
O julgamento do cartel da banca está agora suspenso e a aguardar esclarecimentos do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJEU), para que o Tribunal da Concorrência português possa proferir uma sentença final. E o Estado português optou por enviar algumas observações para Bruxelas sobre o processo em que os principais bancos portugueses recorreram às coimas de 225 milhões de euros aplicadas pela Autoridade da Concorrência (AdC) por partilha de informação sensível sobre crédito habitação durante dez anos. Nas notas enviadas ao tribunal europeu, o Governo admite que a troca de dados entre bancos permitiu “falsear a concorrência”.
Este caso está em julgamento desde outubro de 2021 pelo Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (TCRS), o qual deu como provada a existência de um conluio entre os bancos, havendo troca de informação sensível sobre o crédito habitação sem que isso se refletisse num benefício para as famílias. Mas diante das dúvidas se esta prática constituiu uma violação da concorrência por objeto, o Tribunal da Concorrência decidiu suspender o julgamento no passado dia 28 de abril, remetendo-o para o Tribunal de Justiça da União Europeia para que que fossem esclarecidas questões técnicas, tal como noticiou o idealista/news.
Quando o TJEU intervém neste tipo de casos, dando determinados esclarecimentos, o Governo pode pronunciar-se e apresentar observações escritas. E foi isso mesmo que o Executivo português fez, afirmando que os bancos “falsearam as condições de concorrência no mercado”, cita o Público.
A tomada de posição do Governo sobre o caso conhecido como cartel da banca vai ao encontro da avaliação da própria Autoridade da Concorrência (entidade independente do Estado) e do Tribunal da Concorrência, que deu como provado que os principais bancos do país trocavam informações de forma regular e concertada sobre as condições comerciais a aplicar nos créditos habitação, ao consumo e às empresas, nomeadamente sobre os spreads aplicados e as variáveis de risco. Esta troca de informação sensível entre as entidades bancárias decorreu durante dez anos, de 2002 a 2013.
Para o Governo, que enviou as observações ao TJUE através do Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE), as condições comerciais dos créditos não estavam disponíveis publicamente, pelo que, sem partilha de informação, os bancos não teriam acesso aos dados dos concorrentes e as “decisões não seriam as mesmas”, refere o mesmo jornal. Estes dados valiam ouro especialmente num momento em que só a CGD, o BCP, o antigo BES e o BPI representavam mais de 70% da oferta de crédito habitação, sublinha o Estado português. Neste contexto, a partilha de informação tinha “um elevado potencial colusivo”, porque permitia “alinhar e ajustar permanentemente os comportamentos” dos bancos.
Em resumo, esta troca de informação entre bancos “permitiu não só atenuar o grau de incerteza quanto ao funcionamento do mercado, como também falsear a concorrência”, afirmou o Estado citado pela mesma publicação.

Troca de informação é restrição da concorrência por objeto?
O que está em causa neste caso – e o que o Tribunal da Concorrência quer ver esclarecido pelo TJUE para tomar uma decisão – é se a troca de informação entre os bancos deve, ou não, ser qualificada com uma restrição da concorrência “por objeto”, ou seja, se esta prática teve ou não efeito sobre os consumidores.
Sobre este ponto, o Estado português admite que esta prática entre os bancos deve ser considerada uma “restrição por objeto à luz das linhas de orientação da Comissão [Europeia] sobre cooperação horizontal” entre empresas e à luz “da jurisprudência do Tribunal de Justiça”.
E também o procurador, Paulo Vieira, que acompanha o julgamento no Tribunal da Concorrência, refere que o Ministério Público “acompanha integralmente as razões e os fundamentos” apresentados pelo Governo, cita o mesmo jornal.
Em sua defesa, os bancos contestam que a prática seja considerada uma restrição da concorrência “por objeto”, por considerarem que a partilha de dados não foi grave o suficiente ao ponto de restringir a concorrência.
Agora, cabe ao TJUE esclarecer as questões técnicas enviadas pelo Tribunal da Concorrência sobre esta matéria. Embora seja o tribunal português a decidir se os bancos são condenados ou absolvidos na primeira instância, a interpretação de Bruxelas sobre o caso poderá ser decisiva.
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