
O atual contexto de incerteza em volta da guerra comercial com os EUA levou muitos bancos centrais a fazer uma pausa na descida dos juros de referência, assumindo uma posição “wait and see”. Mas o Banco Central Europeu (BCE) decidiu dar um rumo diferente à sua política monetária, voltando a descer as suas taxas de juro diretoras em 25 pontos base esta quinta-feira, dia 17 de abril. O seu objetivo passa por estimular a economia europeia, que permanece fraca e vê-se ameaçada pelas tarifas de Trump.
Tal como anteciparam os analistas de mercado na última semana, o regulador europeu avançou com aquele que é o sétimo corte dos juros desde que iniciou o ciclo de alívio da sua política monetária em junho, deixando as taxas no nível mais baixo desde o final de 2022 (entre 2,25% e 2,65%).
Com esta a nova descida de 25 pontos base decidida na reunião realizada esta quinta-feira, dia 17 de abril, os juros do BCE passam a fixar-se nos seguintes valores a partir de 23 de abril:
- Taxa aplicada à facilidade permanente de depósitos diminui para 2,25%;
- Taxa de juro das principais operações de refinanciamento desceu para 2,40%;
- Taxa aplicável à facilidade permanente de cedência de liquidez cai para 2,65%.
Inflação na zona euro continua a descer – mas riscos para economia dispararam
A decisão do guardião do euro liderado por Christine Lagarde foi tomada à luz dos atuais dados e perspetivas sobre a inflação na zona euro e crescimento económico, bem como a força da transmissão da sua política monetária.
Por um lado, “o processo de desinflacionista está bem encaminhado” rumo ao objetivo de 2% no médio prazo, tal como destaca o Conselho do BCE em comunicado. A inflação na zona euro caiu para 2,2% em março (estava em 2,3% em fevereiro) e a inflação subjacente – que não inclui os preços da energia e dos alimentos – baixou para 2,5% (fixou-se em 2,6% no mês anterior), segundo os dados mais recentes do Eurostat.
"A maioria das medidas da inflação subjacente sugere que a inflação estabilizará, numa base sustentada, em torno do objetivo de médio prazo de 2%", referem desde o supervisor. E acrescenta ainda que "o crescimento dos salários regista uma moderação e os lucros estão a atenuar, em parte, o impacto do crescimento ainda elevado dos salários na inflação".
"A inflação continuou a evoluir em consonância com as expectativas dos nossos especialistas, tendo tanto a inflação global como a inflação subjacente descido em março", Conselho do BCE
Este é o cenário atual para a inflação na zona euro, que corre o risco de mudar depois de o presidente dos EUA, Donald Trump, ter anunciado as novas tarifas de 20% a produtos importados da União Europeia. “No médio prazo, ainda não se sabe em que direção a inflação se vai mover, impulsionada para cima pelas tarifas e para baixo pela esperada desaceleração do consumo”, comenta Miguel Cabrita, responsável pelo idealista/créditohabitação em Portugal.
“Um euro mais forte contribuirá para reduzir a inflação importada. Além disso, a descida dos preços do petróleo, desencadeada por receios de um abrandamento económico mundial e de aumentos da produção da OPEP+, também contribuirá para o processo desinflacionista”, acrescentam os analistas da Ebury Portugal em declarações ao idealista/news.
Vislumbra-se, no entanto, um cenário bem adverso para o crescimento económico na área do euro, motivo pelo qual os membros do Conselho do BCE optaram por reduzir novamente os juros, uma decisão que foi unânime entre os governadores. “O BCE parece ter mudado sua agenda diante do terremoto tarifário de Trump e está a antecipar uma provável desaceleração na atividade económica”, que está praticamente estagnada há cerca de dois anos, diz Miguel Cabrita.
Aliás, Christine Lagarde já admitiu mesmo que a guerra comercial dos EUA poderia reduzir o Produto Interno Bruto (PIB) da zona euro em 0,5%, mesmo com o estímulo fiscal da Alemanha. “No plano do crescimento, tanto os direitos aduaneiros como um euro mais forte poderão reduzir as exportações europeias, num contexto de quase estagnação económica”, antecipam desde a Ebury.
"A economia da área do euro tem vindo a reforçar a sua resiliência a choques mundiais, mas as perspetivas de crescimento deterioraram‑se devido às crescentes tensões comerciais", Conselho do BCE
Portanto, “os receios de uma guerra comercial global frustraram as esperanças de que a zona euro pudesse estar a iniciar uma recuperação económica sustentada em 2025", conclui Michael Krautzberger, diretor de Investimento Global em Obrigações, Allianz Global Investors (Allianz GI).
Desde o BCE consideram que "é provável que a incerteza acrescida reduza a confiança das famílias e das empresas e que a reação adversa e volátil do mercado às tensões comerciais conduza a um aumento da restritividade das condições de financiamento. Estes fatores podem afetar ainda mais as perspetivas económicas para a área do euro", admitem.
Lagarde destacou, aliás, que "algumas das tarifas já estão em vigor, que subiram de aproximadamente 3% até 13% em termos de taxas em bens exportados para os EUA". Estas tarifas já aplicadas são um "choque negativo na procura e podemos antecipar que vai ter algum impacto no crescimento, mas o impacto líquido na inflação ficará mais claro com o tempo", acrescentou na conferência de imprensa após a reunião. Até porque "há uma série de respostas potenciais do lado da Comissão Europeia", alerta.

Juros do BCE ainda têm margem para descer em 2025?
Ainda faltam cerca de dois meses para o próximo encontro do Conselho do BCE, que se realiza a 5 de junho. Nessa altura, o supervisor europeu conseguirá ter uma visão mais abragente e concreta sobre o impacto das tarifas de Trump na inflação e no crescimento económico. Uma vez mais, "o Conselho do BCE não se compromete previamente com uma trajetória de taxas específica, especialmente nas atuais condições de excecional incerteza", dizem. Já os analistas de mercado antecipam que o BCE seguirá com um novo corte dos juros.
“Neste momento, acreditamos que um novo corte em junho é um cenário provável. De facto, o mercado não só dá como certo este corte, como desconta mais um a dois antes do final do ano (ou seja, um total de três a quatro cortes)”, explicam os analistas da Ebury Portugal, que não excluem a possibilidade de as taxas do BCE descerem para o limite inferior à taxa neutra estimada (1,75 - 2,25%) ou até mesmo abaixo dele.
Perante os receios sobre a evolução do Produto Interno Bruto (PIB) europeu devido à guerra comercial iniciada nos EUA, Michael Krautzberger, da Allianz GI, diz que os mercados agora esperam que o BCE "corte os juros nas próximas duas reuniões, e uma taxa no final do ciclo previsto abaixo dos 2%".
Por seu turno, Martin Wolburg, economista sénior da Generali AM, antecipa mesmo que a guerra comercial desencadeie mais dois cortes consecutivos nas taxas para 1,75%. E se esta incerteza escalar ainda mais, estarão no horizonte “cortes ainda maiores para território expansionista”, antevê. Isto porque "mesmo sem uma nova escalada por meio de retaliações da UE, o PIB da zona do euro pode ser afetado em quase 0,5 pontos percentuais do PIB no horizonte de um ano", diz o especialista indo ao encontro das estimativas da própria Lagarde.

As próximas reuniões do BCE
O Conselho do BCE reúne-se aproximadamente de seis em seis semanas. Este é o calendário das próximas reuniões de política monetária do guardião do euro, nas quais vai anunciar as suas decisões sobre as taxas de juro diretoras:
- 5 de junho de 2025
- 24 de julho de 2025
- 11 de setembro de 2025
- 30 de outubro de 2025
- 18 de dezembro de 2025
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