
Os problemas da habitação em Portugal já estão identificados. Agora, o desafio pretende-se em pôr em marcha todas as medidas do programa Construir Portugal para dar casas às famílias mais necessitadas. Para isso, “é preciso pensar na lógica da casa, para que se possa construir em escala bem, depressa e barato de forma a responder ao flagelo da falta de habitação, mas sem beliscar a qualidade final do produto”, diz Patrícia Gonçalves Costa, secretária de Estado da Habitação. Já os autarcas criticam o facto de o programa do Governo da AD não olhar para as características de cada território e não priorizar a construção para venda.
Numa mensagem deixada na sessão de abertura da XII Semana da Reabilitação Urbana do Porto, a secretária de Estado da Habitação disse que, antes de construir, “é preciso pensar na lógica da casa”, ou seja, no número de divisões, suites, casas de banho ou arrumações, para perceber o que é essencial ter numa habitação. Na sua perspetiva, só assim é que é possível “construir em escala bem, depressa e barato de forma a responder ao flagelo da falta de habitação, mas sem beliscar a qualidade final do produto”.
A governante e arquiteta admitiu na ocasião que o “terreno é uma das parcelas mais caras numa habitação”, motivo pelo qual o atual Executivo quer alterar o regime jurídico de gestão territorial, de forma a transformar terrenos rústicos em urbanos, desde que sirvam para construir habitação acessível ou a custos controlados. “Assim, garantimos casas a preços que as famílias possam pagar”, concluiu Patrícia Gonçalves Costa no evento que arrancou esta terça-feira, dia 5 de novembro, em Vila Nova de Gaia e conta com o idealista como portal oficial.
“Foi junto dos municípios que o Estado encontrou os maiores e melhores parceiros (…), o que nos permite ter hoje um retrato das necessidades habitacionais: há 130 mil famílias necessitadas e não 26 mil”, admitiu ainda a secretária de Estado da Habitação. E foi neste sentido que o Governo anunciou a construção de 59 mil casas com 2,8 mil milhões de euros a concretizar até 2030. “É o maior investimento em habitação pública”, afirmou.
Já Manuel Reis Campos, presidente da Associação dos Industriais da Construção Civil e Obras Públicas (AICCOPN), lembrou que há um excedente habitacional no país, sendo que muitas dessas casas precisam de obras para estarem prontas a habitar. É por isso que defende que "é preciso dar um impulso à reabilitação urbana e colocá-la no centro da agenda nacional”, porque até agora “a reabilitação não tem sido suficiente”, lamenta.

Construir Portugal devia ter olhado para características dos territórios
Para os autarcas do Grande Porto presentes no evento, o programa Construir Portugal podia ter ido mais longe, olhando mais para as necessidades de cada território, bem como para a construção para venda e não só para arrendamento acessível.
“Um plano nacional que não olha para a questão dos territórios peca desde logo por isso”, opina Ricardo Valente, vereador da Câmara Municipal do Porto, que diz que a maioria dos edifícios devolutos ou em mau estado situa-se em territórios onde não há economia. Na sua visão, o Construir Portugal “é um programa muito ligado ao Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), com uma lógica de curto prazo”.
Em contraste, nas zonas do país onde há mais economia, não há casas para alojar trabalhadores. “O desenvolvimento da economia está a ser travado, porque não há casas para os trabalhadores e, assim, as empresas não conseguem crescer ou instalar-se”, acrescenta o vereador da Câmara do Porto. Também Carlos Mouta, vice-presidente da Câmara Municipal de Matosinhos, concorda que se não houver habitação para as famílias viverem, as empresas não conseguem trazer trabalhadores e talento”, o que acaba por ter “impacto nas cidades, pois perdem atratividade” perante cidades europeias concorrentes.
"A única forma de baixar os preços [das casas] é haver choque de oferta", Ricardo Valente, vereador da Câmara do Porto
Além disso, há também quem aponte o dedo por o programa Construir Portugal priorizar apenas a construção para arrendamento acessível. “As políticas públicas devem dar respostas heterogéneas. A construção para arrendamento é - e deve ser - uma prioridade, mas construção para venda também não pode deixar de ser uma prioridade. Não podemos esquecer que pode fazer mais sentido para um jovem adquirir a sua casa por pagar menos ao banco do que ao senhorio”, disse Eduardo Vítor Rodrigues, presidente da Câmara de Vila Nova de Gaia.
O que parece estar a precisar de revisão também a fórmula de cálculo sobre a habitação acessível, que indica que o preço da casa tem de ser 20% mais baixo que a mediana nacional. “Mas se a mediana estiver sempre a subir (muito empurrada pelas transações de casas de luxo) a habitação acessível fica mais cara. Esta fórmula revela iliteracia. A única forma de baixar os preços é haver choque de oferta”, defende Ricardo Valente.
Por outro lado, há também quem critique o facto de a administração central ter empurrado responsabilidades para as autarquias. “O Estado passou para as câmaras a responsabilidade de autorizar” projetos habitacionais, passando o próprio Estado a ter o papel de verificar se está bem feito ou de punir caso contrário, comenta António Silva Tiago, presidente da Câmara Municipal da Maia. Assim, “se até junho de 2026 não estiverem casas concluídas, a culpa será das câmaras” apesar de estarem dependentes de outras instituições que revelam atrasos, como é o caso do IHRU, lamenta o autarca.

Da redução do IVA ao simplex: a solução para gerar oferta de habitação
“É com a união de todos os atores públicos e privados que vamos encontrar uma solução para a habitação”, acredita o presidente da AICCOPN. Mas esta estratégia de colaboração deveria ser repensada, acredita o autarca de Gaia: “Queremos fazer política pública com uma estrutura de parceiros, que não use uma lógica piramidal, em que a autarquia está no topo. Mas sim numa lógica horizontal em que todos, público e privado, participamos no mesmo projeto, havendo aqui o conceito de humildade institucional”, aponta.
Para construir mais habitação em Portugal é preciso “melhorar alguns aspetos do simplex, para garantir rapidez e segurança aos construtores, e ainda implementar as medidas previstas no Construir Portugal, como a disponibilização de imóveis públicos devolutos, terrenos e medidas fiscais que visem baixar os custos das obras”, como a redução do IVA, disse ainda Manuel Reis Campos, admitindo que viu um “passo positivo” no Orçamento de Estado para 2025 (OE2025) no que diz respeito à autorização legislativa em matéria do IVA na construção. Ainda assim, “persistem incertezas e é preciso que o Governo clarifique para que os promotores possam avançar com planos de forma segura”.
No que diz respeito ao simplex, o autarca da Maia espera que a revisão venha a resolver “algumas insuficiências e constrangimentos” sentidos nos municípios devido à atribuição de responsabilidades sobre os projetos. E António Miguel Castro, presidente do conselho de administração da Gaiurb, diz que o novo simplex deveria deixar “a regulação e fiscalização e apostar na inovação e desenvolvimento”.

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