
As famílias já têm vindo a sentir um ligeiro alívio nas prestações da casa com as recentes descidas da Euribor, que já estava a antecipar aquele que foi o primeiro corte dos juros diretores pelo Banco Central Europeu (BCE) decidido esta quinta-feira, dia 6 de junho. Mas agora há uma questão que se impõe: será que os juros no crédito habitação em Portugal vão descer ainda mais? Tudo depende de como reagir a Euribor à redução dos juros do BCE. Os analistas de mercado antecipam que as taxas Euribor deverão continuar a descer, mas não muito mais no curto prazo. E também consideram improvável que haja impacto positivo imediato na venda de casas. Explicamos porquê.
A tão aguardada redução das taxas de juro diretoras pelo BCE foi anunciada na reunião de política monetária realizada esta quinta-feira, dia 6 de junho. Esta decisão do regulador liderado por Christine Lagarde terá impacto nos novos créditos habitação, assim como nos existentes. Mas os especialistas de mercado admitem que este impacto nas prestações da casa será limitado, por duas razões. Primeiro, trata-se de uma ligeira redução dos juros de 25 pontos base, que desceu a taxa de refinanciamento para 4,25%. Segundo, as taxas Euribor já têm vindo a descontar este alívio previsto dos juros do BCE.
Uma maior descida das prestações da casa relativas aos empréstimos a taxa variável (ou mista em período variável) vai depender das decisões tomadas pelo guardião do euro daqui para a frente. Para já, "o Conselho do BCE não se compromete previamente com uma trajetória de taxas específica", revelam em comunicado, o que significa que um novo corte dos juros tem data incerta, podendo ocorrer apenas depois do verão.
Euribor já está a descer e a aliviar prestações da casa
O que se tem sentido no mercado financeiro é que a Euribor já assumiu uma trajetória descendente. Desde o final de 2023 que as taxas têm vindo a descer – embora de forma não linear -, antecipando o corte dos juros do BCE, que tem sido anunciado pelo próprio regulador nos últimos meses.
Ao descontar os cortes dos juros do BCE já previstos para junho, as taxas Euribor desceram para todos os prazos em maio face ao mês anterior:
- Euribor a 12 meses: a média mensal de maio foi de 3,680%, menos 0,023 pontos percentuais (p.p.) face a abril (3,703%);
- Euribor a 6 meses: esta taxa mensal caiu para 3,787% em maio, menos 0,051 p.p. do que em abril (3,838%);
- Euribor a 3 meses: a taxa do prazo mais curto desceu para 3,813% em maio, um menor valor face ao mês anterior, quando se fixou em 3,885%.
Estas recentes descidas da Euribor têm influenciado em baixa, sobretudo, as prestações dos novos créditos habitação em Portugal (a taxa variável) – tal como mostramos neste artigo que tem por base simulações do idealista/créditohabitação. Mas este alívio das prestações tem sido ligeiro, de apenas alguns euros. Também quem já está a pagar um empréstimo da casa viu baixar as prestações revistas em junho (ainda que ligeiramente).
O que se tem visto no mercado, por outro lado, é que vários bancos estão a melhorar as condições dos créditos habitação a taxa mista, antecipando também o alívio dos juros do BCE. E tanto assim é que as taxas mistas passaram a representar 75% dos novos créditos habitação própria e permanente em abril (um peso recorde em Portugal), tal como revelou recentemente o Banco de Portugal.
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Como é que o corte dos juros do BCE vai impactar o crédito habitação no imediato?
Muito se tem falado que as boas notícias para quem quer contratar um crédito habitação (ou já tem um) iriam chegar a partir de junho, uma vez que a redução das taxas do BCE levaria a uma queda significativa da Euribor. Mas será mesmo assim? Agora, os especialistas de mercado admitem que, afinal, a descida destas taxas no curto prazo poderá não ser tão grande como o esperado.
Questionado sobre o impacto da descida dos juros do BCE sobre as hipotecas, Miguel Cabrita, responsável pelo idealista/créditohabitação em Portugal, admite que “é possível que não tenha um impacto real ao nível do consumidor, porque a Euribor a 12 meses já está a descontar esta queda”.
Também David Brito, diretor-geral da Ebury Portugal, diz ao idealista/news que a “queda do indicador pode não ser muito significativa”, uma vez que “os mercados já estão a descontar esse corte há algum tempo”. "Parece que a descida da Euribor será mais lenta e gradual do que o previsto há alguns meses, pelo que os titulares de hipotecas terão de ser um pouco mais pacientes", acrescenta.
Esta opinião é partilhada por Miguel Córdoba, professor de economia financeira na Universidade CEU San Pablo, que afirma que o corte das taxas terá “um pequeno efeito nas economias familiares, reduzindo ligeiramente os juros dos créditos habitação". Isto porque as descidas dos juros “afetam apenas uma parte das suas prestações mensais, uma vez que estas são compostas por capital a amortizar e por juros”.

Claro está que os empréstimos habitação a taxa variável contratados nos próximos meses vão beneficiar mais da recente redução da Euribor (e das futuras descidas, mesmo que sejam ligeiras). E há uma explicação simples: os créditos da casa são contratados com as novas taxas (mais baixas) e no início do contrato os mutuários pagam uma parcela muito maior de juros do que de capital.
Por outro lado, quem está a pagar créditos habitação a taxa variável (ou mista em período variável) já não vai sentir tanto as descidas da Euribor, desde logo porque as atualizações das prestações são feitas a cada três, seis ou 12 meses, conforme o prazo da Euribor contratado. Portanto, as famílias que utilizem prazos mais longos vão ter atualizações da prestação mais demoradas. Por outro lado, quanto mais tempo uma família estiver a pagar o crédito, menos paga de juros e mais capital amortiza.
O economista Miguel Córdoba explica isso mesmo recorrendo a um exemplo de um crédito habitação contratado há 15 anos: “Uma família que paga 800 euros de prestação, deste valor 600 euros são para amortizar capital em dívida e 200 euros são juros, pelo que uma descida de 0,25 pontos percentuais significa reduzir a prestação em cerca de 12,5 euros. Assim, fica a pagar 787,5 euros por mês”.
Embora o ritmo de queda seja uma incógnita, os especialistas acreditam que a Euribor deverá continuar a descer nos próximos meses, isto se não se verificarem surpresas negativas do lado dos indicadores económicos que influenciem as decisões do BCE, como a inflação.

Venda de casas em Portugal vai aumentar com alívio dos juros?
A venda de casas em Portugal – e na Europa – caiu durante 2023 devido aos elevados juros no crédito habitação, a par dos baixos salários e dificuldades em economizar perante o aumento do custo de vida. Agora, será que o alívio dos juros poderá motivar a compra de casas? Os especialistas não acreditam que haverá um aumento imediato de transações.
O economista espanhol Julián Salcedo, presidente do Fórum de Economistas Imobiliários, garante ao idealista/news que o problema não está só nas elevadas taxas de juro no crédito habitação, mas sim num conjunto de fatores, como:
- Preço das casas está em alta e “inacessível para grande parte dos compradores”
- Salários continuam baixos e “insuficientes para pagar o preço atual das casas”;
- Perda de capacidade de compra das famílias;
- Dificuldades de acesso ao financiamento bancário (para os menos solventes);
- Falta de poupança prévia para dar de entrada para o crédito.
“A verdade é que as taxas atuais não constituem uma limitação à atividade do mercado imobiliário. Os bancos estão a ser bastante agressivos, especialmente nas ofertas de taxas fixas e mistas, claramente abaixo da Euribor. E nestes níveis os pagamentos dos créditos habitação são normalmente aceitáveis para a maioria dos compradores. O problema está na parte da poupança”, frisa Miguel Cabrita.
Foi por isso mesmo que o Governo de Montenegro avançou com dois apoios à compra de casa destinados aos jovens até aos 35 anos: a isenção de IMT e imposto de selo para habitações até 316 mil euros e a garantia pública até 15% do crédito da casa. Resta agora saber se estas medidas vão passar pelo crivo do Parlamento.
Também a gestora alemã Patrizia diz que “é improvável que um corte por si só tenha um impacto material na dinâmica do mercado residencial da noite para o dia, especialmente porque é esperado há muito tempo e, portanto, é amplamente descontado. No entanto, é certamente um passo na direção certa para criar uma atividade de mercado mais favorável e construtiva”, acrescenta.
Quanto aos preços das casas, não se espera uma mudança. E Miguel Cabrita, do idealista/créditohabitação, explica porquê: “O verdadeiro problema do mercado imobiliário é a grande diferença entre a oferta e a procura, e esta não dá sinais de ser resolvida no curto prazo, razão pela qual continuamos a ver pressão sobre os preços nas grandes cidades e zonas com maior procura. Não estão a ser construídas mais casas, a procura continuará forte. Não estamos otimistas em relação aos preços”, conclui.

Euribor vai descer até aos 3% em 2024 - e prestações caem
A descida da Euribor ao longo de 2024 vai depender das decisões do BCE quanto ao rumo das taxas de juro diretoras. Agora, os mercados financeiros admitem que a data em que poderá ocorrer um alívio do preço do dinheiro é incerta. Mas preveem que haja mais dois ou três cortes destas taxas até ao final do ano de 25 pontos base, pelo que o alívio da política monetária deverá ser lento, tal como explicamos neste artigo.
Quanto à evolução da Euribor nos próximos meses, o economista Julián Salcedo assume que vai haver mais recuos das taxas em breve, mas alerta: “Ninguém espera grandes quedas. Dificilmente a veremos abaixo de 3% no final de 2024, e não seria bom que caísse abaixo deste nível, pelo menos até que a inflação seja sustentada no objetivo de 2%”.
Estas são as previsões de alguns analistas de mercado para a evolução da Euribor até ao final de 2024:
- a Ebury Portugal admite que a Euribor se situe em torno dos 3% - 3,5% no fim do ano;
- o Bankinter vê a Euribor em torno de 3,25% no final do ano;
- o BBVA Research admite que a Euribor ficará em 3,3%;
- desde a espanhola Funcas, colocam o indicador nos 3,2% em 2024.
Ao que tudo indica, há consenso entre especialistas de que as taxas Euribor não deverão descer abaixo dos 3% até ao final deste ano. E a descida deste indicador deverá ser lenta e moderada, evoluindo em linha com as decisões futuras do BCE. Mas como é que ficam as prestações da casa? As simulações do idealista/créditohabitação, tendo em conta novos empréstimos da casa de 150.000 euros (com spread de 0,7% e prazo de 30 anos), mostram que:
- se a Euribor a 6 meses cair dos atuais 3,787% (média mensal de maio) para 3,5%, significa que as prestações mensais vão descer dos atuais 759 euros para 733 euros (menos 26 euros);
- se a Euribor a 6 meses descer para 3,25% este ano, as prestações da casa passam para 711 euros (menos 48 euros);
- se no final do ano a Euribor a 6 meses estiver em 3%, as prestações da casa serão de 690 euros. Isto quer dizer que se uma família contratar um crédito habitação a taxa variável no final deste ano pagará quase menos 70 euros de prestação durante o semestre seguinte do que quem se antecipou e contratou o empréstimo da casa em junho.
Assim, depois de o BCE avançar com os cortes dos juros esta quinta-feira, as famílias portuguesas podem esperar uma descida progressiva da Euribor ao longo de 2024, embora tudo indique que esta trajetória será bem mais lenta do que a sua fase ascendente. Enquanto os novos créditos habitação de taxa variável vão logo refletir as menores taxas Euribor, nos empréstimos da casa existentes a descida da Euribor vai ser sentida só quando as prestações da casa forem atualizadas trimestral, semestral ou anualmente.
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