
A pandemia trouxe muitas alterações no segmento de escritórios. O teletrabalho ganhou força e as empresas, atentas a este fenómeno, reinventaram-se e adotaram, em muitos casos, o trabalho híbrido como regra. Mas será que a tendência veio para ficar? “Não acredito no desaparecimento dos escritórios, mas sim na transformação da sua função. O escritório torna-se ainda mais uma ferramenta de convívio, socialização e cultura da empresa, podendo contribuir para o recrutamento dos melhores candidatos”, diz ao idealista/news Swan Sallmard, Partner da South, empresa de gestão de ativos imobiliários que em Portugal tem mais de 250.000 metros quadrados (m2) de escritórios sob gestão no segmento prime, num total de 25 edifícios.
Segundo a mesma responsável, o “desaparecimento dos escritórios pode ser perigoso devido às dificuldades de transição, transmissão de informação e competências”. “O ‘knowledge gap’ entre os gestores e os colaboradores mais jovens que não aparecem no escritório é uma das grandes ameaças dos próximos anos no mundo profissional”, alerta.
Outro dos temas abordados na entrevista está relacionado com a continuidade da atratividade de Portugal junto dos investidores. “Continuamos a acreditar na robustez do mercado português, especialmente em Lisboa no setor prime de escritórios”, revela Swan Sallmard, salientando que a South continua a ambicionar aumentar a sua carteira no país. A abordagem é agora, no entanto, mais prudente. “Só iremos adquirir ativos que façam sentido. Os ‘yields’ ainda não refletem a realidade económica e não vamos comprar a qualquer preço”, conta.
Uma coisa é certa, assegura a Partner da South: “Dado o novo paradigma do trabalho, com necessidades de convívio e maior sustentabilidade, as empresas estão mais exigentes em relação à qualidade das áreas que pretendem arrendar”.

O grupo South entrou em Portugal em 2015, com a compra e consequente gestão da Torre Ocidente, no Centro Comercial Colombo, em Lisboa. Que balanço faz da atividade do grupo no país?
Aproveitando o conhecimento e a experiência de mais de 20 anos na gestão de ativos imobiliários em França, na Europa de forma global e mesmo no Brasil, ao entrar em Portugal conseguimos estabelecer-nos desde cedo como uma referência neste setor. Adotamos uma abordagem centrada na minúcia e transparência das operações, na excelência técnica e relacional e na proteção dos interesses de todas as partes envolvidas. Isso permitiu-nos expandir rapidamente a presença no mercado português, assumindo projetos de grande relevância.
Desde então, o grupo South passou a gerir vários imóveis no país, como por exemplo o edifício sede da NOS, o Campus da Justiça no Parque das Nações, três edifícios das Torres de Lisboa e o fundo Maxirent, composto por sete edifícios entre eles o Fontes Pereira do Melo n.º 7 (edifício do registo civil), o edifício Navigator (Fontes Pereira do Melo n.º 27) e o edifício sede do grupo BCG na rua das Chagas. Que desafios existem em Portugal neste segmento do setor imobiliário?
São diversos os desafios que se colocam em Portugal neste setor, sendo que alguns têm vindo a acentuar-se nos últimos anos. Um exemplo é a inflação. Destaca-se também a regulação, uma vez que implica o cumprimento de leis e regulamentos específicos, o que pode ser complexo e exigir recursos. O equilíbrio entre a oferta e a procura é outro aspeto crítico, implicando a gestão de inquilinos e a definição de preços de arrendamento competitivos.
"Temos mais de 250.000 m2 de escritórios sob gestão no segmento de escritórios prime e com um total de 25 edifícios sob a nossa responsabilidade de gestão. Representam mais de 900 milhões de euros de ativos sob gestão"
Além disso, observamos a crescente importância da sustentabilidade, que requer a adoção de práticas e tecnologias sustentáveis para reduzir o impacto ambiental. Todo este contexto exige uma abordagem estratégica e adaptativa por parte dos profissionais de gestão de ativos em Portugal. Assim, é fundamental que estes profissionais se mantenham atualizados com as tendências do setor, de forma a manterem-se competitivos.
Adicionalmente, torna-se cada vez mais necessário que as soluções sejam personalizadas para satisfazer as necessidades exclusivas de cada ativo imobiliário ao longo do seu ciclo de vida.
Quantos edifícios gere ao todo o grupo South em Portugal? Estamos a falar de quantos m2?
Temos mais de 250.000 m2 de escritórios sob gestão no segmento de escritórios prime e com um total de 25 edifícios sob a nossa responsabilidade de gestão. Representam mais de 900 milhões de euros de ativos sob gestão.
A pandemia trouxe muitas alterações no segmento de escritórios e o teletrabalho e/ou trabalho híbrido parece ter vindo para ficar. Concorda com esta ideia? Porquê?
É verdade que a pandemia trouxe muitas alterações neste segmento e que os modelos de teletrabalho parecem ter vindo para ficar. E muitas empresas estão a adotar o modelo híbrido. É uma grande inovação social que vai afetar a maneira de trabalhar das gerações futuras.
"Não acredito no desaparecimento dos escritórios, mas sim na transformação da sua função. O escritório torna-se ainda mais uma ferramenta de convívio, socialização e cultura da empresa, podendo contribuir para o recrutamento dos melhores candidatos"
Agora, não acredito no desaparecimento dos escritórios, mas sim na transformação da sua função. O escritório torna-se ainda mais uma ferramenta de convívio, socialização e cultura da empresa, podendo contribuir para o recrutamento dos melhores candidatos. Todos os edifícios sem personalidade ou com acesso complicado estão a ficar vazios. O movimento que estamos a observar nos EUA ou na Europa, com bairros exclusivos de negócios a perderem atratividade, é evidente. Lisboa, sendo uma cidade mais pequena e com menos oferta, sofre menos, mas a competição existe entre os ativos. Os proprietários e as empresas devem oferecer mais aos colaboradores, e o escritório é fundamental nessa demonstração.
Além disso, o desaparecimento dos escritórios pode ser perigoso devido às dificuldades de transição, transmissão de informação e competências. O 'knowledge gap' entre os gestores e os colaboradores mais jovens que não aparecem no escritório é uma das grandes ameaças dos próximos anos no mundo profissional.
Finalmente, é fundamental lembrar que nem todas as funções podem ser realizadas remotamente. Em algumas indústrias e cargos, a presença física no local de trabalho é essencial para garantir a eficácia das operações, promover a colaboração e manter a cultura empresarial. Portanto, embora o teletrabalho seja uma opção valiosa, não pode substituir completamente a necessidade de estar presencialmente em algumas situações. A chave está em encontrar um equilíbrio adequado entre o trabalho remoto e o trabalho presencial, adaptando-se às necessidades específicas de cada empresa e função. Isso permitirá que as empresas ofereçam flexibilidade aos funcionários ao mesmo tempo que atendem às exigências do negócio.
"O 'knowledge gap' entre os gestores e os colaboradores mais jovens que não aparecem no escritório é uma das grandes ameaças dos próximos anos no mundo profissional"
A nossa carteira reflete essas necessidades, e ao planear as nossas obras estamos sempre conscientes da experiência de ‘hospitality’ que os nossos edifícios devem proporcionar.

O que procuram hoje (que tipo de espaços de trabalho) as empresas que se querem instalar em Portugal?
Procuram diversos tipos de espaços de trabalho, incluindo espaços de coworking e escritórios privados. Os espaços de flex-working estão a tornar-se cada vez mais populares em Portugal. Oferecem um ambiente de trabalho partilhado com comodidades como internet, café e salas de reunião, sendo ideais para freelancers ou microempresas. Permitem a flexibilidade de espaço e podem facilitar a interação com outros profissionais, o que é benéfico para estabelecer contactos.
"Os espaços de flex-working estão a tornar-se cada vez mais populares em Portugal"
Por outro lado, os escritórios privados também estão disponíveis para empresas de todos os tamanhos. Algumas empresas podem preferir arrendar o seu próprio espaço de escritório independente enquanto outras podem optar por usar espaços partilhados para reduzir custos e para se relacionarem com outros profissionais.
Continua a haver empresas estrangeiras a querer entrar em Portugal e ter um escritório no país, nomeadamente multinacionais, tendo em conta o atual contexto económico (alta inflação, aumento de juros etc.)?
Claramente. Houve uma pausa no mercado de investimento de ativos, com uma diminuição de 35% no primeiro trimestre de 2023 em comparação com o período homólogo, tendo sido vendidos apenas sete ativos. Estas transações foram realizadas por investidores domésticos, o que é um ponto interessante. De facto, a Europa está a enfrentar desafios, e globalmente observamos uma queda de 57% nos investimentos imobiliários durante a primeira metade do ano no continente. Este movimento afeta todos os países, incluindo Portugal. Isto decorre da inflação e da política monetária de aumento das taxas dos bonds, o que reduz automaticamente o retorno através dos investimentos imobiliários. Agora, estamos a regressar a um ciclo de buyers market, onde os vendedores ainda não querem alterar os preços.
"Dado o novo paradigma do trabalho, com necessidades de convívio e maior sustentabilidade, as empresas estão mais exigentes em relação à qualidade das áreas que pretendem arrendar. (...) A ausência de edifícios de grande qualidade pode também justificar a desaceleração da entrada de investidores estrangeiros em Lisboa"
Em termos de entrada em Portugal como arrendatários, também existe uma pausa. O ‘take up’ do primeiro trimestre de 2023 foi de 38.000 m2, em comparação com os 168.000 m2 no mesmo período de 2022. A incerteza global deve ser levada em conta, mas existem também explicações mais locais. Dado o novo paradigma do trabalho, com necessidades de convívio e maior sustentabilidade, as empresas estão mais exigentes em relação à qualidade das áreas que pretendem arrendar. Em Lisboa, há falta de escritórios premium, apesar de haver um pipeline de construções. A ausência de edifícios de grande qualidade pode também justificar a desaceleração da entrada de investidores estrangeiros em Lisboa.
No caso das empresas que já têm escritórios no país, que tipo de alterações/mudanças estão a fazer nos mesmos para os adaptarem às novas realidades?
As características de sustentabilidade e os espaços de convívio são agora fundamentais na escolha de um escritório, mas o mais importante é a localização e a acessibilidade. O equilíbrio entre o envolvimento financeiro e as características citadas é muito importante.

Sustentabilidade é cada vez mais palavra de ordem no setor imobiliário, sobretudo no segmento de escritórios. O que está a mudar neste “campo”?
Várias mudanças significativas estão a acontecer. Uma delas diz respeito à gestão ambiental. As construtoras estão a investir em programas de gestão ambiental que incluem a separação dos resíduos desde o início do projeto até o final da obra, visando reduzir o impacto ambiental.
A eficiência energética também está a ganhar destaque. A sustentabilidade no setor imobiliário está agora intrinsecamente ligada à eficiência energética. Edifícios equipados com sistemas de iluminação e climatização eficientes têm o potencial de reduzir significativamente o consumo de energia.
Outro ponto importante é a redução das emissões de gases com efeito de estufa. Dado que o setor imobiliário é responsável por uma parcela substancial dessas emissões, a redução tornou-se uma prioridade, com um impacto direto na pegada ambiental.
"Continuamos a acreditar na robustez do mercado português, especialmente em Lisboa, no setor prime de escritórios. Em tempos de crise, os fundamentais do negócio tornam-se incontornáveis e, para os ativos de escritórios, é a localização que supera todas as outras características"
A adoção de práticas ESG também está a ganhar terreno. A incorporação dessas práticas na gestão de ativos imobiliários pode proporcionar benefícios tanto financeiros como ambientais para as empresas, aumentando a sua atratividade para investidores e arrendatários conscientes. Além disso, uma abordagem sustentável implica a incorporação de eficiência energética e hídrica nas edificações, o uso de materiais adequados, a promoção do bem-estar dos utilizadores e a redução global do impacto ambiental.
A sustentabilidade tornou-se um imperativo e uma oportunidade no setor imobiliário, exigindo uma abordagem estratégica e compromisso com práticas mais amigas do ambiente.
Na gestão dos nossos ativos estamos muito cuidadosos neste aspeto e obtivemos certificações energéticas importantes, como a BREEAM Very Good para as Torres E e G das Torres de Lisboa.
Há oportunidades de investimento na área de aquisição de edifícios de escritórios em Portugal? Têm interesse em reforçar a vossa carteira? Há algum valor que possam avançar destinado a este tipo de operações? Há alguma oportunidade na calha para fechar ainda este ano?
Continuamos a acreditar na robustez do mercado português, especialmente em Lisboa, no setor prime de escritórios. Em tempos de crise, os fundamentais do negócio tornam-se incontornáveis e, para os ativos de escritórios, é a localização que supera todas as outras características. Mantemos o interesse em aumentar a nossa carteira de escritórios prime, sempre foi o nosso caminho. No entanto, adotamos uma abordagem prudente e só iremos adquirir ativos que façam sentido. Os ‘yields’ ainda não refletem a realidade económica, e não vamos comprar a qualquer preço.
Que futuro acredita que terá o grupo South em Portugal nos próximos anos? Porquê?
O grupo South representa proprietários e investidores de longo prazo, o que nos permite resistir aos diferentes ciclos da economia, como o período de incerteza em que nos encontramos. Superámos muito bem a Covid, com resultados excelentes, apesar da pandemia. Em 2022-23, aproveitámos a pausa no mercado para reestruturar o nosso grupo com a criação da SOUTHCAP SGOIC. Estamos agora em condições de apoiar qualquer tipo de investidor para diferentes tipos de investimentos em Portugal e acreditamos que teremos um papel importante no mercado nos próximos anos, pois temos envergadura para atrair investidores estrangeiros. Além disso, acreditamos que a nossa gestão internalizada dos ativos, desde o ‘property management’ até à reestruturação corporativa dos veículos, confere uma grande qualidade aos resultados diários, resultando em rentabilidade e segurança para os investidores. Contamos continuar com essa estratégia que foi a nossa aposta desde 2015.


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