A versão final do documento que saiu do Parlamento é diferente da proposta inicial do Governo. Explicamos as medidas com mais impacto para o setor.
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OE2021 aprovado: afinal o que vai mudar no imobiliário no próximo ano?
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Às portas de 2021, e num contexto de crise gerado pela pandemia da Covid-19, importa começar a preparar em força o próximo ano. O Orçamento do Estado para 2021 (OE 2021) foi, entretanto, aprovado no Parlamento e terá efeitos no imobiliário, verificando-se alterações com impacto tanto a nível das empresas como dos particulares. Explicamos agora as medidas que mais afetam o setor, com a ajuda de especialistas fiscais.

Após vários dias em debate e votações, foi aprovado, no passado dia 26 de novembro de 2020, o OE 2021 (documento oficial). Num contexto de incerteza conduzido pela pandemia Covid-19, o documento final não trouxe mudanças estruturais para o setor imobiliário, mas, ainda assim, verificam-se alterações com impacto tanto a nível das empresas como dos particulares, tal como analisa a PwC neste artigo preparado para o idealista/news.

Na linha do que tem acontecido nos últimos Orçamentos do Estado, foram apresentadas centenas de propostas de alteração à Proposta de Lei para o OE 2021 inicialmente apresentada pelo Governo, algumas das quais acomodadas no texto final da Lei do OE 2021.

Assim, conhecidas agora as propostas de alteração aprovadas, resta-nos perceber, então, qual o verdadeiro impacto do OE 2021 no setor imobiliário, pelo que abordaremos, de seguida, as medidas que nos parecem ter mais interesse e (algumas) consequências para este setor.

IMT na aquisição de Sociedades Anónimas com imóveis em Portugal

Uma das medidas mais comentadas, aquando da apresentação da Proposta de Lei do OE 20221, foi a sujeição a IMT na aquisição de, pelo menos, 75% do capital social de Sociedades Anónimas (ou quando o número de sócios se reduza a dois, casados ou unidos de facto), cujo ativo seja composto por mais de 50% por imóveis localizados em Portugal.

Conforme referido à data, esta nova norma continha, no entanto, importantes exceções, algo que não se verificava na norma já existente relativa às Sociedades por Quotas.

Ora, uma das propostas de alteração agora aprovada promove, precisamente, a uniformização das regras de tributação, em sede de IMT, para as diferentes formas jurídicas societárias.

Assim, deixa de existir distinção entre Sociedades por Quotas e Sociedades Anónimas, passando a estar apenas sujeitas a IMT, à taxa de 6,5%:

  • As aquisições de participações sociais em sociedades (não cotadas) cujo ativo seja constituído em mais de 50%, direta ou indiretamente, por bens imóveis localizados em Portugal;
  • Quando tais imóveis não se encontrem diretamente afetos a uma atividade agrícola, industrial ou comercial (à exceção da compra e venda de imóveis); e
  • Desde que por aquela aquisição, por amortização ou quaisquer outros factos, algum dos sócios fique a dispor de, pelo menos, 75 % do capital social (ou o número de sócios se reduza a dois casados ou unidos de facto).

Se, à primeira vista, esta medida parece vir revolucionar a tributação em sede de IMT na aquisição de Sociedades Anónimas que detenham imóveis em Portugal, na realidade, e tal como referido aquando da análise à Proposta de Lei do OE 2021, entende-se que o impacto não será significativo uma vez que está circunscrita a situações particulares, como imóveis não afetos a uma atividade (e.g., habitacionais de uso próprio) ou as sociedades cuja atividade consista na compra e venda de imóveis.

Aliás, com o alargamento das exceções para as Sociedades por Quotas, verifica-se, nestes casos, uma redução do âmbito de aplicação, e.g., a aquisição de mais de 75% do capital social de uma Sociedade por Quotas cujo ativo seja composto em mais de 50% de imóveis afetos a uma atividade comercial é, atualmente, sujeito a IMT, enquanto que a partir de 2021 deixará de o ser.

Parece-nos, ainda assim, de saudar a uniformização da norma a todos os tipos societários, evitando os dois pesos e duas medidas que inicialmente estavam previstos para Sociedades por Quotas e Sociedades Anónimas.

Detenções indiretas por entidades offshore

Na senda do combate (por via de uma tributação mais penalizadora) às sociedades que tenham domicílio fiscal em país, território ou região sujeito a um regime fiscal mais favorável (os denominados “offshores”), o OE 2021 também traz novidades.

Assim, uma das propostas de alteração aprovada, prevê que as isenções de compra para revenda e construção para venda deixam de se aplicar no caso de entidades dominadas ou controladas, direta ou indiretamente, por entidades residentes em territórios offshore.

Adicionalmente, alarga-se agora a aplicação das taxas agravadas de IMI e IMT (7,5% e 10%, respetivamente) para as situações de detenção indireta por sociedades offshore, i.e., no caso de imóveis detidos por uma entidade dominada ou controlada, direta ou indiretamente, por entidades residentes em territórios offshore. De notar que, atualmente, a aplicação das taxas agravadas apenas era aplicável no caso de investimento direto, i.e., quando as sociedades offshore detinham de forma direta imóveis em Portugal.

IMT na aquisição de imóveis detidos por sociedades

Umas das medidas que havia sido inicialmente incluída na Proposta de Lei para o OE 2021 e que não sofreu alterações, prende-se com a possibilidade de compensação de IMT aquando da transmissão de imóveis para a esfera dos sócios, acionistas ou participantes, quando estes já tinham suportado IMT aquando da aquisição das respetivas participações sociais ou unidades de participação.

Tal como comentado anteriormente, o alargamento da possibilidade de compensação a outras transmissões a título oneroso que não apenas no caso da dissolução dessas sociedades/ fundos (que é o que se encontra atualmente previsto) é uma boa medida, uma vez que elimina situações de dupla tributação que eram pouco compreensíveis.

Heranças

Outra medida que vale a pena notar e saudar (e que também já vem da Proposta de Lei para o OE 2021) está relacionada com a possibilidade de a isenção de IMI prevista para os prédios com Valor Patrimonial Tributário (VPT) igual ou inferior a € 66.500, de sujeitos passivos com rendimento bruto total do agregado familiar igual ou inferior a € 15.295, poder passar a ser aplicada à quota-parte dos herdeiros que cumpram os requisitos para a isenção, quando esses imóveis sejam detidos por heranças indivisas e afetos à habitação permanente dos herdeiros.

Antes, como agora, parece-nos ser uma medida simples, mas justa e eficaz.

Determinação do VPT dos terrenos para construção

Umas das novidades introduzidas pelas propostas apresentadas (e aprovadas) está relacionada com as regras de determinação do VPT dos terrenos para construção, que se encontram consagradas no artigo 45.º do Código do IMI.

Esta alteração tem um primeiro mérito que é o de, com a introdução expressa da forma de cálculo, clarificar e desmitificar algumas dúvidas de interpretação quanto à correta determinação do VPT dos terrenos para construção.

No entanto, há ainda uma outra alteração, mais de detalhe mas com alguma importância: a percentagem do valor das edificações autorizadas ou previstas com terreno incluído (um dos parâmetros da fórmula e que varia entre 15% e 45%) passa aplicar-se a toda a fórmula, situação que não acontece atualmente e que poderá levar a uma redução do VPT dos terrenos para construção.

Contudo, não podemos deixar de notar que é feita tábua rasa das discussões havidas (até em sede judicial) quanto à (in)aplicabilidade dos coeficientes de afetação e de localização aos terrenos para construção: a fórmula agora apresentada continua a considerá-los, pelo que a litigância a este respeito não está perto de terminar.

Afetação (e desafetação) de imóveis à atividade profissional/ empresarial

Se é verdade que a Proposta de Lei para o OE 2021 inicialmente apresentada previa a desoneração das transmissões de imóveis entre a esfera profissional/ empresarial e a esfera privada dos empresários (deixando de ser tributadas em sede de IRS, passando a mais-valia a ser apenas tributada, por regra, aquando da alienação do imóvel a terceiros), não é menos verdade que também criava algumas obrigações adicionais que, nalguns casos, poderia ter um impacto ainda mais penalizador para os contribuintes.

No entanto, desta fase de propostas de alteração, resultou um ajustamento dessas obrigações que, não as eliminando, tem pelo menos o mérito de as reduzir. Dada a pertinência do tema, o mesmo será desenvolvido em mais detalhe num novo artigo.

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Concluindo, não há como negar que o setor imobiliário teve, em Portugal, nos últimos tempos, um papel fundamental na atividade económica, pelo que um cenário de (alguma) acalmia fiscal no imobiliário poderá ter como vantagem não agitar demasiado as águas numa altura em que já existe alguma ondulação por força da (longa e persistente) pandemia Covid-19.

Apesar do momento excecional em que vivemos, parece-nos que o OE 2021 aposta as fichas na velha máxima que “depois da tempestade, vem a bonança” (mas sem fazer muito por isso), na esperança, quiçá, que a confiança dos investidores não seja defraudada e que o setor imobiliário, que se tem revelado um boa fonte de receita para o Estado, sobreviva de forma vitoriosa a mais um desafio.

*Diogo Gonçalves Pires / Jacinta Marques Santos, PwC

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