Nova mudança de ciclo do setor imobiliário na Europa é marcada pela dificuldade em obter financiamento dada a subida dos juros.
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Ciclo imobiliário a mudar na Europa
GTRES

As dificuldades em refinanciar um edifício de escritórios em Londres (Reino Unido) ou a tensa venda do Commerzbank Tower em Frankfurt (Alemanha) são exemplos claros da mudança de ciclo no mercado imobiliário europeu, que é marcada pelas crescentes dificuldades na obtenção de crédito face à rápida subida das taxas de juro. Hoje, os investidores estão a enfrentar a maior mudança de ciclo do setor imobiliário na Europa, diz a Bloomberg. E estão também a aguardar os resultados da banca e a sua reação à possível subida do crédito malparado.

A magnitude deste cenário será conhecida nas próximas semanas, altura em que são divulgados os resultados anuais das principais instituições de crédito da Europa. E o mercado está em alerta, já que as acentuadas quedas nas avaliações ameaçam subir o número de incumprimentos bancários, desencadeando medidas de financiamento de emergência que vão desde as vendas forçadas a injeção de capital.

O bolo geral da dívida ascende a cerca de 1,9 triliões de euros e distribuem-se em empréstimos, títulos e outras dívidas concedidas, sobretudo, a proprietários de imóveis residenciais e comerciais europeus e britânicos, apontam os dados da European Banking Authority, Bayes Business School, citados pelo mesmo meio.

Acontece que cerca de 20% do total da dívida – ou seja, cerca de 390 bilhões de euros – vai vencer este ano. E este vai ser o primeiro teste às regulamentações europeias elaboradas após a crise financeira global de 2008, para reduzir os riscos de os empréstimos imobiliários entrarem em incumprimento.

A verdade é que a aplicação dessas mesmas regulamentações europeias poderá levar a que as instituições bancárias na Europa reajam de forma mais severa perante os créditos em risco de incumprimento. Até porque, no geral, os bancos estão em melhor forma financeira do que durante a última crise imobiliária, pelo que podem estar menos dispostos a permitir que estes casos se arrastem. Este cenário coloca o ónus sobre os mutuários.

Financiamento bancário
Foto de khwanchai phanthong no Pexels

O que é que os bancos vão fazer com os seus empréstimos problemáticos?

Após a crise financeira de 2008, a maioria dos bancos resistiu em reclamar empréstimos malparados, porque isso iria causar enormes perdas. De acordo com as novas regras do crédito malparado, os credores (bancos e instituições de crédito) devem antecipar as perdas esperadas, em vez de as acumuladas. Isso significa que as instituições têm menos incentivos para ficarem paradas e esperar que os valores dos ativos se recuperem.

“As avaliações do fim de ano realizadas no primeiro trimestre serão a chave”, destacou Ravi Stickney, socio gerente e diretor de investimentos imobiliários na Cheyne Capital. “A grande questão está sobre o que os bancos vão realmente fazer”, garante o especialista citado pelo mesmo meio.

Até agora, as avaliações não caíram o suficiente para colocar em risco a dívida sénior - os empréstimos que os bancos normalmente mantêm -, mas isso pode mudar em breve. As propriedades comerciais do Reino Unido, avaliadas pela consultora imobiliária CBRE, caíram 13% no ano passado. A queda acelerou no segundo semestre. Os analistas da Goldman Sachs preveem que a queda total pode ultrapassar os 20%.

Os bancos podem agir antes que os preços caiam ainda mais e se arrisquem a perdas maiores. Os problemas podem tornar-se mais graves para quem vê as dívidas a vencer. Os bancos e entidades estão a reduzir o valor dos imóveis que estão dispostos a financiar. E isso significa que uma avaliação mais baixa pode funcionar como um golpe duplo, ampliando a lacuna de financiamento bancário.

“O apetite dos bancos está fraco e permanecerá moderado até que haja sinais de que o mercado atingiu o fundo do poço”, diz Vincent Nobel, diretor de empréstimos da Federated Hermes. "Os novos regulamentos encorajam os bancos a lidar com empréstimos malparados, e uma maneira de resolver os problemas é torná-los um problema de outra pessoa”, comenta ainda Vicent Nobel citado pela Bloomberg.

Subida de juros na Europa
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Da Suécia ao resto da Europa: como é que os fundos alternativos vão ajudar?

Até agora, a Suécia tem sido o epicentro da crise, registando uma queda dos preços das casas de 20% em relação aos valores máximos. As empresas imobiliárias que operam no país perderam 30% de seu valor nos últimos 12 meses. E o Banco Central da Suécia e a Autoridade de Supervisão Financeira (FSA) alertaram repetidamente sobre os riscos da dívida imobiliária comercial.

A queda nos valores das propriedades pode desencadear um "efeito dominó", já que a procura por mais garantias bancárias podem forçar a venda dos imóveis com prejuízo, de acordo com Anders Kvist, consultor sénior do diretor da FSA.

Há países que asseguram fatores de estabilidade no mercado hipotecário, como é o caso de Portugal, Itália e Espanha, que foram os mais atingidos após a crise financeira global. Mas há outros que estão mais expostos ao risco: o Reino Unido está a entrar em colapso e há sinais de que a Alemanha pode ser o próximo país.

Por outro lado, há mais opções disponíveis para investidores imobiliários em dificuldades. Entidades como os fundos de crédito expandiram-se durante a última década. As seguradoras e outros credores alternativos tiveram uma parcela maior de novos empréstimos imobiliários no Reino Unido do que os principais bancos do país no primeiro semestre do ano passado, de acordo com a pesquisa de Bayes.

Nos próximos 18 meses, os investidores vão investir uma quantidade recorde de dinheiro nos chamados “fundos oportunistas” que fazem apostas no imobiliário mais arriscadas, disse o presidente-executivo da Cantor Fitzgerald, Howard Lutnick, na semana passada no Fórum Económico Mundial, em Davos. A tendência ajudará a acelerar a recuperação dos mercados imobiliários comerciais, observou.

Essas novas ferramentas podem tornar a crise mais curta do que no passado, quando os bancos se agarraram a empréstimos malparados durante vários anos. Louis Landeman, analista de crédito do Danske Bank em Estocolmo, espera que os mutuários tenham as ferramentas suficientes para agir contra este novo ciclo imobiliário que se está a instalar em solo europeu.

Queda dos preços das casas na Europa
Foto de Dominika Gregušová no Pexels
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