Explicamos com fundamento jurídico os direitos e deveres dos proprietários de imóveis em edifícios em propriedade horizontal.
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Se uma casa vazia ou devoluta num prédio estiver a causar problemas estruturais ou de segurança que afetam os demais condóminos, os proprietários das outras frações podem recorrer a mecanismos jurídicos para resolver a questão. No entanto, há várias questões a que é preciso estar atento, nos termos da lei. Afinal, o que é o direito à propriedade privada? O que são imóveis devolutos? Quais os direitos e deveres dos proprietários? Explicamos tudo o que se tem de ter em conta neste artigo preparado pelo idealista/news, com fundamento jurídico.

A propriedade é comummente qualificada como o direito real máximo - e em efetivo, é o modelo de todos os outros direitos reais. A propriedade representa decerto um dos aspetos de maior controvérsia da história civilizacional do homem. Estando a riqueza associada aos bens produtivos, ter a propriedade destes equivale ao domínio da produção da riqueza e a uma posição de preponderância, ou mesmo de poder, na relação com outros, seja essa relação entre povos ou Estados, entre estes e aqueles que estão sujeitos à sua soberania ou meramente entre privados. Daí que a atribuição da propriedade assuma uma importância capital em qualquer ordem jurídica, começa por explicar Luís Marques dos Santos, associado de Imobiliário da PRA – Raposo, Sá Miranda & Associados.

Direito à propriedade privada: o que diz a lei

O artigo 62.º n.º 1 do Constituição da República Portuguesa dispõe que “a todos é garantido o direito à propriedade privada e à sua transmissão em vida ou por morte, nos termos da constituição”, sendo um direito fundamental consagrado e protegido constitucionalmente.

O preceito faz proclamar, em primeiro lugar, a garantia de existência da propriedade privada no nosso país em segundo lugar, garante a liberdade de afetação dos bens pelo titular do direito patrimonial, por fim, garante a livre garantia da livre disposição da coisa, em vida ou por morte.

O Artigo 1305.º fixa o conteúdo da propriedade “o proprietário goza de modo pleno e exclusivo dos direitos de uso, fruição e disposição das coisas que lhe pertencem...”

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O direito de propriedade atribui ao titular todos os poderes ou faculdades que à coisa se podem referir. O proprietário pode fazer qualquer aproveitamento da coisa que a lei não proíba, o que leva a considerar para a sua delimitação somente as restrições a esse aproveitamento enquanto conteúdo negativo. Logo poderá usar, fruir, transformar, reivindicar, excluir terceiras não autorizados do gozo da coisa, pode demarcar, podendo alienar, onerar ou renunciar.

A lei não obriga o proprietário a efetuar um uso efetivo do seu direito de propriedade, ou seja, o direito por si existe e será oponível a qualquer um que o deseje usar que não o proprietário, mas a este a lei permite que não use e conserve todos os poderes sobre o direito por si constituído, sendo este o poder de não usar.

O que é um edifício devoluto?

Para efeitos do Decreto-Lei n.º 159/2006, de 8 de agosto, considera-se devoluto o prédio urbano ou a fração autónoma que durante um ano se encontre desocupada, sendo indícios de desocupação a inexistência de contratos em vigor com empresas de telecomunicações, de fornecimento de água, gás e eletricidade e a inexistência de faturação relativa a estes consumos (art.º 2, Decreto-Lei n.º 159/2006, de 8 de agosto) com as exceções previstas no artº. 3 do mencionado Diploma.

Do ponto de vista procedimental, os municípios procedem à identificação dos prédios urbanos ou frações autónomas que se encontrem devolutos e notificam o sujeito passivo do imposto municipal sobre imóveis, para o domicílio fiscal, do projeto de declaração de prédio devoluto, para este exercer o direito de audição prévia e da decisão, nos termos e prazos previstos no Código do Procedimento Administrativo. A decisão de declaração de prédio ou fração autónoma devoluta é sempre suscetível de impugnação judicial, nos termos gerais previstos no Código de Processo nos Tribunais Administrativos (art.º 3, Decreto-Lei n.º 159/2006, de 8 de agosto).

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Não se verificando ilicitude no não uso e, caso seja essa a opção do titular da propriedade, tornar devoluto o imóvel, sendo um direito conferido ao titular do direito, existindo somente uma penalização o abrigo do disposto no artigo 112.º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), para efeitos de aplicação da taxa do imposto municipal sobre imóveis (IMI), algo plenamente tolerável e aceitável, não sendo contestado o Direito constituído pelo titular ou de algo forma oponível com outro direito em confronto.

Imóveis devolutos integrados em prédios: direitos e deveres

Agora assumindo que este imóvel em estado devoluto se encontra integrado num prédio urbano em propriedade horizontal, ou seja, num prédio onde concorrem dois direitos, um, de propriedade singular e exclusiva, que tem por objeto as frações autónomas do edifício e outro, de compropriedade, incidente sobre as partes comuns: cada condómino é proprietário exclusivo da fração que lhe pertence e comproprietário das partes comuns do edifício (artigo 1420º n.º 1 do Código Civil).

No que toca à fração autónoma, o conteúdo do direito do condómino tem a mesma feição da propriedade, o conteúdo positivo do tipo deste direito (art.º 1305 do Código Civil) aplica-se igualmente à propriedade horizontal. O condómino pode usar e fruir a fração e as partes comuns do edifício, assim, com dispor do seu direito, constituindo direitos reais de gozo, de garantia ou de aquisição, o conjunto dos dois direitos é incindível.

Agora, montada a trama legal e do balizamento de direitos, que para muitos foi ou é uma ocorrência real com o qual tiveram ou encontram-se a lidar, a existência de uma fração autónoma integrada num prédio em propriedade horizontal em estado devoluto, por vontade ou incapacidade do titular do direito de propriedade em efetuar o uso previsto para o imóvel, faltando apenas o último elemento desestabilizador da sã convivência entre condóminos, ocorrência de danos com origem na fração devoluta e a responsabilização daqueles que são titulares da propriedade.

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É atribuído ao proprietário do imóvel o direito de não usar, podendo desembocar e perfilar-se, no estado de devoluto do imóvel, caso se verifique o enquadramento para tanto, porém, a este, o proprietário, não poderá renunciar ou abdicar, enquanto sujeito passivo da prestação, dos deveres prestar que impendem sobre o titular de um direito real a favor de outro enquanto obrigação real, ou seja, uma obrigação propter rem.

As obrigações propter rem não tem qualquer relação de acessoriedade com o direito real, fazendo parte do conteúdo do mesmo. As obrigações reais não correspondem a relações jurídicas distintas do direito real e autónomas deste, integrando o conteúdo complexo do direito real.

Se a fonte da obrigação propter rem é o direito real, o seu titular apenas se encontra vinculado ao cumprimento enquanto persistir a titularidade do direito. Se esta deixa de existir, a obrigação propter rem vinculará um novo titular, caso venha a existir.

Conclusão: o titular do direito poderá abdicar do exercício dos seus direitos sobre a sua propriedade, inclusive poderá deixar em estado de devoluto, está no seu direito, mas não poderá desvincular-se para com terceiros enquanto sujeito passivo da prestação do seu dever de prestar, verificando-se danos que tenham por origem o imóvel em estado devoluta deverá o titular proceder à prestação que ponha fim à ocorrência do dano e proceda as reparações devidas de forma a estabilizar a situação conforme se encontrava em momento prévio à ocorrência do facto ou a indemnização dos prejudicados.

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