentam dificuldades crescentes na sua autonomia", acrescentou, dando nota de que também o estado vai ceder imóveis e terrenos públicos devolutos para ajudar a aumentar a oferta de habitação, em parceria com o setor privado. 

A grande prioridade do Executivo com o Mais Habitação, garante Costa, é "gerar oferta de habitação suficiente e acessível às famílias portuguesas e para isso precisamos de adotar medidas que possam ter um efeito de regulação do mercado durante os próximos anos", reiterou, frisando que "hoje não são só as famílias mais carenciadas que têm dificuldade no acesso à habitação. Toda a classe média tem dificuldade no acesso à habitação". E é neste contexto que surge o desígnio de fomentar a utilização do património devoluto, previamente classificado como tal pelas câmaras municipais.

Consciente dos riscos e consequências que este tipo de intervenções, como o arrendamento coercivo, podem ter ao nível da confiança no mercado e de desgaste político, o primeiro-ministro deteve-se a explicar a medida em detalhe. Com o objetivo de "garantir tranquilidade e segurança" começou por dizer que o arrendamento forçado "aplica-se exclusivamente aos territórios onde não há baixa densidade (Portaria 208/2017)". E "todas as outras formas de edificação que não sejam fracções autónomas ou apartamentos não são abrangidas por esta figura". 

Por outro lado, o primeiro-ministro deu a conhecer que, no âmbito do novo regime, só ficam abrangidos "os imóveis que há mais de dois anos, pelo menos a dois anos, já estão classificados pelos municípios como estando em situação de devoluto". Isto significa que os imóveis que não estejam hoje considerados como devolutos "só poderão ser objeto desta medida dois anos fiscais, depois de terem sido qualificados como sendo devolutos", nas palavras de António Costa. Isto significa um aligeiramento face à proposta inicial do Governo, antes da consulta pública, que era de considerar os imóveis devolutos ao fim de apenas um ano.

Segundo os dados Instituto Nacional de Estatística (INE), baseados nos Censos de 2021, existiam 723.215 casas vazias em Portugal, das quais cerca de 348 mil estavam colocadas no mercado de venda ou arrendamento e uma fatia de 375 mil - que cumprem os critérios para serem considerados imóveis devolutos - estavam vagas por "outros motivos".

Todos os imóveis vazios são considerados devolutos e ficam abrangidos pelo arrendamento forçado?


O Governo garante que não são considerados como imóveis devolutos e, como tal, não são abrangidos pelo presente regime, entre outras situações:

  • casas de férias;
  • casas de emigrantes ou de pessoas deslocadas por razões de saúde e razões
  • profissionais ou formativas; 
  • casas cujos proprietários estão num equipamento social como um lar ou estão
  • a prestar cuidados permanentes como cuidadores informais.

O que é que acontece a um imóvel devoluto depois de estar dois anos a pagar IMI agravado?

Sempre que um imóvel seja classificado pelo município como devoluto e, como tal, seja já objeto de IMI agravado, e sempre que, sobre essa classificação tenham já passado dois anos, deve o município proceder a nova comunicação ao proprietário para a respetiva
utilização.

Assim, passa a aplicar-se apenas nas situações em que, decorridos dois anos desde a sua consideração como devoluto pelo município, não tenha sido dado uso ao imóvel, e sempre que esse imóvel se localize em territórios que não se enquadrem no conceito de baixa densidade (Portaria 208/2007)

Findo esse prazo, o município deve notificar o proprietário para, consoante os casos:

  • Proceder às obras de conservação e, quando não o faça, o município poder
  • recorrer ao instrumento que já existe na lei para as obras coercivas.
  • Concretizar o dever de uso do imóvel no prazo de 90 dias, sendo que, quando
  • não o fizer, o município pode propor o seu arrendamento ou, em última instância,
  • proceder ao arrendamento forçado.

A utilização do instrumento do arrendamento forçado, consagrado na lei desde 2014 (artigo 14.º, n.º 2, alínea a) da Lei n.º 31/2014, de 30 de maio), pretende dar um incentivo para que sejam efetivamente disponibilizadas no mercado habitacional casas que atualmente estão sem uso, podendo o próprio IHRU, sempre que o município não pretendam proceder ao arrendamento do imóvel e o mesmo não careça de obras de
conservação, exercer esse direito.

Nova linha de crédito de 150 milhões para municípios fazerem obras coercivas

Por outro lado, o Governo aprovou, esta quinta-feira, o financiamento de 150 milhões de euros aos municípios, através do Banco Português do Fomento, para financiar a realização de “obras coercivas por parte dos municípios” em casas devolutas.

O objetivo é “fomentar o cumprimento das prerrogativas dos municípios já existentes no Regime Jurídico da Urbanização e Edificação (RJUE), com a criação de uma linha de financiamento de 150 milhões de euros”, avança o Governo.

“Apesar de já existir esta prerrogativa legal, a falta de linhas de financiamento inviabiliza, muitas vezes, o cumprimento das competências dos municípios; situação que cumpre resolver com a criação desta linha de financiamento”, esclareceu o primeiro-ministro.

O Governo quer, assim, garantir que os municípios não precisam de canalizar capitais próprios para executarem estas obras coercivas, sendo a amortização do empréstimo efetuada ou através do pagamento da dívida pelo proprietário – responsável pela execução das obras, ao abrigo do dever de conservação que sobre ele impende –, ou através dos rendimentos gerados pelo imóvel, através do arrendamento.

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