
Os empresários do setor da construção que realizam pequenos trabalhos de obras particulares vão ser o grande alvo de uma campanha de combate à clandestinidade que o regulador do setor vai lançar em breve. O presidente do Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção (IMPIC, antigo InCI), Fernando Silva, revela em entrevista ao idealista/news o objetivo deste plano de ação, que "ganha maior relevância com a força da reabilitação urbana".
A nova lei dos alvarás foi alvo de críticas, com os agentes do setor a dizerem, por exemplo, que incentivaria à clandestinidade. O que tem a dizer?
Efetivamente, esta lei traz algumas alterações de relevo, sendo que algumas delas resultam da aplicação do direito comunitário.
Um dos pontos que tem sido mais polémico é a introdução de diferentes licenças de construção para as empresas consoante exerçam obra pública ou particular. E é até com satisfação que, enquanto regulador, oiço o setor a queixar-se disto e a pedir mais regulação.
"Na obra pública mantém-se praticamente tudo, mas houve um abrandamento de requisitos no alvará de obra particular"
Como assim?
Na obra pública mantém-se tudo basicamente inalterado, mas houve, de fato, um abrandamento de requisitos no alvará de obra particular. Mas isto não deve ser visto de forma negativa porque não significa o abrandar da qualidade ou da exigência na obra particular.
O que esta lei diz é que o regulador no momento da emissão do alvará não vai ser tão exigente, mas depois no terreno tem que lá estar o técnico capaz para dirigir a obra.
Como vê hoje o setor do imobiliário? Está mais profissional?
Sim, sem dúvida, que o setor está hoje mais profissional. Há muito menos denúncias e participações ao regulador por infração às regras que regem esta atividade. Hoje em dia a clandestinidade é muito baixa.
E na construção? Há a fama de haver muitos patos bravos…
A construção foi dos setores mais afetados pela crise, mas as empresas do setor tiveram, em geral, uma capacidade de adaptação extraordinária.
As grandes construtoras de repente inverteram o seu negócio, internacionalizaram-se e hoje têm 60% a 80% do volume de negócios no estrangeiro.
Há casos em que não foi totalmente positivo, mas não deixa de demonstrar uma grande capacidade de reagir e procurar novos mercados porque a alternativa seria fechar e morrer.
Mas essa não é a única realidade…
Sim, é verdade que o nosso tecido empresarial, em mais de 80%, são micro, pequenas e médias empresas. E aí o que posso dizer é que o ajustamento foi feito. Por exemplo, ao nível dos alvarás, nos últimos quatro anos perdemos mais de 20% das empresas. E nos títulos de registos chegámos a ter 40.000 empresários com título de registo e hoje andamos nos vinte e picos mil.
"Nos últimos quatro anos perdemos mais de 20% das empresas de construção. Nos títulos de registos hoje andamos nos vinte mil"
Mas atenção porque há duas realidades: empresas que desapareceram mesmo de um dia para o outro porque deixaram de ter negócio, mas também há outras que de um dia para o outro estão a voltar à atividade, fruto por exemplo da reabilitação urbana.
E estão a aparecer pequenas empresas com mais capacidades e técnicos altamente qualificados. Isto é altamente positivo porque é a tal reestruturação que a crise potenciou.
E essas empresas de desapareceram mesmo ou está a voltar a aumentar o nível de clandestinidade?
A clandestinidade é uma matéria que o instituto vai querer resolver nos próximos tempos, porque há uma área onde há trabalho a fazer que é ao nível do trabalhador individual, do pintor, do canalizador, do ladrilhador, por exemplo, que atuam a título individual, sem uma estrutura empresarial montada. Este trabalhador tem que estar licenciado e muitas vezes não está.
A clandestinidade é a esse nível, já não é ao nível da empresa com alvará. Nesses casos, as obras que fazem já é de uma certa dimensão e controlo acaba por ser feito pelos próprios pares. As empresas que estão licenciadas e funcionam bem não querem concorrer no mercado com empresas que não estão.
"A clandestinidade é uma matéria que o instituto vai querer resolver nos próximos tempos"
Além disso, as nossas equipas andam no terreno e as entidades licenciadoras, como as autarquias, têm a obrigação de nos comunicar as obras e estaleiros clandestinos que encontrem e esse trabalho está a ser feito.
Como é que se combate esta situação?
De duas formas: com uma campanha contra a clandestinidade que vamos fazer nos próximos tempos na comunicação social e com um aperto do controlo cruzado.
Os meios tecnológicos e os sistemas de informação permitem fazê-lo, nomeadamente com o Registo Nacional de Pessoas Coletivas e as bases de dados da administração fiscal.
Quais as consequências para os profissionais que forem encontrados com atividade aberta nas Finanças, mas sem registo no regulador?
Num primeiro momento vamos dar-lhes um prazo para se registarem e depois disso atuar conforme previsto na lei.
Esta fiscalização ganha maior relevância neste momento em que a reabilitação está em força?
Sem dúvida que o combate à clandestinidade nos empresários que fazem pequenos trabalhos é mais premente agora, numa altura em que os obras de construção, nomeadamente as particulares, são de pequena dimensão, e muitas delas nem serem sequer são sujeitas a licenciamento municipal, ou comunicação prévia, e portanto quase clandestinas.
O que explica que estes empresários não estejam registados no regulador?
Não entendo. A taxa é de 100 euros no primeiro ano de atividade e 35 euros nos anos subsequentes. E não estão sequer em causa aspetos burocráticos porque é um registo muito simples que se faz na hora. O regulador emite alvarás da classe 1 e títulos de registo que agora na nova lei se chamam certificados de empreiteiros de obra particular ou pública.
"O registo dos empresários no regulador é muito simples e faz-se na hora"
Os requisitos de acesso à atividade resumem-se ao registo criminal para que se faça prova de que o indivíduo é comercialmente idóneo e um seguro de responsabilidade civil ,que penso que todos os empresários que andam nesta atividade têm de ter.
Em alguns tipos de trabalho é exigida uma formação complementar ou uma certificação complementar, como um eletricista ou técnico de telecomunicações, que também têm que estar registados noutros reguladores.
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