
Imagens de famílias inteiras com mochilas às costas invadem os ecrãs. Pais, mães, filhos, avós, animais de estimação, mas principalmente mulheres e crianças. Mais de um milhão de refugiados, segundo dados oficiais do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), fugiram da Guerra na Ucrânia, no período de uma semana - desde que estalou o conflito armado pela mão da Rússia, no dia 24 de fevereiro de 2022. E isto é só o princípio, temem as autoridades internacionais. A Comissão Europeia admite sete milhões de potenciais refugiados. Sabe como ajudar a Ucrânia aqui.
São cidadãos que deixam vidas inteiras para trás e aventuram-se a passar a fronteira com os poucos bens que conseguem transportar - sendo o transporte terrestre a principal rota de fuga desde que o espaço aéreo foi fechado com o início da invasão. E a Ukrzaliznytsia, a empresa que gere a rede de comboios com destinos internacionais desde a Ucrânia, pediu esta quarta-feira o estabelecimento de um corredor humanitário seguro para continuar a evacuação de civis.
Estas pessoas rumam ao ocidente, em busca de segurança. E Portugal é um dos países europeus que dá sinais de estar pronto para os abraçar. Multiplicam-se as iniciativas públicas e privadas para acolher as famílias que fogem do conflito armado entre a Rússia e a Ucrânia. E quais é que abrem a porta de casa e criam alojamento para estes refugiados da guerra? Foi o que o idealista/news procurou saber junto de várias.
Os movimentos que têm surgido pela Europa e pelo mundo convergem, de momento, num único sentido: apoiar a Ucrânia e o seu povo. Ouvem-se gritos desde vários países – inclusive por parte de russos – pedindo o cessar-fogo imediato deste conflito, que tem deixado um rasto de destruição pelas ruas, praças, monumentos, edifícios e habitações. Esta mesma noite registou-se um incêndio na maior central nuclear da Europa, em Zaporiyia, provocado por um ataque russo. E, em reação a tudo isto, multiplicam-se as mensagens de apoio à Ucrânia e as iniciativas desenhadas para ajudar as famílias que decidem ficar no país, mas também as que escolhem sair em busca de paz. Porque ir também é um ato de coragem.

A onda de solidariedade aos refugiados da guerra na Ucrânia desde Portugal
Já são várias iniciativas de resposta humanitária em curso em Portugal - aqui reunimos alguns movimentos orientados por organizações não governamentais que estão a receber donativos de todos os que pretendem dar a mão à Ucrânia.
O próprio Governo, esta terça-feira, dia 1 de março de 2022, publicou em Diário da República uma resolução que concede proteção temporária a pessoas deslocadas da Ucrânia e que simplifica o processo de regularização legal destas pessoas no país. Isto quer dizer que, segundo anunciou a ministra da Segurança Social citada pela CNN Portugal, será atribuído de imediato a estes cidadãos o número de utente do Serviço Nacional de Saúde, número da Segurança Social e Número de Identificação Fiscal (NIF).
Esta não foi a única medida pública desenhada: o Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) criou uma "task-force" para acompanhar estas famílias a conseguir alojamento e emprego. E os dados recolhidos até esse mesmo dia indicam que Portugal tem capacidade para acolher 1.245 pessoas. Como o indicador registou uma “evolução muito significativa” de um dia para o outro, tal como referiu a ministra de Estado e da Presidência, prevê-se que o número de alojamentos disponíveis seja já superior. Até porque, segundo Mariana Vieira da Silva, o Governo está a "trabalhar com diversas instituições, com as câmaras e com a sociedade civil para ter uma lista de alojamentos disponível", disse citada pela Lusa.

Quais as iniciativas privadas que estão a dar casas às famílias refugiadas?
A Europa está unida para ajudar estas pessoas vindas da Ucrânia. E são vários os movimentos sociais e privados que têm surgido para dar resposta a uma necessidade imediata destas pessoas: ter o conforto de um teto e segurança que uma casa pode oferecer longe do conflito armado.
Uma das iniciativas mais recentes foi lançada no início desta semana pela Airbnb.org, uma organização que está empenhada em fornecer alojamento até 100.000 refugiados em fuga da Ucrânia, através da coordenação com vários governos europeus. As estadias serão financiadas através de doações para o Fundo de Refugiados da Airbnb.org e também pela disponibilidade e “generosidade” dos proprietários das casas, tal como noticiou o idealista/news.

A partir de Portugal foi lançada uma plataforma online global destinada a ajudar os cidadãos ucranianos, a “Wehelpukraine.org”. Esta iniciativa já mobilizou dezenas de pessoas e organizações para gerir a plataforma e o seu objetivo passa por encontrar e disponibilizar alojamento, medicamentos e ofertas de trabalho às famílias, refere o Jornal de Notícias. Todo o apoio integrado a estas pessoas está a ser prestado também pelo centro de contacto disponível na língua portuguesa, inglesa e ucraniana.
Também os escuteiros querem acolher refugiados vindos da Ucrânia. O Corpo Nacional de Escutas (CNE) já estabeleceu contactos com o Governo no sentido de articular o apoio a estas famílias, referem numa circular citada pela imprensa. A ideia passa por ceder alguns centros e campos escutistas em várias zonas do país e ainda por divulgar a Plataforma de Doação Escutista, onde é possível fazer donativos para apoiar a Organização Escutista da Ucrânia que está no terreno.
Apenas um dia depois da invasão russa à Ucrânia, outro movimento focado em oferecer alojamento às famílias ucranianas estava a nascer em território nacional. Foi na manhã da passada sexta-feira, dia 25 de fevereiro de 2022, que Joanna Kotlan e Ana Gomes fundaram a iniciativa “Consultores Imobiliários pela Ucrânia”, através de um grupo no Facebook. Como o nome indica, este movimento veio unir os profissionais do ramo imobiliário de forma a facilitar alojamento às famílias que chegam da guerra na Ucrânia e que neste momento não têm casa. O idealista/news foi conhecer melhor esta iniciativa portuguesa e conta tudo.

Os “anjos” do imobiliário que oferecem alojamento aos refugiados ucranianos em Portugal
Tudo começou por angariar casas e só nos últimos dias é que o movimento “Consultores Imobiliários pela Ucrânia” recebeu os primeiros pedidos de alojamento por parte das famílias ucranianas. Com apenas uma semana de vida, e à hora em que foi feita a recolha de dados, esta iniciativa conseguiu mobilizar cerca de 30 voluntários, listar 1.500 camas disponibilizadas pelos proprietários de forma gratuita ou a baixo custo e, sobretudo, dar um teto a 26 famílias que vêm da Ucrânia para fugir a um cenário de guerra. E estes números tendem a crescer nos próximos dias.
“A cada hora que passa temos mais oferta, temos mais pedidos de ajuda, temos mais pessoas a colaborar connosco. Tem sido um movimento que muito nos tem surpreendido pela positiva, porque a união das pessoas e a vontade que as pessoas têm de ajudar é muita, é mesmo muita”, conta Ana Gomes, fundadora do projeto, em declarações ao idealista/news.
Neste cenário, “a adesão dos proprietários está a ser incrível, a todo o minuto estamos a receber uma oferta”, adianta Joanna Kotlan na mesma entrevista por telefone. Chegam ofertas de alojamento um pouco por todo o país. E se for necessário conseguir alojamento numa localidade não listada na base de dados? Dada a adesão por parte da comunidade imobiliária (que já conta com mais de 8.500 pessoas), a fundadora do projeto diz ter “a certeza de que conseguimos alojamento para qualquer pessoa em qualquer zona do país” de forma rápida.

Além de disponibilizarem os alojamentos, os proprietários estão a desempenhar um “papel determinante” na hora de receber e acolher os cidadãos ucranianos. Isto porque depois de haver o “casamento” entre o pedido de ajuda e o alojamento disponível em Portugal, as famílias são direcionadas para os proprietários, que as recebem, ajudam a acomodar em segurança e fazem um acompanhamento diário. “Felizmente, tem havido proprietários que até se disponibilizam para ir buscar as famílias onde quer que elas estejam. Oferecem o carro, oferecem teto. É uma onda de solidariedade enorme”, reforça Ana Gomes. Para as famílias que chegam, todos os envolvidos nesta iniciativa são verdadeiros “anjos”, partilha ainda.
“A oferta tem sido de tal ordem que ultrapassa os pedidos de ajuda que chegam”, avança ainda Joanna Kotlan. Agora, o movimento conta com mais de 20 famílias em processo de alojamento. E as expectativas passam por ajudar umas “quantas centenas de famílias”. “Sentimos que podemos ajudar e fazer a diferença a muitas famílias”, diz ainda Ana Gomes. E para que isso seja possível há pontes a serem criadas com outras entidades.

Alojamento Local: proprietários disponibilizam imóveis para ajudar refugiados da guerra na Ucrânia
Muitas das camas e casas que estão disponíveis para acolher as famílias ucranianas vêm do universo do Alojamento Local. “Temos vários hosteis e bastantes casas de alojamento local. Há muita gente que disponibiliza um hostel”, comenta Ana Gomes, destacando que há um caso concreto em que o proprietário cancelou as reservas para ter alojamentos disponíveis para estas famílias nos próximos meses.
Também Eduardo Miranda, presidente da Associação do Alojamento Local em Portugal (ALEP), tem conhecimento de que hoje “há alojamentos que estão a receber refugiados da Ucrânia”, até porque foram contactados por várias pessoas que se mostraram disponíveis para oferecer ajuda através de alojamento e emprego, por exemplo.
“Vemos essa vaga de disponibilidade e de apoio à Ucrânia neste momento difícil, como algo extremamente positivo. É um sinal, no fundo, que estamos todos nisto e que é um desafio não só para a Ucrânia, mas para toda a Europa e para a humanidade”, comenta Eduardo Miranda em entrevista telefónica ao idealista/news.

O desafio passa pela centralização e integração dos apoios aos refugiados da Ucrânia
São várias as iniciativas de alojamento - e não só - que estão a chegar um pouco por todo o país. A onda de solidariedade com o povo ucraniano multiplicou-se à velocidade da luz em Portugal e está hoje dispersa por diversas entidades e geografias.
É, agora, necessário começar a centralizar e integrar as iniciativas que estão a surgir um pouco por todo o país. É neste sentido que também tem trabalhado o movimento “Consultores Imobiliários pela Ucrânia”. “Queremos muito disponibilizar esta base de dados para instituições que possam ter contactos com refugiados”, como associações que representem a comunidade ucraniana ou os refugiados, para chegar ainda a mais pessoas, afirma Joanna Kotlan.
Hoje, já estão a trabalhar com várias instituições em simultâneo. Está a haver cruzamento de dados entre as câmaras municipais e o movimento para tentar condensar toda a informação disponível numa base de dados, com o intuito de aumentar a sua capacidade de chegar às famílias ucranianas. “O nosso maior objetivo é criar a maior base nacional de alojamento que existe no mercado e poder oferecê-la a todas as pessoas que venham desta guerra e que precisem de uma casa”, resume Ana Gomes na mesma entrevista.

O alojamento é uma das variáveis a ter em conta na hora de acolher estas famílias – é certo. “Estamos a falar de pessoas que têm de mudar toda a sua vida, que têm de recomeçar de novo”, realça Eduardo Miranda da ALEP. E por isso estas pessoas também precisam de apoios no processo de legalização (já facilitado pelo Governo), para encontrar emprego e ter acesso a cuidados de saúde, ao ensino e a meios de primeira necessidade, como alimentos e roupa.
“Para termos uma ajuda efetiva, é importante que haja instituições governamentais e não governamentais que trabalhem de uma forma holística, como um todo, senão corremos o risco de ter inúmeras iniciativas isoladas, todas com boa intenção de ajudar, mas que não conseguem ser tão eficazes”, alerta o presidente da ALEP em entrevista telefónica.
E é neste sentido que esta associação está agora a “contactar as entidades privadas que estão a ser criadas de apoio a ucranianos em Portugal, mas também estamos a ver as entidades públicas governamentais, ou seja, os municípios e áreas dos governos que estão envolvidos nestas iniciativas”, aponta. A ideia, segundo o responsável, é nos próximos dias perceber onde é que a ALEP conseguirá ser “mais útil” numa componente específica que é o Alojamento Local temporário, dentro de um ou mais projetos que sejam capazes de coordenar a ajuda aos cidadãos ucranianos como um todo. “Isto porque sem a coordenação com as outras componentes, a ajuda poderá não ser eficaz”, argumenta Eduardo Miranda.

Câmaras somam alojamentos para acolher refugiados ucranianos
De norte a sul, o país abre portas e cria mecanismos para responder às necessidades básicas das famílias ucranianas que chegam de malas e bagagens em busca de segurança e conforto. E conceder habitação é uma das prioridades de várias autarquias do país, que também reúnem reforços para garantir alimentos, cuidados médicos, trabalho e acesso ao ensino.
Na capital, Lisboa, o autarca Carlos Moedas já arregaçou as mangas e criou uma Equipa de Missão liderada pela Proteção Civil Municipal para coordenar a resposta no terreno. O objetivo, num primeiro momento, passa por apoiar os cidadãos ucranianos que já estão em Lisboa e que não podem regressar, com alimentação, alojamento, vestuário, medicamentos e apoio psicossocial, dizem numa nota de imprensa. Num segundo momento, – em articulação com a embaixada da Ucrânia em Portugal –, Lisboa prepara-se para receber refugiados, com a construção de um centro de acolhimento temporário, na sede da Polícia Municipal de Lisboa.
Também o município de Cascais lançou esta quarta-feira a campanha de apoio ao povo da Ucrânia “SOS Ucrânia” que prevê o abastecimento de bens, o resgate e o acolhimento de refugiados no concelho, disse à Lusa o presidente da Câmara Municipal de Cascais. No âmbito desta iniciativa estão a ser preparadas soluções de alojamento provisório para os refugiados ucranianos que cheguem a Portugal, tendo, numa primeira fase, capacidade para acolher até 300 pessoas.

Bem a norte do país, o município de Vila Nova de Gaia vai disponibilizar de “forma total e imediata” as instalações do hostel do Parque Biológico, para acolhimento das famílias ucranianas que cheguem ao concelho nos próximos tempos, com uma capacidade para cerca de 50 pessoas, referem na sua página oficial. E a Câmara Municipal de Braga, coordenada com entidades públicas e privadas locais, já se prepara para receber no final desta semana 30 refugiados ucranianos, criando para o efeito “condições que garantam o acolhimento imediato dos refugiados e a sua posterior integração, nomeadamente a disponibilização de cuidados de saúde, habitação condigna, emprego e necessidades educativas”, explica a autarquia numa nota publicada na segunda-feira.
Também a Câmara Municipal do Porto está a preparar várias medidas integradas para dar resposta às necessidades dos ucranianos que têm fugido do seu país, lê-se na nota de imprensa. “Somos todos Ucrânia” é o nome da iniciativa para apoiar estes cidadãos e passará pela recolha de bens de primeira necessidade para fazer chegar à fronteira da Polónia com a Ucrânia e também pela criação de uma bolsa de emprego em conjunto com diversas associações empresariais com atividade na região.

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