Numa altura em que o Governo está a rever o simplex, vários especialistas apontam caminhos de melhoria no 2.º dia da SRU Porto.
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Simplex urbanístico
Moderadora; Rui Lima, sócio Morais Leitão; Pedro Baganha, Ex-Vereador do Urbanismo da CM Porto; Rui d’Ávila, GFH; Manuel Maria Gonçalves, CEO APPII | Créditos: Vida Imobiliária Flickr

O imobiliário português continua à espera de medidas que simplifiquem o licenciamento, com o atual Simplex Urbanístico a ser apontado como instrumento central, mas ainda insuficiente para resolver problemas estruturais. Durante a XIII Semana da Reabilitação Urbana do Porto (SRU), vários especialistas em construção, urbanismo e habitação debateram os entraves do atual processo de licenciamento e apontaram caminhos para tornar a regulação mais eficiente, numa altura em que o Governo está preparar uma profunda reformulação deste regime. E deixaram um aviso: as mudanças legais, por si só, não chegam.

Após as novidades dadas pelo ministro das Infraestruturas e da Habitação, Miguel Pinto Luz, no arranque da XIII Semana da Reabilitação Urbana, o segundo dia (quinta-feira, 13 de novembro) ficou marcado pelas reações ao atual Simplex Urbanístico, em vigor há mais de um ano e meio. Segundo os intervenientes, o conjunto de medidas foi criado com o propósito de agilizar processos e reduzir burocracias, mas acabou por não resolver questões estruturais relacionadas com o planeamento urbano e com a articulação entre entidades públicas.

“O Simplex, até à sua próxima versão, não vai resolver os problemas de fundo", Fernando Santo, presidente do Conselho Estratégico da Construção, Imobiliário e Habitação da CIP

Apesar de reconhecer que houve uma evolução com o Simplex, Fernando Santo, presidente do Conselho Estratégico da Construção, Imobiliário e Habitação da Confederação Empresarial de Portugal (CIP), diz que o sistema atual ainda sofre de excesso de normas e responsabilidades dispersas. “Falar em termos de pareceres jurídicos divergentes é inevitável, temos mais de 15 entidades externas a intervir. Projetistas e empreiteiros enfrentam consequências graves e os promotores acabam por sofrer”, referiu.

“O Simplex, até à sua próxima versão, não vai resolver os problemas de fundo que estamos aqui a discutir”, afirmou o especialista no evento que conta com o idealista enquanto portal oficial. Para o Simplex Urbanístico 2.0, Fernando Santo defende medidas como harmonização dos regulamentos municipais, redução da intervenção das entidades externas e maior coordenação entre entidades públicas e municipais, para que a simplificação seja real e eficaz.

Na visão de Pedro Baganha, ex-vereador do Urbanismo da Câmara do Porto, a eficácia da nova versão do Simplex depende também da cultura administrativa local. “Sem uma cultura voltada para o desenvolvimento, as mudanças legais não resolvem o problema estrutural. A eficácia do Simplex depende da qualidade do planeamento territorial e da postura da máquina administrativa", defende.

Pedro Baganha
Pedro Baganha, Ex-Vereador do Urbanismo da Câmara Municipal do Porto | Créditos: Vida Imobiliária Flickr

Reduzir prazos? "Processos nas câmaras vão agravar-se"

A eficácia do licenciamento urbanístico depende tanto da clareza das regras, como da capacidade das autarquias de as aplicar de forma coordenada. Pedro Baganha destacou que “se hoje se debatem com dificuldade em cumprir os prazos e os requisitos que o Simplex trouxe para as autarquias, com a redução de prazos, os processos nas câmaras vão agravar-se”, evidenciando que os municípios com menos técnicos qualificados enfrentam desafios ainda maiores. 

Para o ex-vereador, aplicar prazos mais curtos sem reforço de recursos humanos transforma a promessa de simplificação em sobrecarga para as autarquias, tornando mais lenta a resposta administrativa e prejudicando o objetivo de acelerar os processos. “O Simplex resolve as consequências. Mas não está aí a causa do problema do sistema", reforça Pedro Baganha. 

Na sua perspetiva, a nova versão do Simplex, que deverá sair da gaveta do Governo em 2026, só terá efeito real se for acompanhada de planeamento territorial robusto e práticas administrativas bem estruturadas. Sem essas bases, a administração local tende a adotar uma postura defensiva, atrasando decisões para se proteger de possíveis falhas, o que reforça a necessidade de articular competências e responsabilidades entre técnicos e câmaras.

Essa articulação entre promotores, autarquias e entidades externas é central para que a simplificação dos licenciamentos urbanos funcione de facto. O sócio da Morais Leitão Rui Ribeiro Lima explica que “o que mudou foi a intermediação municipal – o termo de responsabilidade passou a ser comunicado diretamente, sem exigência de resposta da câmara, mas a obrigação legal permanece a mesma.” 

Simplex urbanístico
Fernando Santo, presidente do Conselho Estratégico da Construção, Imobiliário e Habitação da Confederação Empresarial de Portugal (CIP) participou nesta sessão por vídeochamada Créditos: Vida Imobiliária | Flickr

Digitalização dos licenciamentos: pode ser o caminho, mas não a solução

A digitalização do licenciamento urbano surge como um passo necessário para modernizar e uniformizar a gestão de processos. É isso que se pretende com a Plataforma Eletrónica de Procedimentos Urbanísticos (PEPU), transversal às 308 autarquias, que vai entrar em vigor no próximo ano. Mas os profissionais alertam que a digitalização sozinha também não resolve os problemas estruturais dos licenciamentos.

Rui Ribeiro Lima, sócio da Morais Leitão, explica que “a digitalização é irreversível (...), mas a articulação entre entidades públicas, redes e câmaras é essencial. A digitalização só será útil se resolver problemas de comunicação e reduzir entraves administrativos.” Ou seja, sem um alinhamento efetivo entre promotores e autarquias, a tecnologia corre o risco de não ter impacto real no terreno.

“[PEPU] é fundamental para acelerar o licenciamento e reduzir atrasos", Manuel Maria Gonçales, CEO da APPII

Nesse sentido, Manuel Maria Gonçalves, CEO da Associação Portuguesa de Promotores e Investidores Imobiliários (APPII), reforça que a esta plataforma única é “fundamental para acelerar o licenciamento e reduzir atrasos, mas só terá impacto se houver transparência e meritocracia, incluindo KPIs claros sobre tempos de resposta e taxas de pedidos incompletos.”

O alerta é reforçado por Rui d’Ávila, administrador da GFH, que lembra que “não se reduz prazos simplesmente no decreto. Os municípios têm que ter tempo para apreciar projetos, e os planos de urbanização são muitas vezes rígidos e antigos, exigindo mecanismos de flexibilidade.” Assim, a implementação eficaz da digitalização exige uma combinação entre tecnologia, cooperação institucional e atualização dos instrumentos legais, mostrando que a modernização administrativa depende tanto da cultura institucional, quanto da inovação digital.

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