Preocupações do banco central liderado por Lagarde centram-se, agora, em reanimar a economia europeia que continua fraca.
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Juros do BCE a descer
Christine Lagarde, presidente do BCE Getty images

As inquietações do Banco Central Europeu (BCE) têm vindo a mudar ao longo do último ano. Antes, a principal preocupação passava por baixar a inflação na zona euro até ao patamar dos 2%. Como a subida de preços parece estar controlada, os olhos da presidente Christine Lagarde estão postos agora no fraco crescimento da economia europeia e no contexto internacional. Foi precisamente para animar o consumo e o investimento que o guardião do euro decidiu voltar a descer as taxas de juro diretoras em 25 pontos base na reunião desta quinta-feira, dia 30 de janeiro. Mas há quem admita que a política de Donald Trump, novo presidente dos EUA, pode ameaçar a estabilidade da inflação e fazer mudar o rumo da política monetária europeia.

Tal como previam os analistas de mercado, o BCE voltou a cortar as suas taxas de juro diretoras em 25 pontos base na reunião de política monetária realizada esta quinta-feira, a primeira de 2025. Assim vão ficar os juros do BCE, pelo menos, até dia 6 de março de 2025, data do próximo encontro:

  • Taxa aplicada à facilidade permanente de depósitos diminui para 2,75%;
  • Taxa de juro das principais operações de refinanciamento desceu para 2,9%. 
  • Taxa aplicável à facilidade permanente de cedência de liquidez cai para 3,15%.

"Não houve discussão sobre se esta decisão era apropriada, foi unânime, todos os governadores apoiaram a decisão de cortar em 25 pontos", disse a presidente do BCE, Christine Lagarde, na conferência de imprensa após a reunião. 

"O BCE continua com a sua agenda de redução controlada da pressão monetária, apesar dos possíveis riscos de uma guerra tarifária que começa nos EUA. O regulador europeu continua confiante de que a inflação parece estar controlada, embora ainda tenha um último caminho para atingir o objetivo de 2%", comenta Miguel Cabrita, responsável pelo idealista/créditohabitação em Portugal.

Aquele que é o 5º corte dos juros do BCE assinala, assim, que o regulador europeu continua confiante num regresso da inflação na área euro à meta de 2%, depois de ter começado a descida dos juros em junho passado. Para Christine Lagarde, presidente do BCE, “a direção [das taxas] é clara", disse no Fórum Económico Mundial de Davos.

"O processo desinflacionista está bem encaminhado", lê-se no comunicado publicado do BCE publicado esta quinta-feira, onde admite que a inflação global e a inflação subjacente vão estabilizar em torno de 2% no decurso deste ano. Por outro lado, "a inflação interna permanece elevada, sobretudo porque os salários e os preços em determinados setores [como o dos serviços] ainda estão a ajustar‑se".

A verdade é que a inflação na zona euro tem vindo a estabilizar em torno dos 2% nos últimos meses, tendo a taxa anual se fixado em 2,4% em dezembro (subiu ligeiramente face ao mês anterior), de acordo com os dados do Eurostat. Agora, a sua maior motivação em aliviar os juros está em reanimar o crescimento económico. É isso mesmo que diz Jari Stehn, economista-chefe na Europa da Goldman Sachs: “Os riscos para a economia da zona do euro estão atualmente no lado do crescimento, em vez da inflação”.

"A economia continua a enfrentar fatores adversos, mas o aumento dos rendimentos reais e o desvanecimento gradual dos efeitos da política monetária restritiva deverão apoiar uma subida da procura com o tempo", Conselho do BCE

As mais recentes estimativas da Bloomberg revelam que o Produto Interno Bruto (PIB) na área euro deverá crescer apenas 0,1% no quarto trimestre de 2024, o que representa um abrandamento face aos 0,4% registados no período anterior. Entretanto, o Eurostat revelou que a economia na zona euro deverá ter estagnado no fim do ano passado, de acordo com as suas estimativas provisórias. E a Alemanha e a França, as maiores economias da zona euro, deverão ser principais responsáveis por esta estagnação – até porque ambas estão a passar por turbulências políticas.

Apesar de os empréstimos estarem a ficar gradualmente menos onerosos para as empresas e famílias, o Conselho do BCE realça que "as condições de financiamento mantêm‑se restritivas, também porque a política monetária continua a ser restritiva e os passados aumentos das taxas de juro ainda estão a ser transmitidos ao stock de crédito", refere no documento.

Mas há sinais de esperança de que as reduções dos juros do BCE dinamizem a atividade económica europeia: "A economia continua a enfrentar fatores adversos, mas o aumento dos rendimentos reais e o desvanecimento gradual dos efeitos da política monetária restritiva deverão apoiar uma subida da procura com o tempo", antecipam desde o regulador europeu.

Decisões do BCE
Getty images

Juros do BCE têm margem para descer: quanto?

Depois da reunião desta quinta-feira, os olhos dos mercados já estão postos no próximo encontro dos membros do Conselho do BCE, que se vai realizar a 6 de março. Desde o regulador europeu sente-se cautela sobre o futuro, uma vez que voltou a frisar que "não se compromete previamente com uma trajetória de taxas específica".

Aliás, Christine Lagarde admitiu que ainda "não houve discussão sobre o ponto onde parar a trajetória de redução". Mas assegurou que os governadores sabem "a direção a seguir", já o ritmo, sequência e magnitude será consoante os dados que o BCE recolhe nas próximas semanas e meses.

Por parte dos analistas, as expectativas estão voltadas para um novo corte dos juros do BCE de 25 pontos base em março, o que colocaria a taxa dos depósitos em 2,5%. “Dada a posição atual da economia, um ritmo de 25 pontos-base por reunião parece apropriado”, comenta Michala Marcussen, economista-chefe do grupo na Societe Generale, à Bloomberg, admitindo que “a perspectiva para o crescimento de 2025 é fraca” e que a “preocupação está voltada para a competitividade”.

Há quem admita que o corte de juros do BCE poderá ocorrer só depois de março. Desde a Ebury Portugal admitem que "a nova redução da taxa de juro de 'dimensão normal' será realizada na próxima reunião em maio, que seria a sexta consecutiva", explicam ao idealista/news.

A mais recente projeção dos economistas aponta para que o BCE fixe os juros entre 2% e 2,25%. E uma das hipóteses mais aceite atualmente é que as taxas do BCE estabilizem em 2% (ao nível da inflação), embora as previsões para o fim de 2025 possam variar muito. 

“O ambiente monetário é menos propício a uma rápida descida das taxas de juro", Painel Funcas

"Desde que a economia não descarrile, é provável que o BCE mude de velocidade e, nos próximos trimestres, abrande o ritmo de cortes", dizem os analistas do BPI citados pelo Jornal de Negócios.

A verdade é que o clima de incerteza da política internacional escalou nos últimos meses: a somar aos conflitos armados (na Ucrânia e no Médio Oriente), a política do monetária do BCE pode ser posta à prova pelas novas medidas protecionistas de Donald Trump, que admite subir as tarifas alfandegárias sobre produtos europeus. 

“O ambiente monetário é menos propício a uma rápida descida das taxas de juro, ao contrário do que foi antecipado em novembro”, afirmam desde o espanhol Painel Funcas, que mantém uma “visão pessimista do ambiente internacional, particularmente na União Europeia”. E recorda que "persiste um diferencial significativo de crescimento e de taxas de juro entre a zona euro e os EUA".

Mas há também quem diga que o cenário económico está favorável a que o BCE avance com mais cortes dos juros, como é o caso do Bankinter, da Generali e da Julius Bear. Os especialistas destas entidades admitem que as taxas do BCE podem cair até 1,75% em meados de 2025, à medida que os riscos para a inflação desvanecem e o crescimento económico ganha fôlego.

"Por enquanto, os mercados continuam a ver uma taxa terminal do BCE de cerca de 2%, mas continua a existir um risco muito real de que o ciclo de cortes possa ir ainda mais longe do que isso, particularmente se os dados de atividade económica continuarem a surpreender para o lado negativo", antecipam os analistas da Ebury Portugal.

Juros do BCE
Getty images

Políticas de Trump ameaçam queda da inflação na área euro

O guardião do euro tem mostrado confiança quanto à estabilização da inflação na zona euro, afastando possíveis efeitos da política de Trump sobre a subida de preços na Europa. Esta semana, a própria Lagarde tentou minimizar as preocupações ao afirmar que "qualquer subida da inflação nos Estados Unidos (...) será um problema para os Estados Unidos".

Mas os economistas do Deutsche Bank já avisaram que a estabilidade da inflação na área euro pode ser posta em causa com a "política imprevisível" de Trump e pelo aumento recente dos preços do petróleo, cita a AFP. Também Isabel Schnabel, membro da Comissão Executiva do BCE, admite que “é muito provável” haver uma guerra comercial com EUA sob a presidência de Trump, com consequências negativas para a atividade e para os preços.

Esta quinta-feira, Lagarde admitiu que as tarifas que o Presidente norte-americano quer aplicar vão ter um "impacto global negativo", mas sem mais detalhes ainda não é possível avaliar os efeitos nas taxas, na redefinição de rotas de comércio e possíveis retaliações. "Quando isso acontecer, vai entrar na nossa avaliação", assegurou a presidente do BCE.

Durante a sua intervenção no Fórum de Davos, Trump voltou a ameaçar com tarifas aduaneiras, que, caso se concretizem, podem levar a Europa a reagir com reciprocidade, o que pode relançar a inflação.

Impacto da política de Trump na UE
Christine Lagarde, presidente do BCE, e Donald Trump, Presidente dos EUA Getty images

A verdade é que a política de Trump já está a influenciar a decisão do banco central dos EUA. Perante os novos riscos inflacionistas, a Reserva Federal (Fed) foi mais cautelosa na sua política monetária do que o BCE, tendo decidido deixar os juros inalterados na reunião de janeiro. Isto apesar de Donald Trump se ter pronunciado a favor de uma nova descida. Se o regulador europeu continuar a cortar os juros mais rápido que a Fed, poderá haver consequências para a economia europeia e para a inflação, uma vez que o euro voltará a cair face ao dólar, encarecendo os produtos importados e mexendo com investimentos.

Esta pressão de Trump sobre a Fed não é nova: o novo presidente dos EUA tem criticado o desempenho do banco central e do seu presidente Jerome Powell, afirmando que a política monetária da Fed é atualmente demasiado indecisa e que gostaria de ver os juros baixar “significativamente”. Tudo isto levou a presidente do BCE a afirmar que independência dos bancos centrais está a ser questionada em várias partes do mundo e que muitos enfrentam pressões políticas, o que afeta “o nível e a volatilidade das taxas de câmbio, as taxas de rendibilidade das obrigações e o prémio de risco”.

As próximas reuniões do BCE

O Conselho do BCE reúne-se aproximadamente de seis em seis semanas. Este é o calendário das próximas reuniões de política monetária do guardião do euro, nas quais vai anunciar as suas decisões sobre as taxas de juro diretoras:

  • 6 de março de 2025
  • 17 de abril de 2025
  • 5 de junho de 2025
  • 24 de julho de 2025
  • 11 de setembro de 2025
  • 30 de outubro de 2025
  • 18 de dezembro de 2025

*Com Lusa

*Notícia atualizada dia 31 de janeiro, às 15h08, com novos dados do PIB na zona euro e declarações da Ebury Portugal

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