As ferramentas do famoso psiquiatra e escritor brasileiro para transformar a casa num lugar mais saudável para viver melhor.
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Augusto Cury
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A casa já não é apenas um dormitório, a casa é o pilar da nossa existência. Um porto de abrigo, um espaço onde criamos memórias, recarregamos energias ou até trabalhamos. E por isso a relação entre a gestão da emoção, saúde mental, e a casa onde vivemos, é mais profunda do que imaginamos. Ter uma casa, por si só, não nos faz mais felizes ou garante qualidade de vida, até porque “há muitos miseráveis a viver em palácios”, segundo o psiquiatra e escritor brasileiro Augusto Cury. Em entrevista ao idealista/news, o cientista diz que, na sua opinião, “estamos diante da geração mais triste de sempre”, de uma sociedade cada vez mais pobre emocionalmente, sendo fundamental travar este “grave” problema. E o imobiliário pode ser parte da solução.

Mas o que é que o imobiliário tem que ver com a gestão da emoção? Tudo. E prova disso é o programa Gestão da Emoção - “Mentes Saudáveis e Lares Felizes” lançado pelo psiquiatra recentemente, em parceria com a FGR Incorporações – uma promotora brasileira –, e com curadoria do especialista em mercado imobiliário Marcus Araujo. O programa é voltado para o mundo imobiliário com a finalidade de revolucionar e melhorar as relações entre os membros de uma mesma família, e entre amigos e vizinhos numa mesma comunidade. Num primeiro momento, será aplicado nos empreendimentos da promotora, e todos os clientes vão receber um curso para construir relações saudáveis.

A ideia de criar este programa partiu da observação de que “a Humanidade está a adoecer rápido e coletivamente, e os números são dramáticos”, segundo explicou o psiquiatra ao idealista/news à margem do evento SIMM! Lisboa 2022, realizado esta segunda-feira, 12 de setembro. “Uma em cada duas pessoas, ou mais de 3 bilhões e meio de seres humanos tem ou vai desenvolver um transtorno psiquiátrico no futuro”, refere.

gestão de emoções
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Por que é que a casa nem sempre é sinónimo de felicidade?

Para Augusto Cury, “na era dos mendigos emocionais”, muitas pessoas apostam tudo na compra de uma casa, acreditando que esse será o “momento”, o ponto de viragem, contudo, no dia seguinte os problemas de base continuam – e é preciso resolvê-los na raíz. “De que adianta às pessoas assinarem um contrato para a compra de uma casa ou apartamento, para viverem aparentemente felizes, se no dia a seguir acabam por tornar-se predadores emocionais uns dos outros? Por isso nasceu o primeiro programa mundial de Gestão da Emoção - “Mentes Saudáveis, Lares Felizes”, explica.

“Muitos clientes de imobiliário têm uma boa residência. Têm cama, mas não dormem, têm mesa farta, mas são desnutridos emocionalmente. Discutem demais uns com os outros. Pais que não comunicam com os filhos; casais que também não perguntam um para o outro: quais são os teus sonhos? Onde é que eu não consegui ajudar-te a tornares-te autor ou autora da tua própria história? As pessoas estão magérrimas, portanto, emocionalmente. Têm alimento sobre a mesa, mas emocionalmente mendigam o pão da alegria e, além disso, digladeiam-se por coisas tolas: roupa molhada em cima da cama, cabelo em cima do espelho... Às vezes, por pequenas diferenças de comportamento. Isso é algo grave”, acrescenta.

Como transformar a casa num lugar melhor para viver

Augusto Cury distingue gestão da emoção de inteligência emocional. Para o psiquiatra, a inteligência emocional – um termo perpetuado em todo o mundo – não existe. E porquê? Porque a emoção não é inteligente, a emoção é imatura, e é preciso entendê-la, assim como dar-lhe espaço. E relembra: “A vida é um grande contrato de risco. E mesmo quando nos esmaga, há sempre a procura pela superação”, defende o psiquiatra.

casas saudáveis
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Para o professor e escritor brasileiro, a educação ensina-nos desde muito cedo a conhecer melhor o planeta físico, mas a compreender muito pouco o planeta emoção. Algo que, a seu ver, é fundamental. Augusto Cury considera que vivemos “intoxicados”, que na nossa mente “há mais lixo que no mundo todo”, daí ser tão importante aprender ferramentas mínimas de gestão da emoção para viver melhor e “não sermos carrascos de nós mesmos”. “Nas redes sociais estamos na era do cancelamento, na era da felicidade artificial, do recorte da realidade. E é fundamental utilizar essas ferramentas”, acrescenta, apontando estratégias para viver melhor e mais feliz dentro de casa - uma vez que "a casa protege-nos, mas não de nós mesmos".

As técnicas de Augusto Cury para criar lares saudáveis:

  1. A técnica DCD (duvidar, criticar e determinar): duvidar de tudo aquilo que nos controla; criticar cada ideia perturbadora e cada emoção angustiante; e determinar ou decidir, ser gestor da emoção, viver uma vida mais leve, namorar a vida;
  2. Ser um consumidor emocional responsável: não comprar ofensas, mágoas, críticas injustas que nós não causamos, ou seja, não comprar aquilo que não nos pertence;
  3. A minha paz vale ouro, o resto é lixo: eu não posso vendê-la por nada nem niguém;
  4. A mesa redonda do “Eu”: o “Eu” nosso, que representa a capacidade de escolha e a consciência crítica; é preciso criticar, confrontar, impugnar tudo aquilo que é lixo mental, para reciclar esse lixo e transformar em adubo para que possamos desenvolver a primavera emocional, o prazer de viver, o encanto pela vida e nos tornarmos mais pensadores.

De acordo com o especialista, também estamos demasiado expostos à tecnologia e às redes sociais. E essa superexposição tem consquências nas relações sociais. “As consequências são gravíssimas. As redes sociais mexem com o ciclo da dopamina e da serotonina, gerando uma dependência ao nível de drogas estimulantes, isto é, desenvolve-se uma dependência psicológica”, defende.

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As consequências da “intoxicação digital”

“Se tirarmos um telemóvel a um adolescente ou um pré adolescente, depois de três a quatro horas aparece a síndrome de abstinência: irritabilidade, angústia, vazio existencial, aversão ao tédio, ansiedade e, muitas vezes, insónia, que são sintomas de quando uma pessoa usa uma droga estimulante como a cocaína, que só que aparecem depois de 24 a 48 horas – já o telemóvel aparece depois de algumas horas”, frisa o psiquiatra, para quem a “intoxicação digital é muito grave”.

Segundo Agusto Cury, uma criança de sete anos de idade “tem mais informações que o imperador romano tinha no auge de Roma”. “Isso acelera a mente e leva as crianças e adolescentes, bem como os adultos, a viver agitados, inquietos, sofrerem por antecipação, ruminar em perdas, mágoas e frustrações, trabalharem muito mal as suas contrariedades, défice memória, défice de concentração, inclusive acordar cansado”.

É importante aprender, por isso, a gerir a emoção. “Os pais deveriam falar das suas lágrimas para os seus filhos aprenderem a chorar as deles; os professores deveriam falar dos seus fracassos e dificuldades para que os seus alunos entendam que quem vence sem riscos, triunfa sem glórias. Nós temos que, de facto, apostar na gestão da emoção não apenas no mundo das grandes construtoras, mas também na educação e desde cedo”, remata o psiquiatra.

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