Em entrevista, os responsáveis pela nova promotora Antrix explicam como construir habitação acessível e levá-la para todo o país.
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Gonçalo Lopes
Gonçalo Lopes

Erik Vlieger chegou ao Algarve há cerca de 20 anos, onde investiu, sobretudo, em habitação e hotelaria com a Carvoeiro Branco. Mas o empresário holandês nunca desistiu do seu “sonho” de criar uma empresa nacional que levasse a habitação acessível mais além, para zonas como Lisboa, Coimbra e Porto. Foi com esta missão que nasceu este ano a promotora imobiliária Antrix, que tem o “objetivo de construir 10.000 casas” e a “preços baixos”, revelou Erik Vlieger, CEO da Antrix e Carvoeiro Branco. “Portugal precisa de casas para os portugueses”, sublinha em entrevista ao idealista/news.

Construir habitação acessível é, portanto, a grande missão da Antrix, que já está a analisar projetos em vários pontos do país, como no Montijo, em Setúbal e em Alcochete, os quais deverão dar “frutos” já em 2026. E, para que isso seja possível, será preciso construir em escala: “A ideia é criar habitação em quantidade, com margens mais baixas e preços mais acessíveis”, refere na mesma entrevista Pedro Limbert, diretor comercial e de marketing na Antrix e Carvoeiro Branco, que diz ver “com bons olhos” a possível redução do IVA na construção para 6%.

“A reabilitação é muito importante, porque um dos grandes problemas nas cidades em Portugal são as ruínas”, Erik Vlieger, CEO da Antrix e Carvoeiro Branco

Para já, a jovem promotora imobiliária tem investido ao lado da empresa mãe Carvoeiro Branco em projetos imobiliários de uso misto no Algarve. E têm uma particularidade: a recuperação de fábricas antigas. É o caso da Fábrica Bela Olhão, que deu lugar ao projeto Bela Formosa com um hotel, casas turísticas e residenciais, lojas e um centro de conferências. E da Fábrica do Inglês, em Silves, um centro cultural que terá “escritórios, o Museu da Cortiça, um pequeno hotel boutique, restauração e também alguma habitação”, avança Pedro Limbert.

A vontade de dar nova vida a fábricas ou outros edifícios devolutos está, assim, também na génese da Antrix, que pretende não ficar por aqui. Para o empresário holandês e fundador da promotora imobiliária Erik Vlieger, “a reabilitação é muito importante, porque um dos grandes problemas nas cidades em Portugal são as ruínas. E, às vezes, ninguém sabe quem são os proprietários das ruínas. É tempo de o Estado português criar uma lei para atacar este problema”, apela nesta entrevista conjunta ao idealista/news para ler em seguida.

Nova promotora imobiliária
Erik Vlieger, CEO da Antrix e Carvoeiro Branco, e Pedro Limbert, diretor comercial na Antrix e Carvoeiro Branco Créditos: Gonçalo Lopes | idealista/news

Erik de Vlieger vive em Portugal há cerca de 20 anos. Como avalia a evolução do mercado imobiliário português neste período? 

Erik de Vlieger [EV]: O Algarve tem uma economia muito diferente da do resto de Portugal, é muito turística. E temos um problema no Algarve – que também é um pouco uma irritação. Os meus pares, por exemplo, em Vilamoura estão a construir apartamentos entre 1 milhão e 2 milhões de euros. Mas quando precisam de um jardineiro para cuidar de espaços ao ar livre, precisam de um português que trabalha por cerca de 900 euros por mês. E o problema é que este português que cuida do jardim também precisa de uma casa acessível para viver e não existe. Então, a Carvoeiro Branco tem a responsabilidade de desenvolver casas também para os portugueses. Há promotores imobiliários de Lisboa, americanos e espanhóis que vêm para o Algarve só para obter lucro e esquecem-se que têm também a responsabilidade de construir casa para os portugueses.

“Portugal precisa de casas para os portugueses e não só para estrangeiros”, Erik de Vlieger

Em junho de 2025, criou a promotora imobiliária Antrix. O que traz de novo esta empresa para o mercado habitacional português? 

EV: Sempre tive o sonho de criar uma empresa portuguesa com projetos no Porto, Lisboa, Setúbal, Montijo, Carnaxide, Coimbra… Mas a realidade é que tenho 65 anos. Na Antrix temos três partners e também o meu filho que tem 35 anos. E, quando a criámos, disse-lhes que trabalharia na empresa durante dois anos e, depois, sairia para me concentrar apenas na Carvoeiro Branco, no Algarve, entre Sagres e Vila Real de Santo António.

No total do grupo, temos um portfólio de construção de 1.750 unidades neste momento, com o valor total de vendas previsto de mil milhões de euros. A Antrix é uma empresa nacional, que tem o objetivo de construir 10.000 casas. É um mercado para casas entre 200 e 400 mil euros, em quantidade é possível. Também falámos com uma empresa de construção para fazermos uma ‘joint venture’ para promover construção económica, porque Portugal precisa de casas para os portugueses e não só para estrangeiros. É muito importante. 

Construção de casas em Portugal
Empreendimento PrimeLife, Carvoeiro Créditos: Gonçalo Lopes | idealista/news

Investir em habitação será o vosso principal foco na Antrix? Em que zonas do país já têm projetos em negociação?

EV: No Algarve, temos resorts, hotéis e também habitação de baixo preço. Na região de Setúbal, Montijo e Moita será só residencial. Não falamos de edifícios com 30 ou 50 apartamentos, mas sim de quantidade, com margens de lucro mais pequenas. No primeiro ou segundo trimestres de 2026, estou convicto que vamos comprar posições no norte do Alentejo.

Pedro Limbert [PL]: Estamos neste momento em negociações para mais posições no Algarve Central com a Carvoeiro Branco. E, com a Antrix, estamos a analisar projetos no Montijo, em Setúbal, em Alcochete, que esperemos que deem frutos a partir do próximo ano. O residencial a sul de Lisboa será, sem dúvida, também com uma ótica de habitação mais acessível. Vai tudo depender do projeto que conseguirmos aprovar, do local onde vamos conseguir construir. Mas a ideia é também criar habitação em quantidade, com margens mais baixas e preços mais acessíveis.

“Ainda não sei quando, mas vamos investir em casas para estudantes em Coimbra”, Erik de Vlieger

No segmento residencial, pretendem diversificar a oferta para alojamentos para estudantes ou coliving, por exemplo?

EV: Em Coimbra, sim, que é a minha cidade portuguesa favorita. O mercado para estudantes é pequeno e barato, pelo que é muito difícil e a solução passará pela quantidade. Na Holanda, por exemplo, há casas em contentores e casas de madeira que são arrendadas a estudantes por dois ou três anos. Ainda não sei quando, mas vamos investir em casas para estudantes em Coimbra.

Reabilitação urbana
Projeto Bela Formosa nasce da requalificação da Fábrica Bela Olhão Créditos: Antrix | Carvoeiro Branco

A Antrix já tem casas em construção nos projetos que possui no Algarve, como a Bela Formosa?

PL: Casas em construção ainda não temos nenhuma na Antrix.  Adquirimos o projeto Bela Formosa que, infelizmente, não estava pronto para construir, pelo que estamos neste momento a ultrapassar questões burocráticas, estando previsto terminar o projeto e submetê-lo à câmara no início do próximo ano, altura em que vamos preparar o lançamento. 

No projeto Bela Formosa, em Olhão, teremos 434 chaves. Serão quartos de hotel, apartamentos turísticos e apartamentos residenciais destinados a um público médio-alto, português e internacional. Estamos a falar de um projeto residencial em cima da água, que obviamente tem um custo de aquisição e de construção superior e, consequentemente, teremos de ter um preço um pouco mais elevado. Noutros será diferente. 

“[A redução do IVA para 6% na construção] poderá, sem dúvida, facilitar os promotores a investir, porque reduz os custos de investimento”, Pedro Limbert, diretor comercial e de marketing na Antrix e Carvoeiro Branco

Está nos planos da Antrix construir casas a preços acessíveis. Como vê as recentes medidas para a habitação anunciadas pelo Governo, nomeadamente a redução do IVA para 6% na construção de casas para vender até 648 mil euros?

PL: Poderá, sem dúvida, facilitar os promotores a investir, porque reduz os custos de investimento. Na visão da Carvoeiro Branco e da Antrix, é uma medida que nos permite continuar a fazer aquilo que já era um dos nossos objetivos: construir habitação acessível. E, obviamente, temos mais margem para o fazer. Portanto, vemos esta medida com bons olhos. Não obstante, esta medida vem agarrada à tentativa de aumentar a oferta, de reduzir o preço das casas, mas há muito mais que tem de ser feito, nomeadamente na desburocratização de processos, na celeridade dos mesmos, acho que isso aí é que está o ganho.

Por exemplo, na Carvoeiro Branco temos o projeto do Vale da Pipa, na zona norte de Lagoa, com 304 apartamentos de habitação acessível, que estamos há quatro anos a trabalhar com a câmara e com as entidades que a rodeiam para conseguirmos aprovar. São quatro anos de custos e de trabalho para entregarmos habitação a quem precisa e ainda não conseguimos. Esperemos que muito em breve este projeto seja aprovado.

Licenciamento urbanístico
Vale da Pipa Residence, Lagoa Créditos: Carvoeiro Branco

O que vos leva a agarrar projetos de revitalização de antigas fábricas, como a Fábrica Bela Olhão e a Fábrica do Inglês, em Silves? Quais são as principais motivações e desafios? 

PL: A nossa motivação prende-se pelo facto de os centros das cidades terem-nas abandonadas, em ruínas. A Fábrica do Inglês esteve abandonada durante 15 anos, apesar de ter sido remodelada no início do milénio. Depois de mais de um ano de trabalho, estamos muito contentes por termos conseguido concretizar, em setembro, a compra da Fábrica do Inglês. É um espaço culturalmente muito importante para o Algarve e para Silves. A ideia é conservar todo o património, todo o edificado, mas voltar a renovar um espaço que já criou tantas memórias a tanta gente, já trouxe felicidade a muita gente. Reabrir o museu, que acho que é muito importante para o Algarve, porque não temos muitos espaços culturais, como o Museu da Cortiça e, por isso, essa é uma das nossas prioridades. 

Portanto, temos essa vontade de reabilitar. E não vamos ficar por aqui. Lanço também o repto a proprietários de fábricas devolutas no Algarve - e não só - a falarem connosco, pois poderemos ter interesse em ajudar e em desenvolver. E esta é uma das nossas missões, quase aqui também uma imagem de marca. 

“O uso misto acaba sempre por criar alguma diversidade e uma experiência um pouco mais completa dentro do empreendimento que vamos construir”, Pedro Limbert

Investir em projetos imobiliários de uso misto é um dos vossos focos? Porquê? 

PL: O uso misto acaba sempre por criar alguma diversidade e uma experiência um pouco mais completa dentro do empreendimento que vamos construir. Quando é possível, fazemo-lo, na grande maioria das vezes, em projetos turísticos. O facto de termos um hotel ou apartamentos turísticos acaba sempre por ter serviços associados. Em projetos residenciais como o Bela Olhão, temos também ali a necessidade em plano pormenor, de ter também uma unidade hoteleira. Portanto, é também, por vezes, a imposição do planeamento do território, embora para nós faça sentido que assim o seja, para podermos servir diferentes necessidades e criar uma experiência mais completa. 

No caso do Bela Olhão terá hotel, apartamentos turísticos, residenciais, lojas, centro de conferências, tudo à beira-rio. E na Fábrica do Inglês teremos também escritório, o museu, um pequeno hotel boutique, restauração e também alguma habitação. E é assim que queremos continuar a fazer, porque achamos que servimos a população da melhor forma.

Reabilitar fábricas antigas
Fábrica do Inglês, Silves Créditos: Gonçalo Lopes | idealista/news

Portanto na Fábrica do Inglês, em Silves, também têm previsto habitação?

PL: Exato. A Fábrica do Inglês tem vários edifícios do século XIX, que vão ser integralmente mantidos. Tem o museu, o edifício oeste e outros dois edifícios, onde vamos instalar o nosso escritório. Tem um edifício central que é a casa de chá, que neste momento está totalmente deteriorado, pelo que vamos iniciar de imediato trabalhos para conseguirmos manter o que existe. 

A Fábrica do Inglês tem também uma zona criada na altura da sua reconstrução em 1998 ou 1999, pelo grupo que na altura a comprou e que a transformou num espaço de divertimento cultural, onde tinham tendas e faziam espetáculos. Será nessa zona, que neste momento não tem nada construído, onde iremos dar azo a alguma habitação dentro do complexo. Portanto, será um complexo aberto ao público, mas também privado onde a rotina vai cruzar trabalhadores, residentes, visitantes e utilizadores do hotel e escritório. Será um projeto extremamente diferenciador no panorama do Algarve e até nacional. Estamos até a preparar uma curta-metragem sobre a Fábrica do Inglês que será lançada em breve.

“No caso dos empreendimentos grandes, (…) tomámos a decisão de trabalhar com construtores do Norte, que têm equipas mais especializadas, mais completas”, Pedro Limbert

Com vários projetos em curso na Carvoeiro Branco e Antrix, como têm lidado com a questão da falta de mão de obra na construção?

PL: Ao nível de força de trabalho interno na empresa, 90% dos nossos trabalhadores são algarvios, trabalham aqui e a nossa intenção é dar excelentes condições de trabalho e um ambiente empresarial diferenciador, divertido, integrado, respeitoso e, por isso, conseguimos atrair e reter talento. 

Quanto à força de trabalho no que toca à construção dos nossos empreendimentos, temos também a nossa empresa de construção para projetos até cerca de 100 unidades. Construímos internamente e aí temos o desafio da mão de obra e, por vezes, temos de recorrer a subempreiteiros. Bem sabemos que muita da força de trabalho neste momento no setor da construção advém de fora do país, sendo que, por vezes, são ainda mais qualificados do que a mão de obra que temos cá. E estamos, portanto, cientes e satisfeitos que assim continue, porque o setor da construção bem precisa. 

No caso dos empreendimentos grandes, não construímos internamente. Também tomámos a decisão de não construir mais com construtores locais, precisamente pela falta de infraestrutura que existe no Algarve, que não permite que as empresas algarvias consigam ter mão de obra suficiente para fazer face a construções desse tamanho. Note-se que o Algarve não é propriamente um sítio barato de se viver. Então, tomámos a decisão de trabalhar com construtores do Norte, que têm equipas mais especializadas, mais completas para fazer face às necessidades das nossas construções.

Mão de obra na construção de casas
Fundações do The Court, Carvoeiro, projeto da Antrix e da Carvoeiro Branco Créditos: Gonçalo Lopes | idealista/news

Qual é a sua perspetiva sobre a evolução da oferta, procura e preços das casas no próximo ano?

EV: Não tenho uma bola de cristal. Muitos pensam que os preços das casas em Portugal vão atingir um certo teto, mas eu creio que vão avançar muito mais. No Algarve, há muito poucas licenças de construção por causa da burocracia, porque a burocracia aqui é muito perigosa. E não podemos continuar a construir cada vez no Algarve, não é mais possível neste momento.

"É tempo de o Estado português criar uma lei para atacar este problema [das ruínas], é muito importante", Erik de Vlieger

A construção em altura poderia ser uma solução no Algarve? E a reabilitação?

EV: Sim, em Faro, Portimão e em Albufeira não vejo problema em construir em altura. Mas para o resto do Algarve não, é melhor construir mais baixo, como no Carvoeiro, Lagos… Temos de ter calma com a nossa costa.

A reabilitação é muito importante, porque um dos grandes problemas nas cidades em Portugal são as ruínas. E, às vezes, ninguém sabe quem são os proprietários das ruínas. É tempo de o Estado português criar uma lei para atacar este problema, é muito importante. Por exemplo, em qualquer país na Europa, quando um imóvel está em ruína por cinco anos, o Governo pode desapropriar. Em Portugal é muito difícil e há uma lei muito forte e democrática.

Habitação no Algarve
Vale de Milho Village, Carvoeiro Créditos: Gonçalo Lopes | idealista/news

Quais são os planos futuros da Antrix no país e além-fronteiras (quanto pretendem investir, em que zonas e segmentos)?

PL: Para Portugal o plano é desenvolver os projetos que já temos no Algarve, como o Bela Formosa e a Fábrica do Inglês, e dar continuidade à expansão nacional para Lisboa, Margem Sul, Montijo, Alcochete e Setúbal. Queremos fazê-lo já a partir do próximo ano. Vamos construir em escala e o nosso objetivo são as 10.000 casas. Vamos demorar vários anos até lá chegar, mas queremos fazê-lo de forma contínua, estruturada e com responsabilidade. Mas, para já, estamos no início. Já temos duas posições muito fortes na dentro da Antrix, com cerca de 600 unidades para desenvolver. No total do grupo, já quase chega às 1.800. Além fronteiras, os planos ainda não são muito claros.

EV: Os projetos pensados para o sudeste de Espanha são residenciais e hotelaria na mesma linha da Carvoeiro Branco, mas com escritório e sede no país. Neste momento, com as novas regras fiscais em Espanha, muitos compradores estrangeiros não compram lá, mas compram em Portugal. A atual governação espanhola está a ser boa para Portugal.

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