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IMI: "Portugueses estão a pagar 1,2 milhões de euros a mais", diz bastonário da OTOC
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Aplaudindo a criação do coeficiente de localização na avaliação de imóveis, o bastonário da Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas (OTOC) acusa, porém, o Governo de estar a cobrar IMI a mais e de não rever em baixa os custos da construção que contam para o valor dos impostos finais, estando assim a penalizar os proprietários. Queres saber o que tem mais a dizer este especialista em impostos sobre a área do imobiliário? Aqui tens a primeira parte da entrevista de Domingues de Azevedo ao idealista/news.

O novo mecanismo de avaliação dos imóveis para efeitos de IMI e IMT tem sido alvo de muitas críticas por parte dos proprietários. Qual é a sua visão enquanto bastonário da OTOC?

O novo código tem aspetos discutíveis e que, em alguns casos, penalizam os sujeitos passivos, mas tem um fator que é efetivamente mais favorável: o coeficiente de localização. 

Afinal um mesmo prédio numa rua de Vila Real tem um valor diferente de numa rua de Lisboa e com um coeficiente de localização é feita essa correção, com base em critérios objetivos. Isto é muito mais positivo do que o sistema que tínhamos antes baseado nas chamadas comissões de cada concelho, que faziam as avaliações dos imóveis in loco atribuindo depois um valor.

Era muito mais suscetível de pressões uma comissão constituída por pessoas do que é o atual sistema, que é automático e assenta em critérios objetivos como fatores de localização, de área, etc. 

Quais são os pontos discutíveis do novo sistema, a seu ver?

Uma das grandes deficiências que continua no código das avaliações tem a ver com a "tradição" de aumentar o valor patrimonial em momentos de grande procura no imobiliário, mas de não acompanhar depois as oscilações de preço dos imóveis no mercado, sobretudo as descendentes.

Temos um sistema de avaliação de prédios que está desatualizado. Foi concebido num momento de grande aquecimento da economia que não foi depois devidamente ajustado no momento da crise financeira, mantendo-se os valores irreais atribuídos aos prédios que hoje não têm.

Temos um sistema de avaliação de prédios que está desatualizado com valores mais altos do que deveria. Isto faz com que os impostos pagos pelos titulares dos prédios estejam desfasados da realidade.

O que está em causa é o valor atribuído por metro quadrado de construção numa momento de alta da economia e hoje a realidade dos custos da construção é outra, bem menor. 

Quais as consequências práticas deste desajustamento para os proprietários?

Isto faz com que os impostos pagos pelos titulares dos prédios estejam desfasados da realidade, porque os valores das avaliações não correspondem aos valores de mercado. 

Não tem havido um mecanismo que acompanhe as flutuações do mercado e o legislador devia ter a preocupação de atualizar os valores de construção, pelo menos uma vez por ano.

Qual deveria ser o valor do custo da construção por m2 a ser considerado atualmente pelas Finanças?

Neste momento, está nos 625 euros por m2 e qualquer valor acima de 500 euros já seria considerado elevado. Ou seja, por cada m2, os proprietários estão a pagar mais 125 euros de valor patrimonial, que serve depois para determinar o valor do imposto final. Isto é uma diferença significativa.

E esta questão é ainda mais grave do que o simples valor, porque tem a ver com a base de direito em que assentam estas questões. Afinal se há revisões para beneficiar o Estado, também tem de haver quando é para beneficiar o contribuinte.

Além do mais, quando alguém reclama a revisão de uma matriz esta questão não é reclamável, porque é fixada nacionalmente e assim sendo só o Governo é que pode alterar. E não houve por parte deste Governo qualquer iniciativa para corrigir esta situação. 

O que explica tantas reclamações dos contribuintes à volta do IMI este ano?

Em 2012, quando foi aprovado o novo código de avaliação dos imóveis decidiu-se que aplicava-se às inscrições que se realizassem a partir daquela data. Isto significava que todos os prédios inscritos para trás tinham sido avaliados por diferentes critérios. Mas é óbvio que isto provocava distorções no valor.

E então o legislador português, e a meu ver muito bem, criou no próprio código uma disposição que dizia que nos 10 anos seguintes todos os prédios tinham que estar avaliados ao abrigo das novas regras. O que está mal são os critérios que estiveram na base desta avaliação, porque provocam casos de verdadeira injustiça fiscal. 

O legislador fez bem em querer avaliar todos os prédios do país. O que está mal são os critérios que estiveram na base desta avaliação, porque provocam casos de verdadeira injustiça fiscal. 

Por exemplo, com o passar dos anos, os critérios e as condições dos imóveis modificaram-se muito e existem prédios hoje em ruínas que não têm as mínimas condições de habitabilidade, ou que eram antigos prédios rurais destinados a outras funcionalidades, que agora foram avaliados como prédios urbanos normais.

Como não existem visitas aos locais e os imóveis são avaliados apenas pelas matrizes e projetos das câmaras acabaram por gerar-se situações de alguma incompreensibilidade por parte das Finanças. Muitas pessoas acabaram por deparar-se com valores para pagar completamente incomportáveis e desajustados. 

E, como nos termos do nosso código, nos três anos posteriores à inscrição do prédio, os contribuintes podem reclamar os valores atribuídos às matrizes, muita gente têm-no feito e bem, a meu ver. 

O fim da cláusula da salvaguarda no IMI foi outro drama social para os donos de imóveis...

Desde a atribuição do novo valor de avaliação, criou-se uma regra de salvaguarda que é que nos dois anos seguintes à revisão o menor de um dos valores que ele representa-se ou um terço do aumento do valor até ao limite de 75 euros seria o aumento máximo face ao imposto do ano anterior.

Isto quer dizer que houve uma progressão em espiral. No primeiro ano, era a contribuição do ano anterior mais 75 euros, e no segundo ano esse valor mais 75 euros. No terceiro ano, acontecia o mesmo. Este ano o que aconteceu foi que os prédios avaliados não puderam usar mais a cláusula de salvaguarda. E, por isso, não havia limites ao aumento do imposto.

Isto quer dizer que se antes pagavam 400 euros por ano, mas com a avaliação lhes tocava pagar outros 400 euros extra, tiveram que começar a pagar logo 800 euros por ano. 

Pelo fim do prazo da cláusula de salvaguarda, todo o valor do imposto que faltava incluir do valor inicial da revisão teve que ser pago este ano.

A atribuição da isenção às famílias mais carenciadas passou a ser automática. Como vê este procedimento?

Estamos a falar de um mecanismo que funciona com a conjugação de dois fatores, casas de pouco valor patrimonial (até 65 mil euros) e de agregados familiares com poucos rendimentos baixos (até 16 mil euros), que permite beneficiar as famílias mais carenciadas e com o qual estou de acordo. 

Há quem diga que se está a pagar IMI a mais. Partilha desta opinião?

O Governo diz que não, mas na minha opinião estão a ser pagos cerca de 1,2 milhões de euros a mais. Por exemplo, eu pagava por ano 640 euros e agora pago 1.800 euros. Mais do dobro. 

Este aumento da carga fiscal pode afetar a decisão de compra de um imóvel e, consequentemente, o setor imobiliário?

Acho que não. É verdade que são valores muito elevados para muita gente, sobretudo assim de repente, mas em termos de fruição na realidade as pessoas têm que admitir que isto nem é muito, porque pagar uma renda custa muito mais que isto.

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