
A ideia de ressuscitar o movimento cooperativo parece estar a ganhar força em Portugal, sendo esta uma solução a ter em conta para aumentar a oferta de habitação no país, nomeadamente a preços comportáveis pela generalidade das pessoas. Isso mesmo indica, em entrevista ao idealista/news, Francisco Rocha Antunes, fundador e presidente executivo da MOME, gestora profissional de cooperativas de habitação que está a apostar, para já, na região do Grande Porto. “As cooperativas aumentam a oferta de habitação a preços mais acessíveis, permitindo que um maior número de pessoas tenha acesso a uma habitação própria”, conta.
Salientando que “o modelo cooperativo tem como grande objetivo a compra de casa a preço de custo”, o responsável adianta que o compromisso da MOME “em relação aos valores das casas é que fiquem 20% abaixo do valor do mercado onde estão inseridas”.
São dois os projetos que a empresa está neste momento a desenvolver: o Pedras.coop, em Lavadores, Vila Nova de Gaia, e o Hera.coop, no Carvalhido, Porto. “Representam um investimento de cerca de 40 milhões de euros, num total de 60 fogos, e ficarão concluídos em 2025 e 2026, respetivamente”, revela Francisco Rocha Antunes, levantando um pouco o véu sobre futuros investimentos e projetos: “Num horizonte de cinco anos, visamos construir cerca de 1.500 novas casas, dinamizando entre quatro e cinco novas cooperativas por ano a partir de 2024, num total de investimento cooperativo de 700 milhões de euros”.
A solução de apostar em modelos cooperativos no segmento residencial também não parece estar a passar ao lado do Governo, tendo a ministra da Habitação, Marina Gonçalves, referido recentemente que o Governo ainda está a desenhar a linha de financiamento para as cooperativas, sendo que “a ideia é que seja bonificada”. Sobre este tema, o fundador e presidente executivo da MOME – é também Chair do Urban Land Institute (ULI) Portugal – diz que tem estado atento “ao desenvolvimento do programa Mais Habitação”, mas refere que ainda não conseguiu “perceber em concreto o que o Governo pretende fazer especificamente sobre as cooperativas”.

A MOME nasceu em 2021, em plena pandemia. Que balanço faz da atividade da empresa?
A dimensão global do desafio da habitação determina que ao longo dos tempos se tenham definido e testado soluções diferentes e ajustadas a cada contexto histórico, tecnológico, social e cultural. O conhecimento do que melhor se faz pelo mundo permite-nos estruturar soluções e modelos de articulação de parceiros ajustados aos desafios e às realidades locais das zonas em que desenvolvemos projetos. O modelo cooperativo cria, assim, oportunidades de transferir para uma maioria de pessoas vantagens que se materializam na possibilidade de adquirir casa a preço de custo, num processo em que dispõem de acesso total ao mecanismo de formação de preço da sua casa.
Numa altura em que a habitação é um dos principais problemas enfrentados pelos portugueses (e não só), acreditamos que a nossa proposta de valor pode ser uma verdadeira solução, apresentando habitações de qualidade a preço de custo. Colocamos as pessoas no centro das soluções, criando condições para que mais pessoas possam ter casas desenhadas e pensadas para elas. É nosso objetivo contribuir para a transformação das comunidades de forma a alcançar uma vivência coletiva urbana sustentável.
Até agora, temos sido recebidos pelo mercado de forma positiva e queremos continuar a trajetória de crescimento e melhorar a eficiência dos processos e a capacidade de acrescentar valor aos projetos já em desenvolvimento e aos outros que temos no horizonte.
A MOME “destaca-se por projetar, desenvolver e construir soluções de habitação funcionais, confortáveis e ecológicas, a preço de custo”. Como é que isto é possível?
O modelo cooperativo tem como grande objetivo a compra de casa a preço de custo. Sem intermediários, conseguimos disponibilizar às pessoas a melhor versão possível de uma habitação, ao melhor custo. O processo da MOME é de grande eficiência no tempo, custo e escala. O primeiro passo é a montagem: a MOME identifica um terreno, desenvolve e contrata os projetos de arquitetura e de especialidades e também a empreitada. Nesta fase, garantimos o estudo de mercado, a submissão do licenciamento e todos os projetos necessários para que isso seja possível. Garantimos, ainda, o financiamento à construção e a calendarização do desenvolvimento da cooperativa. Nesse seguimento, a cooperativa é formalmente constituída.
Segue-se a fase de adesão, em que os interessados submetem uma proposta de adesão simples que nos permite analisar a viabilidade financeira de cada candidato para o projeto em que se está a inscrever. Através do nosso site, qualquer pessoa pode solicitar a sua pré-adesão para agendar uma sessão com a nossa equipa e ficar a conhecer todos os detalhes. Assim que a cooperativa tiver reunido todos os cooperadores, inicia-se a construção.
"Numa altura em que a habitação é um dos principais problemas enfrentados pelos portugueses (e não só), acreditamos que a nossa proposta de valor pode ser uma verdadeira solução, apresentando habitações de qualidade a preço de custo. (...) É nosso objetivo contribuir para a transformação das comunidades de forma a alcançar uma vivência coletiva urbana sustentável"
Depois, decorre a construção das casas. O tempo de construção dependerá sempre do projeto e da definição do calendário. Os cooperadores poderão acompanhar o desenvolvimento da obra com visitas agendadas e também através de atualizações no site. Assim que as obras são concluídas, o último passo é a entrega das habitações aos cooperadores. A MOME fará todo o desenvolvimento do processo para que a escritura definitiva das habitações seja realizada.
O processo de desenvolvimento imobiliário é feito procurando sempre reduzir progressivamente o impacto de carbono das construções, através de uma procura sistemática das soluções mais sustentáveis em cada parte desse processo.

Fale-nos um pouco sobre os projetos que a MOME está a desenvolver, em Gaia e no Porto.
Os primeiros projetos – Pedras.coop, em Lavadores, Vila Nova de Gaia, e Hera.coop, no Carvalhido, Porto – já estão em desenvolvimento, representam um investimento de cerca de 40 milhões de euros, num total de 60 fogos, e ficarão concluídos em 2025 e 2026, respetivamente. O nosso compromisso em relação aos valores das casas é que fiquem 20% abaixo do valor do mercado onde estão inseridas.
No caso da Pedras.coop, estamos a falar de uma zona em que uma moradia equivalente à que estamos a desenvolver custa cerca de um milhão de euros. O nosso objetivo é que o preço de venda seja 20% abaixo do valor de mercado quando abrimos as adesões.
No caso da Hera.coop, o objetivo é o mesmo: colocar as habitações à disposição dos cooperadores 20% abaixo do valor de mercado quando abrimos adesões.
"O nosso compromisso em relação aos valores das casas é que fiquem 20% abaixo do valor do mercado onde estão inseridas. (...) Num horizonte de cinco anos, visamos construir cerca de 1.500 novas casas, dinamizando entre quatro e cinco novas cooperativas por ano a partir de 2024, num total de investimento cooperativo de 700 milhões de euros"
A MOME pretende dinamizar cinco novas cooperativas por ano a partir de 2024. O que pode adiantar sobre estes projetos?
Num horizonte de cinco anos, visamos construir cerca de 1.500 novas casas, dinamizando entre quatro e cinco novas cooperativas por ano a partir de 2024, num total de investimento cooperativo de 700 milhões de euros. Nesta primeira fase do projeto, estaremos apenas concentrados em desenvolver cooperativas de habitação na região do Porto, em locais ainda a ser definidos. Iniciámos um processo de análise sistemática dos terrenos disponíveis para edificação para assegurarmos que temos a capacidade de cumprir esses objetivos.

Até onde vão as ambições da MOME?
Para já, queremos e estamos a desenvolver cooperativas de habitação somente na região do Porto, mas não excluímos expandir os nossos serviços a outros pontos do país no futuro. Também não colocamos de parte a implementação de outras formas de organização, já que o modelo que estamos a desenvolver se aplica a todos os segmentos.
"(...) Queremos, sobretudo, ser uma solução e dar às pessoas acesso à melhor versão da sua casa, dentro das suas capacidades financeiras, e criar condições para que mais pessoas possam ter casas desenhadas e pensadas para elas"
Neste momento, queremos, sobretudo, ser uma solução e dar às pessoas acesso à melhor versão da sua casa, dentro das suas capacidades financeiras, e criar condições para que mais pessoas possam ter casas desenhadas e pensadas para elas. A longo prazo, temos como objetivo contribuir para acelerar a mudança da sociedade para uma vivência coletiva urbana mais sustentável.
Que importância têm as cooperativas e este modelo de negócio para aumentar a oferta de habitação em Portugal, nomeadamente para a classe média portuguesa?
As cooperativas têm uma importância significativa na oferta de habitação em Portugal não só para a classe média, mas também todas as outras, pois fornecem uma alternativa viável às opções tradicionais de aquisição de habitação. Este modelo de negócio pode, por isso, ser parte importante do caminho, permitindo que várias pessoas se associem para construir uma habitação em conjunto, dividindo os custos e os benefícios do investimento e beneficiando do efeito de escala que essa associação traz. O modelo cooperativo permite encarar a série de custos indispensáveis para se fazerem casas de forma racional e aberta, uma vez que apenas se somam os custos de desenvolvimento das casas, eliminando a necessidade de remunerar os capitais investidos, uma vez que cada cooperador investe diretamente na sua casa.
"As cooperativas têm uma importância significativa na oferta de habitação em Portugal não só para a classe média, mas também todas as outras, pois fornecem uma alternativa viável às opções tradicionais de aquisição de habitação. (...) As cooperativas aumentam a oferta de habitação a preços mais acessíveis (...)"
Desta forma, as cooperativas aumentam a oferta de habitação a preços mais acessíveis, permitindo que um maior número de pessoas tenha acesso a uma habitação própria. Além disso, a participação dos cooperadores no processo de construção e administração da habitação fomenta a responsabilidade coletiva e a solidariedade entre os participantes, tornando a compra da mesma mais informada, transparente e consciente dos desafios de construir casas adaptadas aos novos tempos.
Como as casas são a preço de custo, há pessoas que pensam que as cooperativas de habitação só servem as necessidades de quem não tem rendimentos elevados, o que não faz sentido. Independentemente da capacidade financeira de cada pessoa ou família, a poupança e utilização eficiente do seu rendimento é algo que serve todas as pessoas. O modelo cooperativo permite que as pessoas comprem a melhor casa possível a preço de custo, independentemente da sua capacidade financeira. Se as poupanças rondam cerca de 20%, isso significa que uma família poderá ou poupar esse montante e ter mais dinheiro disponível ou viver numa casa com um valor 20% acima do que normalmente poderia. Este é um raciocínio que serve tanto pessoas com baixos rendimentos como pessoas com outros rendimentos.
"Embora as cooperativas sejam uma opção viável para a oferta de habitação, não são o único caminho a seguir (...)"
Embora as cooperativas sejam uma opção viável para a oferta de habitação, não são o único caminho a seguir. É necessário um esforço conjunto por parte do setor público e privado para encontrar soluções sustentáveis e eficazes na oferta de habitação em Portugal, que atendam às necessidades da população em geral.

O Governo parece estar também mais atento, através do Mais Habitação, às cooperativas de habitação. Estão abertos a colaborar com o Governo?
Tendo em conta o panorama atual da habitação, temos estado atentos ao desenvolvimento do programa Mais Habitação, mas ainda não conseguimos perceber em concreto o que o Governo pretende fazer especificamente sobre as cooperativas.
Estamos sempre abertos à colaboração com todas as entidades do Estado Central e Local, mas para já temos estado concentrados a analisar os planos de ordenamento territorial para percebermos quais as localizações que terão mais interesse para o desenvolvimento de projetos habitacionais.
O que distingue as casas da MOME das restantes existentes no mercado?
A nossa solução resulta em habitações bem construídas, funcionais, confortáveis e ecológicas, com garantia de durabilidade e, acima de tudo, a preço de custo. Graças a mais de 30 anos de experiência da nossa equipa no desenvolvimento de projetos imobiliários, agregamos cooperadores numa economia de escala que dá acesso aos melhores profissionais e ao melhor talento na arquitetura, engenharia, construção e gestão.
"Temos estado atentos ao desenvolvimento do programa Mais Habitação, mas ainda não conseguimos perceber em concreto o que o Governo pretende fazer especificamente sobre as cooperativas"
Profissionalizando, de forma pioneira, a gestão de cooperativas de habitação, a MOME presta um conjunto alargado de serviços técnicos especializados em todos os aspetos que envolvem a criação de uma habitação, tais como projeto, licenciamento, financiamento, construção ou escritura. A empresa fica responsável, assim, por todas as fases do projeto, desde a conceção à escritura de cada unidade – incluindo as etapas de montagem, análise de candidaturas e adesão, construção e entrega –, facilitando todos os passos e burocracias necessárias. Acresce todo o portfólio de experiência e fiabilidade comprovada, sendo a MOME uma participada da +urbano, empresa com elevada experiência no desenvolvimento de projetos imobiliários de referência no Porto e norte de Portugal. Aqui, destaque-se, a título de exemplo, a coordenação do processo de restauro e modernização do Mercado do Bolhão, o Passeio dos Clérigos, o Quarteirão D. João I, o projeto Via Rápida-Viso ou a fábrica ASA, em Guimarães.

São casas que têm em conta os requisitos mais procurados no pós-pandemia (mais varandas, espaços para escritórios etc.)?
Claramente. No caso da Pedras.coop, temos casas com uma entrada ampla por um pátio, que a define e mantém uma relação de multifuncionalidade com a garagem, cozinha e sala de jantar. Esse pátio pode ser um espaço de refeição, de estar, ou de apoio às divisões. O interior das casas convida ao convívio familiar. A cozinha, elemento central, feita em harmonia com a zona de jantar, está pensada para o dia a dia das famílias contemporâneas. Essa área flui para as zonas de estar, onde conseguem relaxar sem nunca perder de vista o frenesim da zona de refeições. A casa é transparente. No piso superior, encontram-se três ou quatro suites, ligadas por um corredor cheio de luz. Com a privacidade que as suites permitem, com exposição solar variada e vistas verdes, beneficiam de toda a calma necessária para um bom descanso.
Relativamente às principais caraterísticas técnicas do empreendimento, sublinhe-se que já são NZEB – Nearly Zero-Energy Buildings, ou seja, edifícios com emissões quase nulas e com um desempenho energético muito elevado –, e mesmo a pouca energia de que precisam é maioritariamente proveniente de fontes renováveis produzidas no local de consumo.
"Acreditamos que a progressiva adoção dos métodos modernos de construção, com uma crescente produção de componentes fora do local das obras, irá contribuir para que as casas sejam mais sustentáveis sem implicar que sejam mais caras por isso"
No projeto Hera.coop, numa fase mais embrionária, iremos ter pequenos blocos de apartamentos com objetivos de descarbonização muito ambiciosos e que incorporam formas passivas de redução significativa de consumo de energia mantendo elevados níveis de conforto térmico.
Sustentabilidade é crucial também para a MOME. Como é que se constroem casas sustentáveis e 20% abaixo do preço do mercado?
A procura das melhores formas de construir com uma sucessiva redução do impacto de carbono é possível recorrendo a projetistas que tenham o mesmo entendimento do que deve ser o processo de construção e colaborando com as empresas de construção que já iniciaram o seu próprio percurso de descarbonização.
A progressiva digitalização de todo o processo permite ir aumentando o rigor e a eficiência dos métodos de trabalho, otimizando toda a cadeia de criação de valor.
Acreditamos que a progressiva adoção dos métodos modernos de construção, com uma crescente produção de componentes fora do local das obras, irá contribuir para que as casas sejam mais sustentáveis sem implicar que sejam mais caras por isso.

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