Falta de oferta de habitação em Portugal foi um dos temas em destaque na terceira edição da Convenção APEMIP Imocionate.
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Paulo Portas
Paulo Portas, ex-vice-primeiro-ministro Créditos: Gonçalo Lopes | idealista/news

Aumentar a oferta de casas no mercado, construindo novas e reabilitando as que estão devolutas ou sem uso. Aceitar que a tecnologia e sobretudo a Inteligência Artificial (IA) vieram para ficar no segmento da mediação imobiliária. Fazer pactos de longa duração a nível governamental, para que as medidas subsistam com o passar dos anos sem haver alterações legislativas. Perceber que são precisas mais casas para dar resposta à crise na habitação – ou de acesso a habitação –, mas ter a noção de que não se vão construir as casas necessárias de um dia para o outro. Estas foram algumas das ideias deixadas pelos oradores que subiram ao palco do auditório da Fundação Champalimaud durante a 3ª edição da Convenção APEMIP Imocionate, que decorreu esta terça-feira (1 de julho de 2025) - o idealista foi um dos principais patrocinadores do evento.

“As causas do problema da habitação e da construção estão identificadas, mas não se resolve rapidamente, e o Estado acrescenta bastante tempo ao tempo que as pessoas e as empresas precisam”, disse Paulo Portas, durante a sua intervenção.

Uma opinião de certa forma partilhada por Miguel Morgado, licenciado em Economia e doutorado em Ciência Política e comentador da SIC Notícias: “Se a raiz de fundo é termos deixado de construir casas, então é preciso construir mais, mas tudo isto demora tempo. Soluções imediatas só podemos ter do lado da procura [como por exemplo a garantia pública do Estado no crédito habitação e a isenção de IMT]. 

"Cresci com a certeza de que Lisboa era a primeira cidade do país e a segunda era o Porto. Esse mundo já não existe. Acho possível que daqui a dez anos a primeira cidade seja Sintra e a segunda Gaia. Para Lisboa e Porto é difícil crescer, e para onde Lisboa podia crescer já cresceu"
Paulo Portas, ex-vice-primeiro-ministro 

Paulo Portas deixou ainda outro alerta, salientando que “as cidades mudam mais que as pessoas”, sendo isso o que está a acontecer: “Cresci com a certeza de que Lisboa era a primeira cidade do país e a segunda era o Porto. Esse mundo já não existe. Acho possível que daqui a dez anos a primeira cidade seja Sintra [Grande Lisboa] e a segunda Gaia [Grande Porto]. Para Lisboa e Porto é difícil crescer, e para onde Lisboa podia crescer já cresceu. Não é fácil gerir o crescimento de uma cidade antiga como Lisboa quanto ao espaço disponível, e no Porto ainda menos”.

Nesse sentido, referiu, a discussão sobre a possibilidade de construir em altura poderá ganhar força, “mas terá de se regular muitas coisas”. 

Coube ao ex-vice-primeiro-ministro de Portugal, de resto, encerrar o evento, tendo falado sobre temas que de alguma forma foram sendo abordados ao longo do dia. Um deles está relacionado com a necessidade, urgente, de aumentar a oferta de casas, quer no setor privado quer no público, sendo crucial (também) aumentar o parque habitacional municipal.  

“O problema está na oferta. Constrói-se menos que há 15 e 20 anos. No princípio do século construíam-se mais de 100.000 habitações por ano, já estivemos nos 60.000 e já caímos mais fundo, mas a capacidade de construção, com a legislação que existe… O objetivo do Governo, melhorado, são 59.000 casas durante a legislatura, das quais 26.000 são financiadas pelo PRR. Estamos em números muito insuficientes para aumentar a oferta”, desabafa. 

Construção nova de casas
Rita Neves, jornalista, e Miguel Morgado, comentador da SIC Notícias Créditos: Gonçalo Lopes | idealista/news

Números mostram a urgência de construir mais casas

Sobre este tema, os números divulgados por Manuel Reis Campos, presidente da Confederação Portuguesa da Construção e do Imobiliário (CPCI), são esclarecedores. 

  • Na última década, construíram-se 15.000 habitações por ano e na década anterior 68.000 habitações. Isto do lado dos privados, que construíram em 20 anos 830.000 habitações. O Estado construiu 8.700 habitações em 20 anos;
  • Nos últimos três anos, o setor está a construir, a ver pelos licenciamentos, na ordem dos 30.000, 32.000, 34.000 fogos;
  • Em 2021, precisávamos de 136.800 habitações para ficarmos sem carência, e depois tínhamos de construir cerca de 45.000 todos os anos para manter a situação equilibrada. Neste momento, nem para manter essa situação equilibrada temos;
  • Em 2000, 2001 e 2002, o setor construiu 122.000 habitações. Temos de fazer a quantidade de casas que fazíamos nesses anos. Agora estamos a construir, ou seja, o número de licenciamentos, é na ordem dos 34.000, isto em 2024. Este ano temos mais 16%, mas ainda não chega, é pouco.
  • Os Censos de 2021 mostram que não se construiu e que também não se reabilitou, sendo que em 2021 havia mais 253.000 edifícios a precisar de obras face a 2011. 

Agilizar processos de licenciamento e diminuir as burocracias é encarado também como fator decisivo para conseguir aumentar a oferta de habitação no país. E foram vários os especialistas que “bateram nessa tecla”, além de Paulo Portas e Manuel Reis Campos.  

Igualmente urgente é criar no setor imobiliário medidas de longo prazo e uma espécie de “compromisso” por parte do(s) Governo(s), uma ideia já deixada por vários especialistas e agora reiterada, por exemplo, por Marina Gonçalves, ex-ministra e secretária de Estado da Habitação, que considera que o poder político deve conseguir colocar ideologias de parte. “É uma reflexão que temos de fazer. Tem de ser um trabalho de comunidade”, disse, apelando à importância de “ser possível haver consensos”. 

Uma visão também partilhada por Ricardo Costa, CCO do grupo Impresa, que falou na importância de haver uma solução que envolva, entre outros, Estado, autarquias, investidores e promotores imobiliários.

APEMIP Imocionate 2025
Manuel Reis Campos, Marina Gonçalves e António Ramalho num dos debates Créditos: Gonçalo Lopes | idealista/news

Outras ideias a retirar da Convenção APEMIP Imocionate

  • Estão a vender-se mais casas e mais caras e os portugueses são os principais compradores, havendo menos transações por parte de cidadãos estrangeiros. “90% das transações imobiliárias que vão ser feitas este ano serão de casas usadas e quem as vende são cidadãos portugueses”, disse Paulo Caiado, presidente da Associação dos Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária de Portugal (APEMIP);
  • A grande maioria dos portugueses (mais de 70%) continua a preferir ter casa própria, ou seja, ser proprietário e não inquilino, destacaram, por exemplo, Paulo Caiado e Paulo Portas;
  • Em Portugal, há um problema com o salário médio líquido, que se está a “colar” ao salário mínimo. “O salário mínimo progrediu muito, merecidamente. O problema é o diferencial entre o salário mínimo que não paga IRS e o salário médio líquido que paga, uma diferença está na casa dos 250 euros. O salário médio líquido está vertiginosamente perto do mínimo”, reiterou Paulo Portas;
  • A tecnologia, nomeadamente a IA, entrou em força na sociedade e também na atividade da mediação imobiliária. “Há várias oportunidades de negócio que se abrem com a IA. Não adianta resistir, há que automatizar naquilo que não acrescenta valor e investir no que acrescenta”, reconheceu Alfredo Valente, CEO da iad Portugal;
  • Os preços dos terrenos são caros e é preciso agilizar e facilitar a conversão de solos rústicos para urbanos: “Se as câmaras tiverem possibilidade, que têm, de libertar solos rústicos para urbanos e colocá-los no mercado estabelecendo os limites de venda dessas casas, há promotores imobiliários que vão comprar”, assegura Isaltino Morais, presidente da Câmara Municipal de Oeiras. “Os preços das casas não vão baixar, porque os solos são caros. Todos os dias recebo promotores em Oeiras que querem construir a custos controlados, mas para isso têm de ter terrenos a preços acessíveis”, concluiu. 

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