
São muitos os players do setor imobiliário que apelam à necessidade de baixar o IVA na construção – de 23% para 6% – de forma a ser possível aumentar a oferta de casas em Portugal, sendo esse um dos caminhos a seguir para dar resposta à crise na habitação – ou à crise de acesso à habitação, como sugerem alguns especialistas. Luís Mota Duarte, Deputy CEO da Sonae Sierra, tem uma visão mais abrangente, considerando que os vários agentes do setor imobiliário ficam “muitas vezes a olhar para o Estado” à espera de resultados, podendo “fazer mais”.
“Na habitação, do ponto de vista da construção e da promoção, é muito mais atrativo investir em construir para vender (Build to Sell/BtS) do que construir para arrendar (Build to Rent/BtR), mas se calhar a sociedade precisa mais de BtR do que BtS. Não quero ser critico, mas tipicamente olhamos para o Estado e dizemos que tem de ajustar com o IVA, com os licenciamentos etc. Sim, tem de ajustar, mas nós, agentes económicos, promotores, bancos, construtores, proprietários de terrenos etc., podemos fazer mais para isso”, disse Luís Mota Duarte durante a sua intervenção na conferência “Portuguese Real Estate Investment Vehicles & Financing”, que se realizou esta sexta-feira (23 de maio de 2025) no hotel Pestana Palace, em Lisboa.
E concretizou a sua ideia: “Poder-se-ia juntar um grupo com estes agentes económicos com o objetivo de criar mais habitação, sendo rentável para todos na mesma. Se todos na cadeia de valor tiverem alinhados é muito mais fácil fazê-lo. Seguramente o Estado vendo uma iniciativa destas também poderia contribuir e ajudar. Creio que isso é necessário. Os agentes económicos em si podem fazer muito mais do que creio que fazemos atualmente”.
"Poder-se-ia juntar um grupo com estes agentes económicos com o objetivo de criar mais habitação, sendo rentável para todos na mesma. Se todos na cadeia de valor tiverem alinhados é muito mais fácil fazê-lo. Seguramente o Estado vendo uma iniciativa destas também poderia contribuir e ajudar. Creio que isso é necessário. Os agentes económicos em si podem fazer muito mais do que creio que fazemos atualmente"
Luís Mota Duarte, Deputy CEO da Sonae Sierra
Segundo o Deputy CEO da Sonae Sierra, que assumiu o cargo em 2024, a própria Sonae Sierra está “a tentar fazer algumas coisas” no setor residencial, “tanto de ‘affordable housing’ (habitação acessível ou a custos controlados) como de BtR”, e com a “consciência de ter um retorno mais baixo”.
“Tendo em conta que estamos praticamente na cadeia de valor toda conseguimos criar um modelo mais rentável, e assim também tentamos entrar um pouco por esse caminho. No entanto, creio que o imobiliário muitas vezes fica a olhar para o Estado, para tentar o Estado resolver temas fiscais, nomeadamente, que podem acontecer ou não, mas nós temos de viver apesar disso e tentar resolver [o tema da falta de habitação]”, explicou.
Para Luís Mota Duarte não há dúvidas: há muitas oportunidades em Portugal e bastante interesse pelo país, nomeadamente no setor imobiliário, mas também há desafios. “Um dos maiores é criar as condições para este crescimento continuar. Ele pode continuar e o imobiliário pode desempenhar um papel muito importante. O imobiliário visto de uma forma absoluta, do ponto de vista ‘risk-adjusted’, tipicamente é mais baixo, e do ponto de vista ‘renturn on equity’, porque é muito alavancável, tipicamente tem um retorno mais atrativo. Esta componente de ‘risk-adjusted’ é onde Portugal tem falhado um pouco. Portugal tem tido uma perceção de risco no mercado internacional de ser de elevado risco, quando não o é, não é um país de elevado risco. Comparativamente com outros países, temos até bastante estabilidade”.
E deixou um alerta. “Se Portugal é um país em que não confiamos uns nos outros é porque algures na vida fomos enganados. Esse comportamento cabe-nos a todos, o de criar essa estabilidade, para que quem internacionalmente faça negócios em Portugal se sinta confortável, seguro”.

Sierra e banco BTG: queremos ser “complementares à banca”
Noutro painel de debate, mais direcionado para a banca comercial e para a importância e/ou necessidade de haver, atualmente, maior disponibilidade de financiamento alternativo no setor imobiliário nacional, com a entrada de novos ‘players’ no mercado, responsáveis da Sonae Sierra e do BTG Pactual, o principal banco de investimento da América Latina, abordaram a parceria que fizeram recentemente. O objetivo, asseguraram, passa por apostar em ativos para os quais os bancos tradicionais não tencionam olhar.
“Identificámos uma oportunidade de entrar na área do crédito imobiliário há uns tempos e recentemente celebrámos este acordo com o BTG Pactual, para podemos entrar e investir no setor imobiliário não só através do ‘equity’, como temos feito ao longo dos anos, mas também através do crédito”, explicou David Campos e Cunha, Head of Credit Ventures, Invesment Management da Sonae Sierra.
“Na prática trazemos para cima da mesa o nosso conhecimento, seja setorial como geográfico, especialmente útil para um ‘player’ como o BTG, e funcionamos quase como um ‘advisor’, mas um ‘advisor’ que vai um passo além do ‘advisor’ tradicional, porque coinveste, ou seja, coinvestimos com os nossos parceiros. É essa visão diferente e inovadora que trazemos para cima da mesa. Financiamos terrenos, ativos que podem estar menos bem percebidos, que podem estar em diferentes fases do ciclo de vida, que não encaixam perfeitamente naquilo que os nossos colegas procuram para alavancar. É aí que queremos estar, precisamente como complementares à banca e nunca como concorrentes”, detalhou, enaltecendo a importância de perceber qual é o ciclo de vida dos ativos.
"Financiamos terrenos, ativos que podem estar menos bem percebidos, que podem estar em diferentes fases do ciclo de vida, que não encaixam perfeitamente naquilo que os nossos colegas procuram para alavancar. É aí que queremos estar, precisamente como complementares à banca e nunca como concorrentes"
David Campos e Cunha, Head of Credit Ventures, Invesment Management da Sonae Sierra
Do lado do BTG Pactual, Alberto Sanchez, Director e Corporate Lending for Europe do banco de investimento brasileiro, revelou que o banco entrou na Europa há dois anos, estando muito focado na Ibéria, e que o “setor imobiliário está muito quente”, com muitos projetos – residenciais, hotéis, comércio, etc. – a precisar de financiamento.
“Há alguns projetos que os bancos tradicionais não gostam de financiar. O financiamento para a aquisição de terrenos, por exemplo, é algo que podemos olhar. Para nós, que estamos ainda a tentar encontrar o nosso espaço, financiar um ativo numa cidade portuguesa ou espanhola para o desenvolvimento de um projeto residencial quando sabemos que há falta de oferta, parece um investimento bom. Se é um terreno que tem um projeto bom e está numa boa cidade podemos olhar. O que percebemos é que os projetos muito bons são muito bem cobertos pelos bancos locais, e aí a concorrência é terrível e não conseguimos participar, mas há espaço e projetos para financiadores alternativos, sendo aí que entramos nós. Como parte dessa estratégia, fizemos uma parceria com a Sonae Sierra”, contextualizou Alberto Sanchez.
“Somos um banco que não tem muitas linhas vermelhas. A nossa ideia é trabalhar com os ‘sponsors’ para encontrar uma estrutura que funcione para eles e para nós, é encontrar um ponto de encontro”, concluiu.
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