Bruxelas lançou nova estratégia para a Europa ser mais competiva. Mas economista alerta que é preciso acelerar o passo.
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Competitividade europeia
Mario Draghi, economista italiano e ex-presidente do Banco Central Europeu Getty images

Entre a nova estratégia comercial dos EUA, a reiterada ofensiva chinesa, as guerras que se intensificaram e outros tantos riscos geopolíticos e macroeconómicos, a Europa vive atualmente a braços com vários desafios a nível de competitividade global. Isto mesmo já veio alertar Mário Draghi, ex-presidente do Banco Central Europeu (BCE), há um ano: sem um crescimento mais rápido, a Europa não conseguiria alcançar os seus objetivos climáticos, digitais, tecnológicos e de segurança num contexto mundial em constante transformação. De lá para cá, Bruxelas desenhou uma “bússola” para guiar o crescimento da competitividade, investindo vários milhões de euros. Mas ainda há muito a fazer na aceleração do investimento em tecnologia e revisão da política da concorrência, tal como avisa o economista italiano - também ex-primeiro-ministro do país.

O relatório de Draghi sobre a competitividade na Europa, publicado em setembro do ano passado, identificou três áreas críticas para o desenvolvimento da União Europeia (UE) num mundo em constante mudança: 

  • colmatar o défice de inovação;
  • descarbonizar a economia;
  • reduzir as dependências externas, especialmente de matérias-primas e semicondutores. 

Além disso, também desenhou propostas para reformar a política de concorrência da UE e diminuir os encargos regulamentares excessivos que prejudicam os empreendedores. Ou seja, no atual quadro seria necessário suavizar a atual rigidez das autoridades da concorrência da UE (mais de cinquenta), que acabam por favorecer o crescimento de empresas não europeias na Europa e penalizar empresas tecnológicas nascidas no seio europeu.

Do relatório de Mario Draghi destaca-se exatamente essa mensagem de que a fragmentação regulatória na Europa, a lentidão dos processos de autorização e a falta de escala no mercado único dificultam que as empresas europeias possam competir com gigantes norte-americanos e asiáticos. Além disso, o economista realça a necessidade de rever a política da UE para permitir a criação de campeões europeus, especialmente em setores estratégicos como o tecnológico.

“Europa vê-se incapaz de acompanhar o ritmo de mudança que ocorre noutras partes do mundo”, Mario Draghi

A grande maioria das recomendações urgentes de Draghi inspiraram o desenho da bússola de competitividade apresentada pela Comissão Europeia (CE) em janeiro de 2025, que visa orientar a restauração do dinamismo e crescimento económico europeu, numa altura em que o contexto mundial se tornou ainda mais desafiante, nomeadamente, devido às novas tarifas de Trump e o fortalecimento da economia chinesa.

Numa análise recente ao progresso da UE na implementação das recomendações estabelecidas no relatório de Draghi sobre o futuro da competitividade europeia, Bruxelas destaca que mais da metade das iniciativas já foram implementadas com mais de 1 bilião de euros mobilizados em inovação, tecnologia limpa e segurança. “A bússola está a garantir que a Europa permaneça competitiva, sustentável e resiliente”, refere a CE no seu website oficial.

Para melhorar a inovação, foram canalizados 200 mil milhões de euros para investimento em Inteligência Artificial (IA). E as empresas mais inovadoras podem contar com 70 mil milhões de euros de financiamento. No campo dos negócios, destaca-se uma poupança de 8,4 mil milhões de euros graças às medidas de simplificação, sendo que “o objetivo mais vasto da CE inclui a redução da burocracia em 25% no geral e em 35% para as PME até ao final de 2029”.

Embora “os cidadãos e empresas europeias valorizem o diagnóstico, as prioridades claras e os planos de ação, estão desiludidos com a lentidão do processo europeu”, destacou Mario Draghi na conferência realizada a 16 de setembro de 2025 que marcou um ano do seu relatório. O economista italiano avisa que a “Europa vê-se incapaz de acompanhar o ritmo de mudança que ocorre noutras partes do mundo”, como nos EUA e na China. “Um caminho diferente exige nova velocidade, nova escala e nova intensidade”, recomenda.

Tecnologia e concorrência na Europa
Mario Draghi, economista italiano e ex-presidente do Banco Central Europeu, e Ursula von der Leyen, Presidente da Comissão Europeia Getty images

O que falta fazer para melhorar a competitividade europeia?

Ainda há muito a fazer nesta matéria. A Ursula von der Leyen, presidente da CE, definiu a próxima fase para reforçar competitividade da Europa, incluindo:

  • mais investimentos em tecnologias digitais e limpas;
  • novas medidas para reduzir custos empresariais e completar a união de poupança e investimento;
  • um roteiro para o mercado único até 2028, abrangendo capital, serviços, energia, telecomunicações, o “28.º regime” e uma nova “quinta liberdade” para o conhecimento e a inovação;
  • novas iniciativas em IA, quântica, baterias e tecnologias limpas.

Na visão de Mario Draghi é preciso ir ainda mais longe. Apesar de reconhecer progressos tecnológicos e na IA, o economista italiano reforça é preciso “maior ambição na área da tecnologia” em três áreas: eliminar barreiras à expansão de novas tecnologias (implementar o 28.º regime), simplificação "radical" do Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados e integração vertical da IA na indústria.

Ao nível da política de concorrência, também ainda há muito a fazer. Desde logo, Mario Draghi diz que é preciso agilizar “imediatamente” a revisão das diretrizes de fusão, porque a “indústria não pode esperar até 2027”. Na sua visão, “a Europa deve ser capaz de proteger a concorrência, promovendo ao mesmo tempo consolidação e inovação”. Até porque a consolidação de empresas pode ajudar a “reduzir pesquisas e desenvolvimentos duplicados, diminuir custos, acelerar a inovação e concentrar os orçamentos”, não sendo necessariamente uma ameaça aos consumidores. É isso que já está a ser feito nos EUA e na Ásia, enquanto a Europa “continua dividida entre múltiplos campeões nacionais e bases industriais sobrepostas”.

Também há áreas em que Bruxelas tem poderes para fazer mais. “A regulação é onde a UE pode agir mais rápido e de forma mais decisiva. A Europa há muito que se apresenta como uma potência regulatória — agora deve provar que se pode adaptar a um cenário tecnológico em rápida mudança”, defende o também ex-primeiro-ministro de Itália, que recomenda ainda “reformas mais profundas de competências, tomada de decisão e financiamento”.

“Se diminuirmos barreiras no mercado único e permitirmos que as empresas ganhem escala mais rapidamente, também aceleraremos o crescimento dos mercados de capitais europeus”, Mario Draghi

É preciso ainda reforçar a cooperação entre os 27 Estados-membros, concentrando projetos e agrupando recursos, para chegar ao “próximo passo lógico” que seria “considerar uma dívida comum para projetos comuns”, acrescenta Draghi. Tudo isto permitiria à Europa “financiar projetos maiores em áreas que aumentam a produtividade — inovação de ponta, tecnologias, P&D em defesa ou redes de energia — onde os gastos nacionais fragmentados não conseguem entregar mais resultados”.

“Ao aumentar a produção mais rápido do que os custos de juros, os tais projetos iriam restaurar gradualmente o espaço fiscal e tornariam mais fácil financiar necessidades de investimento mais amplas”, refere o economista italiano, lembrando que no seu relatório sobre a competitividade europeia estimou que uma subida de 2% na produtividade total ao longo de uma década poderia reduzir o peso das finanças públicas em cerca de um terço. 

“E se diminuirmos barreiras no mercado único e permitirmos que as empresas ganhem escala mais rapidamente, também aceleraremos o crescimento dos mercados de capitais europeus”, o que pode ajudar a financiar as necessidades de investimento do lado dos privados, refere.

“Quanto mais avançarmos nas reformas, mais capital privado se mobilizará — e menos dinheiro público precisaremos. É claro que esse caminho vai quebrar tabus de longa data. Mas o resto do mundo já quebrou os seus. Para a sobrevivência da Europa, devemos fazer o que ainda não foi feito antes e recusar ser contidos por limites autoimpostos”, conclui Mario Draghi.

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