
De nome canino tipicamente português, Bobi tem feito história e (já) não passa despercebido. Falamos de um cão com 30 anos de vida (humanos) que, seguindo a regra de que um ano de cão equivale a cerca de sete anos humanos, terá cerca de 210 anos de cão, um verdadeiro marco histórico confirmado pelo Guiness World Records, conferindo-lhe assim o título do cão vivo mais velho do mundo e de todos os tempos.
Este guerreiro de quatro patas vive na aldeia rural de Conqueiros, em Leiria, e conseguiu bater a meta do antigo recorde que pertencia ao Bluey, 1910-1939, o cão pastor australiano, que viveu até aos 29 anos e 5 meses. O idealista/news esteve à conversa com Leonel Costa, o tutor de Bobi, que nos contou mais sobre a história deste cão que agora é conhecido nos quatro cantos do mundo.
Bobi: o companheiro de uma vida
Leonel Costa, tem 38 anos, é segurança privado e intitula-se como dono do Bobi. No entanto, antes de assumir esta responsabilidade, foram os pais de Leonel que cuidaram dele com muito carinho como sempre fizeram com outros animais que tiveram. Atualmente, é Leonel que se responsabiliza pelos cuidados do amigo de quatro patas, numa história que tem (mesmo) muitos anos.
É caso para dizer que o Bobi foi um cão para a vida toda: chegou a sua casa durante a infância, acompanhou-o na adolescência e tornou-se como um irmão para Leonel. Mas com o passar dos anos, com a idade a avançar, Bobi foi começando a precisar de cada vez mais cuidados e os papéis inverteram-se.
Atualmente, Leonel já se sente como se fosse um pai para o seu patudo: “Não tenho filhos, mas sinto que o Bobi está muito dependente de mim, portanto hoje considero-me um pai para ele”.

Como surgiu o Bobi, na vida de Leonel?
O Bobi nasceu em maio de 1992, junto com três animais, os meus pais foram ao local onde eles nasceram para retirar os bebés que estavam lá e não repararam no Bobi. Quando não havia condições financeiras para os ter ou quando já tinham outros animais, que era o caso, assim que os animais nasciam, nas primeiras horas de vida, os mais antigos iam buscar os animais e enterravam-nos.
Talvez porque o Bobi é da cor da lenha, ou talvez por ter de ser um processo muito rápido, para as cadelas não verem isto a acontecer, têm de aproveitar uma altura em que a cadela sai de perto dos animais e na altura nem se aperceberam da existência do Bobi.
Então nós só tínhamos duas opções: ou contávamos aos nossos pais que estava lá um animal e provavelmente acontecia o mesmo que aconteceu aos outros, ou então aguardávamos, porque normalmente os mais antigos diziam que quando os animais abrissem os olhos já iriam sofrer e nessa altura já não era possível fazer esse procedimento.
Foi assim, escondemos o Bobi dos nossos pais até ele abrir os olhos e depois contámos-lhes quando já sabíamos que não ia acontecer nada. Contámos aos nossos pais e ficámos de castigo, mas valeu a pena porque qualquer criança quer ficar com os animais.
"Escondemos o Bobi dos nossos pais, até ele abrir os olhos e depois contámos-lhes quando já sabíamos que não ia acontecer nada"

Como foi crescer e como é viver ao lado do Bobi?
É fantástico! O meu pai foi caçador, teve muito animais e por isso não tive só o Bobi. Existiram outros animais, tive um cão que também durou 22 anos chamado Chicote mas com o qual tive pouco contacto. Já existia quando nasci, lembro-me dele, contudo muito vagamente.
Depois sempre tivemos muitos animais, mas o Bobi é diferente em tudo: pelo simbolismo e pela forma como nasceu. Lembro-me que quando era mais pequeno, estudava perto de casa, numa escola primária, que fica a cerca de um quilómetro da minha casa.
Tenho memórias, de eu e os meus colegas irmos para a escola e o Bobi ia connosco pelo caminho, depois quando entrávamos ele voltava para casa. São aquelas memórias que ainda hoje partilho com os meus colegas e todos nós nos lembramos.
"Tenho memórias, de eu e os meus colegas, irmos para a escola e o Bobi ia connosco pelo caminho, depois quando entrávamos ele voltava para casa"
O Bobi acompanhou-me em tudo, hoje ao olhar para o Bobi, para muitas pessoas é só um cão, mas para mim não é só um cão. Em primeiro, porque me faz lembrar o meu pai e o meu irmão que já não estão entre nós, eram pessoas que gostavam muito dele e que já partiram.
Depois também me faz lembrar outros animais, da sua descendência, ou seja, o Bobi é o último animal que tenho da descendência de todos os cães que já passaram por minha casa e por isso têm ainda mais simbolismo.
"O Bobi acompanhou-me em tudo, hoje ao olhar para o ele penso que para muitas pessoas é só um cão, mas para mim não é só um cão"

O Bobi tem trinta anos humanos que tem tanto de incrível como de assustador. Pensa muito sobre o dia em que o Bobi nos deixar?
Vai custar muito um dia quando o Bobi me deixar, ou eu o deixar a ele primeiro, nós não sabemos! Mas realmente é aquele cão que representa toda a descendência de todos os outros animais que tive ao longo da vida.
Quando o Bobi nos deixar, com certeza que irei buscar outro animal e irei amá-lo muito porque adoro animais, no entanto, já não será aquela sequência. Irei buscar outro animal, cuidar muito bem dele, dar muito amor, o mesmo amor que o Bobi teve, porém, será um sentimento diferente porque não representa outra coisa.
Para muitas pessoas é só um cão, para mim não, mas se calhar só entende quem vem à minha casa ou quem conviveu com ele. Tenho muito medo de que esse dia possa chegar porque seguramente vai ser tão difícil como quando perdi o meu pai ou meu irmão.
Estou a comparará-lo a uma pessoa, sei que para muitas pessoas estas comparação pode ser meio descabida, mas para mim não. Adoro animais e o Bobi neste momento é tudo para mim. Só quem gosta é que entende, quem acha indiferente até são capazes de nos chamar doidos.
"Tenho muito medo de que esse dia possa chegar porque seguramente vai ser tão difícil como quando perdi o meu pai ou meu irmão"

Qual é a reação dos veterinários quando lhes diz a idade do Bobi?
Para os veterinários é incrível porque olham para o Bobi e veem que ele de facto tem traços de velhice no andar, no levantar, na visão, mas a nível de focinho está muito bem para idade que tem. Para eles também é uma surpresa porque os anos foram passando e muitas vezes quando vou ao veterinário dizem-me “O Bobi ainda está vivo?”.
"Ele de facto tem traços de velhice no andar, no levantar, na visão, mas a nível de focinho está muito bem para idade que tem"
Derivado ao que está a acontecer tenho tido alguns contactos de alguns veterinários do país e também de alguns investigadores de outros países que vieram fazer um estudo sobre o Bobi, é um caso que todos eles têm curiosidade em conhecer. No entanto, até para os veterinários que já o conhecem é surpreendente. Felizmente, faço várias análises ao Bobi, de seis em seis meses, tem estado tudo bem e por isso para eles é um caso único.
"É uma surpresa porque os anos foram passando e muitas vezes quando vou ao veterinário dizem-me “O Bobi ainda está vivo?”

Como é atualmente a vida do Bobi? Ainda brinca?
O Bobi já não deixa tanta saudade aos carteiros como deixava antigamente. Confesso que agora quando saiu a notícia, alguns carteiros aqui da zona passaram lá em casa e acho engraçado porque eles diziam que quando passavam pela minha casa tinham de meter uma mudança na mota porque o Bobi estava à espera deles constantemente.
Agora, com os anos que foram passando já está mais limitado, ou seja, o Bobi nunca esteve preso a correntes, sempre teve muita liberdade e atualmente vamos dar os passeios habituais e ele vai ao mesmo ritmo que nós, já não corre tanto e eu já o consigo acompanhar.
Se há um ou outro dia que não consiga ir com ele à rua, apesar de ele ter um quintal grande para passear, ele já fica um bocado stressado porque está habituado a ir à rua dar um passeio no pinhal, no meio da natureza. Aliás, acho que esse é um dos fatores que tem contribuído para esta longevidade.
Contudo, já está mais limitado a nível da visão, bate contra as portas, contra as cadeiras, nota-se custa a levantar, por vezes tenho de o ajudar a levantar, mas quando ganha balanço deixem-no ir que ele vai, o pior é quando é para travar.
"Por vezes tenho de o ajudar a levantar, mas quando ganha balanço deixem-no ir que ele vai, o pior é quando é para travar"

E como é a relação do Bobi com outros animais?
Brinca muito com os gatos, acho que até por isso ele é especial. Este cão tem qualquer coisa que não é normal! Tenho vídeos dele da vida toda com gatos e foi um animal que ele sempre adorou.
Confesso que tenho um gato que é cego que encontrei na rua. Quando o levei para casa fiquei um bocado com medo porque os outros gatos podiam fugir caso o Bobi fizesse alguma coisa e este gato não. A relação deste gato com o Bobi, é quase como se fosse de pai para filho e até por estes exemplos se vê como o Bobi é especial.

Como sugeriu o Guiness World Records na vossa vida?
Foi no ano passado. O Bobi faz anos em maio e eu faço anos em março. Na altura em que eu fazia anos um colega meu disse-me “olha lá o teu cão já deve estar perto daquele australiano que é cão mais velho do mundo”.
Entretanto fui pesquisar e reparei que o Bobi ía fazer 30 anos, em maio, e que ía superar o recorde. Foi um processo muito demorado e primeiro contactei o Guiness para saber o que era necessário.
Havia muita gente que me dizia “Leonel não te metas nisso porque o Guiness ou é por interesse, ou vai pedir-te alguma coisa em troca e tens que pagar muito dinheiro”, mas pensei assim: sei a idade que o ele tem, tenho como comprovar tudo por isso não me vai custar nada e acho que devo fazer isto pelo Bobi. Por ele ter 30 anos, o mínimo que podia fazer era pelo menos tentar.
"Foi um processo muito demorado e primeiro contactei o Guiness para saber o que era necessário"

Depois do primeiro contacto, como foi todo o processo com o Guiness?
Contactei o Guiness, eles pediram imensa documentação, os registos do Bobi de 1992, o historial veterinário dele, vacinas, muitas fotografias, muitos vídeos e alguns exames.
O Bobi foi consultado por vários veterinários, não podia ser só o habitual. Isso foi uma das coisas que o Guiness pediu, para ter outros veterinários que nunca olharam para o Bobi e ter relatórios diferentes. Portanto, isto foi um processo que durou quase um ano, estamos a falar dez a onze meses, onde o Guiness pediu muita informação e fui fazendo chegar tudo.
Tinha sempre aquela incerteza sobre se ia ser ou não, mas também muitas esperança. Foi uma espera até agora, foi no início de fevereiro que me contactaram de madrugada, para me dar a notícia.
"Foi um processo que durou quase um ano, estamos a falar dez a onze meses, onde o Guiness pediu muita informação e fui fazendo chegar tudo"
Como foi a sua reação?
Fiquei muito contente porque foi o comprovar daquilo que já sabíamos. Quem é de fora e não conhece o Bobi, se calhar olha para o focinho e vê que é tão fofinho e tão juvenil que pode pensar “caramba, mas será que ele tem mesmo 30 anos?”.
No entanto, realmente foi só fazer chegar toda a documentação ao Guiness, eles fizeram as investigações que tinham de fazer e só comprovaram aquilo que nós já sabíamos: o Bobi é o cão mais velho do mundo.
Como é que tem lidado com o mediatismo visto que o Bobi ficou conhecido nos quatro cantos do mundo?
Confesso que essa é uma parte que não esperava. Quando fiz a inscrição no Guiness no ano passado, já sabia que o Bobi era o cão mais velho de Portugal, visto que ele está registado.
Agora nunca imaginei esta dimensão. Sabia que provavelmente ia ter destaque no Guiness, talvez nas redes sociais, mas apenas isso. Vivemos numa pequena aldeia, com cerca de 200 a 300 habitantes, isto para nós foi uma surpresa e não estávamos à espera de tanto impacto.
E não é fácil! Tento colaborar com todos ao máximo, sejam jornalistas ou pessoas mais curiosas, atualmente até estou a fazer uma lista de marcações porque há pessoas de Lisboa, do Porto, da Figueira da Foz que me têm contactado via redes sociais. Por isso, tento colaborar ao máximo, tenho muito orgulho que queiram ver o Bobi porque ao vê-lo, podem também ver a família que o criou.
"Vivemos numa pequena aldeia, com cerca de 200 a 300 habitantes, isto para nós foi uma surpresa e não estávamos à espera de tanto impacto"

Como se está a adaptar o Bobi ao mediatismo?
Ele gosta muito de pessoas e de contacto. Aliás qualquer jornalista que já cá tenha vindo pode comprovar que o Bobi adora festinhas e miminhos. Para ele toda esta agitação até tem sido uma festa, nós olhámos para ele e vemos que ele está feliz com pessoas em casa. Por outro lado, está a ter o reverso da medalha tenho notado nele um cansaço que não é habitual. O ato de sentar e levantar repetidamente para as fotografias acaba por cansá-lo.
"O Bobi adora festinhas e miminhos"
Portanto, tem o lado bom que é a felicidade para o Bobi, mas por outro lado é a saúde dele que pode ser colocada em causa de certa forma. Tento controlar da melhor forma para que as pessoas consigam ir realizar o seu trabalho, mas de facto reparo que ele está a ficar cansado desta situação porque já o custa.
Por isso, tento orientar da melhor forma possível e volto a dizer que tenho muito orgulho em que as pessoas possam tirar uma fotografia com o Bobi com os diplomas do Guiness, que é o que a maioria das pessoas procura. No entanto, temos de colocar a saúde do Bobi em primeiro lugar.
"Portanto, tem o lado bom que é a felicidade para o Bobi, mas por outro lado é a saúde dele que pode ser colocada em causa de certa forma"
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